RE - 4720 - Sessão: 25/08/2016 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso com pedido liminar interposto pelo MUNICÍPIO DE CANOAS em face de sentença proferida pelo Juízo da 66ª Zona Eleitoral (fls. 16-18), que indeferiu pedido de autorização para divulgação publicitária referente ao 15º Encontro das Almas Iluminadas.

Entendeu o juiz a quo, em síntese, que a publicidade institucional é vedada no período e que a pretensão deduzida não está abrangida na hipótese excepcional de permissão legal carreada no conceito de grave e urgente necessidade pública, veiculado pelo art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97 e pelo art. 62, inc. VI, al. “b”, da Resolução TSE n. 23.457/15.

Em suas razões (fls. 22-36), a recorrente argumenta que o evento faz parte do calendário do município e que, conforme a jurisprudência, seriam razões suficientes para a autorização: a utilidade pública do evento, a impossibilidade de comprometimento da isonomia entre os futuros candidatos, bem como a ausência de promoção pessoal de agentes públicos de eventuais candidatos ou da Administração Municipal no material confeccionado. Indica haver um “hiato” trazido pela Lei n. 13.165/15, pois entre 02.7.2016 e 20.07.2016 não haveria candidatos oficiais ao paço municipal. Aduz, ainda, que o evento pretende preservar o direito das minorias, promovendo “iniciativas que debatam – e combatam – a intolerância religiosa” como ação integrante de política pública municipal. Requer o provimento do recurso.

O pedido liminar foi indeferido, conforme decisão das fls. 49-50.

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 55-58).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e merece ser conhecido.

Inicialmente, cumpre referir que o 15º Encontro das Almas Iluminadas se realizará no vindouro dia 26.8.2016, cabendo ainda, portanto, manifestação útil desta Corte.

Assim, passo ao exame do mérito.

Depreende-se do art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei das Eleições que a realização da publicidade institucional nos três meses que antecedem o pleito tem seu limite estabelecido pelo pressuposto do atendimento à grave e urgente necessidade pública, assim reconhecido pela Justiça Eleitoral, sob pena de malferimento da isonomia da disputa eleitoral.

Por ocasião da decisão monocrática, relativa ao pedido de concessão de medida liminar, manifestei-me pela negativa de concessão.

E permaneço com tal convicção.

Os fundamentos são essencialmente os mesmos, de forma que, a rigor, submeto ao Tribunal a manifestação anteriormente havida, muito semelhante à que segue.

Entendo irretocável a fundamentação exposta pela d. Magistrada da 66ª ZE para negar o pedido na origem, pois indicou que o evento tem “cunho estritamente municipal”, a ser “realizado em local desvinculado do tema”, e que teria por destinatárias “pessoas ligadas aos cultos de matriz africana, cerca de 15% da população canoense”.

De qualquer forma, vou além.

Isso porque, ao contrário dos casos anteriores, em eventos realizados na própria cidade de Canoas (Feira do Livro e Passagem da Tocha Olímpica), o presente caso não guarda relação com situação que dê guarida a fomento de política pública, mormente no período eleitoral.

Note-se que, sob a ótica constitucional, a educação é direito de todos e dever do Estado, sendo promovida e incentivada com a colaboração da sociedade (art. 205, CF); bem como é dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um (art. 217, CF).

 Ou seja, os eventos permitidos anteriormente guardavam relação direta com os mandamentos constitucionais que determinavam posturas ativas do Estado, via implementação de políticas públicas, de modo que as decisões liminares concedidas por este Tribunal relativizaram a dicção legal – “grave e urgente necessidade pública”, em prol dos benefícios que a comunidade canoense, como um todo, poderia auferir. Dito de outra forma, procedeu-se à interpretação conforme a Constituição do comando presente no art. 73, VI, “b”, da Lei n. 9.504/97 e da Resolução TSE n. 23.457/15, por tratar-se, naquelas oportunidades, de efetivação de direitos fundamentais de segunda geração/dimensão: a educação e o esporte (seja este sob a ótica da saúde, seja pelo prisma do lazer).

Direitos que provocam o atuar do poder público, portanto.

A religião, contudo – melhor dito, a liberdade religiosa, tem dois vieses constitucionais. O primeiro vem inserto no art. 19 da CF e tem enfoque exatamente na omissão governamental, determinando a laicidade, enquanto o segundo visa a proteger o exercício do direito fundamental do indivíduo. Este, estampado no art. 5º, VI, da CF opera inclusive para que o cidadão exercite a liberdade religiosa de não possuir religião.

Dessa forma, entendo descaber ao poder público fomentar, apoiar ou incentivar evento deste ou daquele credo, não importando o percentual que ele atinja na comunidade ou quão elevados sejam os valores por ele veiculados, principalmente nos três meses que antecedem o pleito.

Repito, a fundamentação ora exposta é de todo similar à proferida monocraticamente, por entender absolutamente suficiente ao caso posto, sobremodo se considerada, ainda, a manifestação do d. Procurador Regional Eleitoral no sentido de que “a grave necessidade pública não está configurada, no caso em exame, uma vez que a situação de promoção da cultura de matriz africana, cunho religioso – não diz respeito à situação que exija urgente fomento estatal, ainda mais no período crítico vedado pelo art. 73, VI, b, da Lei das Eleições, isto é, nos três meses antecedentes ao pleito”.

 

Ante o exposto, VOTO por negar provimento ao recurso.