RE - 21634 - Sessão: 25/10/2016 às 17:00

Muito respeitando o criterioso voto da juíza relatora, penso que existem circunstâncias distintivas, as quais justificam o provimento do recurso interposto pela COLIGAÇÃO RETOMADA E DESENVOLVIMENTO (REDE/SOLIDARIEDADE) e JOSÉ FRANCISCO SANCHOTENE FELICE.

Nesse sentido, acompanho a eminente relatora no tocante ao afastamento das preliminares destacadas, ponderando, no entanto, quanto à apreciação da questão de fundo.

À vista do disposto no art. 1º, I, “g” da LC n. 64/90, é fato incontroverso que se fazem presentes os requisitos atinentes à prolação de decisão pelo órgão competente, irrecorrível no âmbito administrativo e sem que tenha havido o exaurimento do prazo de inelegibilidade de 8 (oito) anos, bem como inexistente notícia de suspensão ou anulação pelo Poder Judiciário.

Já no condizente à configuração de desaprovação de contas por irregularidade insanável, e que configure ato doloso de improbidade administrativa – tarefa reservada, irretorquivelmente, nesta seara, ao juiz eleitoral – eis aí a minha ponderação, na medida em que estou absolutamente convencido, com muito respeito aos entendimentos em contrário, disso não se tratar.

Acima de tudo, não verifiquei na conduta do gestor e pretenso candidato elementos mínimos que demonstrem, para fins de inelegibilidade, ato de improbidade administrativa praticado na modalidade dolosa, por ser inviável extrair das irregularidades apontadas postura da qual se presuma desonestidade ou intenção em causar dano ao Erário.

Para tanto, peço vênia para rememorar, sinteticamente, a sucessão dos fatos que levaram este Tribunal a examinar a viabilidade do registro de candidatura de JOSÉ FRANCISCO SANCHOTENE FELICE ao cargo de prefeito, por ele já exercido nas legislaturas 2005-2008 e 2009-2012.

O ora recorrente teve as contas relativas à sua gestão à frente do Município de Uruguaiana, no exercício de 2012, aprovadas pela Segunda Câmara do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul – TCE/RS, cuja ementa e respectiva justificativa, naquilo que importa, foram as seguintes (fls. 152-153):

Ementa: Processo de Contas de Governos dos Senhores Administradores do Executivo Municipal de Uruguaiana, referente ao exercício de 2012. Falhas formais e de controle interno. Cientificação. Parecer favorável.

[…]

- considerando o fato de o Balanço-Geral da Administração Municipal e demais documentos que integram o referido Processo de Contas de Governo conterem tão somente falhas de natureza formal, não prejudiciais ao erário, bem como outras de controle interno, decorrentes de deficiências materiais ou humanas da Entidade, devidamente comprovadas nos autos, as quais, na sua globalidade, não comprometem as contas em seu conjunto, embora ensejem cientificação no sentido de sua correção para os exercícios subsequentes; [...]

Colho o seguinte excerto dessa decisão, nas palavras do então relator (fls. 145-147):

[…]

Com efeito, a herança efetivamente deixada pela gestão 2001-2004 para a subsequente (2005-2008), a qual teve José Francisco Sanchotene Felice como Prefeito, foi de R$ 3.313.121,66. Como se denota, valor superior aos R$ 2.436.255,03 ora deixados para a legislatura 2013-2016, em que pese o Administrador ter conseguido, ao final, da legislatura 2005-2008, o equilíbrio pleno nas contas públicas (inexistência de valor escriturado em Restos a Pagar sem disponibilidade financeira para resgate).

Posto isto, ainda que preocupante a situação das contas públicas que envolvem pagamentos de curto prazo, houve, indubitavelmente, melhoras no desempenho do Fluxo de Caixa.

- Equilíbrio Financeiro – importância de R$ 4.173.898,34 empenhada no decorrer do exercício de 2012, sem que houvesse o pertinente lastro financeiro para resgate, transgressão ao § 1º do artigo 1º da Lei Complementar nº 101/2000.

Aqui valem os mesmos comentários efetuados anteriormente em relação aos Restos a Pagar, pois a herança deixada pela gestão 2001-2004 para a subsequente (2005-2008) foi de R$ 6.967.520,35, superior, por conseguinte, aos R$ 4.173.898,34 deixados para a legislatura 2013-2016.

Em resumo, ainda que os valores seja vultosos, houve redução no montante lançado em despesas de curto prazo destituídas de disponibilidades financeiras para cumprimento dessas obrigações, demonstrando progresso na busca pelo equilíbrio financeiro das contas públicas.

