RC - 3550 - Sessão: 06/04/2017 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso criminal interposto por MARENILDA SILVA DE BORTOLI, DILSON RUI PILA DA SILVA e MIRO JOAQUIM DOS SANTOS contra sentença do Juízo da 74ª Zona Eleitoral (Alvorada) que os condenou como incursos nas sanções do art. 347 do Código Eleitoral (CE) (fls. 423-431v.).

A denúncia foi oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL (MPE), em 11.6.2014, contra os ora recorrentes, e José Pedro Vilant, João Batista Lannes Vieira, Celmir Martello e Priscila Pereira Duarte – os quais foram absolvidos – , e contra José Arno Apollo do Amaral, em relação ao qual houve cisão do feito por ocasião de audiência instrutória (fls. 371-373).

A ação penal está amparada nos seguintes fatos descritos na denúncia (fls. 02-04):

1º Fato:

No dia 15 de agosto de 2012, por volta das 14h25min, na Rua Nilzo Ramires (próximo à praça João Goulart), em Alvorada, os denunciados MIRO JOAQUIM DOS SANTOS e MARENILDA SILVA DE BORTOLI recusaram o cumprimento de ordem da Justiça Eleitoral, decisão proferida nos autos da Representação nº 60.34.2012.6.21.0074, segundo a qual nova incursão na propaganda eleitoral irregular configuraria o delito de desobediência, ao deixarem de adotar providências para proibir que a irregularidade se repetisse.

Em 09 de agosto de 2012 o MM. Juiz Eleitoral proferiu decisão determinando “a intimação de todos os partidos da COLIGAÇÃO 'ALVORADA POR UM NOVO TEMPO', na pessoa dos presidentes dos respectivos diretórios municipais, com a advertência de que, em caso de nova incursão na propaganda irregular, será determinada lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência em desfavor de todos os intimados, sem prejuízo de providências outras previstas na legislação vigente, a fim de fazer cessar a infração” (fl. 09 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074).

Os denunciados, na condição de presidentes dos diretórios municipais do PRB e PTB (Coligação Avança Alvorada), em que pese devidamente intimados da referida decisão no dia 10/08/2012 (fls. 11 e 18 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074), recusaram o cumprimento da ordem da Justiça Eleitoral, ao permitirem o tráfego de veículo com propaganda da então candidata que fazia parte de sua coligação Nadir Terezinha da Rosa Machado (PTB), propagando, por meio de alto-falante, em veículo de som mensagens em prol da referida candidata, no dia 15/08/2012.

 

2º Fato:

No dia 16 de agosto de 2012, por volta das 18h15min, na Av. Presidente Getúlio Vargas, próximo à Igreja Universal do Reino de Deus, em Alvorada, os denunciados MIRO JOAQUIM DOS SANTOS e MARENILDA SILVA DE BORTOLI recusaram o cumprimento de ordem da Justiça Eleitoral, proferida nos autos da Representação nº 60.34.2012.6.21.0074, segundo a qual nova incursão na propaganda eleitoral irregular configuraria o delito de desobediência, ao deixarem de adotar providências para proibir que a irregularidade se repetisse.

Em 09 de agosto de 2012 o MM. Juiz Eleitoral proferiu decisão determinando “a intimação de todos os partidos da COLIGAÇÃO 'ALVORADA POR UM NOVO TEMPO', na pessoa dos presidentes dos respectivos diretórios municipais, com a advertência de que, em caso de nova incursão na propaganda irregular, será determinada lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência em desfavor de todos os intimados, sem prejuízo de providências outras previstas na legislação vigente, a fim de fazer cessar a infração” (fl. 09 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074).

Os denunciados, na condição de presidentes dos diretórios municipais do PRB e PTB (Coligação Avança Alvorada), em que pese devidamente intimados da referida decisão no dia 10/08/2012 (fls. 11 e 18 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074), recusaram o cumprimento da ordem da Justiça Eleitoral, ao permitirem o tráfego de veículo com aparelhagem de som instalada, com identificação do então candidato da sua coligação Ildelfonso Milcharek (PTB), que fazia soar mensagens em favor do aludido candidato no dia 16/08/2012.

