PET - 15468 - Sessão: 08/09/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de ação declaratória de nulidade de ato jurídico, proposta por EDUARDO SOARES DA ROSA contra decisão proferida pelo Tribunal Regional Eleitoral na Prestação de Contas n. 2171-48.2014.6.21.0000, na qual julgou como não prestadas as contas do referido candidato ao cargo de deputado estadual, nas eleições gerais de 2014 (fls. 02-5).

Afirma que o TRE-RS julgou como não prestadas as contas do candidato Eduardo por conta da não regularização da representação processual. Aduz que as contas foram prestadas por meio de advogado devidamente inscrito na OAB/RS, conforme se depreende do extrato de prestação de contas (fl. 08 – PC n. 2171-48). Alega que as intimações do candidato para sanar a pendência verificada não ocorreram. Ainda, que as tentativas de notificação aconteceram após o término do pleito, de forma que deveriam observar as regras contidas no Código de Processo Civil.  Salienta que, ao se constatar a ausência de procuração, a providência a ser adotada seria a intimação do próprio causídico para apresentação do instrumento de mandato. Por derradeiro, requer a reabertura de prazo para a regularização da representação processual nos autos da PC n. 2171-48 e, assim, garantida a sua quitação eleitoral.

Foi determinado o apensamento da PC n. 2171-84 aos presentes autos (fl. 09).

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo julgamento conjunto com o RE n. 704-60 e, no mérito, pela improcedência do pedido (fls. 14-17v.).

É o relatório.

 

 

VOTO

Preliminar

A Procuradoria Regional Eleitoral, preliminarmente, requer a conexão da causa com o Recurso Eleitoral n. 704-60.2016.6.21.0001, fulcro no artigo 55 e § 1º do Código de Processo Civil.

Dispõe o art. 55 e § 1º do CPC:

Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.

§ 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado.

In casu, no julgamento do Recurso Eleitoral n. 704-60.20165.6.21.0001 foi determinado o apensamento aos presentes autos, motivo pelo qual passo ao julgamento conjunto dos feitos.

Mérito

Trata-se de ação declaratória de nulidade de ato jurídico com vistas a desconstituir decisão, já transitada em julgado, nos autos da Prestação de Contas n. 2171-48.2014.6.21.0000, a qual julgou como não prestadas as contas de EDUARDO SOARES DA ROSA, candidato a deputado estadual nas eleições de 2014.

Na Justiça Eleitoral, o manejo da ação rescisória tem disciplina normativa específica, prevista no artigo 22, I, “j”, do Código Eleitoral, cabível perante o TSE, restrita à hipótese de inelegibilidade, dentro do prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias:

Art. 22. Compete ao Tribunal Superior:

I - Processar e julgar originariamente:

[…] j) a ação rescisória, nos casos de inelegibilidade, desde que intentada dentro de cento e vinte dias de decisão irrecorrível, possibilitando-se o exercício do mandato eletivo até o seu trânsito em julgado.

O Código de Processo Civil, por sua vez, tem aplicação subsidiária e prevê, em seu art. 966, as demais hipóteses em que a decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida.

A decisão judicial definitiva, excepcionalmente, também pode ser impugnada, a qualquer tempo, por meio da ação declaratória de nulidade insanável, ou denominada querela nullitatis insanabilis. O Tribunal Superior Eleitoral já se manifestou acerca da possibilidade do seu manejo na hipótese de revelia decorrente de ausência ou de defeito na citação.

Extraio do TSE, nesse sentido, as seguintes ementas:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE. DECISÃO JUDICIAL QUE DEFERIU REGISTRO DE CANDIDATURA TRANSITADA EM JULGADO. 1. O cabimento da querela nullitatis restringe-se às hipóteses de revelia decorrente de ausência ou de defeito na citação e de sentença proferida sem dispositivo legal, sem assinatura do magistrado ou exarada por quem não exerce função judicante ou atividade jurisdicional. 2. O agravante não infirmou os fundamentos da decisão agravada. 3. Agravo regimental desprovido.

