RE - 16370 - Sessão: 28/11/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pela COLIGAÇÃO FRENTE AMPLA (PT/PDT/PPS/PSD/PRB) em face de sentença do Juízo da 116ª Zona que, nos autos de Ação de Investigação Judicial Eleitoral movida em 30.8.2016 contra a COLIGAÇÃO UM NOVO CAMINHO PARA BUTIÁ (PMDB/PR/PSB) e os candidatos à chapa majoritária JEFFERSON SALATIEL DA SILVA VIEIRA e LUIZ ANTÔNIO KRUMEL, relativamente ao pleito de 2016 em Butiá, julgou improcedente o pedido.

Em suas razões, aduziu que Jefferson Salatiel abusou do seu poder político enquanto chefe do Poder Legislativo e utilizou sala pertencente à Câmara dos Vereadores para realizar reunião preparatória à convenção partidária. Sustentou que a sentença equivocou-se ao não reconhecer a prática da conduta vedada no inc. I do art. 73 da Lei n. 9.504/97, porquanto evidente não se tratar de convenção partidária, mas sim de reunião partidária que originou propaganda eleitoral antecipada em favor dos candidatos à eleição majoritária. Afirmou que a utilização da sala decorreu do abuso de autoridade do Presidente da Câmara à época do fato, praticado em benefício próprio e da coligação que viria a compor.

Requereu o provimento, a fim de ser julgada procedente a ação e, por consequência, “multados e/ou cassado o diploma dos recorridos, nos termos do art. 73, inc. I, §§ 4º e 8º da Lei n. 9.504/97, ou, sendo o entendimento deste Tribunal, a aplicação da multa do art. 36, § 3º, por ter cometido a infração do art. 36-A, inc. II, da mesma lei” (fls. 51-55).

Com contrarrazões (fls. 59-60), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 63-66v.).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele conheço.

Mérito

No mérito, insta averiguar se a realização de reunião político-partidária em sala pertencente à Câmara de Vereadores de Butiá, em período prévio às eleições de 2016, com a participação do então Presidente daquela Casa e candidato ao cargo de prefeito, Jefferson Salatiel da Silva Vieira, teve o condão de caracterizar a conduta vedada prevista no inc. I do art. 73 da Lei das Eleições e/ou, cumulativamente, o abuso de poder de autoridade retratado na norma do art. 22 da LC 64/90, e objeto da presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE.

Para esse fim, inicialmente lanço algumas premissas.

A finalidade precípua da AIJE é apurar o uso indevido, o desvio ou o abuso do poder no seu espectro econômico e político (ou emanado de autoridade), bem como a utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou partido político. Uma vez configurado o ilícito, a procedência da representação instrumentalizada leva à declaração de inelegibilidade de todos os que para ele tenham contribuído, por oito anos, e à cassação do registro ou diploma do beneficiado.

Esta a legislação de regência:

LC 64/90

Art. 19

As transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, abuso do poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de voto, serão apuradas mediante investigações jurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais.

Parágrafo único. A apuração e a punição das transgressões mencionadas no caput deste artigo terão o objetivo de proteger a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

[...]

Art. 22

Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: [...]

XIV - julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;

[...]

XVI - para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

Art. 23

O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

Afora sua generalidade, isto é, ausência de taxatividade, a AIJE caracteriza-se por prescindir do elemento subjetivo do candidato efetivamente beneficiado, pela tutela da normalidade e legitimidade das eleições e pela prova da potencialidade lesiva da prática imputada.

A leitura atenta do inc. XVI do art. 22 da LC n. 64/90, acrescentado pela LC n. 135/10, revela que o requisito da gravidade das circunstâncias está ligado à noção de preservação da normalidade e legitimidade das eleições – como o bem jurídico em sua magnitude ampla. É dizer, o elemento constitutivo do abuso de poder, em sua concepção genérica, tem suas feições delineadas, no caso concreto, pela gravidade das circunstâncias do ilícito.