 

3º Fato:

No dia 03 de setembro de 2012, por volta das 13h50min, na Av. Presidente Getúlio Vargas, na esquina da Praça João Goulart, em Alvorada, os denunciados DILSON RUI PILA DA SILVA e JOSÉ PEDRO VILANT recusaram o cumprimento de ordem da Justiça Eleitoral, proferida nos autos da Representação nº 60.34.2012.6.21.0074, segundo a qual nova incursão na propaganda eleitoral irregular configuraria o delito de desobediência, ao deixarem de adotar providências para proibir que a irregularidade se repetisse.

Em 09 de agosto de 2012 o MM. Juiz Eleitoral proferiu decisão determinando “a intimação de todos os partidos da COLIGAÇÃO 'ALVORADA POR UM NOVO TEMPO', na pessoa dos presidentes dos respectivos diretórios municipais, com a advertência de que, em caso de nova incursão na propaganda irregular, será determinada lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência em desfavor de todos os intimados, sem prejuízo de providências outras previstas na legislação vigente, a fim de fazer cessar a infração” (fl. 09 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074).

Os denunciados, na condição de presidentes dos diretórios municipais do PDT e PSL (Coligação União por Alvorada), em que pese devidamente intimados da referida decisão no dia 10/08/2012 (fls. 13 e 16 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074), recusaram o cumprimento da ordem da Justiça Eleitoral, ao permitirem o tráfego de veículo com propaganda do então candidato da sua coligação Tiano Ribeiro de Almeida (PDT), propagando, por meio de alto-falante, mensagens a favor do referido candidato, em 03/09/2012.

 

4º Fato:

No dia 04 de setembro de 2012, por volta das 13h30min, na Rua Nilzo Ramires (próximo à Praça João Goulart), em Alvorada, os denunciados JOSÉ ARNO APPOLO DO AMARAL, JOÃO BATISTA LANNES VIEIRA, CELMIR MARTELLO e PRISCILA PERERIRA DUARTE recusaram o cumprimento de ordem da Justiça Eleitoral, proferida nos autos da Representação nº 60.34.2012.6.21.0074, segundo a qual nova incursão na propaganda eleitoral irregular configuraria o delito de desobediência, ao deixarem de adotar providências para proibir que a irregularidade se repetisse.

Em 09 de agosto de 2012 o MM. Juiz Eleitoral proferiu decisão determinando “a intimação de todos os partidos da COLIGAÇÃO 'ALVORADA POR UM NOVO TEMPO', na pessoa dos presidentes dos respectivos diretórios municipais, com a advertência de que, em caso de nova incursão na propaganda irregular, será determinada lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência em desfavor de todos os intimados, sem prejuízo de providências outras previstas na legislação vigente, a fim de fazer cessar a infração” (fl. 09 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074).

Os denunciados, na condição de presidentes dos diretórios municipais do PMDB, PR, DEM e PCdoB (Coligação Força Popular e Democrática), em que pese devidamente intimados da referida decisão no dia 10/08/2012 (fls. 15, 17, 19 do expediente eleitoral n.º 28.58.2014.6.21.0074) e 14/08/2012 (fl. 25 do expediente eleitoral n.º 28.58.2014.6.21.0074), recusaram o cumprimento da ordem expedida pela Justiça Eleitoral, ao permitirem o tráfego de veículo com propaganda da então candidata da sua coligação Maria Teresinha da Silva (PMDB), propagando, por meio de alto falante, mensagens a favor da candidata, em 04/09/2012.

