RE - 36736 - Sessão: 05/12/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ALINI WILGES (fls. 34-36) em face de sentença proferida pelo Juízo da 45ª Zona Eleitoral (fl. 32 e verso) que julgou procedente representação por propaganda eleitoral irregular ajuizada por JACQUES GONÇALVES BARBOSA, BRUNO WALTER HESSE, EDUARDO DEBACCO LOUREIRO e pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT, de Santo Ângelo, condenando a representada ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), além da retirada das publicações de sua página na rede social Facebook.

Em suas razões, a recorrente afirmou que publicou, em sua conta pessoal do Facebook, somente comentários sobre matéria veiculada na imprensa local, acerca de fatos públicos e notórios atribuídos aos representantes. Aduziu que sua manifestação não teve cunho eleitoral e pugnou pela reforma da sentença para julgar improcedente a representação, ou, alternativamente, a redução do valor da multa.

Apresentadas contrarrazões (fls. 39-41), nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo provimento do recurso (fls. 45-47).

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 24 horas previsto no art. 35 da Resolução TSE n. 23.462/15.

Preliminar reconhecida ex officio - ilegitimidade ad causam

Tenho que os representantes, ora recorridos, Partido Democrático Trabalhista – PDT, de Santo Ângelo, e Eduardo Debacco Loureiro não detêm legitimidade ativa para a causa, devendo ser excluídos da demanda.

O primeiro porque compôs a COLIGAÇÃO PRA FRENTE SANTO ANGELO, integrada, também, pelos partidos PCdoB, SD, REDE, PSB e PTB, no pleito de 2016 às eleições majoritárias, e formou coligação com o Partido Solidariedade nas eleições proporcionais.

Ao reproduzir o disposto no art. 6º, §4º, da Lei n. 9.504/97, a Resolução TSE n. 23.455/15 assentou que o partido coligado somente terá legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação:

Art. 6º A coligação terá denominação própria, que poderá ser a junção de todas as siglas dos partidos políticos que a integram, sendo a ela atribuídas as prerrogativas e obrigações de partido político no que se refere ao processo eleitoral, devendo funcionar como um só partido político no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários.

[…]

§ 3º Durante o período compreendido entre a data da convenção e o termo final do prazo para a impugnação do registro de candidatos, o partido político coligado somente possui legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação.

Também assim a jurisprudência deste Tribunal:

Recurso. Impugnação ao registro de candidatura. Cargo de vereador. Ilegitimidade ativa do partido político. Art. 6º, § 4º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016.

Irresignação contra decisão que rejeitou a impugnação e deferiu o pedido de registro de candidatura postulado.

Interposição recursal por partido político integrante de coligação. Legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral apenas para questionar a validade da própria coligação. Ilegitimidade ativa.

Não conhecimento.

(RE 9886 – Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – J. Sessão de 09.9.2016.)

 

Recurso. Registro de candidatura. Cargo de vereador. Ilegitimidade ativa. Partido coligado. Eleições 2016.

Preliminar de ilegitimidade ativa acolhida. O partido político coligado não detém legitimidade para atuar de forma isolada, exceto quando questionar a validade da própria coligação, nos termos do art. 6º, § 4º, da Lei n. 9.504/97.

Não conhecimento.

(TRE-RS – RE 48-86 – Rel. DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI – J. Sessão de 13.9.2016.)

Quanto ao recorrido Eduardo Debacco Loureiro, destaco, primeiramente, que nem ele nem a representada, ora recorrente, Alini Wilges foram candidatos nas eleições municipais de 2016.

A Resolução TSE n. 23.462/15, que regulamenta, para as eleições de 2016, as representações, reclamações e pedidos de resposta previstos na Lei n. 9.504/97, é expressa em seu art. 2º sobre a legitimidade para propor representações eleitorais. Nesse sentido:

Artigo 2º: As reclamações e as representações poderão ser feitas por qualquer partido político, coligação, candidato ou pelo Ministério Público.

(Lei nº 9.504/1997, art. 96, caput e inciso I).

In casu, a mensagem supostamente ofensiva foi veiculada em rede social da internet – Facebook – pela eleitora Alini Wilges. Também eleitor o representante Eduardo Debacco Loureiro.

Não compete à Justiça Eleitoral intervir na relação eleitor-eleitor, em razão de conteúdo veiculado em espaço não reservado à propaganda eleitoral, apenas por se tratar de matéria de cunho político, partidário ou eleitoral.

Nesse sentido, a jurisprudência:

Recurso. Representação. Direito de resposta. Facebook. Eleições 2016.

Sentença do juízo originário que julgou improcedente representação para assegurar direito de resposta. Postagem realizada na rede social Facebook, apresentando conteúdo alegadamente calunioso e ofensivo.

