RE - 7689 - Sessão: 15/02/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por CLÁUDIO ROBERTO PEREIRA AVILA contra decisão do Juízo da 71ª Zona Eleitoral – Gravataí – (fls. 113-116), o qual julgou procedente a representação por doação acima do limite legal e condenou o recorrente ao pagamento de multa no valor de cinco vezes a quantia doada em excesso, totalizando R$ 33.524,45 (trinta e três mil quinhentos e vinte e quatro reais e quarenta e cinco centavos), com fundamento no art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

Os embargos de declaração opostos contra a sentença (fls. 120-122) foram rejeitados (fl. 124).

O representado interpôs recurso (fls. 128-134), alegando que, por meio de declaração retificadora de ajuste anual do imposto de renda, informou rendimentos tributáveis no montante de R$ 200.455,58 (duzentos mil quatrocentos e cinquenta e cinco reais e cinquenta e oito centavos), de maneira que as doações efetuadas durante a campanha eleitoral de 2014, no valor total de R$ 14.700,90 (quatorze mil setecentos reais e noventa centavos), obedeceram ao limite disposto no art. 23, § 1º, inc. I, da Lei das Eleições. Sustentou, ainda, que a retificação da declaração do imposto de renda é faculdade do contribuinte prevista na legislação tributária e reconhecida jurisprudencialmente, não estando, ademais, condicionada à prévia notificação do órgão fazendário, competindo ao autor da representação comprovar eventual vício ou má-fé na prática do ato.

O Ministério Público Eleitoral de piso apresentou contrarrazões nas fls. 141-144.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela manutenção da sentença, requerendo, na hipótese de entendimento diverso por este Tribunal, fosse o feito convertido em diligência, oportunizando-se ao representado a comprovação do recebimento dos valores acrescidos aos rendimentos inicialmente declarados com relação ao ano-base de 2013, objeto da declaração retificadora (fls. 153-157).

Intimada (fl. 159), a parte representada peticionou nos autos, juntando extratos bancários referentes àquele ano-calendário (fls. 164-178v.).

Com nova vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fl. 184 e verso).

É o relatório.

 

VOTOS

Des. Carlos Cini Marchionatti (relator):

Admissibilidade

A sentença foi publicada no DEJERS, dia 25.7.2016 (fl. 118), tendo sido protocolizados os embargos declaratórios em 26.7.2016 (fl. 120), e publicada a decisão que os rejeitou em 09.8.2016 (fl. 125). O recurso, por sua vez, foi interposto em 12.8.2016 (fl. 128), sendo, portanto, tempestivo, pois observado o tríduo legal.

Preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço o recurso.

Mérito

Trata-se de recurso interposto por Cláudio Roberto Pereira Avila contra decisão do Juízo da 71ª Zona Eleitoral (fls. 113-116), que julgou procedente a representação por reconhecer que houve infringência à norma disposta no art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97, em virtude de o recorrente ter efetuado doação para campanhas eleitorais no ano de 2014, no valor de R$ 14.700,90 (quatorze mil setecentos reais e noventa centavos), excedendo o percentual de 10% (dez por cento) da renda bruta auferida no ano anterior ao pleito, correspondente a R$ 79.960,12 (setenta e nove mil novecentos e sessenta reais e doze centavos).

Em decorrência da conduta ilícita, a magistrada de primeiro grau, com base no art. 23, § 3º, da Lei das Eleições, condenou o representado ao pagamento de penalidade pecuniária no valor de R$ 33.524,45 (trinta e três mil quinhentos e vinte e quatro reais e quarenta e cinco centavos), equivalente a cinco vezes a quantia doada em excesso (R$ 6.704,89), de acordo com informação da Receita Federal do Brasil (fl. 17 do Anexo I).

Os referidos dispositivos legais, à época em que realizadas as doações, possuíam a seguinte redação:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas:

I - no caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição. […]

§3º A doação de quantia acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso. […] (Grifei.)

No entender da juíza eleitoral de primeira instância, a declaração retificadora de imposto de renda, realizada após a propositura da representação e trazida aos autos somente em sede de alegações finais, não constituiria documento hábil a comprovar os rendimentos brutos auferidos pelo representado no ano de 2013, inexistindo prova de o mesmo ter procedido à retificação dos seus rendimentos exclusivamente por força de notificação da Receita Federal do Brasil. Por esses motivos, julgou procedente a ação, aplicando a penalidade de multa anteriormente referida (fl. 115).

Ao manifestar-se no processo, a douta Procuradoria Regional Eleitoral, após examinar diferentes correntes jurisprudenciais acerca da admissibilidade da declaração retificadora de imposto de renda para fins de verificar o excesso de doação em ações congêneres, inclusive oriunda deste Tribunal, ponderou ser indispensável a apresentação de documentos idôneos que demonstrassem a percepção dos rendimentos, sob pena de manipulação do resultado do processo pelo representado, quando o recolhimento do tributo se mostra mais vantajoso relativamente ao pagamento da multa de natureza eleitoral (fls. 153-157).

O representado, intimado para complementar a documentação, juntou extratos bancários referentes aos meses de fevereiro a dezembro de 2013 (fls. 165-178v.). Todavia, esses documentos, segundo a orientação da Procuradoria Regional Eleitoral, seriam insuficientes para provar, de forma inequívoca, o acréscimo patrimonial declarado na prestação retificadora por não revelarem a natureza e a circunstância fática em que creditados ao representado (fl. 184 e verso).

