RE - 17932 - Sessão: 22/09/2016 às 14:00

RELATÓRIO

EVERTON VANDERLEI FLORES VIEIRA interpõe recurso (fls. 30-40) em face da sentença (fls. 24-26) que indeferiu o seu pedido de registro de candidatura ao cargo de vereador pelo PSD de São Pedro do Sul.

Em suas razões recursais, alega que a pré-candidatura há de ser deferida, pois o processo no qual foi condenado “se encontra ainda sub judice junto ao TJRS, no prazo de apresentação de recurso especial ao STJ e de recurso extraordinário ao STF”. Entende a decisão ilegal e controvertida, uma vez que sem trânsito em julgado não poderia haver a condenação do recorrente. Indica divergência jurisprudencial no Tribunal de Justiça do RS acerca da matéria do processo no qual restou condenado. Aponta jurisprudência. Requer a concessão de liminar para anular a decisão guerreada, o recebimento e o processamento do recurso para confirmar a liminar requerida e, ao final, o provimento do recurso.

Nesta instância, os autos foram remetidos à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 116-117v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos, deve ser conhecido.

Preliminarmente, julgo prejudicado o pedido de concessão de medida liminar, incabível à espécie. Não apenas porque o rito dos pedidos de registro de candidatura é absolutamente célere, mas principalmente porque, de acordo com o art. 16-A da Lei n. 9.504/97, é permitido ao candidato cujo registro esteja sub judice, como o caso que ora se trata, permanecer praticando os atos inerentes à campanha eleitoral.

Dessa forma, ausente prejuízo ao recorrente, entendo prejudicado o pedido.

No caso dos autos, o juízo a quo entendeu incidente inelegibilidade prevista no art. 1º, I, ‘l’, da Lei Complementar n. 64/90:

Art. 1º.  São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

l) os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena; (Incluída pela LC 135/10, de 04.6.10)

Com razão o magistrado.

Isso porque EVERTON VANDERLEI FLORES VIEIRA restou condenado por órgão colegiado – 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul pela prática de ato doloso de improbidade administrativa. A decisão reconheceu, ainda, ter havido lesão ao erário e enriquecimento ilícito, cominando a suspensão dos direitos políticos pelo período de 5 (cinco) anos.

O processo tem tombo originário de n. 129/1.09.00005067-0 e, em grau recursal, recebeu o n. 70063991442, instância na qual houve o provimento do recurso interposto pelo Ministério Público Estadual, sendo confirmada a suspensão dos direitos políticos do ora recorrente. O julgado recebeu a seguinte ementa:

APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VEREADORES E SERVIDORES MUNICIPAIS. DIÁRIAS PARA FORA DO ESTADO EM EXCESSO. PARTICIPAÇÃO EM CURSOS DE APERFEIÇOAMENTO. DESVIO DE FINALIDADE. OBTENÇÃO DE VANTAGEM PATRIMONIAL ILÍCITA. PREJUÍZO AO ERÁRIO. COMPROVAÇÃO DO DOLO. APLICAÇÃO DOS ARTIGOS 09 E 10 DA LEI Nº 8.429/92. MANUTENÇÃO DAS SANÇÕES. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROVIDO PARA APLICAR A PENA DE PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA A UM DOS RÉUS. - APELO DOS RÉUS - O fato de existir previsão legal para o pagamento de diárias, inclusive em dobro para fora do Estado, não afasta a análise do alegado desvirtuamento do pagamento pelo uso abusivo (excesso de diárias) e desvio de finalidade. O exame da juridicidade do caso está no excesso de viagens para fora do Estado, com utilização de verba pública para benefício pessoal, isto é, com outro propósito que não o interesse público. Daí a correta conclusão da sentença no sentido de que o "ato de usufruir abusivamente de diárias sob o pretexto de participação em cursos de aperfeiçoamento, que se realizavam em cidades turísticas ou próximas à divisa com o Estado vizinho (SC), com conteúdos programáticos semelhantes aos oferecidos pela UVERGS, dentro do Estado do RS, fugiu ao senso comum de razoabilidade, adequação e proporcionalidade". Comprovação do agir doloso com desvio de finalidade, porquanto a verba pública relativa às diárias foi utilizada pelos réus como outra fonte de renda, levando ao enriquecimento ilícito e causando evidente prejuízo ao erário. Situação que caracteriza, no caso concreto, ato de improbidade administrativa tipificado nos artigos 09 e 10 da Lei nº 8.429/92, punível com as sanções do art. 12, incisos I e II, da Lei 8.429/92. Aplicação das sanções com base no princípio da proporcionalidade. Manutenção da sentença de parcial procedência. - APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO - A aplicação da sanção de perda da função pública no caso concreto dos autos não viola a proporcionalidade, tendo em vista a gravidade das condutas praticadas pelo réu no exercício do mandato de vereador. Trata-se da penalidade mais eficaz, considerando que os atos praticados são absolutamente incompatíveis com a função de vereador ainda exercida por um dos réus. NEGADO PROVIMENTO AO APELO DOS RÉUS. APELO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROVIDO.