Posto isso, diverge-se, com a devida vênia, do entendimento do Ministério Público de contas, bem como do expresso no voto de Devolução de Vista praticado pelo Conselheiro Estilac Xavier, o que significa concluir pela emissão de Parecer Favorável às contas de José Francisco Sanchotene Felice. [...]

Posteriormente, em decorrência do acolhimento de embargos declaratórios opostos pelo Ministério Público de Contas, o Plenário daquela Corte acabou por emitir parecer desfavorável às contas em questão (fls. 169-172). Essencialmente, segundo o voto condutor vencedor, pelo desatendimento da LC n. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), assim:

[...] Como se observa R$ 2.035.989,92 referem-se a Restos a Pagar Processados, enquanto que R$ 2.137.908,42 referem-se a Restos a Pagar Não Processados. Tais valores totalizam o montante de R$ 4.173.898,34 da insuficiência financeira ao final do encerramento de 2012.

Outro aspecto que considero para analisar a insuficiência financeira é a informação da Confederação Nacional dos Municípios sobre o impacto da desoneração do IPI nas transferências do FPM. Neste sentido, observo que tal documento foi juntado à folha 228 do processo original, e informa que tal impacto, para o exercício de 2012, totaliza R$ 763.984,40.

A partir das informações que trouxe acima, observo que mesmo que fossem considerados apenas os Restos a Pagar Processados e fossem abatidos os valores recebidos a menor por conta da desoneração do IPI, a insuficiência financeira no encerramento do exercício importaria em R$ 1.272.005,52 [R$ 2.035.989,92 (-) R$ 763.984,40].

[...]

No presente caso, trata-se de Gestor eleito inicialmente para o período de 2005-2008, reeleito para o mandato de 2009-2012. Nesse sentido, a situação encontrada pelo Gestor ao assumir o mandato de Prefeito no exercício de 2005, cuja insuficiência, em valores nominais, era de R$ 6.967.520,35, foi deviProcessosdamente sopesada para fins de julgamento das contas do exercício de 2008. Observo que no exercício de 2008 não foi verificada insuficiência financeira.

Com a devida vênia ao posicionamento adotado pela Segunda Câmara, a emissão de Parecer Favorável na presente situação, em minha opinião, é um contrassenso ao que preconiza a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ora, se o Gestor obteve sucesso na redução do desequilíbrio financeiro em determinado período, tal situação não deve ser uma atenuante para que gere o mesmo desequilíbrio em momento futuro. Ainda mais, no presente caso, pelo fato do Gestor ter zerado a insuficiência financeira em um mandato (final do exercício de 2008) e ter elevado significativamente tal insuficiência no mandato seguinte (final do exercício de 2012).

Como manifestei anteriormente, ainda que fossem considerados apenas os Restos a Pagar Processados e fossem abatidos os valores recebidos a menor por conta da desoneração do IPI, a insuficiência financeira no encerramento de 2012 corresponde a R$ 1.272.005,52. Ou seja, valor suficiente para macular a globalidade das contas e ser considerado para fins de não atendimento à LRF e para a emissão do Parecer Prévio Desfavorável. Por este motivo, entendo que o apelo deve ser provido.

Pelo exposto, VOTO pelo conhecimento do presente Recurso de Embargos e, no mérito, pelo seu provimento, no sentido de considerar não atendida a Lei Complementar Federal nº 101/2000 e de emitir Parecer Prévio Desfavorável ao Gestor.

Dentro desse contexto, ao meu sentir, no parecer derradeiro pela rejeição das contas públicas não há elementos que autorizem concluir tenha havido dolo, ainda que sob a sua forma genérica; sequer houve menção, em uma leitura atenta de todo o voto em evidência, acerca de qual dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal fora infringido.

Nessa toada, consta dos autos pronunciamento da Confederação Nacional dos Municípios – CNM (fl. 126), segundo o qual, relativamente ao impacto da política nacional de desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI no Fundo de Participação dos Municípios - FPM, “o atual enfraquecimento da economia já afetou fortemente as receitas municipais e ainda, com a intenção de estimular a economia, o Governo Federal agravou mais a situação financeira das Prefeituras, pois promoveu diversas desonerações do IPI”, sendo que “no ano de 2012, tal política gerou um impacto de R$ 2,47 bilhões para os cofres municipais, diminuindo os repasses do FPM. Isso porque o FPM é proveniente da repartição de 23,5% das receitas do IR (Imposto de Renda) e do IPI”. Mais além, no tocante às contas em questão, conclui o documento em referência que “dada a participação do Município no bolo do FPM, as desonerações do IPI concedidas no ano de 2012 implicaram em uma queda da transferência para a Prefeitura de Uruguaiana/RS, R$ 1.166.201,00, para os anos de 2013 e 2014 as perdas significaram R$ 1.562.559,00 e R$ 961.389,00 respectivamente”.