Prefacial arguida de ofício. Ilegitimidade ativa. Compete à Justiça Eleitoral examinar apenas os pedidos de direito de resposta formulados por terceiro quando a veiculação ocorrer no horário eleitoral gratuito. Entendimento firmado pela Corte Superior. In casu, mensagem supostamente ofensiva, de cunho político-eleitoral, não divulgada no espaço reservado à propaganda eleitoral gratuita, mas na rede social Facebook, cujo autor é terceiro e a mensagem dirigida a outro eleitor. Inviabilidade da pretensão deduzida.

Não conhecimento.

(TRE-RS – RE n. 352-49 – Relator Des. Carlos Cini Marchionatti – P. Sessão 17.10.2016.)

Por essas razões, submeto à apreciação, de ofício, preliminar de ilegitimidade ad causam de Eduardo Debacco Loureiro, haja vista sua condição de terceiro, bem como em razão da suposta ofensa ter sido formulada por eleitora – e não por candidato, partido ou coligação –, e do Partido Democrático Trabalhista – PDT, de Santo Ângelo.

Destaco.

Prossigo.

Preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Mérito

Cuida-se de recurso interposto por Alini Wilges contra sentença que julgou procedente representação contra ela proposta, condenando-a ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) pela postagem, em sua conta pessoal no Facebook, de comentários sobre notícia veiculada em jornal local acerca da instauração, pela câmara de vereadores local, de CPI para apurar suposta irregularidade na utilização de verbas públicas pelos recorridos Eduardo Debacco Loureiro, Jacques Gonçalves Barbosa e Bruno Walter Hesse, quando eram, respectivamente, prefeito, secretário de obras e secretário da fazenda de Santo Ângelo.

Asseveraram os representantes que a recorrente realizou propaganda eleitoral negativa criminosa, mediante a publicação, na rede social Facebook, de mensagens ofensivas à honra dos recorridos.

Eis o teor dos textos em questão:

Urgente!!!!!Não deixem de conferir hoje no jornal os números exatos que serão alvo da cpi das pedras britas!!!! Meu dinheiro e dinheiro do povo que sumiu nas mãos de um prefeito e seus secretários de obras e fazenda!! Os mesmos que hoje tentam eleição pra prefeitura municipal!!!!Vc quer esse pessoal comandando seu dinheiro, sua cidade????EU NÃO!!!!!Vote pela honestidade!!!Vote 11.

 

[…] Seu Dudu Loureiro deixou uma dívida de mais de 40 milhões na prefeitura que o Andres levou 4 anos pagando. E você ainda está defendendo??Se eu fosse você teria vergonha!!!!!Os empresários de santo Angelo e policiais civis e professores não votam no PDT por nada!!!!

Nos últimos anos, a internet e as redes sociais ganharam importância no contexto das eleições brasileiras.

No que diz respeito à participação dos eleitores no processo eleitoral, a regra principal a ser seguida é a da liberdade de expressão, de forma que à pessoa natural é permitido expressar suas opiniões, favoráveis ou contrárias a candidatos e/ou partidos políticos, desde que não haja ofensa à honra de terceiros nem a divulgação de fatos sabidamente inverídicos. É o que estatui o art. 21 da Resolução TSE n. 23.457/15:

Art. 21. É permitida a propaganda eleitoral na Internet a partir do dia 16 de agosto de 2016.
§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado na Internet somente é passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos.

Observe-se que a liberdade de expressão do eleitor era permitida mesmo antes do dia 16 de agosto, data a partir da qual passou a ser autorizada a propaganda eleitoral, o que demonstra a amplitude do direito de manifestação pessoal do cidadão.

O art. 57-D, da Lei das Eleições, reproduzido pela Resolução TSE n. 23.457/15, em seu art. 24, por sua vez, amplia a noção de liberdade de expressão do eleitor ao afirmar que a manifestação do pensamento é livre por meio da rede mundial de computadores (internet) e por outros meios de comunicação.

Art. 57-D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58-A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

Art. 24. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores – Internet, assegurado o direito de resposta, nos termos dos arts. 58, § 3º, inciso IV, alíneas a, b e c, e 58-A da Lei nº 9.504/1997, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica

(Lei n. 9.504/1997, art. 57-D, caput.)

Como visto, desde que devidamente identificado o autor, o exercício da livre manifestação do pensamento é a regra e autoriza que os cidadãos comuns manifestem-se sobre gestores e candidatos, sendo passível de limitação apenas quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos.

Sobre o assunto, é pacífica a jurisprudência, conforme ilustram os julgados abaixo:

Recurso. Direito de Resposta. Alegada postagem de mensagens no facebookde conteúdo inverídico. Deferimento do pedido no juízo originário.

A lei assegura o direito de resposta à mensagem qualificada como sabidamente inverídica, contendo inverdade flagrante que não apresente controvérsias.

Não é plausível transformar o pedido de resposta em processo investigatório com intuito de comprovar a veracidade das versões controvertidas sustentadas pelas partes.