(TSE. Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 50593, Acórdão de 05.02.2015, Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 43, Data 05.03.2015, Página 42.) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2012. AÇÃO ANULATÓRIA. PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. DECISÃO QUE DETERMINOU A NOVA TOTALIZAÇÃO DE VOTOS EM PLEITO PROPORCIONAL. HIPÓTESE DE CABIMENTO RESTRITA: (i) AUSÊNCIA OU DE DEFEITO NA CITAÇÃO E (ii) DE SENTENÇA PROFERIDA SEM DISPOSITIVO LEGAL, SEM ASSINATURA DO MAGISTRADO OU EXARADA POR QUEM NÃO EXERCE FUNÇÃO JUDICANTE OU ATIVIDADE JURISDICIONAL. CAUSA PETENDI QUE NÃO SE AMOLDA ÀS HIPÓTESES QUE AUTORIZAM O AJUIZAMENTO DA QUERELA NULLITATIS. PREJUÍZO DE EXAME DA TUTELA ANTECIPADA. AÇÃO ANULATÓRIA A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.

(TSE - PET: 941720156000000 Maringá/PR 36822015, Relator: Min. Luiz Fux, Data de Julgamento: 15.03.2015, Data de Publicação: 15.03.2015.) (Grifei.)

 

Representação. Propaganda eleitoral irregular. Multa. Condenação. Trânsito em julgado. Posterior alegação. Citação válida. Ausência. Relação processual. Inexistência. Querela Nullitatis. Admissão. Previsão legal. Ausência. Processo eleitoral. Garantia. Direito constitucional de ação. Interesse de agir. 1. É possível a propositura da querela nullitatis, admitida tanto na doutrina quanto na jurisprudência, para se arguir a falta de citação válida que constitui vício insanável. […] Recurso especial parcialmente provido.

(TSE. REspe n. 21.406/SP, rel. Min. FERNANDO NEVES DA SILVA, DJ de 14.5.2004.) (Grifei.)

 

Cumpre destacar que a prestação de contas, autuada sob o n. PC 2171-48, foi apresentada por João Paulo de Almeida Farina, conforme requerimento assinado de fl. 07, o qual também subscreve o extrato de prestação de contas de fl. 08 na qualidade de “administrador financeiro”. Diferentemente do afirmado pelo requerente, as contas não foram apresentadas por meio de advogado devidamente inscrito na OAB/RS.

A Resolução TSE n. 23.406/14, que dispõe sobre a prestação de contas nas eleições de 2014, prevê a obrigatoriedade da constituição de advogado e a necessidade de juntada do instrumento de mandato, em seus artigos 33, § 4º, e 40, II, “g”:

Art. 33. [...]

§ 4º O candidato e o profissional de contabilidade responsável deverão assinar a prestação de contas, sendo obrigatória a constituição de advogado.

 

Art. 40. A prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, será composta:

[…] II – e pelos seguintes documentos:
[…] g) instrumento de mandato para constituição de advogado para a prestação de contas.

Nesse passo, o candidato foi pessoalmente notificado em 21.11.2014, conforme carta de notificação de fl. 10, por meio de fac-símile (fl. 10v), para que regularizasse a representação processual, constituindo advogado, com a juntada de procuração, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena das contas apresentadas não serem conhecidas e consideradas não prestadas.

A notificação, realizada por meio de fac-símile, está em conformidade com o artigo 96-A da Lei n. 9.504/97:

Art. 96-A. Durante o período eleitoral, as intimações via fac-símile encaminhadas pela Justiça Eleitoral a candidato deverão ser exclusivamente realizadas na linha telefônica por ele previamente cadastrada, por ocasião do preenchimento do requerimento de registro de candidatura.

Parágrafo único. O prazo de cumprimento da determinação prevista no caput é de quarenta e oito horas, a contar do recebimento do fac-símile.

 

Ressalta-se que o período eleitoral é aquele definido por meio de instrução expedida pelo Tribunal Superior Eleitoral. Nas eleições gerais de 2014 foi publicada a Resolução TSE n. 23.390/13 – Calendário Eleitoral, a qual prevê a data de 11 de dezembro de 2014 como sendo o “último dia em que as unidades responsáveis pela análise das prestações de contas, em todas as instâncias, permanecerão abertas de forma extraordinária, não mais funcionando aos sábados, domingos e feriados”.

