RE - 12151 - Sessão: 19/12/2016 às 14:00

RELATÓRIO

A COLIGAÇÃO UNIÃO POR GRAMADO (PP - PSDB - PRB - PTB - DEM - PR - PSD - PSB - PSC - REDE) interpõe recurso contra decisão do Juízo da 106ª Zona Eleitoral, que julgou Ação de Investigação Judicial Eleitoral cumulada com representação por propaganda irregular e com direito de resposta, ajuizada pela recorrente em face do PARTIDO ECOLÓGICO NACIONAL - PEN, de ELIAS VIDAL MATTOS DE LEMOS e da COLIGAÇÃO A VEZ E A VOZ DOS GRAMADENSES.

A sentença guerreada julgou a representação improcedente em relação à COLIGAÇÃO A VEZ E A VOZ DOS GRAMADENSES, fixando honorários advocatícios em seu favor no valor de R$ 500,00, bem como procedente no tocante ao PARTIDO ECOLÓGICO NACIONAL – PEN e a ELIAS VIDAL MATTOS DE LEMOS, aplicando-lhes multa individual no valor de R$ 5.000,00, concedendo o direito de resposta em favor da representante e condenando-os ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte autora no valor de R$ 600,00 (fls. 50-51).

Em suas razões (fls. 55-63), a recorrente sustenta que a decisão combatida deixou de analisar o pedido cumulado de aplicação das sanções previstas no art. 22, inc. XIV, da Lei Complementar n. 64/90, diante do uso indevido dos meios de comunicação social em benefício de candidato ou partido político. Pugna pela decretação de nulidade da sentença e retorno dos autos à origem para apreciação da questão. Subsidiariamente, requer o enfrentamento da matéria pelo próprio Tribunal, rogando, ainda, pela majoração das multas aplicadas e pelo afastamento da condenação da recorrente em honorários advocatícios.

Sem contrarrazões, nesta instância, os autos foram remetidos à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pela apreciação da alegação de uso indevido dos meios de comunicação social pelo próprio Tribunal, julgando-se, no mérito, improcedente a ação, e pelo afastamento da condenação da recorrente ao pagamento de honorários advocatícios em razão de sucumbência, mantida a sentença em seus demais termos (fls. 95-99v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo, pois interposto no tríduo previsto no art. 258 do Código Eleitoral.

No mérito, a recorrente alega que propôs ação com cumulação de demandas, envolvendo postulações para a aplicação dos consectários legais pelo uso abusivo dos meios de comunicação social e pela realização de propaganda irregular, como também a concessão de direito de resposta.

Contudo, entende que a sentença padece de omissão, pois o juízo a quo restringiu-se à análise das questões afetas ao reconhecimento de propaganda eleitoral ilícita e ao direito de resposta, silenciando sobre os argumentos e pedidos referentes à aplicação das sanções previstas no art. 22, inc. XIV, da Lei Complementar n. 64/90.

De fato, assiste razão ao recorrente no ponto, pois a decisão de origem careceu do enfrentamento do pedido de aplicação das penalidades legais cominadas à prática de abuso de poder e de uso indevido de veículos ou meios de comunicação social.

Constata-se, ainda, que o feito encontra-se adequadamente instruído e fora processado em conformidade com o rito estatuído no art. 22 da Lei das Inelegibilidades, não havendo necessidade de renovação ou dilação probatória.

Diante de tais circunstâncias, os princípios da celeridade e da eficiência jurisdicional recomendam a aplicação da chamada teoria da causa madura, que autoriza o Tribunal a julgar desde logo o mérito do pedido cujo exame foi omitido na decisão vergastada, desde que a causa esteja em condições de imediata análise, com supedâneo no art. 1.013, § 3º, do Código de Processo Civil, sem que tal medida represente supressão de instância.

Nesse passo, a recorrente alega a ocorrência de uso indevido dos meios de comunicação social, pois o Partido Ecológico Nacional - PEN de Gramado e Elias Vidal Mattos de Lemos publicaram em suas páginas eletrônicas próprias na rede social Facebook, entre os dias 26 de julho e 17 de agosto deste ano, um conjunto de 20 postagens de propaganda eleitoral.

