RE - 9184 - Sessão: 05/10/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ALESSANDRO CAMILO DA SILVA contra decisão do Juízo Eleitoral da 51ª Zona – São Leopoldo, que indeferiu seu registro de candidatura em razão de se encontrar com os direitos políticos suspensos, pois foi condenado pela prática do delito previsto no art. 157, § 2º, incs. I e II do Código Penal, cuja decisão transitou em julgado em 06.8.2003 e a pena extinta pelo seu cumprimento em 15.8.2011, de forma que, não tendo passado os oito anos de inelegibilidade prevista na LC 64/90, o recorrente encontra-se inelegível (fls. 51-57).

Em suas razões de recurso (fls. 61-71) o recorrente afirma, em síntese, que a inelegibilidade de oito anos deve ser contada a partir da publicação do acórdão proferido por órgão colegiado, devendo ser retirada da contagem o período em que cumpria pena, visto que neste período seus direitos políticos já estavam suspensos. Pugnou pela atribuição do efeito suspensivo ao recurso em face do previsto no art. 26-C da LC 64/90, assim como a reforma da sentença com o consequente deferimento do registro de candidatura.

Com as contrarrazões (fls. 74-76v.), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral lançou parecer pelo desprovimento do recurso (fls. 79-84).

É o relatório.

VOTOS

Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja (relatora):

Eminentes colegas:

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

Preliminar de efeito suspensivo ao recurso

Analiso inicialmente o pedido de aplicação do efeito suspensivo ao presente recurso.

Consabido que, nos termos do art. 257 do Código Eleitoral, os recursos interpostos no âmbito desta Justiça Especializada não terão agregados o efeito suspensivo, a não ser nas hipóteses do seu parágrafo segundo, quais sejam, quando a decisão do Juiz Eleitoral importar em cassação do registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo.

Prevê o Código Eleitoral:

Art. 257. Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo.

[...]

§ 2º O recurso ordinário interposto contra decisão proferida por juiz eleitoral ou por Tribunal Regional Eleitoral que resulte em cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo será recebido pelo Tribunal competente com efeito suspensivo.

Como se observa, o caso debatido nestes autos não se amolda a nenhuma das hipóteses elencadas no citado § 2º, do art. 257, do Código Eleitoral, de forma que o pedido se mostra infrutífero.

Ademais, tal providência se mostra desnecessária à luz do art. 16-A da Lei n. 9.504/97, que permite aos candidatos realizarem suas campanhas mesmo que seus registros esteja sub judice. In verbis:

Art. 16-A. O candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição, ficando a validade dos votos a ele atribuídos condicionada ao deferimento de seu registro por instância superior.

Logo, mantida a possibilidade de continuidade da campanha sem prejuízo ao candidato, despiciendo atribuir efeito suspensivo ao presente recurso.

Desta forma, indefiro o pedido e passo ao exame do mérito da irresignação.

Mérito

No mérito, os autos versam sobre inelegibilidade do candidato Alessandro Camilo da Silva, que teve seu registro de candidatura ao cargo de vereador no Município de São Leopoldo indeferido pelo Juízo da 51ª Zona Eleitoral, em razão do previsto no art. 1º, I, 'e', item 2, da Lei Complementar n. 64/1990, com redação dada pela Lei Complementar n. 135/2010.

Dos autos se extrai que o recorrente foi condenado criminalmente à pena de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e multa, pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, incs. I e II, do Código Penal, em decisão proferida pela Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, nos autos da Ação Penal n. 041/2.02.0000711, cuja pena transitou em julgado em 15 de agosto de 2003, sendo que o término do cumprimento da pena ocorreu em 15 de agosto de 2011.

Prevê a Lei das Inelegibilidades:

Art. 1º São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

[...]

e) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes:

2. contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência.

Tem-se, pois, que o prazo de inelegibilidade, iniciado em 15 de agosto de 2011, à luz do dispositivo supra, não transcorreu integralmente.

Entretanto, o recorrente sustenta que a inelegibilidade de oito anos deve ser contada a partir da publicação do acórdão proferido pelo órgão colegiado, diminuindo-se o tempo em que cumpria pena.

Contudo, descabe-lhe razão.

Ao julgar conjuntamente as ADCs 29 e 30 e a ADI 4578, o STF posicionou-se no sentido de que a inelegibilidade não encerra natureza jurídica de pena, mas traduz requisito para que o cidadão possa ocupar cargos eletivos, visando a assegurar a legitimidade do regime democrático.

Do julgamento da supracitada Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 29, na qual ficou decidida a constitucionalidade da Lei Complementar n. 135/2010, relatada pelo Ministro Luiz Fux chega-se a esta conclusão:

Em outras palavras, a elegibilidade é a adequação do indivíduo ao regime jurídico – constitucional e legal complementar – do processo eleitoral, consubstanciada no não preenchimento de requisitos “negativos” (as inelegibilidades). Vale dizer, o indivíduo que tenciona concorrer a cargo eletivo deve aderir ao estatuto jurídico eleitoral. Portanto, a sua adequação a esse estatuto não ingressa no respectivo patrimônio jurídico, antes se traduzindo numa relação ex lege dinâmica.