Por sua vez, relega-se a ideia da potencialidade atrelada ao resultado da eleição, na sua acepção estritamente aritmética, inclusive por força da novel disposição legal, à valoração em conjunto com os demais elementos da lide, até porque é possível juízo de procedência antes mesmo da realização do pleito.

Essa é a lição de Rodrigo López Zilio, segundo o qual o abuso do poder de autoridade “é todo ato emanado de pessoa que exerce cargo, emprego ou função que excede aos limites da legalidade ou de competência. […] pressupõe o exercício de parcela de poder, não podendo se cogitar da incidência desta espécie de abuso quando o ato é praticado por pessoa desvinculada da administração pública (lato sensu)”, ao passo que o abuso de poder político “se caracteriza pela vinculação do agente do ilícito mediante mandato eletivo” (em Direito Eleitoral: noções preliminares, elegibilidade e inelegibilidade, processo eleitoral [da convenção à diplomação], ações eleitorais. 4ª edição. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2014, p. 506).

A seu turno, tal como a motivada por conduta vedada, as representações específicas caracterizam-se pela obrigatória adequação típica ao fato, pela proteção a bens jurídicos diversos e pela prescindibilidade da prova da potencialidade lesiva do fato em relação à lisura do pleito.

Especificamente, as representações por condutas vedadas, consideradas de legalidade restrita, têm como finalidade apurar atos tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais, dispensando-se aí o elemento subjetivo do candidato.

Para a subsunção do fato à norma, o legislador previu a suspensão imediata da conduta, quando for o caso, multa aos responsáveis e, sem prejuízo da pena pecuniária, a cassação do registro ou diploma do candidato beneficiado.

Lei n. 9.504/97

Art. 73

São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária; [...]

§ 1º Reputa-se agente público, para os efeitos deste artigo, quem exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta, ou fundacional. [...]

§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.

§ 5° Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos do caput e no § 10, sem prejuízo do disposto no § 4º, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma.

§ 6º As multas de que trata este artigo serão duplicadas a cada reincidência.

§ 7º As condutas enumeradas no caput caracterizam, ainda, atos de improbidade administrativa, a que se refere o art. 11, inciso I, da Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992, e sujeitam-se às disposições daquele diploma legal, em especial às cominações do art. 12, inciso III.

§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem. […]

Nesse contexto, na esteira da jurisprudência do TSE, cumpre realizar juízo de proporcionalidade na fixação das sanções previstas, à vista da gravidade dos fatos (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 11.488 – Rel. Arnaldo Versiani – j. 22.10.2009).

Embora possível a interligação das suas causas de pedir, diferencia-se a AIJE daquelas representações específicas e especiais no tocante à sua finalidade e ao seu objeto.

É nesse cenário que, no caso vertente, os pedidos aforados apresentam-se na forma de AIJE, sob o viés do abuso do poder de autoridade (art. 22 da LC n. 64/90), e sob a roupagem de representação eleitoral específica, com esteio no art. 73, inc. I, da Lei 9.504/97.

A ora recorrente, ainda, à vista do contexto fático subjacente, sinalizou, em suas razões, a infringência ao art. 36-A, inc. II, da Lei das Eleições.

Prossigo.

Ao compulsar os autos, deparei com as imagens objeto do CD de fl. 9, constantes às fls. 10-11 e reproduzidas na rede social Facebook no dia 22.7.2016, as quais demonstram pessoas sentadas em volta de uma mesa, em recinto fechado no âmbito da Câmara de Vereadores de Butiá.

No texto da respectiva postagem, no perfil de “Joel Maraschin”, menciona-se, tão só, a realização de uma “brainstorming de alta performance com equipe mega focada”, acrescendo-se comentários de terceiros que inseriram palavras de incentivo às possíveis candidaturas atreladas àquela imagem.

O recorrido Jefferson Salatiel admitiu o encontro, isso é incontroverso, mas rechaçou a possibilidade de violação ao texto legal.