As publicações foram apropriadamente analisadas pelo magistrado sentenciante, nos termos que transcrevo (fl. 32):

Não se mostrando necessário maior debruçamento a respeito da irregularidade por extemporaneidade da propaganda eleitoral, temos as postagens 03, 07, 09, 10 e 13, onde, antes do período inicial permitido (16/08/2016), os representados PEN e ELIAS VIDAL MATTOS DE LEMOS apresentam Fedoca como candidato à majoritária, pedindo diretamente voto para o candidato, dizendo que "agora é Fedoda para prefeito", e referências do gênero.

As postagens 04, 06, 08, 09, 12, 14, 15, 17 e 20, se mostram propagandas eleitorais irregulares, considerando que os representados PEN e ELIAS VIDAL MATTOS DE LEMOS utilizam indevidamente o símbolo do PARTIDO PROGRESSISTA e o slogan da PREFEITURA MUNICIPAL DE GRAMADO para campanha demeritória, o que não é permitido.

As pessoas, candidatos, partidos ou coligações podem expressar suas opiniões, ressalvada a responsabilidade pelo conteúdo, mas não podem utilizar os símbolos dos outros partidos, em seus post, como forma de ataque, de campanha negatória.

Quanto as postagens 01, 02, 05, 11 e 16, pelo seus conteúdos é possível verificar que os representados PEN e ELIAS VIDAL MATTOS DE LEMOS imputam condutas criminosas, ou seja, hipóteses e ocorrências de crimes sem qualquer comprovoção ou evidência.

[…]

Desta forma, pelo exame supra verifica-se que somente os post 18 e 19 não representam propaganda irregular, pois todos os demais assim se mostram […].

Por sua vez, o uso indevido dos meios de comunicação social está previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, cujo teor segue:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito.

A previsão legal do instituto constitui um conceito jurídico indeterminado, de textura fluida e aberta, cujo conteúdo semântico é extraído a partir da hipótese concreta, em cotejo com a finalidade normativa de obstaculizar condutas e comportamentos que ultrapassem o emprego regular dos meios de comunicação social e capazes de causar indevido desequilíbrio ao pleito.

Assim, necessário que da gravidade da prática imputada tenha como resultado potencial o rompimento da normalidade das campanhas e da paridade de oportunidades entre os concorrentes nas eleições. Em outras palavras, a tipificação do uso indevido dos meios de comunicação social, na forma do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90, reclama a demonstração de que a conduta abusiva seja apta a influenciar de forma relevante no resultado das urnas.

Sobre o tema, colho da doutrina de José Jairo Gomes o seguinte excerto (Direito Eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 663):

É preciso que o abuso de poder seja relevante, ostentando aptidão para comprometer a lisura, normalidade e legitimidade das eleições, pois são esses os bens jurídicos tutelados pela ação em apreço. Por isso mesmo, há mister que as circunstâncias do evento considerado sejam graves (LC nº 64/90, art. 22, XVI), o que não significa devam necessariamente propiciar a alteração do resultado das eleições.

No mesmo sentido é a jurisprudência, como se verifica pela seguinte ementa:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. USO INDEVIDO DE MEIOS DE COMUNICAÇÃO ENTRELAÇADO COM ABUSO DE PODER ECONÔMICO. PUBLICIDADE ABUSIVA. JORNAL IMPRESSO E INTERNET. APOLOGISMO DE CANDIDATURA. CRÍTICA AOS CONCORRENTES. GRAVIDADE CONFIGURADA. DESPROVIMENTO.

1. Quem interpõe recurso especial não possui interesse em suscitar nulidade por ausência de intimação da parte contrária para contrarrazões, notadamente no caso dos autos, em que o decisum foi favorável aos recorridos, ora agravados. Precedente e art. 282, §§ 1º e 2º, do CPC/2015.

2. Admite-se Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) para apurar uso indevido dos meios de comunicação social entrelaçado com abuso de poder econômico. O primeiro configura-se por exposição excessiva de candidato na mídia em detrimento dos demais, enquanto o segundo caracteriza-se por emprego desproporcional de recursos patrimoniais (públicos ou privados), ambos de forma a comprometer a legitimidade do pleito e a paridade de armas entre postulantes a cargo eletivo. Precedentes.

[...]

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 10070, Acórdão de 07.6.2016, Relator Min. ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 194, Data 07.10.2016, Página 59-60). (Grifei.)