(Apelação Cível N. 70063991442, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leonel Pires Ohlweiler, Julgado em 28.04.2016.)

Daí, muito embora as razões de recurso, não há como dar guarida à tese de que haveria de se aguardar o trânsito em julgado da condenação, pois o texto da LC n. 64/90 não deixa margens interpretativas: basta a condenação por órgão colegiado para que ocorra a incidência da hipótese de inelegibilidade da alínea “l” do art. 1º, I.

Nessa linha, a jurisprudência do TSE:

Eleições 2014. [...]. Registro de candidatura indeferido. Deputado federal. Art. 1º, I, l, da LC nº 64/90. Condenação por ato doloso de improbidade administrativa. Requisitos. Preenchimento. Inelegibilidade. Incidência. [...] 1. Nos termos da jurisprudência mais recente desta Corte, a inelegibilidade que surge após o pedido de registro de candidatura pode ser apreciada nas instâncias ordinárias, desde que garantidos o contraditório e a ampla defesa, não havendo falar em colisão com o disposto no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97, tendo em vista o disposto no art. 7°, parágrafo único, da LC nº 64/90, segundo o qual, ‘o Juiz, ou Tribunal, formará sua convicção pela livre apreciação da prova, atendendo aos fatos e às circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes, mencionando, na decisão, os que motivaram seu convencimento’. (RO n° 154-29/DF, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, PSESS de 26.8.2014). 2. No caso vertente, o candidato foi condenado em ação civil pública, por ato doloso de improbidade previsto no art. 9° da Lei n° 8.429/92, em razão de ter usado verba pública destinada ao pagamento de despesas referentes ao exercício regular do mandato, em benefício próprio, o que demonstra a ocorrência de enriquecimento ilícito de sua parte e dano ao erário, haja vista que a referida verba foi usada com finalidade diversa e para fins ilícitos, em manifesta ofensa à moralidade para o exercício do mandato. 3.  O dolo, na espécie, é evidente, pois não é possível vislumbrar a prática da referida conduta que não seja dolosamente, até porque, o enquadramento realizado na forma do art. 9º da Lei n° 8.429/92, como evidenciado no caso vertente, não admite a forma culposa. [...]

(Ac. de 24.10.2014 no AgR-RO n. 38427, rel. Min. Luciana Lóssio.)

 

Eleições 2014. Candidato a deputado federal. [...]. Registro de candidatura indeferido no TRE. Incidência na inelegibilidade referida no art. 1º, inciso I, alínea l, da Lei Complementar nº 64/1990. Requisitos ausentes. [...]. Registro deferido. [...] 2. A incidência na causa de inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea l, da LC nº 64/1990 exige o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: i) decisão transitada ou proferida por órgão colegiado do Poder Judiciário; ii) condenação por improbidade administrativa na modalidade dolosa; iii) conduta ímproba que acarrete dano ao erário e enriquecimento ilícito; iv) suspensão dos direitos políticos; v) prazo de inelegibilidade não exaurido. 3. Com base na compreensão da reserva legal proporcional, as causas de inelegibilidade devem ser interpretadas restritivamente, evitando-se a criação de restrição de direitos políticos sob fundamentos frágeis e inseguros, como a possibilidade de dispensar determinado requisito da causa de inelegibilidade, ofensiva à dogmática de proteção dos direitos fundamentais. 4. A incidência na causa de inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea l, da LC nº 64/1990 pressupõe análise vinculada da condenação colegiada imposta em ação de improbidade administrativa, não competindo à Justiça Eleitoral, em processo de registro de candidatura, chegar à conclusão não reconhecida pela Justiça Comum competente. 5. Condenação colegiada por improbidade administrativa decorrente de violação de princípios (art. 11 da Lei nº 8.429/1992). A análise sistemática da Lei de Improbidade revela que a condenação por violação de princípios não autoriza a necessária conclusão de que houve dano ao erário, tampouco enriquecimento ilícito. São condutas tipificadas e    m artigos distintos e podem ocorrer isoladamente. 6. Não houve enriquecimento ilícito do candidato nem condenação colegiada por dano ao erário, mas por violação de princípios, tampouco há referência expressa aos ilícitos. 7.  Não compete à Justiça Eleitoral proceder a novo julgamento da ação de improbidade administrativa, para, de forma presumida, concluir por dano ao erário e enriquecimento ilícito, usurpando a competência do Tribunal próprio para julgar eventual recurso. [...]

(Ac. de 27.11.2014 no RO n. 44853, rel. Min. Gilmar Mendes.)

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo íntegra a sentença que indeferiu o pedido de  registro de candidatura.