É essa característica continuativa do enquadramento do cidadão na legislação eleitoral, aliás, que também permite concluir pela validade da extensão dos prazos de inelegibilidade, originariamente previstos em 3 (três) , 4 (quatro) ou 5 (cinco) anos, para 8 (oito) anos, nos casos em que os mesmos encontram-se em curso ou já se encerraram. Em outras palavras, é de se entender que, mesmo no caso em que o indivíduo já foi atingido pela inelegibilidade de acordo com as hipóteses e prazos anteriormente previstos na Lei Complementar nº 64/90, esses prazos poderão ser estendidos – se ainda em curso – ou mesmo restaurados para que cheguem a 8 (oito) anos, por força da lex nova, desde que não ultrapassem esse prazo.

Explica-se: trata-se, tão-somente, de imposição de um novo requisito negativo para a que o cidadão possa candidatar-se a cargo eletivo, que não se confunde com agravamento de pena ou com bis in idem. Observe-se, para tanto, que o legislador cuidou de distinguir claramente a inelegibilidade das condenações – assim é que, por exemplo, o art. 1º, I, “e”, da Lei Complementar nº 64/90 expressamente impõe a inelegibilidade para período posterior ao cumprimento da pena. (Grifei.)

Neste cenário, tendo em conta que a inelegibilidade não é pena, não se pode utilizar de institutos de Direito Penal com o fito de reduzir o tempo de limitação da capacidade eleitoral passiva, ou seja, não há como utilizar a detração penal para diminuir o tempo de inelegibilidade prevista em abstrato.

No ponto, lanço mão do parecer ministerial utilizando-o como razão decidir:

Tendo por norte a natureza não penal da sanção de inelegibilidade ora em comento, não é possível a utilização de institutos do Direito Penal, como é o caso da detração, para o fim de reduzir o lapso temporal em que a capacidade eleitoral passiva fica prejudicada.

Ou seja, não previu a Lei das Inelegibilidades qualquer forma de desconto do lapso temporal da inelegibilidade prevista para após o cumprimento da pena, do tempo já transcorrido entre a decisão colegiada e o início da suspensão dos direitos políticos decorrentes do trânsito em julgado da decisão condenatória na seara criminal.

Eventual interpretação no sentido sustentado no recurso é tese minoritária no âmbito do Supremo Tribunal Federal, prevalecendo o entendimento daquela Corte Constitucional quando do julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade nºs 29 e 30 e da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.578, no sentido de que são constitucionais os preceitos normativos introduzidos pela LC nº 135/2010 que disciplinaram novas hipóteses geradoras de inelegibilidades, dentre outros, aquelas instituídas pela alínea “e” do inciso I do art. 1º da Lei Complementar 64/90 [...].

Assim, tendo a extinção da pena do recorrente se dado em 15.8.2011, ainda transcorre o lapso temporal de incapacidade eleitoral passiva de oito anos, ou seja, o recorrente está impedido de concorrer a cargos eletivos até 15.8.2019.

Neste sentido a jurisprudência do TSE:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO. CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO CRIME DE ROUBO MAJORADO. ART. 157, § 2º, DO CÓDIGO PENAL. INCIDÊNCIA DA INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, I, E, 2, DA LC Nº 64/90.

1. A condenação por órgão colegiado pela prática do delito tipificado no art. 157 do CP - inserto no Título II (Crimes contra o patrimônio) do mencionado Diploma Normativo - gera inelegibilidade, uma vez que o aludido crime consta da lista veiculada no art. 1º, I, e, da LC nº 64/90.

2. In casu, o ora Agravante foi condenado pela prática de roubo majorado (art. 157, § 2º, do CP), tendo a sentença transitado em julgado em 2.6.2006 e o referido impedimento cessado em 17.11.2008, consoante o acórdão da Corte de origem.

3. O prazo concernente à hipótese de inelegibilidade prevista na mencionada alínea e, nos termos do decidido pelo Supremo na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 29, projeta-se por oito anos após o cumprimento da pena.

4. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Ordinário nº 80880, Acórdão de 02.10.2014, Relator Min. LUIZ FUX, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 02.10.2014). (Grifei.)

Assim, a teor do art. 1º, inc. I, alínea 'e', item 2, perduram os efeitos da decisão condenatória referida, permanecendo o recorrente inelegível até 15.8.2019.

Com essas considerações, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença que indeferiu o registro de ALESSANDRO CAMILO DA SILVA ao cargo de vereador do Município de São Leopoldo.

É como voto, Senhora Presidente.

 

(Após votar a relatora negando provimento ao recurso, no que foi acompanhada pela Dra. Maria de Lourdes e pelo Des. Paulo Afonso, pediu vista o Dr. Silvio Ronaldo. Demais julgadores aguardam o voto-vista. Julgamento suspenso.)