REl - 0600293-57.2024.6.21.0107 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/05/2025 00:00 a 23/05/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, discute-se a regularidade dos pagamentos efetuados por meio de cheques nominais não cruzados, circunstância que motivou a desaprovação das contas da recorrente e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

O art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 determina que os gastos eleitorais de natureza financeira, salvo as exceções previstas na norma, devem ser efetuados por cheque nominal cruzado, transferência bancária identificada, débito em conta, cartão de débito da conta bancária ou Pix. O objetivo da exigência é assegurar a rastreabilidade das transações e permitir a fiscalização pela Justiça Eleitoral.

No caso em análise, os cheques utilizados para pagamento de duas despesas no montante de R$ 1.953,00, embora nominais, não foram cruzados, permitindo a liquidação sem a obrigatoriedade de depósito na conta do beneficiário.

A primeira despesa, no valor de R$ 1.000,00, foi realizada por meio de cheque nominal ao fornecedor Gederson Fernando Chaves Cruz, tendo a irregularidade sido apontada pelo fato de que o cheque foi convertido em saque eletrônico, sem comprovação documental direta do recebimento pelo beneficiário.

A segunda despesa, no valor de R$ 953,00, também foi paga por meio de cheque nominal ao mesmo fornecedor. A irregularidade apontada decorre do fato de que, embora o cheque tenha sido emitido em nome do contratado, o valor acabou sendo creditado na conta bancária de Jéssica Gabriela da Silva Cruz, pessoa que, segundo a recorrente, teria vínculo familiar com o prestador do serviço.

O exame dos documentos acostados aos autos permite aferir, de maneira inequívoca, a correta destinação dos recursos.

A recorrente apresentou as microfilmagens dos cheques nominais ao fornecedor Gederson Fernando Chaves Cruz, os quais foram devidamente endossados pelo contratado (ID 45852598, páginas 4 e 6).

Este Tribunal já analisou o tema em eleições anteriores, concluindo por flexibilizar as exigências normativos e afastar a determinação de recolhimento de valores ao erário ante a apresentação da microfilmagem de cheque nominal não cruzado e, embora sacado na “boca do caixa”, subscrito no verso pela parte contratada (endosso em branco), de modo a confirmar o seu efetivo recebimento e legítima circulação. Nesse sentido, destaco os seguintes julgados:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL . JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS. DOCUMENTAÇÃO QUE DISPENSA ANÁLISE TÉCNICA. PRECEDENTES DESTA CORTE. ADMISSIBILIDADE . AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA REGULAR UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. CHEQUES NOMINAIS E NÃO CRUZADOS. DÉBITOS BANCÁRIOS SEM IDENTIFICAÇÃO DO FORNECEDOR. OFERECIMENTO DE PROVA IDÔNEA E SEGURA ACERCA DO DESTINO DOS RECURSOS . ENDOSSO DOS TÍTULOS. FALHA SUPERADA PELA EMISSÃO NOMINAL E PELA APOSIÇÃO DE ASSINATURA DO BENEFICIÁRIO NO VERSO DO CHEQUE. ENDOSSO EM BRANCO. DESPESAS SEM DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA DOS DESTINATÁRIOS DOS RECURSOS . INFRINGÊNCIA À NORMA DE REGÊNCIA. RECOLHIMENTO DO VALOR CONSIDERADO IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. BAIXO PERCENTUAL DAS FALHAS. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE . APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022. 2 . Apresentação de novos documentos comprobatórios. Este Tribunal tem mantido para o pleito de 2022 a jurisprudência quanto à possibilidade da apresentação intempestiva de documentos em processos de prestação de contas, mesmo após a emissão dos pareceres técnico e ministerial, desde que não acarrete prejuízo à tramitação e que, com a simples leitura, seja possível sanar a irregularidade. Documentação conhecida. 3 . Aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 3.1. Gastos cujos pagamentos ocorreram por meio de cheques nominais não cruzados e por débitos bancários sem identificação do fornecedor no extrato eletrônico . Apresentada prova idônea e segura acerca do destino dos recursos, por meio de declaração emitida pela gerência da unidade bancária de que os cheques foram efetivamente sacados pelos respectivos beneficiários. Logo, malgrado a ausência de depósito em conta bancária, o documento certifica que os recursos reverteram em prol dos contratados declarados, sem qualquer prejuízo à fiscalização da Justiça Eleitoral sobre o percurso da verba pública. Incabível a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, havendo mera falha formal por inobservância ao art. 38, inc . I, da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.2. Falta de cruzamento de cheques nominativos a fornecedores, descontados mediante operação de “saque eletrônico”. Cártulas endossadas em branco pelos beneficiários, constando as respectivas assinaturas e números de CPF no verso. Falha superada pela sua emissão nominal e pela aposição da assinatura do beneficiário no verso dos títulos (endosso em branco) . A legislação eleitoral, ao estabelecer as formas de quitação dos gastos eleitorais, não impõe a emissão de cheque não endossável ("não à ordem"), o qual pode ser licitamente transmitido a terceiros, conforme previsto no art. 17 da Lei n. 7.357/85 . Embora afastado o dever de recolhimento de quantias ao Tesouro Nacional, subsiste a falha formal por descumprimento do art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23 .607/19, relativamente aos gastos. No mesmo sentido, o cheque não cruzado e depositado na conta bancária do endossatário alcança o objetivo de conferir transparência e a rastreabilidade bancária da quantia. 3.3 . Gastos com pessoal. Não localizados registros de pagamentos destinados aos fornecedores, mediante anotação de CPF/CNPJ ou nome. Tampouco o candidato juntou cópia das cártulas ou de documentos bancários para comprovar as operações de pagamento. Posicionamento deste Regional no sentido da necessidade da apresentação pelos candidatos não apenas de documentos fiscais ou outros legalmente admitidos para comprovar a regularidade dos gastos eleitorais custeados com recursos públicos, como preceitua o art . 53, inc. II, letra c, da Resolução TSE n. 23.607/19, mas também prova de que o correlato pagamento se deu de acordo com o prescrito no art . 38 do mesmo estatuto regulamentar. Glosados os dispêndios sub examine, com o consequente comando de ressarcimento da quantia ao erário. 4. As irregularidades representaram 9,80% do montante arrecadado pelo candidato . Aplicados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 5. Aprovação com ressalvas. Determinado o recolhimento do valor considerado irregular ao Tesouro Nacional .

