REl - 0600285-08.2024.6.21.0034 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/05/2025 00:00 a 23/05/2025 23:59

VOTO

A sentença julgou parcialmente procedente a representação, condenando o recorrente ao pagamento de multa, no valor de R$ 5.000,00, com fundamento no art. 30, § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19, por veiculação da seguinte postagem de rede social Instagram, que se trata de manchete publicada em jornal no ano de 1985:

 

A decisão confirmou a liminar que determinou a remoção do conteúdo da internet e abstenção de nova publicação, e decidiu pela remessa de cópia dos autos à Delegacia da Polícia Federal para instauração de procedimento investigatório, visando à apuração do crime previsto no art. 325 do Código Eleitoral. Transcrevo as razões de decidir:

(…)

De fato, a publicação impugnada revela-se ilícita na medida em que atribui ao candidato da coligação representante o cometimento de crime, possuindo potencial para afetar a integridade do processo eleitoral e causar danos à imagem e à honra do candidato, cuidando-se, pois, de agressões e ataques pessoais. Na publicação é atribuído ao candidato envolvimento em evento de trânsito que resultou na morte de uma criança, fato ocorrido há quase 40 anos e já julgado, não havendo notícia de que o candidato tenha sido criminalmente responsabilizado. Trata-se, portanto, de leviana disseminação de notícia que nenhuma relação tem com o debate político-eleitoral. Quanto à remoção do perfil, no entanto, entende-se não ser necessária e adequada a medida em juízo de cognição sumária, dada a extensão de tão drástica providência." Nesse cenário, impõe-se o juízo de parcial procedência, inclusive com aplicação da multa prevista no artigo 30, §1º, da Resolução TSE nº 23.610/2019."

Nestes termos, considerando que a conduta do representado extrapola os limites da crítica política legítima e adentra o campo das agressões pessoais, causando danos à honra e à imagem do representante, bem como à lisura do processo eleitoral, acolhe-se parcialmente os pedidos da representação eleitoral.

Diante do exposto, e considerando que a veiculação do conteúdo impugnado revela-se ilícita e ofensiva, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente representação, tornando definitiva a decisão liminar que determinou a suspensão da veiculação do conteúdo impugnado, aplico a multa prevista no artigo 30, §1º, da Resolução TSE nº 23.610/2019 ao representado pela prática de propaganda eleitoral irregular, no valor de R$ 5.000,00 e determino que seja remetido cópia integral dos autos à Delegacia da Polícia Federal para a instauração de procedimento investigatório policial, a fim de apurar a prática de crime tipificado no artigo 325 do Código Eleitoral.

 

As demais publicidades contidas no perfil de Instagram administrado pelo recorrente, referidas na petição inicial, não foram consideradas irregulares na decisão recorrida e não houve recurso da coligação representante objetivado a reforma da sentença nesse ponto.

As razões recursais apresentadas concentram-se na defesa da liberdade de expressão e na contestação da aplicação da multa.

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo provimento do recurso, destacando que a interpretação do art. 57-D da Lei n. 9.504/97 deve ser restritiva por limitar o direito fundamental. Ressaltou que o autor das postagens foi facilmente identificado, afastando a caracterização de anonimato efetivo, e que a publicação, embora ácida, baseou-se em fatos verídicos noticiados pela imprensa, inserindo-se nos limites do debate político-eleitoral.

Quanto às razões de reforma da sentença, considero que o recurso merece provimento, conforme bem pontuado pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer.

De plano, anoto que não se verifica do conteúdo da publicidade juntada aos autos a afirmação de que Marroni estaria sob efeito de álcool ou drogas durante o acidente. A matéria jornalística sequer é de autoria do recorrente, mas sim do jornal impresso Diário Popular, e está reproduzida no feito em baixa qualidade de resolução de imagem, sendo impossível ler seu inteiro teor. Além disso, a recorrida afirma que tal circunstância não condiz com a verdade apurada no inquérito da época, mas não faz prova nesse sentido.

Como destacado pela Procuradoria Regional Eleitoral, por limite direito fundamental, a interpretação do art. 57-D da Lei n. 9.504/97 deve ser restritiva. No caso concreto, verifica-se que a publicação questionada reproduziu notícia veiculada em jornal sobre acidente de trânsito envolvendo o candidato, acrescentando comentário que, embora ácido e incisivo, não ultrapassou os limites do debate político-eleitoral.

O conteúdo baseou-se em fato verídico noticiado pela imprensa à época, e não houve prova de que configurando difusão de fato sabidamente inverídico. Ademais, manifestações contundentes, críticas duras e questionamentos agudos integram a dialética democrática.

Deve prevalecer, como regra, a livre manifestação do pensamento durante a campanha eleitoral. Essa diretriz decorre diretamente do direito fundamental insculpido no art. 5º, inc. IV, da Constituição Federal.

Ademais, o art. 38, § 3º, da Res. TSE n. 23.610/19, ao tratar do anonimato, expressamente refere: "A publicação somente será considerada anônima caso não seja possível a identificação das usuárias ou dos usuários após a adoção das providências previstas no art. 40 desta Resolução". No caso em tela, a autoria foi prontamente verificada.

Conforme precedente do TSE trazido à colação pela Procuradoria Regional Eleitoral: "Identificado o responsável pelo conteúdo supostamente ofensivo, não é possível a aplicação de multa em razão do anonimato ou utilização de perfil falso, pois sua identidade não se encontrava protegida por efetivo anonimato, como preceitua o § 2º do art. 57–D da Lei 9.504/97 (Rp n. 0601697–71/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgado em 22.10.2020, DJe de 10.11.2020)" (TSE. Agravo em Recurso Especial Eleitoral n. 060060422, Acórdão, Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 09.9.2022).

Diante das especificidades do fato analisado, entendo que o recurso comporta provimento, pois não se trata de anonimato o recorrente não atribui ao recorrido a prática de nenhum crime e nem afirma inverdade flagrante ofensiva à honra. Trata-se de hipótese claramente acobertada pela liberdade de manifestação constitucionalmente assegurada.

Com esses fundamentos, VOTO pelo provimento do recurso interposto para reformar a sentença, julgar improcedente a representação e afastar a multa fixada, nos termos da fundamentação.