RE - 16470 - Sessão: 15/02/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ALBERTINA PEREIRA DO CANTO, MARCUS VINICIUS MÜLLER PEGORARO e JOÃO NILSON DA SILVA COUTINHO contra a sentença do Juízo Eleitoral da 14ª Zona – Canguçu (fls. 42-44) –, que julgou procedente a representação por propaganda irregular ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, para o fim de condenar os representados ao pagamento de multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), por infringência ao art. 37 da Lei n. 9.504/97 mediante realização de comício em bem de uso comum consistente em um salão paroquial.

Em suas razões (fls. 48-52), os recorrentes postulam a reforma da sentença, a fim de que seja julgada improcedente a representação eleitoral, sob argumento de que fizeram um contrato de locação de espaço para abrigar o comício eleitoral, tal como já havia sido feito por outras coligações que participavam do pleito. Afirmam que o prédio no qual restou realizado o comício é um anexo do templo da congregação religiosa,  não caracterizando a vedação expressa no art. 37, § 4º, da Lei n. 9.504/97, pelo qual inexistente a ilegalidade no caso em tela, conforme a exegese do art. 5º, inc. XVI, da CF e do art. 39, § 1º, da Lei das Eleições.

Com contrarrazões (fls. 54-57), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 60-63).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do prazo de 24 horas previsto no art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97 e no art. 35 da Resolução TSE n. 23.462/15, motivo pelo qual dele conheço.

No mérito, os recorrentes foram condenados por realização de propaganda eleitoral em bem de uso comum, consistente em promoção, no dia 17.9.2016, de um comício no salão paroquial da localidade da Solidez, 1º Distrito de Canguçu, no momento em que acontecia a festividade tradicional na Comunidade Religiosa Redentor.

De acordo com o juízo a quo, restou comprovado que o comício foi promovido na mesma oportunidade de evento que é realizado anualmente naquela data (terceiro sábado de setembro) e cujo acesso é livre à população. “Houve, assim, nítida realização de propaganda eleitoral, conceito do qual o comício não pode ser excluído, com aproveitamento de evento já tradicional na comunidade. Muito embora a disciplina dos comícios seja especificada no art. 39 da Lei das Eleições, o disposto no art. 37 não está excluído desse tipo de propaganda”.

Entretanto, a realização de comício em bem público ou em bem de uso comum não está sujeita aos limites estabelecidos no art. 37 da Lei n. 9.504/97. A promoção de comício em bem de uso comum é expressão do próprio direito de reunião, garantido no art. 5º, inc. XVI, da Constituição Federal, sendo permitido que se realize em local público, como se extrai do art. 39, § 1º, da Lei n. 9.504/97:

Art. 39. A realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, em recinto aberto ou fechado, não depende de licença da polícia.

§ 1º O candidato, partido ou coligação promotora do ato fará a devida comunicação à autoridade policial em, no mínimo, vinte e quatro horas antes de sua realização, a fim de que esta lhe garanta, segundo a prioridade do aviso, o direito contra quem tencione usar o local no mesmo dia e horário.

§ 2º A autoridade policial tomará as providências necessárias à garantia da realização do ato e ao funcionamento do tráfego e dos serviços públicos que o evento possa afetar.

[...]

Assim, assegurado o direito à realização de comícios em bens de uso comum, as regras restritivas da propaganda eleitoral sofrem equivalente mitigação. Do contrário, restaria inviabilizada a promoção de comícios.

Esse é o entendimento da jurisprudência:

Recurso. Representação. Bem público. Utilização, em comício, de telões (painéis eletrônicos) equiparáveis a outdoors. Propaganda eleitoral irregular. Improcedência.

O comício é expressão do direito de reunião garantido no artigo 5º, inciso XVI, da Constituição Federal, podendo realizar-se em bem público ou de uso comum, em horário específico, a teor do disposto no caput e § 1º do artigo 39 da Lei n. 9.504/97 – não se sujeitando o tema versado no caso concreto à disciplina prescrita no artigo 37 do referido diploma legal.

Regularidade do uso dos painéis eletrônicos, ante a falta de comprovação de ocorrência de abuso na transmissão de imagens e a supra-aludida submissão da espécie ao regramento legal das reuniões político-partidárias.

Decisão recorrida mantida por seus próprios fundamentos.

Provimento negado.

(TRE-RS, RP 6297-83, Relatora Desa. Federal MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, j. 22.11.2010.)

 

ELEIÇÕES 2010. RECURSO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL. PAINEL UTILIZADO DURANTE A REALIZAÇÃO DE COMÍCIO. NÃO SUBSUNÇÃO À HIPÓTESE LEGAL PREVISTA NO ART. 37, § 2º, DA LEI N. 9.504/97.

1. A limitação de 4m² em bens particulares se estende apenas aos casos de propaganda de caráter permanente.

2. A realização de comícios ou reuniões políticas em bens de uso comum não se sujeita às limitações previstas no art. 37, § 2º, da Lei n. 9.504/97, submetendo-se unicamente às regras estabelecidas pelo artigo 39 da mesma Lei.

Recurso conhecido e desprovido.

(TRE/PR, Rp n. 168106, Acórdão n. 39.888, de 18.8.2010, Relator Dr. LUCIANO CARRASCO FALAVINHA SOUZA.)

Consoante se verifica, os comícios ou reuniões políticas limitam-se unicamente às regras estabelecidas no art. 39 da Lei n. 9.504/97.

Não há nenhuma irregularidade na realização de comício em bem de uso comum, pois, embora seja vedada a propaganda nesse tipo de local, excepcionalmente, admite-se a promoção de comícios, a serem realizados em horários específicos. Tal direito requer sejam viabilizados os meios necessários para a sua realização.

Dessa forma, a situação posta nos autos não está caracterizada como propaganda irregular, de modo que se impõe a reforma da sentença, pois não há que se falar em violação ao art. 37 da Lei n. 9.504/97.

 

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para o fim de reformar a sentença e julgar improcedente o pedido condenatório, afastando a penalidade imposta.