RE - 2890 - Sessão: 23/11/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recursos interpostos por GR TECH CONSTRUÇÕES E LOCAÇOES LTDA e pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra decisão do Juízo da 149ª Zona que julgou PROCEDENTE (fls. 60-62) a representação por doação para campanha acima do limite ajuizada pelo Parquet, e condenou a empresa à sanção de multa no valor de R$ 113.250,00 (cento e treze mil duzentos e cinquenta reais) em virtude de excesso de doação da ordem de R$ 22.650,00 (vinte de dois mil seiscentos e cinquenta reais).

O Ministério Público Eleitoral traz razões de recurso para fundamentar a reforma da decisão relativamente a estender a condenação à recorrida, proibindo-a de contratar com o Poder Público ou de participar de processo licitatório pelo prazo de 5 (cinco) anos, ao argumento central de que a conduta da recorrida tem contornos graves (fls. 83-85).

A empresa, por seu turno, recorre (fls. 68-75), trazendo matéria preliminar, ao considerar ter havido ilícita quebra de sigilo fiscal sem prévia autorização judicial. No mérito, sustenta a necessidade de redução da multa, pois a quantia doada teria sido incapaz de, por si só, influenciar no resultado do pleito, mostrando-se excessiva a reprimenda aplicada no caso concreto. Traz precedentes que entende pertinentes ao caso e requer a reforma da decisão.

Com as contrarrazões de ambas as partes, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso da empresa condenada e pelo provimento do recurso do Ministério Público Eleitoral (fls. 109-118).

É o relatório.

 

VOTO

Tempestividade

Ambos os recursos são tempestivos.

No que diz respeito à empresa GR Tech, a decisão foi publicada no DEJERS em 28.07.2016, fl. 67, e o apelo interposto em 01.08.2016, fl. 68.

O Ministério Público Eleitoral, por sua vez, foi intimado da sentença em 29.08.2016, sexta-feira (fl. 67v.), e apresentou a irresignação em 03.08.2016, quarta-feira, conforme a certidão constante à fl. 82v.

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço de ambos.

 

Preliminar. Ilicitude da prova.

Invoca a recorrente GR Tech a ocorrência de cerceamento de defesa sob o argumento de que informações, as quais deram suporte à condenação, foram obtidas a partir de violação ilegal do seu sigilo fiscal, decorrendo, daí, a nulidade da decisão recorrida.

A preliminar deve ser rechaçada.

Quanto aos valores doados para campanhas eleitorais e nomes dos doadores, trata-se de informações públicas, não acobertadas por sigilo, prevendo a Lei das Eleições a divulgação desses dados na rede mundial de computadores.

Sob aspecto diverso note-se, no que concerne ao conteúdo protegido por sigilo fiscal, a ocorrência de requisição pelo Juízo Eleitoral (fl. 11) à Superintendência Regional da Receita Federal do Brasil dos “valores totais doados pelo representado para campanhas nas eleições de 2014”, bem como do “faturamento bruto declarado pela representada para o exercício de 2013”.

Tais dados foram requeridos a partir da constatação de suposta irregularidade, viabilizada mediante o convênio firmado entre a Justiça Eleitoral e a Receita Federal (Portaria Conjunta n. 74/06), o qual prevê a comunicação sobre excessos de doações verificadas quando do cruzamento de dados, absolutamente viável.

Nesse sentido, já decidiu esta e. Corte:

Recurso. Representação. Doação acima do limite legal. Pessoa Física. Art. 23, § 1º, I, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2014.

Afastada preliminar. Caráter público das informações referentes às doações realizadas para campanha eleitoral, não acobertadas por sigilo. Licitude da prova extraída do relatório de cruzamento de dados entre a Justiça Eleitoral e a Secretaria da Receita Federal para instrução de procedimentos judiciais. Irrelevante o valor representado pelos bens e direitos para dimensionar o montante da doação. O valor decorrente de liquidação de empresa, cujo montante já integre o patrimônio do doador em exercícios anteriores, sem qualquer diferença positiva de ganho de capital, não pode ser considerado como rendimento, devendo ser excluído do cálculo para apuração do limite legal. As doações realizadas por pessoas físicas, em regime de comunhão universal de bens, ficam limitadas a dez por cento do somatório dos rendimentos auferidos pelo casal no exercício fiscal anterior ao do pleito. O comando disposto na norma do art. 23, § 1°, inc.I, da Lei n. 9.504/97 é de aplicação objetiva. Ultrapassado o limite estabelecido, há incidência da sanção correspondente. Multa cominada no patamar mínimo previsto pela legislação de regência. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 3507, Rel. Leonardo Saldanha. DEJERS de 10.3.2016.) (Grifei.)