Sendo a internet um instrumento de informação democrático e gratuito, a proibição de livre manifestação deve ser tida como excepcional. Mensagem que não ultrapassa os limites dos questionamento político, não restando evidenciada ofensa, difamação ou matéria inverídica. Ademais, a mera crítica política, embora ácida e contundente, não autoriza a concessão do direito pleiteado.

Provimento.

(TRE-RS. Recurso Eleitoral n. 5.779, Rel. Dr. Jorge Alberto Zugno, 11.9.2012.)

(Grifei.)

 

Recurso. Representação. Propaganda eleitoral. Internet. Multa. Art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97. Art.17, inc. IX, da Resolução TSE 23.457/15. Eleições 2016.

Improcedência da representação pelo juízo de primeiro grau.

Divulgação, em site de relacionamentos, de suposta afirmação ofensiva. Comentário que não transbordou da garantia constitucional da livre manifestação do pensamento. Não vislumbrado na publicação o conteúdo calunioso, injurioso, difamatório ou sabidamente inverídico.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE n. 397-85 – Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – P. Sessão 08.11.2016.)

No caso sob exame, cumpre referir, primeiramente, que deixo de considerar o comentário trazido à fl. 14 dos autos - “[…] Seu Dudu Loureiro deixou uma dívida de mais de 40 milhões na prefeitura que o Andres levou 4 anos pagando. E você ainda está defendendo?? Se eu fosse você teria vergonha!!!!!Os empresários de santo Angelo e policiais civis e professores não votam no PDT por nada!!!!”-, pois refere-se exclusivamente ao recorrido Eduardo Debacco Loureiro, o qual foi excluído da demanda em razão da ilegitimidade para figurar na representação.

Quanto ao teor da postagem reproduzida nos prints acostados às fls. 09, 12 e 13, tenho que não ultrapassou o limite da livre manifestação do pensamento.

A recorrente, na qualidade de pessoa natural devidamente identificada, limitou-se a expor sua opinião quanto à postura dos recorridos relativamente a fato de conhecimento público a eles atribuído na condição de integrantes da administração do município, o qual se encontra, de acordo com matéria jornalística postada ao lado do texto de autoria da representada, submetido à investigação pelo legislativo municipal.

Quando muito, o comentário em questão está circunscrito ao campo da crítica cidadão vs. Administração Pública, e foi realizado dentro do espaço atinente ao momento político vivenciado em períodos eleitorais, nos quais posições antagônicas são acentuadas.

Dessa forma, entendo que o comentário tecido pela recorrente acerca da notícia veiculada no jornal “A Tribuna”, apesar de ácido e contundente, não configura propaganda eleitoral negativa, mas, sim, exercício do direito de livre manifestação do pensamento ou da liberdade de expressão, postulados de guarida constitucional e caracterizadores do Estado Democrático de Direito (arts. 5º, incs. IV e IX, e 220, da CF/88 e art. 57-C da Lei n. 9.504/97), e sobre o qual não estão imunes as pessoas públicas.

A norma eleitoral não atinge direitos e garantias fundamentais, mas os garante de modo a permitir que qualquer eleitor manifeste-se.

Não identifico, portanto, no caso, quaisquer meios de burla à norma eleitoral ou ofensa à honra de alguém. Tratou-se, como já dito, do gozo do direito de liberdade de expressão realizada por eleitora devidamente identificada, e, no meu sentir, os dizeres contidos na publicação não se caracterizam como calúnia, difamação ou injúria.

Nesse sentido, é o entendimento deste e. Tribunal:

Recurso. Representação. Propaganda eleitoral irregular. Internet. Facebook. Eleições 2016.

Decisão de piso que julgou improcedente a representação.

Postagem realizada na rede social Facebook com crítica à administração municipal. Comentário inserido no campo do debate político, sem desbordar para a injúria, calúnia ou difamação.

Exercício do direito de liberdade de expressão, realizado por pessoa plenamente identificada, não caracterizando divulgação de fato sabidamente inverídico.

Provimento negado.

(TRE-RS - RE n. 390-93, Rel. Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja – P. Sessão 26.10.2016.) (Grifei.)

Assim, compactuo com os argumentos trazidos pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral, que opinou pelo provimento do recurso, por entender que “[…] não houve, no caso, o uso indevido ou abusivo do direito ao livre exercício da manifestação de pensamento, tampouco abuso da liberdade de crítica inerente ao embate das eleições. Ademais, é cediço que aquele que submete ou pretende submeter seu nome ao escrutínio aberto, com o objetivo de conquistar ou manter mandato público, não pode angustiar-se com elementos ou termos próprios do acerbo debate eleitoral.” (fls. 45-47).

Dispositivo

Diante do exposto, excluo da lide EDUARDO DEBACCO LOUREIRO e o PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT de Santo Ângelo, em razão de sua ilegitimidade ativa ad causam, e VOTO pelo provimento do recurso para julgar improcedente a representação, afastando a multa imposta à representada ora recorrente ALINI WILGES.