No entanto, em que pese a respeitável argumentação da magistrada de primeiro grau e da Procuradoria Regional Eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral pacificou entendimento no sentido de reconhecer a declaração retificadora do imposto de renda como documento hábil a comprovar a observância do limite de doação definido no art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97.

Como constitui faculdade do contribuinte, eventual má-fé de sua parte quanto ao conteúdo das informações retificadas não pode ser presumida e utilizada como fundamento para embasar a condenação por doação eleitoral acima do patamar previsto em lei, remanescendo a investigação de eventuais irregularidades de ordem tributária aos órgãos competentes.

Colaciono, abaixo, ementa de julgado proferido pela Superior Instância, afirmando o seu posicionamento a respeito da matéria:

ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO ELEITORAL. PESSOA FÍSICA. PRELIMINAR. DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO DO TSE QUE DETERMINOU O RETORNO DOS AUTOS. DETERMINAÇÃO CUMPRIDA. PRELIMINAR AFASTADA. MÉRITO. ART. 23, § 1º, I, DA LEI Nº 9.504/97. APRESENTAÇÃO DE DECLARAÇÃO RETIFICADORA. LUCROS RECEBIDOS DE PESSOA JURÍDICA. INCOMPATIBILIDADE DE INFORMAÇÕES. MÁ-FÉ OU VÍCIO NA APRESENTAÇÃO DA RETIFICADORA. AUSÊNCIA. ANÁLISE E BATIMENTO DAS INFORMAÇÕES CONTIDAS NAS DECLARAÇÕES. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL. DOAÇÃO ELEITORAL. LIMITE LEGAL OBSERVADO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO.

1. A retificação da declaração de rendimentos consubstancia faculdade prevista na legislação tributária, cabendo ao autor da representação comprovar eventual vício ou má-fé na prática do ato, haja vista que tais circunstâncias não podem ser presumidas para fins de aplicação das sanções previstas nos arts. 23 e 81 da Lei nº 9.504/97 (REspe nº 90-11/SP, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 21.11.2014 e AgR-AI nº 1475-36/CE, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 5.6.2013).

2. In casu, incompatibilidade entre as informações constantes da declaração de rendimentos retificadora do Recorrente e a declaração da pessoa jurídica não constitui, per se, circunstância capaz de evidenciar a má-fé ou vício na retificação apresentada pela pessoa física.

3. Eventuais fraudes nas informações apresentadas à autoridade fazendária devem ser apuradas pelas instâncias e via adequadas.

4. Recurso especial a que se dá provimento.

(TSE – RESPE 47569/Brasília – DF, Relator Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 08.3.2016, Data de Publicação: DJE Tomo 107, Data 06.6.2016, Página 12.)

Este Tribunal Regional Eleitoral tem seguido linha idêntica ao apreciar casos similares, como mostra a ementa do seguinte precedente:

Recurso. Representação. Doação acima do limite legal. Pessoa Jurídica. Art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2014. Admissibilidade da declaração de imposto de renda retificadora, juntada na fase recursal, a amparar a legalidade da doação. Documento que revela a existência de fato superveniente de forma a configurar a obediência ao limite de dois por cento do faturamento bruto no ano anterior ao da eleição. Legalidade da doação. Afastadas as sanções de multa e de proibição de participar de licitações e contratar com o poder público. Provimento.

(TRE-RS – RE 2750, Relator Dr. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Data de Julgamento: 04.5.2016, Data de Publicação: DEJERS Tomo 79, Data 06.5.2016, Página 3.)

Assim, em consonância com o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral e deste Regional, considero que, na hipótese dos autos, a declaração retificadora apresentada pelo recorrente com relação ao ano de 2013 afasta a configuração do ilícito eleitoral e seus consectários legais (fls. 101-118 do Anexo).

Na primeira declaração apresentada, os rendimentos brutos totalizavam R$ 79.960,12 (fls. 19-23 do Anexo). Com a retificação, o representado incluiu valores recebidos a título de honorários advocatícios, de modo que a renda tributável (R$ 200.455,58) e o 13º salário (R$ 6.504,54) passaram a somar R$ 206.960,12, rendimentos, aliás, compatíveis com a movimentação financeira registrada nos extratos bancários juntados nas fls. 165-178v.

Consequentemente, o total doado no pleito de 2014, ou seja, R$ 14.700,90, não extrapolou o percentual estabelecido no art. 23, § 1º, inc. I, da Lei das Eleições para as doações de campanha, motivo pelo qual o recurso merece ser provido, julgando-se improcedente a representação.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso interposto por CLÁUDIO ROBERTO PEREIRA AVILA, ao efeito de julgar improcedente a representação e afastar a penalidade de multa imposta.

 

Dr. Rafael Maffini:

Acompanho o relator basicamente por cinco motivos: primeiro, o caráter substitutivo da declaração retificadora, que já foi reconhecido pelo Tribunal Superior Eleitoral, no Recurso Especial Eleitoral n. 10-705, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, de novembro de 2016; segundo, pela faculdade/dever de fazer a retificação, na legislação tributária; terceiro, pelo momento em que a retificadora foi apresentada no contexto processual do feito que está em apreciação; quarto lugar – que para mim merece especial destaque – o ônus da prova de quem representa contra a regularidade da retificadora, incumbência não atingida por quem o fez; e, especialmente, porque as movimentações financeiras demonstradas nos extratos juntados aos autos corroboram os termos da retificação.