Ocorre que nada mais há nos autos a título de prova, a não ser a cópia de ata de sessão realizada no Legislativo local, dando conta do exercício da presidência daquela casa por Jefferson Salatiel (fls. 15-16); nem mesmo a oitiva de uma testemunha sequer, sendo que a própria representante desistiu expressamente da inquirição da que fora por ela arrolada na exordial, consoante o Termo de Audiência de fl. 44, pelo qual também se infere a desistência da oferta de alegações finais pelas partes.

Ora, é o inc. I do art. 73 da Lei n. 9.504/97 que faz expressa ressalva de que a cessão ou uso de bens pertencentes à administração pública são permitidos em caso de realização de convenção partidária em prédios públicos - de onde entendo ser possível a utilização desses bens para eventos semelhantes, como reuniões partidárias, sem, contudo, implicar malferimento da norma legal, como ora se verifica.

Já o § 3º do art. 37 da Lei das Eleições, por aplicação analógica, excepciona a incidência da norma inserta no inc. I do art. 73, prevendo a possibilidade de divulgação de propaganda eleitoral no âmbito do Poder Legislativo, a critério do estabelecido pela Mesa Diretora.

Por essas razões, não vislumbro qualquer desequilíbrio entre os candidatos na realização da reunião impugnada. Não vejo como uma reunião realizada na Câmara de vereadores, isto é, na casa onde com maior propriedade estes encontros acontecem, autorize a presunção de que se gerou desequilíbrio entre os candidatos concorrentes naquele pleito.

Ainda, conquanto inequívocas as ressalvas previstas na legislação, os fatos tratados nesses autos não têm força suficiente para ensejar o pesado juízo de procedência e consectários legais previstos para a representação por condutas vedadas.

Nesse sentido o aresto deste Tribunal:

Recurso. Conduta vedada. Artigo 73, incisos I e II, da Lei n. 9.504/97. Prefeito, vice e vereador. Eleições 2012. Improcedência da representação pelo julgador monocrático.

[...]

O uso, pelos representados, da sala de reuniões da Câmara Municipal de Vereadores, ocasião em que também utilizados materiais e equipamentos públicos, não ofende a legislação de regência, haja vista a expressa ressalva prevista no inciso I do citado dispositivo legal, que permite a cessão ou uso de bens pertencentes à administração pública para a realização de convenção partidária, sendo factível o uso destes bens para eventos semelhantes, como reuniões partidárias.

Não verificado qualquer desequilíbrio entre os candidatos na realização da reunião impugnada.

(TRE/RS – RE 764-77.2012.6.21.0161 – Rel. DR. JORGE ALBERTO ZUGNO – J. Sessão de 22.10.2013.)

De forma que, à míngua de acervo probatório consistente, não há como acolher a pretensão deduzida, seja sob o viés do abuso de poder de autoridade, ou político, seja no que concerne à conduta supostamente vedada, na linha da fundamentação da sentença (fls. 47-49):

No mérito.

Não se configura o uso irregular de bem público, pois o próprio artigo 73, inciso I, da Lei 9.504/97, que estabelece a proibição do uso de bens públicos, faz a ressalva, permitindo a utilização para a realização de convenção dos partidos: […]

A doutrina e jurisprudência, por analogia, permitem o uso para eventos análogos ou semelhantes, exatamente o caso da reunião prévia realizada.

Melhor sorte não assiste à parte autora quanto à alegada propaganda antecipada, a qual, para configurar-se, exige que haja pedido explícito de voto, hipótese sequer alegada nos presentes autos.

Conforme o artigo 36-A, da Lei 9.504/97, não se considera propaganda eleitoral antecipada, se não houver pedido explícito de voto, podendo, inclusive, haver menção à pré-candidatura, exaltação de qualidades pessoais dos pré-candidatos, podendo, ainda, ser transmitidos pelos meios de comunicação social e pela internet.

[…]

A jurisprudência é uníssona no mesmo sentido: […]

Por tais razões, o caminho da presente investigação judicial é a improcedência.

ISSO POSTO, julgo IMPROCEDENTE a presente ação de Investigação Judicial Eleitoral.