(TRE-RS - PCE: 0602152-12.2022.6.21 .0000 PORTO ALEGRE - RS 060215212, Relator.: CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 29/02/2024, Data de Publicação: DJE-40, data 06/03/2024) (Grifei.)


 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. NÃO ELEITO . DEPUTADO FEDERAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO REGULAR DE GASTOS COM O FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PAGAMENTO COM CHEQUES NÃO CRUZADOS. TÍTULO SEM ENDOSSO . BENEFICIÁRIO NÃO IDENTIFICADO. DESPESA COM IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO. FACEBOOK. DIFERENÇA ENTRE VALOR PAGO E VALOR COBRADO PELO PRESTADOR . CRÉDITOS. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL . APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022. 2 . Comprovação de gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Entendimento deste tribunal e do TSE no sentido de que deve ser afastada a determinação de recolhimento, mantida, contudo, a glosa naqueles casos em que haja a comprovação do gasto e da quitação ao fornecedor ou prestador de serviço por meio de cheque nominal não cruzado, ao fundamento central de desrespeito à formalidade prevista na legislação. Ou seja, uma vez comprovada a contratação do gasto e demonstrada a quitação ao correspondente fornecedor ou prestador de serviço, há que se considerar regular a despesa, porém, com a manutenção do apontado em face do não atendimento à determinação legal quanto à forma de quitação: cheque nominal cruzado. 3 . Irregularidades apontadas com utilização do FEFC. 3.1. Ausência de identificação do beneficiário do pagamento no extrato bancário, reflexo da quitação de gastos com cheques não cruzados . Identificados, contudo, cheques emitidos para pagamento de prestadores e distribuidores de material, cuja microfilmagem foi trazida aos autos, demonstrando que foram preenchidos de modo nominal aos contratados. À exceção de um, os títulos apresentam endosso, ainda que em branco. Ademais, os respectivos contratos integram o processo e observam os requisitos exigidos pela legislação de regência. Mantido o dever de recolhimento apenas do valor referente a cártula que deixou de receber endosso, restando, quanto a esta, não demonstrado de modo seguro o recebimento do pagamento realizado com verbas públicas ao credor . Afastado o dever de recolhimento referente aos demais títulos, na linha do entendimento precitado do TSE e deste Tribunal. 3.2. Despesa com impulsionamento de conteúdo . Facebook. Diferença entre o valor pago e o cobrado por serviços efetivamente prestados. Ainda que descrita como “desconto” pelo candidato, tal diferença deve ser considerada “sobras de campanha” e recolhida ao Tesouro Nacional, a teor do art. 35, § 2º, inc . I, da Resolução TSE 23.607/19. 4. A soma das irregularidades equivale a apenas 4,75% do total de receitas declaradas, admitindo a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade . 5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - PCE: 06028589220226210000 PORTO ALEGRE - RS 060285892, Relator.: Volnei Dos Santos Coelho, Data de Julgamento: 01/08/2024, Data de Publicação: DJE-151, data 06/08/2024) (Grifei.)