Ora, efetivamente, os impactos da desoneração do IPI e o descalabro da economia nacional nos últimos anos dificultaram, sobremaneira, a observância integral das diretrizes fiscais impostas aos gestores municipais.

Nesse contexto, trago os seguintes arestos do TSE:

ELEIÇÕES 2014. REGISTRO. DEPUTADO ESTADUAL. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LC Nº 64/90.

1. Nos termos da alínea g do art. 1º, I, da Lei das Inelegibilidades, cabe à Justiça Eleitoral verificar se a falha ou irregularidade constatada pelo órgão de contas caracteriza vício insanável e se tal vício pode ser, em tese, enquadrado como ato doloso de improbidade.

2. Nesse exame, não compete à Justiça Eleitoral:

a) decidir sobre o acerto ou desacerto da decisão que rejeitou as contas; ou b) afirmar a existência, em concreto, de ato doloso de improbidade administrativa, pois, em ambas as situações, ocorreria invasão da competência do órgão de controle de contas ou do juízo natural para o processamento e julgamento da ação de improbidade administrativa, com manifesta violação ao devido processo legal e às garantias da defesa.

3. Para que se possa cogitar minimamente da prática de ato doloso de improbidade administrativa, é necessário que, na decisão que rejeitou as contas, existam elementos mínimos que permitam a aferição da insanabilidade das irregularidades apontadas e da prática de ato doloso de improbidade administrativa, não sendo suficiente a simples menção a violação à Lei nº 9.790/99 e à Lei de Responsabilidade Fiscal.

Recurso ordinário provido.

(Recurso Ordinário n. 88467, Acórdão de 25.02.2016, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, 14.4.2016)

 

ELEIÇÕES 2014. RECURSO ORDINÁRIO. CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL. REGISTRO DE CANDIDATURA DEFERIDO. ART. 1º, INCISO I, ALÍNEA G, DA LC Nº 64/1990.

1. Nem toda desaprovação de contas enseja a causa de inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea g, da LC nº 64/1990, somente as que preenchem os requisitos cumulativos constantes dessa norma, assim enumerados: i) decisão do órgão competente; ii) decisão irrecorrível no âmbito administrativo; iii) desaprovação devido à irregularidade insanável; iv) irregularidade que configure ato doloso de improbidade administrativa; v) prazo de oito anos contados da decisão não exaurido; vi) decisão não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.

2. Contas de ordenador de despesas de fundo de previdência, no cargo de prefeito, desaprovadas pelo TCE (exercício de 2009).

3. Não há como reconhecer ato doloso de improbidade administrativa na conduta do impugnado por ser inviável extrair das irregularidades apontadas postura da qual se presuma desonestidade ou intenção em causar dano ao Erário. O acórdão do TCE entendeu existirem irregularidades que em sua maioria consistem em descumprimento de normas legais e regulamentares que disciplinam a gestão de fundo de previdência. Todavia, isso não autoriza concluir pela má-fé do gestor ou pelo desvio de recursos públicos em benefício pessoal ou de terceiro, sobretudo se considerado que a desaprovação das contas se deu em decorrência de revelia e que se lhe aplicou multa em quantia pouco significativa, R$7.219,80 (sete mil, duzentos e dezenove reais e oitenta centavos) ante os valores do orçamento do fundo de previdência receita prevista de R 5.085.000,00 (cinco milhões e oitenta e cinco mil reais), despesa fixada de R$6.692.000.00 (seis milhões, seiscentos e noventa e dois mil reais) e déficit de R$1.607.000,00 (um milhão, seiscentos e sete mil reais).

4. Afasta-se a inelegibilidade referida no art. 1º, inciso I, alínea g, da LC nº 64/1990.

5. Decisão agravada mantida pelos próprios fundamentos. Agravo regimental desprovido.

(TSE – AgR-RO n. 108596 – Rel. Min. GILMAR FERREIRA MENDES – DJE de 29.02.2016).

Mais recentemente, deste Tribunal, em caso análogo, colaciono o seguinte julgado da lavra da eminente Drª Gisele Anne de Vieira Azambuja, o qual igualmente se baseou no precedente do TSE acima reproduzido:

Recurso. Registro de candidatura. Impugnação. Cargo de prefeito. Inelegibilidade. Lei Complementar n. 64/90. Eleições 2016. Decisão do juízo eleitoral que julgou improcedente a impugnação e deferiu a candidatura ao cargo de prefeito, por considerar inaplicável à hipótese da al. “g” do inc. I do art. 1º da LC n. 64/90.

