RE - 2474 - Sessão: 22/11/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por CHENDLER VASCONCELOS SIQUEIRA face à sentença proferida no Juízo da 163ª Zona Eleitoral, sediada em Rio Grande, que julgou procedente a representação apresentada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL e condenou o recorrente por prática de propaganda eleitoral fora do prazo legal, aplicando multa de R$ 5.000,00 (fls. 13-15).

No recurso, o recorrente aduz que a sentença interpretou a nova legislação sob a ótica da lei antiga. Alega que a mensagem enviada por intermédio do aplicativo WhatsApp apenas exaltou as qualidades do recorrente, não havendo pedido explícito de voto. Requer o provimento do recurso e a reforma da sentença para que seja julgada improcedente a representação (fls. 17-20).

O recorrido apresentou contrarrazões (fl. 24 e verso).

A Procuradoria Regional Eleitoral emitiu parecer opinando pelo desprovimento do recurso (fls. 27-30).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais requisitos, deve ser conhecido.

No mérito, inicialmente, é pertinente referir que a Lei n. 13.165, de 29.9.2015, ampliou o rol de condutas e divulgações que não caracterizam propaganda antecipada. Cito o art. 36-A:

Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet:

I - a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II - a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III - a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV - a divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V - a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;

VI - a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias.

A mensagem que teria configurado propaganda eleitoral antecipada tem o seguinte teor (fl. 06):

"Oii

To passando pra lhe lembrar que serei candidato a vereador pelo nosso povo. Com minha experiência nos movimentos sociais e o dom da fala que Xangô me concedeu para defender as nossas pautas lá dentro. Estou passando para sondar o apoio das irmãs e dos irmãos nessa candidatura. Estou na luta por todas e todos nós, não podemos ficar na mão da bancada fundamentalista e seus atos preconceituosos de intolerância religiosa, racismo e homofobia para conosco. Um grande abraço com muito axé e vamos a luta por representatividade."

À análise.

Como se observa, o recorrente exalta suas qualidades e defende a luta por representatividade. Não há pedido explícito de voto, sendo sequer indicada a legenda pela qual o recorrente pretendia concorrer.

Na apreciação da questão, devem ser consideradas as modificações trazidas pela Lei n. 13.165/15, que trouxeram nítido alargamento de possibilidades de atuação dos pré-candidatos. A letra legal é expressa no sentido de que, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura e a exaltação de qualidades pessoais dos pré-candidatos poderão ser realizadas sem qualquer afronta à legislação eleitoral.

Inexistente pedido explícito. Diferente do que consignado na sentença, o “fato de solicitar a lembrança” é mera insinuação, que, no máximo, configura pedido implícito de voto.

Ademais, é de se ressaltar que em julgamento recente que envolvia caso com contornos semelhantes, o Tribunal Superior Eleitoral fixou que a Justiça Eleitoral não deve reprimir a implementação de métodos alternativos de divulgação de propostas e plataformas políticas – o que ocorreria com a excessiva restrição ao uso de mídias sociais e aplicativos. Constou da ementa do RESPE n. 51-24, de relatoria do Ministro Luz Fux, julgado em 18.10.2016:

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. (LEI DAS ELEIÇÕES, ART. 36-A). DIVULGAÇÃO DE MENSAGEM EM FACEBOOK. ENALTECIMENTO DE PARTIDO POLÍTICO. MENÇÃO À POSSÍVEL CANDIDATURA. AUSÊNCIA DE PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTOS. NÃO CONFIGURAÇÃO. LEGÍTIMO EXERCÍCIO DA LIBERDADE JUSFUNDAMENTAL DE INFORMAÇÃO. ULTRAJE À LEGISLAÇÃO ELEITORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO. […]

8. No caso sub examine,

a) O Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Minas Gerais, por maioria, deu parcial provimento a recurso eleitoral, reduzindo ao mínimo legal multa aplicada ao Recorrente pelo Juízo da 52ª Zona Eleitoral, ante o reconhecimento de propaganda eleitoral extemporânea, em virtude de “[ter] public[ado], em seu perfil no Facebook, uma imagem contendo sua fotografia e, ao lado, a seguinte mensagem: “PSB/MG - O melhor para sua cidade é 40!” (fls. 116).

b) Aludida mensagem, a despeito de enaltecer determinado partido político e de indicar possível candidatura, não configura propaganda eleitoral extemporânea vedada pela legislação de regência, como supõe o aresto vergastado.

c) É que, com o fim das doações empresariais e com o reduzido tempo de campanha eleitoral, impõe-se que os pretensos candidatos, no afã de difundir suas propostas e de enaltecer suas qualidades pessoais, logrem buscar formas alternativas de conexão com o seu (futuro) eleitorado, de modo que me parece natural que eles se valham de publicações em posts e de mensagens nas mídias sociais (facebook, twitter etc.) para tal desiderato.

d) A veiculação de mensagens pelas mídias sociais, dada a modicidade de seus custos, harmoniza-se com a teleologia que presidiu tanto a proscrição de financiamento por pessoas jurídicas quanto a Minirreforma Eleitoral: o barateamento das campanhas eleitorais, característica que as tornam inaptas a ocasionar interferência indevida do poder econômico no pleito.

e) A Justiça Eleitoral, se reprimir a implementação de métodos alternativos de divulgação de propostas e plataformas políticas (com excessiva restrição ao uso das mídias sociais), contribuirá negativamente para o esvaziamento integral do período democrático de debates (para alguns, denominado de pré-campanha), instituído pela Lei nº 13.165/2015, na medida em que aniquilará, sem qualquer lastro constitucional ou legal, a interação que deve ocorrer entre os pretensos candidatos e os cidadãos, de ordem a produzir odioso chilling effect nos pretensos candidatos, tamanho o receio de verem suas mensagens e postagens qualificadas como propaganda extemporânea.

f) Como consectário, incentiva-se o aparecimento dos cognominados candidatos-surpresa – aqueles que exsurgem às vésperas do pleito, estimulando um arranjo que, decerto, antes de fortalecer, amesquinha a democracia.

g) O desenho institucional que potencializa e leva a sério o regime democrático requer que seja franqueado maior espaço de difusão de ideias, projetos políticos e opiniões sobre os mais diferentes temas, sobre as qualidades pessoais de pretensos candidatos e sobre os planos de governo futuro, visando a propiciar maior controlabilidade social por parte dos demais players do prélio eleitoral.

h) A exposição por largo período de tempo – sem pedido expresso de voto, o que é vedado por lei – permite que essas ideias sejam testadas no espaço público: se, por um lado, forem falsas ou absurdas, a oposição poderá contraditá-las e a população estará mais bem informada; se, por outro lado, forem boas soluções alvitradas, a oposição terá de aperfeiçoar suas propostas e projetos e o cidadão será, mais uma vez, beneficiado.

i) Destarte, a mensagem veiculada não acarretou prejuízo à paridade de armas, pois qualquer eventual competidor poderia, se assim quisesse, proceder da mesma forma, divulgando mensagens sobre seus posicionamentos, projetos e qualidades, em igualdade de condições, principalmente por tratar-se de propaganda de custo diminuto, inapta a ocasionar interferência indevida do poder econômico no pleito;

9. Recurso especial provido.

Na hipótese, portanto, a mensagem vinculada pelo recorrente, considerando a ausência de pedido explícito de voto, não configurou propaganda eleitoral antecipada.

Ante o exposto, VOTO por dar provimento ao recurso, julgando improcedente a representação.