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ELEIÇÃO 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. OCORRÊNCIA DE OMISSÃO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO EXPRESSA SOBRE DOCUMENTOS JUNTADOS APÓS O PARECER DA PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL. DOCUMENTAÇÃO ANALISADA. EXISTÊNCIA DE DOIS CHEQUES DESCONTADOS NA BOCA DO CAIXA. PROVIMENTO EM RELAÇÃO A UM DELES. AFASTADA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE PARTE DO VALOR. MANTIDA A DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. CONCESSÃO DE EFEITOS INFRINGENTES. EMBARGOS ACOLHIDOS PARCIALMENTE.

1. Oposição contra acórdão que desaprovou as contas e determinou o recolhimento de valor ao Tesouro Nacional, em razão da aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, uma vez que inobservados os meios descritos para a realização de despesas com recursos públicos, na forma exigida pelo art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Ocorrência de omissão por ausência de manifestação expressa sobre os documentos juntados com a nota explicativa acostada aos autos após o término da instrução, na semana anterior ao julgamento do feito. Efetivamente, este Tribunal tem firme jurisprudência no sentido da possibilidade de apresentação intempestiva de documentos em processos de prestação de contas, após a emissão dos pareceres técnicos e ministerial, desde que não acarrete prejuízo à tramitação e que, com a sua simples leitura, seja possível sanar a irregularidade. No caso, a documentação não demandava nova análise técnico-contábil e a reabertura da instrução. Assim, o recurso merece ser acolhido nesse ponto, a fim de que os documentos juntados pela candidata após o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral sejam apreciados, sanando-se a omissão.

3. Os documentos intempestivos em nada modificam o julgado quanto à consideração de que a candidata declarou ter realizado pagamento mediante emissão de cheque nominal e não cruzado, o que permitiu seu desconto e/ou saque sem a regular identificação das pessoas beneficiadas nos extratos bancários, impedindo o rastreio dos recursos públicos e a vinculação do crédito às fornecedoras declaradas, bem como a transparência das contas e sua fiscalização pela Justiça Eleitoral.

4. Desconto de cheque por terceiros. Entendimento desta Corte de que o endosso somente pode ser realizado regular quando o cheque foi emitido de forma nominal e cruzada, obedecendo ao art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, única hipótese em que os candidatos não poderiam ser responsabilizados pelo endosso e pagamento a terceiro diferente da relação contratual entre as partes indicadas na contabilidade, dado que o cheque nominal e cruzado pode ser endossado por meio de assinatura no verso. No caso, não há dúvidas de que um dos cheques foi efetivamente descontado na boca do caixa pela prestadora de serviços contratada nas contas, não sendo caso de desconto do cheque por terceiros porque, embora endossado, o cheque estava nominal e a microfilmagem confirma o desconto pela própria militante. Provimento nesse ponto.

5. Em relação ao outro cheque, a microfilmagem apenas confirma a constatação realizada pelo órgão técnico de que o valor, procedente do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, foi sacado pela própria candidata, a qual firmou o verso da cártula. De fato, ao se observar o extrato bancário, verifica-se o saque em nome da candidata, com anotação do seu respectivo CPF como beneficiária.

6. Embargos acolhidos parcialmente, com efeitos infringentes. Afastada a determinação de recolhimento de parte do valor. Mantida a desaprovação das contas.

(TRE-RS; ED na PCE nº 060329621, Acórdão, Relatora: Des. Patricia Da Silveira Oliveira, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 175, Data 25/09/2023) (Grifei.)


 

Ainda que não tenha sido integralmente observado o comando do art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, os elementos constantes dos autos conferem segurança quanto à destinação dos valores e sobre a regularidade das despesas.

Além disso, as notas fiscais emitidas em nome da candidata atestam a efetiva contratação dos fornecedores (ID 45852598, páginas 3 e 5).

Assim, no caso concreto, a glosa deve ser afastada ante a cabal demonstração de que a ordem de pagamento vinculada às notas fiscais foram disponibilizadas ao prestador dos serviços contratado, não havendo de se cogitar em desvio, desvirtuamento ou malversação dos recursos.

Entretanto, embora afastado o dever de recolhimento de quantias ao Tesouro Nacional, subsiste a falha formal por descumprimento do art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, justificando a manutenção da sentença de desaprovação das contas por seus valores percentuais e nominais consideráveis, ou seja, R$ 1.953,00, que representa 41,55% dos recursos arrecadados pela candidata (R$ 4.700,00).

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso para afastar a determinação de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, mantendo a desaprovação das contas.