RE - 36376 - Sessão: 13/12/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostos pelo representante SILVIO LUIS DA SILVA RAFAELI (fls. 67-70) e pelo representado JOSÉ BATISTA SILVEIRA PEREIRA (fls. 97-100), em face de sentença proferida pelo Juízo da 84ª Zona Eleitoral – Tapes (fls. 51-53), que julgou procedente representação por propaganda eleitoral irregular relativa à publicação de vídeo na rede social Facebook, e condenou o representado JOSÉ BATISTA SILVEIRA PEREIRA em sede de embargos de declaração, aos quais foram atribuídos efeitos infringentes (fls. 62-63), ao pagamento de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Em sua irresignação, o representante SILVIO RAFAELI pugnou pela majoração da multa aplicada ao representado, ora recorrido, JOSÉ BATISTA SILVEIRA PEREIRA.

A seu turno, o representado JOSÉ BATISTA SILVEIRA PEREIRA, requereu o afastamento da multa aplicada.

Apresentadas contrarrazões (fls. 104-11 e 114-8), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso do representante e pelo não conhecimento do recurso do representado (fls. 121-123v.).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

A decisão proferida em sede de embargos de declaração (fls. 62-63) foi afixada no Mural Eletrônico da Justiça Eleitoral do Rio Grande do Sul em 11.10.2016, às 14h01min (fl. 65), sendo que, para a espécie, vale o prazo de 24 horas previsto no art. 35 da Resolução TSE n. 23.462/15.

A seu turno, a Portaria n. 259/16 da Presidência deste Tribunal, que instituiu o Mural Eletrônico, dispõe em seu art. 10 que:

Art. 10. Os prazos para a prática de atos processuais fixados em horas serão contados minuto a minuto, iniciando-se a contagem a partir da 0h (zero hora) do dia seguinte ao da divulgação da decisão judicial ou da intimação no Mural Eletrônico.
Parágrafo único. O prazo fixado em horas que, porventura, vencer fora do horário de funcionamento dos Cartórios Eleitorais e da Secretaria Judiciária do Tribunal fica prorrogado, automaticamente, para o término da primeira hora de início de seu funcionamento no dia imediatamente posterior, findando-se no último minuto da primeira hora de abertura do expediente.

Assim, o recurso do representante SILVIO LUIS DA SILVA RAFAELI é tempestivo, pois interposto em 13.10.2016, às 10h12min (fl. 67).

Quanto ao recurso interposto pelo representado JOSÉ BATISTA SILVEIRA PEREIRA, em que pese o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral pela sua intempestividade, tenho que deve ser igualmente conhecido.

Referido recurso foi protocolizado em 13.10.2016, às 13h52min (fl. 97).

Em princípio, poder-se-ia concluir que fora protocolizado após o horário limite do dia 13.10.2016.

Contudo, no dia 12.10.2016 não houve expediente forense (Dia de Nossa Senhora Aparecida, conforme a Lei n. 6.802/80 e a Portaria TRE-RS P. n. 311/15, inc. IX), fazendo com que a hora inicial da contagem correspondesse à zero hora do dia 13.10.2016, prorrogando, via de consequência, o seu término para a primeira hora de início do dia 14.10.2016.

Nesse sentido, não parece plausível exigir que a contagem em questão inicie e termine em dia durante o qual não há regular funcionamento cartorário.

Isso é o que deflui, inclusive, do teor das Portarias TRE-RS P. n. 301/16 e P. n. 311/16, naquilo que dispõem acerca do funcionamento das serventias cartorárias.

Portanto, a irresignação em referência deve ser considerada tempestiva.

Preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço de ambos os recursos.

Mérito

No caso em tela, reconhecendo como ofensivo o conteúdo de vídeo publicado pelo representado em seu perfil na rede social Facebook, o juízo de piso determinou, liminarmente, a exclusão da postagem, no prazo de 4 (quatro) horas, sob pena de multa diária de R$ 2.000,00.

Noticiado pelo representado o cumprimento da determinação (fls. 41-46), sobreveio sentença julgando procedente a representação (fls. 51-53), ratificando a liminar deferida, por entender a magistrada de piso que o material postado pelo ora recorrido JOSÉ BATISTA SILVEIRA PEREIRA extrapolou a mera crítica, enquadrando-se no disposto no § 3º do art. 57-D da Lei n. 9.504/97.

