RE - 2389 - Sessão: 09/11/2016 às 14:00

RELATÓRIO

ÉLVIO DA SILVA BARCELLOS e JOÃO MANOEL MALESPINHAS ROQUE interpõem recurso contra sentença (fls. 28-30v.) que julgou procedente representação por propaganda antecipada proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL e condenou os recorrentes à multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) cada um.

Em suas razões (fls. 35-40), os recorrentes alegam a suspeição das testemunhas de acusação ouvidas na instrução processual e que o indeferimento da contradita teria caracterizado cerceamento de defesa. Argumentam que as testemunhas ouvidas confirmaram que o episódio o qual deu origem a propositura da ação configurou exaltação pública de qualidades pessoais de pré-candidatos e divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, o que não se confundiria com propaganda antecipada. Acrescentam que não houve pedido de voto e requerem a reforma da decisão com a consequente improcedência da demanda e desobrigação dos recorrentes ao pagamento de multa.

Com contrarrazões (fls. 41-42), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo provimento do recurso (fls. 44-48).

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas.

O recurso é tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a controvérsia cinge-se a verificar se manifestação ocorrida em culto ministrado em igreja, na data de 07.08.2016, constitui propaganda extemporânea na modalidade antecipada, pois ocorrida antes do dia 16 de agosto de 2016, data na qual passou a ser permitida a propaganda eleitoral.

Pois bem.

Objetivando garantir a isonomia entre os candidatos, a legislação eleitoral proíbe a veiculação de propaganda eleitoral antes do dia 16 de agosto, conforme dispõe o art. 1º da Resolução n. 23.457/15 do Tribunal Superior Eleitoral:

Art. 1º A propaganda eleitoral é permitida a partir de 16 de agosto de 2016 (Lei nº 9.504/1997, art. 36).

No entanto, o art. 2º da referida resolução, que reproduz o teor do recente art. 36-A da Lei 9.504/97, possibilita que os pretensos candidatos desenvolvam ações que, embora ocorram antes do aludido prazo, não configuram propaganda antecipada. Assim, é possível que haja menção à pretensa candidatura, exaltação de qualidades pessoais dos pré-candidatos, pedido de apoio político e divulgação das ações políticas desenvolvidas e das que se pretendem desenvolver, desde que não haja pedido explícito de voto:

Art. 2º Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via Internet (Lei n. 9.504/1997, art. 36-A, caput, incisos I a VI e parágrafos):

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na Internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, da discussão de políticas públicas, dos planos de governo ou das alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV - a divulgação de atos de parlamentares e de debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias.

§ 1º É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social.

§ 2º Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político, a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretendem desenvolver.

§ 3º O disposto no § 2º não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão.

(Grifei.)

No caso, compreendo que a manifestação aqui analisada está no rol de exceções do citado art. 36-A.

Colho a avaliação da prova efetuada na sentença para, discordando de suas conclusões, verificar apenas pedido implícito de voto. Vejamos:

Pois bem. Extrai-se da prova testemunhal que há um momento no culto em que são procedidas orações por momentos especiais, como explica Maxeler da Silva Sardão fazem oração para casamento, aniversário, outras tantas coisas; a testemunha, porém, não admitiu que o "momento especial" do representado era a eleição, embora isso seja facilmente perceptível na situação.  

De acordo com as testemunhas, o representado JOÃO MANOEL MALESPINHAS ROQUE  foi chamado pelo pastor, o representado ÉLVIO DA SILVA BARCELLOS, para uma benção especial, subiu ao púpito (ou altar), isto é, foi colocado em destaque; foi perguntado pelo pastor se ele era pré-candidato e a resposta foi afirmativa e assim recebeu a oração especial; as testemunhas concordam que não houve pedido de voto e que não foi divulgado o número do candidato ou seu partido.  

No entanto, Joceli Vignol Abreu Mendes e Laura Abreu Mendes, contam que o representado apresentou-se já  como candidato e que o pastor falou que era preciso ter pessoas cristãs dentro da política;  segundo Joceli, no final do culto o representado ainda se colocou à disposição para quem quisesse conhecê-lo melhor, inclusive informando sobre o  facebook, sendo que o pastor também falou sobre a página do facebook; e mais, acrescentou que todos entenderam que ele era candidato e alguns chegaram a dizer que votarão nele.  