Destarte, estabelecidos tais delineamentos legais e teóricos, tem-se que a série de publicações questionadas teve sua veiculação restrita a dois sítios pessoais do Facebook e às suas interações com seguidores, em município de reduzidas dimensões populacionais.

A despeito de configurarem propaganda irregular e darem ensejo ao direito de resposta, as postagens não se revestem de suficiente gravidade em desfavor da regularidade das eleições, tampouco de relevante projeção sobre o eleitorado para se qualificarem como uso indevido dos meios de comunicação social, nos termos estipulados pelo art. 22 da Lei Complementar n. 64/90.

Em acréscimo, adoto as considerações lançadas pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer:

É dizer, na carência de outros elementos, não se mostra cabível equipararem-se poucas publicações feitas em dois perfis de usuários da rede social Facebook, a divulgações próprias de veículos de comunicação em massa, como rádio, televisão e jornal, a ensejar eventual abuso de poder pelo uso indevido de comunicação social, não verificado na hipótese dos autos.

Outrossim, verifica-se que a conduta ilícita tomada pelos recorridos foi suficientemente reprimida e penalizada pelo juízo de origem, que determinou a imediata retirada das mensagens da internet, concedeu o direito de resposta e aplicou multa por propaganda irregular no valor individual de R$ 5.000,00.

Nesse capítulo, não cabe qualquer reparo à sentença, eis que a sanção pecuniária mantém proporcionalidade com o reduzido potencial lesivo e com as inerentes limitações de difusão do meio empregado, estando, ainda, expressamente consignada a individualização do quantum condenatório a cada um dos representados.

Por derradeiro, no tocante ao pleito de reforma da condenação ao pagamento de honorários advocatícios pelo recorrente em favor da Coligação A Vez e a Voz dos Gramadenses, entendo que deve ser provido.

Com efeito, cumpre afastar a sucumbência imposta, porquanto o art. 4º da Resolução TSE n. 23.478/16, que estabelece diretrizes gerais para a aplicação da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 – Novo Código de Processo Civil – no âmbito da Justiça Eleitoral, expressamente consigna que os feitos eleitorais são gratuitos, não incidindo custas, preparo ou honorários (Lei n. 9.265/96, art. 1º).

De igual modo, há jurisprudência consolidada no sentido do não cabimento de honorários advocatícios nos processos eleitorais, consoante ilustra o seguinte precedente:

Recurso especial. Condenação. Litigância de má-fé. Pretensão. Fixação. Honorários advocatícios.

1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que, em feitos eleitorais, é incabível a condenação em honorários advocatícios, em razão de sucumbência. Precedentes: REspe nº 12783, rel. Min. Costa Leite, DJE de 18.4.1997; RO nº 61, rel. Min. Costa Porto, DJE de 21.6.2002; AgR-REspe nº 23.027, rel. Min. Luiz Carlos Madeira, PSESS em 13.10.2004.

2. Ainda que não sejam devidos honorários de sucumbência nos processos eleitorais, as partes não adquirem uma completa isenção pelos atos processuais que praticam, razão pela qual, configurada a hipótese de litigância de má-fé, as sanções advindas do comportamento temerário da parte devem ser aplicadas integralmente.

3. A regra do art. 18, caput, do Código de Processo Civil contempla situação excepcional, na qual, além dos custos habituais de se ver representada em juízo, a parte sofre prejuízos em razão do comportamento temerário por litigância que não se comporta nos princípios que regem o processo.

Recurso especial provido.

(Recurso Especial Eleitoral nº 183219, Acórdão de 16.6.2014, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 154, Data 20.8.2014, Página 65). (Grifei.)

Destarte, diante da flagrante impossibilidade jurídica da questionada condenação em honorários em processos eleitorias, de ofício, estendo os efeitos da decisão aos recorridos PARTIDO ECOLÓGICO NACIONAL – PEN e ELIAS VIDAL MATTOS DE LEMOS, afastando igualmente as imposições sucumbenciais fixadas em desfavor de ambos.

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso apenas para afastar a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em desfavor da COLIGAÇÃO UNIÃO POR GRAMADO e, de ofício, igualmente afastá-la em relação ao PARTIDO ECOLÓGICO NACIONAL – PEN e a ELIAS VIDAL MATTOS DE LEMOS.