Colho, no mesmo norte, o precedente do TSE:

ELEIÇÕES 2010. RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CANDIDATOS A GOVERNADOR DE ESTADO, A VICE-GOVERNADOR, A SENADOR DA REPÚBLICA E A SUPLENTES DE SENADORES. ABUSO DO PODER POLÍTICO, ECONÔMICO E USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. UTILIZAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS EM CAMPANHA. COAÇÃO SOBRE EMPRESÁRIOS DO ESTADO PARA FAZEREM DOAÇÃO À CAMPANHA DOS RECORRIDOS. ARREGIMENTAÇÃO E TRANSPORTE DE FUNCIONÁRIOS DE EMPRESAS PRIVADAS E DE COOPERATIVAS PARA PARTICIPAREM DE ATO DE CAMPANHA. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DA IMPRENSA ESCRITA EM RELAÇÃO AO ESTADO DO ACRE. ALINHAMENTO POLÍTICO DE JORNAIS PARA BENEFICIAR DETERMINADA CAMPANHA.

1. Com base na compreensão da reserva legal proporcional, a cassação de diploma de detentor de mandato eletivo exige a comprovação, mediante provas robustas admitidas em direito, de abuso de poder grave o suficiente a ensejar essa severa sanção, sob pena de a Justiça Eleitoral substituir-se à vontade do eleitor. Compreensão jurídica que, com a edição da LC nº 135/2010, merece maior atenção e reflexão por todos os órgãos da Justiça Eleitoral, pois o reconhecimento do abuso de poder, além de ensejar a grave sanção de cassação de diploma, afasta o político das disputas eleitorais pelo longo prazo de oito anos (art. 1º, inciso I, alínea d, da LC nº 64/1990), o que pode representar sua exclusão das disputas eleitorais.

2. Abuso do poder político na utilização de servidores públicos em campanha: competia ao Ministério Público Eleitoral provar que os servidores públicos ou estavam trabalhando em campanha eleitoral no horário de expediente ou não estavam de férias no período em que se engajaram em determinada campanha. O recorrente não se desincumbiu de comprovar o fato caracterizador do ilícito eleitoral, nem demonstrou, com base na relação com o horário de expediente de servidores, que estariam trabalhando em período vedado, tampouco pleiteou a oitiva dos servidores que supostamente estariam envolvidos ou que comprovariam os ilícitos.

[...]

3. Abuso do poder político e econômico na coação sobre empresários do Estado para fazerem doação à campanha dos recorridos: impossibilidade de se analisarem interceptações telefônicas declaradas ilícitas pela Justiça Eleitoral. O modelo constitucional de financiamento de disputa de mandatos eletivos, seja pelo sistema proporcional, seja pelo sistema majoritário, não veda a utilização do poder econômico nas campanhas eleitorais; coíbe-se tão somente, em respeito à normalidade e à legitimidade do pleito, o uso excessivo ou abusivo de recursos privados no certame eleitoral, o que não ficou demonstrado pelo Ministério Público Eleitoral, a quem competia provar a alegada ilicitude. O fato de determinada empresa privada possuir contrato com o poder público não impede a pessoa jurídica de participar do processo eleitoral na condição de doadora, salvo se "concessionário ou permissionário de serviço público", nos termos do art. 24, inciso III, da Lei nº 9.504/97, tampouco autoriza concluir necessariamente que as doações foram fruto de coação ou troca de favores.

4. Abuso do poder político e econômico na arregimentação e transporte de funcionários de empresas privadas e de cooperativas para participarem de ato de campanha dos recorridos: a configuração do abuso de poder, com a consequente imposição da grave sanção de cassação de diploma daquele que foi escolhido pelo povo afastamento, portanto, da soberania popular, necessita de prova robusta da prática do ilícito eleitoral, exigindo-se que a conduta ilícita, devidamente comprovada, seja grave o suficiente a ensejar a aplicação dessa severa sanção, nos termos do art. 22, inciso XVI, da LC nº 64/1990, segundo o qual, "para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam". Requisitos ausentes no caso concreto. [...]