Inconformado, o representante opôs embargos de declaração com pedido de efeitos infringentes, alegando que o julgado padecia de omissão, pois não aplicada a sanção pecuniária prevista no § 2º do art. 57-D da Lei n. 9.504/97 (fls. 59-60).

A magistrada sentenciante acolheu os embargos e, atribuindo-lhes efeitos infringentes, condenou o representado JOSÉ PEREIRA ao pagamento de multa fixada no mínimo legal – R$ 5.000,00.

Inconformado com o quantum em que fixada a penalidade, o representante opôs recurso objetivando sua majoração, ao passo que o recurso do representado visa à reforma total da decisão, por ausência de ilegalidade na veiculação inquinada.

Com efeito, no meu sentir, a reforma da sentença é medida que se impõe, porquanto, manifestamente, não se infere o conteúdo ofensivo alegado na exordial.

Para tanto, adoto como razões de decidir trecho do parecer do Procurador Regional Eleitoral, que esgotou a análise desse aspecto, inclusive com esteio na jurisprudência aplicável (fls. 121-123v.):

No caso dos autos, o vídeo impugnado, veiculado por meio da rede social facebook , em perfil pessoal do representado, intitulado “GASTOS DESNECESSÁRIOS COM ALUGUÉIS, AGUARDEM OS PRÓXIMOS VÍDEOS”, não possui conteúdo ofensivo, configurando mera crítica à gestão da administração municipal pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT, conforme se extrai da oitiva da mídia (CD) acostada à fl. 11.

É possível observar que a manifestação do representado contém crítica que, embora contundente, não ultrapassa o limite da liberdade de expressão, sem que tenha havido ofensa à honra do candidato representante.

De outro lado, diferentemente do que afirmado na inicial, a mensagem ora impugnada, não imputa ao candidato ora representante a “pecha de corrupto”, não fazendo qualquer menção a esse termo.

Nessa linha, entende-se que não houve, no caso, um excesso indevido do direito ao livre exercício da manifestação de pensamento, tampouco abuso da liberdade de crítica inerente ao embate das eleições. Ademais, é cediço que aquele que submete ou pretende submeter seu nome ao escrutínio aberto, com o objetivo de conquistar ou manter mandato público, não pode angustiar-se com elementos ou termos próprios do acerbo debate eleitoral.

Nesse sentido:

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANÔNIMA E IRREGULAR. ANONIMATO INEXISTENTE NO SITE FACEBOOK, NA MEDIDA EM QUE OS PERFIS EXISTENTES EM TAL PROVEDOR SÃO PASSÍVEIS DE ESPECIFICAÇÃO, SEJA A PARTIR DOS DADOS CADASTRAIS OBRIGATORIAMENTE FORNECIDOS, SEJA POR INTERMÉDIO DOS NÚMEROS DE PROTOCOLO NA INTERNET. INEXISTÊNCIA DE PEDIDO DE IDENTIFICAÇÃO DOS RESPONSÁVEIS PELAS POSTAGENS IMPUGNADAS. INSERÇÕES EXTERNADAS EM CONSONÂNCIA COM O LIVRE EXERCÍCIO DA MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO, SEM ABUSO DA LIBERDADE DE CRÍTICA INERENTE AO EMBATE DAS ELEIÇÕES. RECONHECIMENTO, ADEMAIS, DE QUE, NO CAMPO DA POLÍTICA, AQUELE QUE SUBMETE OU PRETENDE SUBMETER SEU NOME AO ESCRUTÍNIO ABERTO, COM O OBJETIVO DE RECEBER OU MANTER MANDATO PÚBLICO, NÃO PODE ANGUSTIAR-SE COM

TERMOS OU ELEMENTOS DE ORAÇÃO PRÓPRIOS DO ACERBO DEBATE ELEITORAL, AINDA QUE ÁCIDOS, CONTUNDENTES OU ATÉ IRRITANTES. PRECEDENTES. DECISÃO MONOCRÁTICA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO ELEITORAL

DESPROVIDO.

(TRE/SP - RECURSO nº 475465, Acórdão de 11.12.2014, Relatora CLAUDIA LUCIA FONSECA FANUCCHI, Publicação: DJESP – Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 19.12.2014).