Portanto, houve pedido explícito de voto no momento em que o pastor, na presença do pré-candidato, mencionou a necessidade de pessoas cristãs na política; ressalto que alguns dos presentes até disseram, no final do culto, que votarão no representado. Ainda, foram todos convidados a visitar a página do candidato no Facebook, caso qusisessem conhecê-lo melhor, em verdadeira campanha eleitoral.   (Grifos meus.)

Nota-se que o episódio ocorrido no culto religioso envolveu insinuações, sugestões, sutilezas e percepções, tudo a partir da apresentação do candidato. Ocorre que, ao demandar pedido explícito de voto para caracterizar propaganda eleitoral antecipada, a norma legal exige clareza, certeza, o que não se configurou na situação descrita.

Assim, não vislumbro a ocorrência de propaganda eleitoral antecipada.

E, nesse sentido, transcrevo trechos de recente decisão do Tribunal Superior Eleitoral, firmada nos autos do REspe n. 51-24, de relatoria do Ministro Luz Fux, onde aquela corte interpretou as modificações trazidas na propaganda eleitoral pela Lei n. 13.165/15. Consta do texto do voto que:

Antes da referida alteração normativa, este Tribunal Superior consolidara o entendimento de que haveria propaganda eleitoral antecipada ou extemporânea quando, ainda que subliminarmente ou implicitamente, sem o pedido expresso de voto, se levasse ao conhecimento do público em geral plataformas, propostas e intenções políticas, se fizesse menção à pré-candidatura, a eleições vindouras e/ou se veiculasse a ideia de que o emissor/beneficiário da propaganda seria a pessoa mais bem preparada para exercer mandato eletivo.

Tal conclusão, porém, diante da nova realidade normativa inserida pela Lei nº 13.165/2015, merece ser revista.

A despeito de inexistirem direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, a vedação ou a limitação à propaganda veiculada antecipadamente deve resguardar objetivos constitucionalmente legítimos, de alto valor axiológico, ou possuir uma razão constitucional suficiente, materializadas na promoção e salvaguarda de interesses, que, ante a proeminência e a envergadura na ordem constitucional, justifiquem a limitação da garantia jusfundamental da liberdade de expressão.

Nesse sentido, eventual estabelecimento de limite temporal às propagandas eleitorais encontra lastro no princípio da igualdade de oportunidades entre partidos e candidatos, de forma a maximizar 3 (três) objetivos principais: (i) assegurar a todos os competidores um mesmo prazo para realizarem as atividades de captação de voto, (ii) mitigar o efeito da (inobjetável) assimetria de recursos econômicos na viabilidade das campanhas, no afã de combater a plutocratização sobre os resultados dos pleitos; e (iii) impedir que determinados competidores extraiam vantagens indevidas de seus cargos ou de seu acesso aos grandes veículos de mídia, antecipando, em consequência, a disputa eleitoral.

Precisamente por isso, o enquadramento jurídico-eleitoral de determinada mensagem de pré-candidato ao conceito de propaganda eleitoral extemporânea reclama uma análise tripartite, no sentido de perquirir se o ato atentatório à isonomia de chances, à higidez do pleito ou à moralidade que devem presidir a competição eleitoral. Do contrário, ausentes quaisquer ultrajes a referidos cânones fundamentais eleitorais, a mensagem encerrará livre e legítima forma de exteriorizar seu pensamento dentro dos limites tolerados pelas regras do jogo democrático.

Considerando que a conduta examinada nestes autos não constitui ato atentatório à isonomia de chances, à higidez do pleito ou à moralidade eleitoral, além da já mencionada ausência de pedido explícito de voto, não se configura propaganda eleitoral antecipada.

Portanto, deve ser reformada a sentença que concluiu pela existência de propaganda antecipada e fixou multa no caso sob análise.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso, julgando improcedente a demanda e afastando a aplicação de multa.

É como voto, Senhora Presidente.