 

Assim agindo, os denunciados MIRO JOAQUIM DOS SANTOS e MARENILDA DA SILVA DE BERTOLI incorreram duas vezes nas sanções do artigo 347 do Código Eleitoral, na forma dos artigos 29, caput, e 69, caput, do Código Penal, e os denunciados JOSÉ ARNO APPOLO DO AMARAL, JOÃO BATISTA LANNES VIEIRA, CELMIR MARTELLO, PRISCILA PEREIRA DUARTE, DILSON RUI PILA DA SILVA e JOSÉ PEDRO VILANT incorreram nas sanções do artigo 347 do Código Eleitoral, na forma do artigo 29, caput, do Código Penal, motivo pelo qual o Ministério Público Eleitoral promove a presente ação penal [...]

O MPE exarou promoção consignando que deixava de propor o benefício da suspensão condicional do processo a Miro e Marenilda, porque a cumulação das penas mínimas cominadas para o delito ultrapassa um ano (requisito objetivo), e a Dilson Rui, por não preencher os requisitos subjetivos do art. 77, inc. II, do Código Penal (fl. 228 e verso).

Anexados documentos, inclusive os integrantes dos respectivos Termos Circunstanciados de Ocorrência, objetos dos processos na classe notícia-crime (NC) correlatos e que originaram representações eleitorais específicas (Apensos 1, 2, 3, 4, 5 e 6).

Recebida a denúncia em 11.6.2014 (fl. 183).

Notificados, Miro, Marenilda e Dilson Rui apresentaram defesa (fls. 240-245, 255-264 e 272-277).

Em audiência realizada em 22.01.2016, foram ouvidas uma testemunha arrolada pela acusação e sete pela defesa, e interrogados, ao final, Miro, Merenilda e Dilson Rui, os quais estavam acompanhados por defensor (termo de audiência de fl. 371-373 e áudio de fl. 381).

Apresentadas alegações finais pelas partes (fls. 391-393, 401-404 e 405-413), com exceção do réu Miro (fl. 421), em sentença, o magistrado julgou parcialmente procedente a denúncia, para:

1) absolver os réus José Pedro Vilant, João Batista Lannes Vieira, Celmir Martello e Priscila Pereira Duarte;

2) condenar os réus Miro e Marenilda pela prática dos delitos descritos nos fatos ns. 01 e 02, julgando-os como incursos nas sanções do art. 347 do CE, combinado com os arts. 29, caput, e 69, caput, ambos do Código Penal (CP), fixando-lhes (a) pena privativa de liberdade em seis meses de detenção, substituídas por uma prestação pecuniária, para cada um, no valor de quatro salários-mínimos, cumulada com (b) multa penitenciária de vinte dias-multa, com o valor unitário do dia-multa fixado em um trinta avos do salário-mínimo mensal, vigente ao tempo do fato (fls. 430-1); e

3) condenar o réu Dilson Rui pela prática do delito descrito no fato n. 03, julgando-o como incurso nas sanções do art. 347 do CE, combinado com o art. 29, caput, do CP, fixando-lhe (a) pena privativa de liberdade em seis meses de detenção, substituída por prestação pecuniária no valor de dois salários-mínimos, cumulada com (b) multa penitenciária de vinte dias-multa, com o valor unitário do dia-multa fixado em um trinta avos do salário-mínimo mensal, vigente ao tempo do fato (fls. 423-431v.).

Inconformados, os condenados interpuseram recurso.

Miro, em preliminar, qualificou a sentença como extra petita. No mérito, aduziu (a) ocorrência de prescrição; (b) que não participou diretamente do fato; (c) que seu partido apenas fez parte da Coligação Avança Alvorada pela qual concorreu Nadir Terezinha da Rosa, candidata filiada à agremiação diversa, o PTB, e única praticante dos fatos que resultaram na condenação do recorrente (fls. 442-448).

Dilson Rui, em preliminar, aduziu ilegitimidade passiva para a causa e a inépcia da inicial, pelo que postulou o indeferimento de plano da denúncia. No mérito, aduziu (a) a ocorrência de prescrição; (b) que não teve participação direta no fato imputado, o qual teria sido praticado por outrem; (c) que o conjunto probatório é insuficiente; (d) que não houve dolo na prática do fato a ele imputado (fl. 449-463).