Requisitos necessários para a incidência da alínea em questão: contas rejeitadas por decisão irrecorrível do órgão competente; irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa; inexista decisão judicial que suspenda ou anule os efeitos da rejeição. Cabe à Justiça Eleitoral analisar a natureza das contas reprovadas, para definir a existência de irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade, de modo a caracterizar inelegibilidade.

Na condição de prefeito municipal, exerceu o cargo de administrador de consórcio público - CIDERCA, tendo as contas da gestão de 2005, 2011 e 2012 julgadas irregulares, por decisão do Tribunal de Contas do Estado, com trânsito em julgado. A aplicação isolada de multa, sem imputação de débito, indica que não se apurou qualquer dano ao patrimônio público na gestão do consórcio. Entidade que encontra-se em processo de extinção desde o ano de 2008, permanecendo inativo nas gestões de 2011 e 2012.

A ausência de apontamento de movimentação financeira ou mesmo de realização de qualquer atividade envolvendo recursos públicos, por si só, indica a ausência de prejuízo, malversação do erário, beneficiamento próprio ou violação a princípios da administração. A negligência do administrador, em especial a omissão na entrega dos documentos pertinentes à Tomada de Contas, revela ato de improbidade administrativa, todavia, conduta que não desborda da seara da culpa, sem adentrar ao dolo genérico exigido pela jurisprudência. A conduta ímproba não está vinculada a toda e qualquer irregularidade administrativa, mas à prática de atos orientados pela má-fé ou desonestidade, o que não vislumbrado.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE 157-78.2016.6.21.0014 – Rel. DRA. GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA – J. Sessão de 21.10.2016).

Na mesma direção o aresto de minha lavra:

Recurso. Registro de candidatura. Vereador. Impugnação. Inelegibilidade. Rejeição de Contas Públicas. Lei Complementar n. 64/90. Eleições 2016.

Decisão de piso que julgou procedente a impugnação ministerial e indeferiu o registro de candidatura, por entender caracterizada a inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. “g”, da Lei Complementar n. 64/90.

[...]

Requisitos necessários para a incidência do dispositivo da Lei das Inelegibilidades: contas rejeitadas por decisão irrecorrível do órgão competente, irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa e inexistência de decisão judicial que suspenda ou anule os efeitos da rejeição.

O Tribunal de Contas do Estado julgou irregulares as contas do pré-candidato relativas a sua administração como presidente do Legislativo Municipal no ano de 2007. O órgão julgador é competente, nos termos do art. 71, inc. II, da Constituição Federal. No entanto, a irregularidade em pauta é sanável, decorrente da natureza do próprio apontamento. Indicadas, pelo TCE, as providências a serem tomadas, as quais foram devidamente realizadas.

Portanto, embora ilegal, a prática elencada não configura ato doloso de improbidade administrativa, para os fins da Lei Complementar n. 64/90.

Dentro do contexto, não se fazendo presentes todos os requisitos à incidência da norma, a reforma da sentença subjacente é medida que se impõe.

Deferimento do registro. Provimento.

(TRE-RS – RE 276-58.2016.6.21.0040 – Rel. DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI – J. Sessão de 21.10.2016).

Vale dizer que, embora se possa cogitar de ato de improbidade administrativa baseado em ilegalidade, fato é que nem toda ilegalidade constitui ato de improbidade.

Ou dito de outro modo, a caracterização do ato de improbidade, e a sua consequente e necessária responsabilização, não está vinculada a toda e qualquer irregularidade administrativa.

A pretensão do constituinte e do legislador, ao fixarem a responsabilização pela improbidade, nitidamente se dirige à prevenção e ao combate a atos que violam frontalmente a moralidade administrativa e os demais princípios e valores que orientam a administração pública. Trata-se de responsabilização pela prática de atos orientados pela má-fé ou desonestidade, não apenas o cometimento de irregularidade.

Conforme se infere das transcrições por mim acima realizadas, a desaprovação das contas em tela foi fruto de mudança na jurisprudência do TCE/RS, o qual, ao decidir a questão na plenária, via oposição de Embargos Declaratórios, alterou o entendimento no que diz respeito ao tratamento a ela dispensado.