Dessa forma, inexistiu irregularidade na forma de notificação por meio de fac-símile, uma vez realizada dentro do período eleitoral.

De mais a mais, como bem apontado no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (fl. 16v.), consta que o próprio candidato compareceu em 23.02.15 (petição de fl. 22) perante a Secretaria Judiciária deste Tribunal, dois meses antes do julgamento, ocorrido em 06.5.15, para requerer cópia dos autos de prestação de contas, o que foi deferido (fl. 20).

Na espécie, restou inequívoca a ciência do candidato acerca da ausência de regularização da representação processual, razão pela qual não se vislumbra afronta ao direito de defesa.

A querela nullitatis somente é cabível para impugnar decisão que, embora transitada em julgado, tenha sido contaminada por graves vícios processuais ou na qual seja patente afronta a direito fundamental.

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO. AÇÃO ANULATÓRIA. QUERELA NULLITATIS. ALEGAÇÃO. VÍCIOS. DRAP. COLIGAÇÃO PROPORCIONAL. FALTA DE INTERESSE. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO OPORTUNA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 182 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DESPROVIMENTO. 1. Na linha da jurisprudência desta Corte, não é admissível a querela nullitatis quando o provimento judicial que se pretende anular foi prolatado em processo que tramitou dentro da normalidade, sem qualquer afronta aos pressupostos processuais, ao devido processo legal ou a outro direito fundamental. […] 3. Agravo regimental desprovido.

(TSE. Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 7975, Acórdão de 20.11.2014, Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 229, Data 04.12.2014, Página 9/10.)

 

RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. ELEIÇÕES 2006. QUERELA NULLITATIS. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. ACÓRDÃO PROFERIDO PELO TRE/CE TRANSITADO EM JULGADO. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA. IMPOSSIBILIDADE. AÇÃO RESCISÓRIA. NÃO CABIMENTO. 1. A relativização da coisa julgada é admissível, ao menos em tese, apenas nas situações em que se evidencia colisão entre direitos fundamentais, fazendo-se uma ponderação dos bens envolvidos, com vistas a resolver o conflito e buscar a prevalência daquele direito que represente a proteção a um bem jurídico maior. Precedentes. 2. A fixação de jurisprudência – argumento que fundamenta a pretensão do recorrido – não é fator capaz de invalidar, por meio da querela nullitatis, acórdão proferido em processo que tramitou dentro da normalidade, tendo em vista que não houve afronta ao devido processo legal ou a qualquer outro direito fundamental. 3. De outra parte, não há falar nem mesmo em aplicação do princípio da fungibilidade, de modo a receber a ação declaratória de nulidade como ação rescisória, tendo em vista que, no processo eleitoral, somente há previsão de cabimento da ação rescisória para a desconstituição de decisão desta Corte Superior que examine o mérito de declaração de inelegibilidade. Precedentes. 4. Recursos especiais eleitorais providos.

(TSE. Recurso Especial Eleitoral n. 967904, Acórdão de 08.05.2012, Relatora Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 115, Data 20.06.2012, Página 73.)

 

Portanto, considerando que a Prestação de Contas n. 2171-48 tramitou dentro da normalidade, sem qualquer violação aos pressupostos processuais, ao devido processo legal ou a outro direito fundamental, não é admissível a declaração de sua nulidade.

Por essas razões, quanto ao mérito, na linha do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 14-17v.), tenho que o pedido é manifestamente improcedente.

Relativamente à medida cautelar, pela mesma motivação, tenho por ausente o requisito do fumus boni iuris, razão pela qual deve permanecer inalterada a condição do candidato que teve suas contas, relativas às eleições de 2014, consideradas não prestadas, com decisão transitada em julgado.

Diante do exposto, VOTO pela improcedência dos pedidos formulados por EDUARDO SOARES DA ROSA na ação principal (Pet n. 154-68.2016.6.21.0000) e na cautelar (RE n. 704-60.2016.6.21.0001).