Marenilda, preliminarmente, arguiu ilegitimidade passiva para a causa. No mérito, aduziu (a) que foi incluída na lide apenas porque, à época, ocupava o cargo de presidente de partido; (b) que o fato de exercer cargo de alta importância dentro de uma agremiação partidária não lhe concede poderes para controlar seus filiados (fls. 464-476).

Apresentadas contrarrazões, pelas quais o MPE pugnou, em preliminar, pela nulidade da sentença no que concerne à dosimetria da pena. No mérito, postulou o improvimento dos recursos (fls. 498-500v.).

Nesta instância os autos foram com vista ao Procurador Regional Eleitoral, o qual opinou (fls. 506-519v.): 1) pelo provimento do recurso interposto por Miro; 2) pelo desprovimento do apelo interposto por Marenilda e Dilson Rui; 3) pela redução, de ofício, para dez dias-multa, das penas aplicadas a Marenilda e Dilson Rui; 4) pelo somatório das penas imputadas a Marenilda, diante da condenação cumulada pela prática dos fatos ns. 1, 2; e 5) pela execução provisória da pena.

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

Da sentença, Miro Joaquim dos Santos e Marenilda Silva de Bortoli foram intimados em 26.4.2016 (fls. 436 e 438), e Dilson Rui Pila da Silva, em 27.4.2016 (fl. 439). Os seus patronos, a seu turno, foram intimados mediante a publicação de nota de expediente no DEJERS, em 14.4.2016 (fls. 433-435v.).

O recurso de Miro foi interposto em 18.4.2016 (fl. 442-448); o de Marenilda, em 25.4.2016 (fls. 464-489); e o de Dilson Rui, em 20.4.2016 (fls. 449-463), todos dentro do prazo de dez dias do art. 362 do CE.

Os recursos, portanto, são tempestivos. Presentes os demais requisitos de admissibilidade, deles conheço.

Preliminares

1. Nulidade da sentença por ser extra petita

O recorrente Miro aduziu que a sentença é extra petita, por entender que “sem pedido do MPE, que não pediu a condenação pelo art. 330 CP e fora da regulamentação legal, pois se admitir que um mesmo fato seja enquadrado em duas legislações diversas, ambas com tipificação e sanção próprias, parece, ao recorrente, uma novidade nunca antes vista”.

Entretanto, a alegação não prospera.

Primeiramente, mister ressaltar que a denúncia postulou a condenação dos recorrentes como incursos, tão só, nas sanções do art. 347 do CE.

Nesse passo, agrego às razões de decidir o parecer do procurador regional eleitoral, que bem contextualizou a questão (fls. 510-511):

Não prospera a alegação da defesa no sentido de que a sentença seria extra petita, haja vista a ausência de pedido de condenação criminal nas alegações finais pelo Ministério Público Eleitoral, que postulou a aplicação da sanção pecuniária prevista no art. 37, §1º, da Lei nº 9.504/97 (fls. 391-393).

Houve claro equívoco da agente ministerial firmatária das alegações finais que, após concluir pela existência de prova da materialidade e autoria dos crimes narrados na denúncia, pediu a condenação dos réus “como incursos nas penas no art. 39, §3º, da Lei nº 9.504/97”. Ora, como visto acima, não há sanção prevista para o descumprimento da regra inserta no mencionado dispositivo, razão pela qual possível a responsabilização pelo crime de desobediência. E, havendo pedido de condenação, não se pode cogitar em sentença extra petita, uma vez que a delimitação da acusação é feita pela narração dos fatos na denúncia.

De qualquer modo, vale lembrar que o artigo 385 do Código de Processo Penal permite ao juiz, na ação penal pública, proferir sentença condenatória ainda que o Parquet tenha opinado pela absolvição, e o Superior Tribunal de Justiça, em julgados recentes, tem reafirmado essa possibilidade:

'RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. PEDIDO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ACOLHIDO. APELAÇÃO MINISTERIAL COM PEDIDO CONDENATÓRIO. POSSIBILIDADE. INTERESSE DE RECORRER. CONFLITO PERMANENTE DE INTERESSES NO PROCESSO PENAL. DOSIMETRIA DA PENA.