Destarte, na mesma linha do parecer apresentado pelo Ministério Público Eleitoral em 1º grau (fls. 48-49), entende esta Procuradoria Regional Eleitoral pela não configuração de veiculação de mensagem ofensiva, difamatória, caluniosa, tampouco a afirmação de fatos sabidamente inverídicos (grifos no original).

Nesse passo, visto que a multa foi aplicada ao representado com fundamento no art. 24, § 1º, da Resolução TSE n. 23.457/15, impõe-se considerar novamente o dispositivo congênere – art. 57-D da Lei 9.504/97:

Art. 57-D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3º do art. 58 e do 58-A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica.

[…]

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

§ 3º Sem prejuízo das sanções civis e criminais aplicáveis ao responsável, a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação do ofendido, a retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatos em sítios da internet, inclusive redes sociais.

Incluído pelo art. 3º da Lei n. 12.891, de 2013. (Grifei.)

Da sua leitura, observa-se que a norma abrange duas hipóteses.

A primeira consiste na vedação do anonimato na rede mundial de computadores durante a campanha eleitoral.

A segunda, a seu turno, assegura o direito de resposta na internet, estendendo a aplicação do art. 58 da Lei das Eleições, que contempla esse direito em qualquer veículo de comunicação social:

Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

Assim, a imposição da multa prevista no aludido art. 57-D da Lei n. 9.504/97 refere-se apenas à manifestação anônima do pensamento, pois a disciplina do direito de resposta prevê a aplicação da sanção somente nos casos de descumprimento de ordem judicial e de reiteração da conduta, conforme disposição expressa do art. 58, § 8º, da Lei n. 9.504/97:

Art. 58.

[...]

§ 8º O não-cumprimento integral ou em parte da decisão que conceder a resposta sujeitará o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR, duplicada em caso de reiteração de conduta, sem prejuízo do disposto no art. 347 da Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

[...] (Grifei.)

Dessa forma, repito, a imposição de multa está restrita às hipóteses de anonimato.

Nesse sentido, os seguintes precedentes deste Tribunal:

Recurso. Representação. Direito de resposta. Propaganda eleitoral. Internet. Art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Procedência da representação no juízo de piso, deferindo o direito de resposta, sem aplicação de multa.

Insurgência restrita ao pedido de fixação de multa. Divulgação, em site de relacionamentos, de afirmação ofensiva à honra do candidato. Inaplicável a fixação da sanção prevista no § 2º do art. 57-D da Lei das Eleições, restrita aos casos de anonimato, situação não evidenciada nos autos.

Provimento negado.

(TRE-RS - Relator: Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – P. Sessão 09.11.2016). (Grifei.)

 

Recurso. Representação. Direito de resposta. Propaganda eleitoral. Internet. Multa. Art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Sentença que julgou parcialmente procedente representação por propaganda irregular, determinando a retirada da publicação da página da internet e indeferindo, por outro lado, o pedido de direito de resposta e de aplicação de multa.

Irresignação postulando a fixação de multa. Divulgação, em site de relacionamentos, de afirmação ofensiva à honra do candidato. Inaplicável a pretendida aplicação da multa prevista no § 2º do art. 57-D da Lei das Eleições, penalidade restrita aos casos de anonimato, situação não evidenciada nos autos.

Provimento negado.

(TRE-RS. RE 414-24.2016.6.21.0008, Rel. Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 28.9.2016). (Grifei.)

No caso dos autos, está fartamente demonstrado que o recorrido não se valeu de anonimato ao realizar a postagem na internet, circunstância que torna, portanto, de qualquer sorte, inaplicável a multa prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97.

Em outras palavras, diante da ausência de previsão legal, mesmo que confirmada a sentença no que tange à existência de conteúdo ofensivo, a fixação da sanção pecuniária seria impossível sob o viés jurídico – questão reconhecível, inclusive, ex officio, independente da interposição de recurso eleitoral –, prejudicando, por conseguinte, o pleito recursal de majoração da multa.

Portanto, nesses termos, a reforma da sentença é medida que se impõe.

 

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso interposto por JOSÉ BATISTA SILVEIRA PEREIRA, para o fim de julgar improcedente a representação subjacente e afastar a multa imposta, e pelo desprovimento do recurso interposto por SILVIO LUIS DA SILVA RAFAELI.