RE - 2810 - Sessão: 01/09/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto (fls. 49-54) pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO – PMDB, em face da sentença (fls. 47-48) proferida pelo Juízo da 132ª Zona Eleitoral, que julgou improcedente representação por propaganda eleitoral antecipada no aplicativo WhatsApp, proposta contra o PARTIDO PROGRESSISTA – PP, RENATO GEMELLI, PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT e LUCIANO SANGALLI, relativamente ao próximo pleito em Seberi.

Requereu a condenação dos representados ao pagamento do valor máximo da multa prevista no art. 36, § 3º, da Lei n. 9.504/97 (fls. 49-54).

Apresentadas contrarrazões (fls. 57-62 e 63-65), nesta instância os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pela negativa de provimento ao recurso (fls. 67-70).

É o breve relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recorrente foi intimado da sentença em 17.8.2016, via nota de expediente publicada no DEJERS (fl. 48v.), e o recurso foi interposto em 18.8.2016, às 12h25min (fl. 49), dentro do prazo, portanto, de 24 horas previsto no art. 35 da Resolução TSE n. 23.462/15.

Preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Mérito

Cuida-se de apreciar se os representados PARTIDO PROGRESSISTA - PP, RENATO GEMELLI (prefeito e pré-candidato ao cargo de prefeito pelo PP), PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT e LUCIANO SANGALLI (pré-candidato ao cargo de vice-prefeito pelo PT) realizaram propaganda eleitoral antecipada, entre 15 e 19.7.2016, relativamente ao próximo pleito em Seberi (132ª Zona), por meio da veiculação do seguinte áudio em grupo de usuários do aplicativo WhatsApp:

No dia 02 de outubro, vote no 11, Renato e Sangalli. Alô Seberi vote no 11 o progresso tem que continuar, Renato Prefeito o vice o Sangalli, nosso município não pode parar.

Alô meu povão seberiense no dia 02 de outubro vote no 11, Renato e Sangalli.

[…]

No dia 02 de outubro [...]

Para tanto, a par da previsão de que a propaganda eleitoral, inclusive via internet, é permitida somente a partir de 16.8.2016 (arts. 1º e 21 da Resolução TSE n. 23.457/15), haveria de se perscrutar se houve violação ao art. 36-A da Lei n. 9.504/97, reproduzido no art. 2º daquela resolução:

Art. 2º Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via Internet:

I- a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na Internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;

II- a realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e a expensas dos partidos políticos, para tratar da organização dos processos eleitorais, da discussão de políticas públicas, dos planos de governo ou das alianças partidárias visando às eleições, podendo tais atividades ser divulgadas pelos instrumentos de comunicação intrapartidária;

III- a realização de prévias partidárias e a respectiva distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão da disputa e a realização de debates entre os pré-candidatos;

IV- a divulgação de atos de parlamentares e de debates legislativos, desde que não se faça pedido de votos;

V- a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;

VI- a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias.

§1º É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social.

§2º Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político, a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretendem desenvolver.

§3º O disposto no § 2º não se aplica aos profissionais de comunicação social no exercício da profissão.

Destaco, primeiramente, que o teor do material em foco traz pedido de voto, como faz ver uma simples leitura da mensagem impugnada.

Ao conclamar-se para que se vote em “Renato” e “Sangalli” nas eleições do dia 02 de outubro vindouro, no Município de Seberi, resulta claro tratar-se de pedido de voto em favor dos ora representados RENATO GEMELLI e LUCIANO SANGALLI.

Nesse sentido, consigno que não descarto a possibilidade de propaganda eleitoral irregular, tida por extemporânea, via aplicativo WhatsApp, no contexto próprio do regramento estatuído no art. 21 e seguintes da Resolução TSE n. 23.457/15.

Ocorre que o caso em exame apresenta peculiaridade capaz de modificar essa compreensão, na medida em que, em verdade, trata-se de veiculação de conteúdo eleitoral em “grupo de WhatsApp” – ou mais precisamente, in casu, em três grupos de WhatsApp identificados às fls. 11-13 como “Cruzeiro”, “Esquina 800” e “Moto Clube Animal”, os quais se distinguem por encerrar um determinado número de participantes, de forma “fechada”, inviabilizando, por si, a propagação de mensagens ao público externo. A própria petição inicial subjacente, no aspecto, foi inequívoca ao apontar que a reprodução do áudio ocorreu em “grupos” daquele aplicativo.

O Tribunal Superior Eleitoral, em situação análoga, envolvendo o uso da rede social Twitter, já assentou que não há se falar em propaganda eleitoral em ambiente que não leva ao conhecimento geral as manifestações nele divulgadas, sob pena de eventual vedação a essa prática afrontar liberdades de jaez constitucional:

RECURSO ESPECIAL. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. DIVULGAÇÃO DE DISCURSOS PROFERIDOS EM EVENTO PARTIDÁRIO POR MEIO DO TWITTER. TWITTER É CONVERSA ENTRE PESSOAS. RESTRIÇÃO ÀS LIBERDADES DE PENSAMENTO E EXPRESSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO DA PROPAGANDA EXTEMPORÂNEA.

1. O Twitter consiste em uma conversa entre pessoas e, geralmente, essa comunicação está restrita aos seus vínculos de amizade e a pessoas autorizadas pelo usuário.

2. Impedir a divulgação de um pensamento ou opinião, mesmo que de conteúdo eleitoral, no período vedado pela legislação eleitoral, em uma rede social restrita como o Twitter, é impedir que alguém converse com outrem. Essa proibição implica violação às liberdades de pensamento e de expressão.

3. Não há falar em propaganda eleitoral realizada por meio do Twitter, uma vez que essa rede social não leva ao conhecimento geral as manifestações nela divulgadas.