CONFISSÃO. IRRELEVÂNCIA. INAPLICABILIDADE DA ATENUANTE. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.

1. O Ministério Público, instituição a que o constituinte de 1988 incumbiu, privativamente, de promover a ação penal pública (art. 129, I, da C.R.), possui o dever de deduzir, presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, a pretensão punitiva estatal, compromissado com a descoberta da verdade e a realização da justiça.

2. Ao contrário de outros sistemas, em que o Ministério Público dispõe, por critérios de discricionariedade, da ação, no processo penal brasileiro o Promotor de Justiça não pode abrir mão do dever de conduzir a actio penalis até seu desfecho, quer para a realização da pretensão punitiva, quer para, se for o caso, postular a absolvição do acusado, hipótese, aliás, que não obriga o juiz natural da causa, consoante disposto no art. 385 do Código de Processo Penal, a atender ao pleito ministerial.

3. Isso porque, em um modelo processual clássico, tal qual o que adotou nosso código, influenciado - bem ou mal - por seu congênere italiano, sempre haverá duas situações, como observa Giovani Leoni: uma imanente, de conflito entre o direito punitivo do Estado e o direito de liberdade do indivíduo; e outra, contingente, de relação entre o Ministério Público e o acusado, que pode reproduzir a primeira situação ou divorciar-se integralmente dela.

4. Daí por que o Ministério Público não carecerá de interesse de agir - e de recorrer - ao postular, mediante razões jurídicas, a reforma ou a anulação de sentença absolutória, ainda que, como ocorreu neste caso, tenha anteriormente requerido a absolvição do réu.

5. Demais disso, o interesse de recorrer, que decorre da sucumbência, não se há de limitar apenas ao prejuízo ou gravame sofrido pela parte com a edição do ato impugnado, mas ao benefício ou vantagem, material ou processual, que a futura decisão a ser proferida, por força do recurso, venha a aportar para a parte interessada.

6. A atenuante da confissão espontânea somente será aplicada quando essa for determinante para a condenação do réu.

Precedentes.

7. Recurso especial não provido.

(REsp 1340709/RJ, Relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 08.4.2014, DJe 18.11.2014.)' (Grifos no original.)

[...]

Logo, afasto a preliminar.

2. Inépcia da denúncia

O recorrente Dilson Rui aduziu que a denúncia deve ser indeferida de plano, por ausência de individualização de fato concreto ilícito, tocante à sua pessoa.

Porém, razão não lhe assiste.

Compulsando os autos, é de simples visualização que o fato n. 3º (fl. 03v.), no qual implicado o réu, foi descrito de forma suficiente a propiciar-lhe a defesa:

3º Fato:

No dia 03 de setembro de 2012, por volta das 13h50min, na Av. Presidente Getúlio Vargas, na esquina da Praça João Goulart, em Alvorada, os denunciados DILSON RUI PILA DA SILVA e JOSÉ PEDRO VILANT recusaram o cumprimento de ordem da Justiça Eleitoral, proferida nos autos da Representação nº 60.34.2012.6.21.0074, segundo a qual nova incursão na propaganda eleitoral irregular configuraria o delito de desobediência, ao deixarem de adotar providências para proibir que a irregularidade se repetisse.

Em 09 de agosto de 2012 o MM. Juiz Eleitoral proferiu decisão determinando “a intimação de todos os partidos da COLIGAÇÃO 'ALVORADA POR UM NOVO TEMPO', na pessoa dos presidentes dos respectivos diretórios municipais, com a advertência de que, em caso de nova incursão na propaganda irregular, será determinada lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência em desfavor de todos os intimados, sem prejuízo de providências outras previstas na legislação vigente, a fim de fazer cessar a infração” (fl. 09 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074).