7. Recurso ordinário desprovido.

(TSE – RO n. 191942 – Rel. Min. GILMAR FERREIRA MENDES – DJE de 8.10.2014)

Para além, não conheço da alegação recursal de que, em face do mesmo substrato fático, tenha havido ofensa ao art. 36-A, inc. II, da Lei 9.504/97, visto que não constituiu o pedido inicial, formulado às fls. 2-7 e, portanto, não submetido ao crivo do magistrado de primeira instância. E mesmo que assim não fosse, por decorrência lógica da ausência de subsunção acima delineada, afasta-se a incidência do conteúdo proibitivo objeto da norma do dispositivo em referência.

Nessa mesma linha, agrego ainda a seguinte passagem do parecer do Procurador Regional Eleitoral (fls. 63-66v.):

Com efeito, incontroversa a realização da reunião no dia 22 de julho de 2016, nas dependências da Câmara de Vereadores de Butiá, sendo que a própria defesa reconhece que o objetivo da reunião era “tratar de assunto de preparação das convenções municipais da coligação 'Um novo Caminho para Butiá'” (fl. 20). O evento não contou com a participação de eleitores, mas somente com a presença de pré-candidatos aos cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador, e não foram utilizados materiais e equipamentos públicos, conforme se depreende da fotografia de fl. 10.

Ocorre que o inciso I do artigo 73 da Lei nº 9.504/97 faz expressa ressalva de que a cessão ou uso de bens públicos serão permitidos em caso de realização de convenção partidária, sendo razoável entender possível a utilização desses bens para eventos semelhantes, como o que ocorreu no caso narrado na exordial. [...]

Reitere-se que a reunião ocorreu com a participação de poucos políticos vinculados aos partidos que compõe a coligação investigada e não há notícia de que o acesso era franqueado ao público em geral ou que tenha havido ampla divulgação do encontro, com pedidos de apoio político. Agregue-se, ainda, o fato de outras reuniões do mesmo tipo terem sido realizadas por outros partidos, como demonstram as fotos juntadas às fls. 24-25, motivo pelo qual é evidente não haver desigualdade de oportunidades entre os candidatos.

Sobre este fato, destaca-se as considerações feitas pelo Ministério Público Eleitoral à origem, por relevantes (fls. 45-49):

“Certo, houve o uso de bem público para a reunião, contudo não restam configurados os seguintes elementos para a subsunção do fato à norma.

Por primeiro, não veio prova de que a conduta afetou a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.

Ao depois, tratava-se de pré-candidatura, sendo reuniões similares, de outras greis partidárias foram realizadas no mesmo bem público, conforme fls. 24-5.

Por fim, a legislação prevê exceções que merecem ser consideradas.

(...)

A exceção legal mostra que não desborda do razoável a compreensão de que reunião fechada com apoiadores de futura candidatura de parlamentar, na sede da Câmara Municipal, também enquadra-se em exceção legal a não configurar o abuso.”

[...]

Quanto à alegação de que a divulgação da reunião teria configurado propaganda eleitoral antecipada, tampouco merece acolhida o recurso.

A novel redação do artigo 36-A da Lei das Eleições é expressa ao dispor que não configura propaganda eleitoral antecipada a menção à pretensa candidatura quando não feito pedido explícito de votos, inclusive pela internet. E foi exatamente o que ocorreu no caso, a divulgação em um perfil do Facebook de uma foto da reunião em que se discutia a pré-candidatura dos recorridos, entre outros assuntos, sem fazer qualquer pedido de votos aos eleitores.

Em face de tais razões, a Procuradoria Regional Eleitoral manifesta-se pelo desprovimento do recurso, a fim de que seja mantido o juízo de improcedência da ação.

Portanto, dentro de todo esse contexto, a manutenção da sentença é medida que se impõe.

Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pela COLIGAÇÃO FRENTE AMPLA (PT/PDT/PPS/PSD/PRB) de Butiá.