Com isso, quero relembrar que, inicialmente, com supedâneo em parecer técnico interno, as contas foram efetivamente aprovadas, o que nos leva a pôr em cheque a existência incontestável de DOLO. Então, é de se indagar a força da afirmação dos impugnantes de que é indubitável a presença de ato doloso de improbidade administrativa, eis que tampouco o TCE/RS, em uníssono e de forma perene, assim o entendeu.

O TSE, ademais, tem reiterado a necessidade da configuração de atos de má-fé e marcados por desvio de valores ou benefício pessoal para caracterizar a restrição – o que neste caso não foi reconhecido, a toda evidência, como já visto. Veja-se:

ELEIÇÕES 2014. RECURSO ORDINÁRIO. CANDIDATO AO CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. REGISTRO DE CANDIDATURA DEFERIDO. INCIDÊNCIA NA INELEGIBILIDADE REFERIDA NO ART. 1º, INCISO I, ALÍNEA g, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/1990. AUSÊNCIA DE REQUISITO. ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO CONFIGURADO.

1. A inelegibilidade referida no art. 1º, inciso I, alínea g, da LC nº 64/1990 não é imposta pela decisão que desaprova as contas do gestor de recursos públicos, mas pode ser efeito secundário desse ato administrativo, verificável no momento em que o cidadão requerer o registro de sua candidatura.

2. Nem toda desaprovação de contas enseja a causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso I, alínea g, da LC nº 64/1990, somente as que preenchem os requisitos cumulativos constantes dessa norma, assim enumerados: i) decisão do órgão competente; ii) decisão irrecorrível no âmbito administrativo; iii) desaprovação devido a irregularidade insanável; iv) irregularidade que configure ato doloso de improbidade administrativa; v) prazo de oito anos contados da decisão não exaurido; vi) decisão não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.

3. Vício insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa. Na linha da jurisprudência do TSE, "a insanabilidade dos vícios ensejadores da rejeição das contas, para fins de inelegibilidade, decorre de atos de má-fé e marcados por desvio de valores ou benefício pessoal" (AgR-REspe nº 631-95/RN, rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 30.10.2012).

4. Como o dano ao erário pode ocorrer de forma culposa ou dolosa, segundo a doutrina de Direito Administrativo, compete à Justiça Eleitoral verificar a presença, na decisão de rejeição de contas, de elementos mínimos que demonstrem que a conduta foi praticada dolosamente e que se enquadra em uma das figuras típicas da Lei de Improbidade, não sendo suficiente, para fins de inelegibilidade da alínea g, o dano ao erário decorrente de conduta culposa. Circunstância ausente no caso concreto.

5. Inexistência no caso concreto de elementos mínimos que revelem o ato doloso de improbidade administrativa.

6. Recurso desprovido.

(Recurso Ordinário n. 35148, Acórdão de 16.12.2014, Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Relator designado Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 16.12.2014.) (Grifei.)

Tal conjuntura permite assentar que não se desbordou da seara da culpa, não havendo se falar no dolo genérico exigido pela jurisprudência.

Em juízo de proporcionalidade, tenho que a negligência ou imprudência do prestador, no caso dos autos, embora possa ser configurada como improbidade administrativa, não traz consigo o elemento subjetivo do dolo necessário para que se faça incidir a inelegibilidade da al. “g” do inc. I do art. 1º da Lei Complementar n. 64/90.

Portanto, por entender que as condutas imputadas ao recorrente não se enquadram na hipótese de inelegibilidade prevista na al. “g” do inc. I do art. 1º da LC n. 64/90, deve, neste processo, com o candidato a vice-prefeito Márcio Rodrigues Louzada, cujos autos encontram-se em apenso, ser considerado apto ao pleito de 2016 pela Coligação RETOMADA E DESENVOLVIMENTO (REDE/SOLIDARIEDADE).

 

Ante o exposto, o meu voto é no sentido de acompanhar a ilustríssima relatora no que concerne ao afastamento da matéria preliminar e, no mérito, ponderar para dar provimento ao recurso, ao efeito de deferir o registro da chapa majoritária, formada pela Coligação RETOMADA E DESENVOLVIMENTO (REDE/SOLIDARIEDADE), nas eleições de 2016, à Prefeitura de Uruguaiana.

 

Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz: Estou acompanhando a divergência, pedindo vênia à relatora.

 

Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura: Com a vênia da divergência, acompanho a relatora.

 

Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes: Ouvindo a sustentação da tribuna e o voto do Des. Marchionatti, estou votando com a divergência.

 

Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja: Estou mantendo a coerência, e na esteira do entendimento já pacificado neste tribunal, voto com a relatora.

 

Desa. Liselena Schifino Robles Ribeiro: Em voto de desempate, acompanho a relatora pelo desprovimento.