Os denunciados, na condição de presidentes dos diretórios municipais do PDT e PSL (Coligação União por Alvorada), em que pese devidamente intimados da referida decisão no dia 10/08/2012 (fls. 13 e 16 do expediente eleitoral nº 28.58.2014.6.21.0074), recusaram o cumprimento da ordem da Justiça Eleitoral, ao permitirem o tráfego de veículo com propaganda do então candidato da sua coligação Tiano Ribeiro de Almeida (PDT), propagando, por meio de alto-falante, mensagens a favor do referido candidato, em 03/09/2012.

O fato tido como criminoso, como se infere, foi perfeitamente descrito como sendo o ato de permitir o tráfego de veículo com propaganda irregular, por meio de alto-falante, do candidato Tiano Ribeiro de Almeida, no dia 03.9.2012, por volta das 13h50, na av. Presidente Getúlio Vargas, na esquina da Praça João Goulart em Alvorada.

Ademais, a defesa técnica foi devidamente apresentada, tendo abordado, para além desta preliminar, diversas outras questões, tais como as condizentes com a autoria e materialidade delitivas, o que demonstra a ausência de cerceamento de defesa ou prejuízo.

Dessa forma, afasto a preliminar.

3. Ilegitimidade passiva ad causam dos réus Dilson Rui e Marenilda

Os recorrentes Dilson Rui e Marenilda aduziram preliminar de ilegitimidade passiva para a causa, por ausência de prova da sua participação nos fatos a eles imputados.

Contudo, a matéria confunde-se com o mérito e com ele será apreciada.

4. Nulidade da sentença por deficiência na dosimetria da pena

Em contrarrazões, o Ministério Público Eleitoral (MPE) arguiu a nulidade da sentença, porque (a) a pena-base aplicada aos recorrentes distanciou-se do mínimo legal sem individualização das circunstâncias pessoais de cada qual, tendo sido consideradas as elementares do tipo penal para o seu aumento; e porque (b) não foi realizada a soma das penas atinentes ao concurso material relativo a Miro e Marenilda.

Acerca do concurso material relativo a Miro e Marenilda, ainda que se possa cogitar de matéria reconhecível de ofício, inviável o seu acolhimento ao efeito de, em última análise, majorar a pena estabelecida aos réus. Não tendo sido interposto recurso pelo MPE, entendimento em contrário significaria violação ao princípio da non reformatio in pejus, prática vedada pela jurisprudência.

Quanto à dosimetria da pena levada a efeito na sentença, adoto novamente os fundamentos do parecer do procurador regional eleitoral (fls. 512-513):

Por fim, não prospera a preliminar de nulidade da sentença no que pertine à dosimetria da pena, sob fundamento da ausência de individualização. Ainda que de modo sucinto, foram analisadas as circunstancias judiciais e legais em relação a cada um dos réus.

Quanto à dosimetria da pena, assiste razão ao órgão ministerial de primeiro grau no tocante à impossibilidade de aplicação da pena-base em patamar equivalente ao termo médio, justificando-se o aumento com base nas circunstâncias elementares do crime.

José Antonio Paganella Boschi, no artigo intitulado “A dosimetria das penas privativas de liberdade”2, ao tratar da fixação da pena-base, pondera:

Como não há regras explícitas sobre os procedimentos a utilizar depois de realizada a valoração das circunstâncias judiciais, a doutrina e a jurisprudência recomendam a utilização das seguintes diretivas gerais: a) quando todas elas forem valoradas positivamente, a pena-base será estabelecida no mínimo legalmente cominado, por ser essa a tendência dos países em todo o mundo; b) quando algumas delas (duas ou três) receberem cargas negativas de valor, ela deverá ser fixada um pouco acima do mínimo legal; e, por último, c) quando o conjunto das circunstâncias judiciais for considerado desvalioso, a pena-base será estabelecida em quantidade próxima à do termo médio (obtido com soma do mínimo com o máximo abstratamente cominados e a divisão por dois desse resultado aritmético).