Por sua vez, a quebra do sigilo fiscal observou os trâmites regulares da espécie, sendo decretada em decisão fundamentada da autoridade judicial competente (fl. 11), preservando-se os princípios do devido processo legal e da reserva de jurisdição.

Ademais, a informação revelou-se indispensável para a aferição do valor exato nas doações efetuadas, justificando a mitigação da proteção constitucional consagrada pelo art. 5º, inc. X, da CF/88.

Assim, não há que se falar em ilicitude da prova.

Com esses fundamentos, afasto a matéria preliminar.

 

Mérito

De início, ressalto que esta Corte tem, sistematicamente, entendido pela aplicação da legislação eleitoral com base no preceito tempus regit actum. Nessa linha, as modificações trazidas pela Lei n. 13.165/15, a denominada minirreforma eleitoral, ou as discussões acerca das doações eleitorais por pessoas jurídicas, não integram questões de julgamento do caso – os fatos serão analisados conforme a legislação vigente à época em que ocorridos.

 

Do recurso ministerial.

O Ministério Público de 1º grau recorre da decisão ao entender que a sentença deveria ter determinado, além da multa, a proibição de contratar com o Poder Público ou de participar de licitação pelo prazo de cinco anos.

Demasiado.

O próprio TSE tem entendido que somente em casos extremos, nos quais o excesso de doação tenha sido especialmente grave ou danoso, é que a sanção proibitiva relativa aos contratos com o poder público há de ser aplicada:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. PENALIDADES. MULTA E PROIBIÇÃO DE LICITAR E CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO. CUMULAÇÃO. DESNECESSIDADE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DESPROVIMENTO. 1. A aplicação cumulativa das sanções do art. 81 da Lei nº 9.504 /97, em caso de doação acima do limite legal realizada por pessoa jurídica, depende da gravidade da infração, considerando-se a severa penalidade prevista no § 3º. 2. Afastada a imposição da penalidade referente à proibição de licitar e de contratar com o Poder Público por entender que a aplicação da multa revela-se suficiente para reprimir a conduta dos autos, observando-se os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 3. Agravo regimental desprovido.

(AgRG em RE n. 455-45/RJ. Rel. Ministro Dias Toffoli. DJE de 26.03.2014.)

E o caso sob exame, frise-se, não desbordou da mera irregularidade financeira. Não há, nos autos, prova de danos aptos a justificar, cumulativamente à pena pecuniária, a sanção de suspensão vindicada pelo Parquet, de modo que andou bem a sentença, não merecendo reparos.

Do recurso de GR Tech Construções e Locações LTDA.

A representada, condenada em 1º grau por doação eleitoral acima do limite, alega, fundamentalmente, que a multa deve ser reduzida.

E também este apelo não merece provimento.

A multa já foi aplicada no patamar mínimo legal, sendo inviável sua redução aquém do montante equivalente ao previsto pela norma de regência. Em termos objetivos, verificado o excesso de doação no valor de R$ 22.650,00, impõe-se a multa no valor de R$ 113.250,00, equivalente a cinco vezes a quantia irregular, conforme a dicção do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97, devendo ser mantida em seus exatos termos.

Finalmente, a alegação de que a multa aplicada trata-se de praticamente metade do valor do faturamento da recorrente, no ano de 2013, apenas corrobora ter havido doação desmedida pela condenada, de maneira que não pode ser considerada como argumento para um juízo de proporcionalidade, descabido no caso concreto.

Nessa linha, a jurisprudência do TSE:

Representação. Doação acima do limite legal. Pessoa Física. Multa. Mínimo legal.

1. A jurisprudência desta Corte entende que a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade deve ser levada em consideração apenas para a fixação da multa entre os limites mínimo e máximo estabelecidos em lei (AgR-REspe nº 374-32 rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 19.6.2013).

2. A eventual fixação de multa abaixo do mínimo legal ou mesmo a não imposição da penalidade cabível significaria negar vigência às disposições legais que estabelecem os limites para as doações de pessoas físicas e jurídicas para campanhas eleitorais. Agravo regimental a que se nega provimento.

O Tribunal, por unanimidade, desproveu o agravo regimental, nos termos do voto do Relator. (AgR-Respe n. 15329/PR, DJE 14.03.2014, p. 54, Julgado em 20.02.2014, Rel. Ministro Henrique Neves.)(Grifei.)

Ante o exposto, VOTO por afastar a preliminar e negar provimento a ambos os recursos.