RE - 10647 - Sessão: 06/10/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Examina-se recurso interposto pelo PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO – PTB, Comissão Provisória no Município de PASSA SETE, contra sentença do Juízo Eleitoral da 53ª Zona Eleitoral, que julgou improcedente a impugnação oposta e deferiu o pedido de registro de candidatura ao cargo de prefeito de BERTINO RECH, por considerar inaplicável à hipótese a alínea “g” do inc. I do art. 1º da Lei Complementar n. 64/90 (fls. 98-105)

Em suas razões (fls. 120-124), o partido recorrente aduz, em síntese, que Bertino Rech teve suas contas de gestão na prefeitura, no exercício de 2012, julgadas irregulares por decisão do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul. Sustenta que, consoante previsão do art. 113, inc. IV, do Regimento Interno do TCE-RS, somente as contas de governo devem ser apreciadas pela Câmara de Vereadores. Assim, sendo hipótese de contas de gestão, o Tribunal de Contas é soberano no julgamento do feito. Ao final, pugnou pela reforma da sentença para reconhecer-se a inelegibilidade do recorrido.

Foram oferecidas contrarrazões (fls. 128-131), rebatendo as teses recursais.

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 138-140).

É o relatório.

 

VOTO

Tempestividade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal previsto no art. 52, § 1º, da Resolução TSE n. 23.455/15.

Mérito

No mérito, a hipótese em tela encontra a seguinte positivação:

Art. 1º. São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

[...]

g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição.

Segundo o aludido dispositivo, com redação dada pela Lei Complementar n. 135/10, exige-se o preenchimento de três condições para a caracterização da inelegibilidade em questão: 1) terem sido as contas rejeitadas por decisão irrecorrível do órgão competente; 2) a rejeição ter se dado por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa; 3) inexista decisão judicial que suspenda ou anule os efeitos da rejeição.

Em relação à primeira condição, qual seja, terem sido as contas rejeitadas por decisão irrecorrível do órgão competente, impende destacar que, segundo Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral, 5. ed., 2016, p. 232), é necessário que a decisão "tenha efetivamente transitado em julgado".

E, a partir da data da decisão de rejeição de contas, devidamente transitada em julgado (ou seja, irrecorrível), é que inicia o prazo da inelegibilidade da referida alínea “g”.

O recorrente busca o reconhecimento da inelegibilidade, sustentando que o pré-candidato teve suas contas relativas à gestão do exercício de 2012, quando exerceu o cargo de prefeito, desaprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado, consoante acórdão de fls. 30-43, desse órgão.

Entretanto, é inevitável reconhecer a ausência de decisão irrecorrível do órgão competente a amparar a pretensão recursal, isto porque embora haja decisão do TCE desaprovando a contabilidade, não há notícias de decisão definitiva pela Câmara de Vereadores, órgão competente para julgar as contas de prefeito, nos termos do recentemente decidido pelo Supremo Tribunal Federal.

De fato, a Corte Suprema entendeu que para os fins do art. 1º, inc. I, al. “g”, da Lei Complementar n. 64/90, a apreciação das contas de prefeito, tanto as de governo quanto as de gestão, será exercida pelas câmaras municipais, com auxílio dos tribunais de contas competentes, cujo parecer prévio somente deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos vereadores (RE 848826/DF, rel. orig. Min. Roberto Barroso, red. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 10.8.2016 - repercussão geral).

Nesse julgamento também ficou superada a controvérsia sobre o alcance da fiscalização pelo Tribunal de Contas dependente de ratificação da Câmara Legislativa.

De fato, parcela da doutrina e da jurisprudência distinguiam as contas de gestão das contas de governo no tocante à competência para julgamento. As primeiras envolviam o prefeito enquanto ordenador de despesa, com responsabilidade administrativa, e ocorria exclusivamente perante a Corte de Contas. A segunda envolvia o exame das contas do chefe do Executivo na condição de executor orçamentário, suscitando a responsabilidade política da autoridade, cujo julgamento competia ao Poder Legislativo, auxiliado pelo Tribunal de Contas.

A partir do entendimento proferido pelo STF, não importa perquirir se a análise envolve contas de governo ou contas de gestão, pois ambas devem ser, indistintamente, apreciadas por um processo político-administrativo, partindo-se de um parecer técnico da Corte de Contas sujeito à posterior acolhimento ou rejeição pelo Poder Legislativo respectivo.

Dessa forma, deve ser afastada a previsão do art. 13, inc. IV, do Regimento Interno do TCE-RS, que prevê o parecer prévio apenas para as contas de governo de prefeito, visto que incompatível com a Constituição Federal, em conformidade com a interpretação conferida pelo Plenário do STF aos arts. 31, § 2º, 71, inc. I, e 75 da Carta Magna, por ocasião do julgamento alhures referido.

Na mesma trilha, a manifestação da Câmara Municipal deve ser expressa, uma vez que o Pretório Excelso igualmente definiu que é incabível o julgamento ficto das contas por decurso de prazo (RE 729744/MG, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10.8.2016 - repercussão geral).

Além disso, consta dos autos (fl. 14) certidão do presidente da Câmara Municipal de Passa Sete atestando que as contas da prefeitura municipal dos anos de 2005 a 2010 e de 2012 foram aprovadas pelo Poder Legislativo, estando pendente apenas as contas do exercício de 2011, que ainda não foram remetidas pelo Tribunal de Contas.

Desse modo, não se verifica na espécie a causa de inelegibilidade prevista na alínea “g” do inc. I do art. 1º da Lei Complementar n. 64/90, pois ausente a decisão irrecorrível do órgão competente rejeitando as contas públicas.

Pelo exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a decisão que DEFERIU o registro de candidatura de BERTINO RECH ao cargo de prefeito.