4. A divulgação no Twitter de manifestação de cunho eleitoral no âmbito de evento partidário não tem o condão de caracterizar propaganda eleitoral extemporânea.

5. Recurso especial provido.

(TSE – 74-64.2012.620.0003 – REspe n. 7464 – Rel. Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI – DJE de 15.10.2013.)

Por percuciente, extraio desse julgado o seguinte excerto:

[…] Com base nos trechos colacionados no referido acórdão, é possível verificar que os pronunciamentos divulgados na internet, por meio do Twitter, possuem conteúdo eleitoral. No entanto, entendo que essa rede social não pode ser considerada um meio apto a caracterizar propaganda eleitoral antecipada.

Conforme já me pronunciei anteriormente, no julgamento do R-Rp 1825241DF, o Twitter "é aquilo que podemos chamar de cochicho: uma pessoa cochicha com outra. Seria necessário, então, impedir que antes do período permitido para propaganda eleitoral, as pessoas, numa conversa, perguntassem umas para as outras em quem votarão".

Ainda nessa ocasião, sobre manifestação de cunho eleitoral no Twitter, posicionei-me no sentido de que, "em primeiro lugar, entendo que de propaganda eleitoral não se trata e, em segundo lugar, vedar esse tipo de manifestação afronta a Constituição Federal, nos dispositivos que cuida da liberdade de expressão, de manifestação de pensamento. Entendo, ainda, que estamos diante da possibilidade de as pessoas se comunicarem no seu círculo familiar, de amizade e de grupo social emitindo opiniões. Como impedir isso?".

Com efeito, o Twitter consiste em uma conversa entre pessoas e, geralmente, essa comunicação está restrita aos seus vínculos de amizade e a pessoas autorizadas pelo usuário.

Dessa forma, impedir a divulgação de um pensamento ou opinião, mesmo que de conteúdo eleitoral no período vedado pela legislação eleitoral, em uma rede social restrita como o Twitter é impedir que alguém converse com outrem. Essa proibição implica violação às liberdades de pensamento e de expressão, que constituem direitos fundamentais dos indivíduos e, portanto, não admitem restrições pela Constituição Federal ou, no caso, pela Legislação Eleitoral.

Ademais, tendo em vista que milhões de pessoas conversam várias vezes ao dia por meios de comunicação de caráter mais reservado, como o Twitter, a Justiça Eleitoral não teria estrutura para intervir em todas essas comunicações, a fim de apurar a existência de propaganda eleitoral antecipada.

Portanto, não há falar em propaganda eleitoral realizada por meio do Twitter, uma vez que essa rede social não leva ao conhecimento geral as manifestações nela divulgadas, pois elas possuem caráter de conversa restrita aos seus usuários.

Nesse sentido, razão assiste ao recorrente, porquanto o presente caso se trata de manifestação de cunho eleitoral no âmbito de evento partidário, cuja divulgação no Twitter não tem o condão de caracterizar propaganda eleitoral extemporânea.

À míngua de jurisprudência deste Tribunal sobre a matéria em específico, entendo que tal precedente pode ser aplicado perfeitamente, de forma analógica, ao presente caso.

Indo além, as circunstâncias do caso vertente revelam ambiente virtual ainda mais hermético, haja vista que em grupo de WhatsApp não há a menor possibilidade de participação de alguém que não tenha sido, previamente, nele incluído, podendo, inclusive, deixá-lo a qualquer momento. Vale dizer, também, que outros usuários do aplicativo WhatsApp não podem acessar o conteúdo das conversas do grupo constituído.

Assim, em grupo de WhatsApp, sua conformação impede que se leve ao conhecimento geral as manifestações nele divulgadas, restringindo-se a conversa nele entabulada entre seus participantes.

É preciso fixar os limites desse direito, mesmo na rede mundial de computadores, não há dúvida. O denominado Marco Civil da internet, aliado aos deveres legais mínimos vigentes no ordenamento jurídico, prestam-se a esse desiderato. Para além disso, não se tem como punir.

Reforça essa convicção o fato de que inexiste nos autos elemento vinculativo entre a autoria da propaganda inquinada e os ora representados, ou mesmo a sua mera ciência acerca daquela, pressuposto objetivo para a aplicação do sancionamento almejado.

A título de prova, constam dos autos, exclusivamente, o “CD” e cópias do layout relativas ao áudio e às mensagens dos grupos de WhatsApp em menção (fls. 11-15).

O áudio do CD foi anteriormente reproduzido e as cópias da tela do aplicativo onde demonstradas as inserções do áudio, como visto, correspondem a mensagens trocadas entre os integrantes dos grupos “Cruzeiro”, “Esquina 800” e “Moto Clube Animal”, as quais ocorreram em meio a conversas descontraídas e informais. Em nenhuma das postagens do áudio, todavia, aparece como responsável pelas inserções o nome de quaisquer dos representados. Mais do que isso: em nenhuma das interfaces daqueles grupos de Whatsapp, colacionadas com a inicial, aparece o nome de qualquer dos representados como participante daquelas comunidades.

Da sentença trago, ainda, os seguintes fundamentos, agregando-os às razões de decidir (fls. 47-48):

[…] Também deve ser dito que os "jingles" foram repassados por um aplicativo utilizado em smartphones, sem que se tenha prova de que tenha dado início à divulgação do material. Além disso, no caso em questão, não há notícia nos autos de que o jingle tenha continuado a ser divulgado ou utilizado após a intimação dos envolvidos, concluindo-se não haver descumprimento da ordem liminar que tendia a impedir a propaganda partidária antecipada. [...]

Portanto, dentro de todo esse contexto, a negativa de provimento ao recurso, com a confirmação da sentença recorrida, é medida que se impõe.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - PMDB de Seberi.