Considerando ser essa técnica amplamente aplicada pela jurisprudência, bem como ser assente a ideia de que as elementares do tipo penal não podem servir para exasperar a sanção, sob pena de bis in idem, deve a pena-base ser fixada no mínimo legal de três meses. E, na ausência de circunstâncias agravantes e atenuantes e de causas de aumento e de diminuição da pena, deve ser essa a pena definitivamente fixada.

De consequência, o número de dias-multa, para guardar proporcionalidade com o quantum da pena privativa de liberdade, deve ser reduzido para 10 dias-multa.

Nada obstante, tenho por prejudicada a consequência que eventual reconhecimento de nulidade poderia gerar, na medida em que atrelada à conclusão acerca do mérito da ação, em relação ao qual, como adiante se verá, estou propondo a absolvição dos recorrentes.

Mérito

1. Prescrição

Inicialmente, enfrento a alegação dos recorrentes Miro e Dilson Rui de ocorrência de prescrição do crime pelo qual foram incursos (art. 347 do CE).

À luz do art. 109 do Código Penal (CP), apura-se o prazo prescricional a partir da sua pena em abstrato, nos seguintes termos:

Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1odo art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:

I - em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;

II - em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;

III - em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;

IV - em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;

V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;

VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

O crime de desobediência no âmbito eleitoral, por sua vez, tem como pena abstrata a detenção, de três meses a um ano, além de multa, consoante prescrito no art. 347 do CE. Assim, o máximo da pena é igual a um ano, e, por conseguinte, é aplicável à espécie o prazo prescricional, anterior à sentença, de quatro anos, nos termos do inc. V acima transcrito.

O início da fluência do prazo prescricional para a pretensão punitiva do Estado, antes de transitar em julgado a sentença final, pauta-se pelo teor do art. 111 do CP, inc. I:

Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:

I - do dia em que o crime se consumou;

[...]

Constata-se, da peça de denúncia, que o crime apontado no primeiro fato teria sido praticado na data de 15.8.2012, o do segundo fato teria sido praticado em 16.8.2012 e o do terceiro fato, em 03.9.2012 (fls. 02v.-03v.). Já o recebimento da denúncia - ato que interrompe a fluência do prazo prescricional - ocorreu em 11.6.2014 (fl. 183), tornando essa a nova data inaugural de tal prazo. A sentença, por sua vez, foi publicada em 14.4.2016 (fl. 433), tendo sido os réus dela pessoalmente intimados (fls. 436-439) em 26.4.2016 (Miro e Marenilda) e 27.4.2016 (Dilson Rui). Dentro, portanto, do quadriênio legal.

Uma vez prolatada a sentença, insta a apreciação tomando-se por base a pena aplicada em concreto, consoante o disposto no art. 110, caput, do CP:

Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente.

[...]

Extrai-se que a pena aplicada a todos os recorrentes foi fixada em seis meses de detenção (fl. 430v.). Dessa forma, recai sobre o caso concreto o prazo prescricional de três anos, previsto no inc. VI, do art. 109 do CP, o qual, ante a ausência de notícia de reincidência apta a ensejar o aumento previsto no art. 110, caput, do CP, deve ser mantido nesse patamar.

O marco deflagador de tal contagem é o estabelecido no art. 112, inc. I, do CP:

Art. 112 - No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr:

I - do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional;

[...]

Da sentença, o MPE foi intimado, com carga dos autos, em 16.5.2016, segunda-feira, (fl. 441), fluindo o prazo recursal de cinco dias a partir de 17.5.2016. Ante a ausência de interposição de recurso pelo Parquet no quinquídio de lei, e não se tratando de sentença que revogou suspensão condicional da pena ou de livramento condicional, o marco inaugural para a contagem da prescrição nessa fase recaiu sobre a data de 23.5.2016, segunda-feira, restando em aberto até a presente data.

Logo, pelo exposto, não há ocorrência de prescrição, em quaisquer das suas modalidades, dos fatos com a capitulação delitiva descrita na inicial.

2. Questão de fundo

Cuida-se de averiguar se a veiculação da propaganda dos candidatos Nadir Terezinha da Rosa Machado (PTB), Ildenfolso Milcharek (PTB) e Tiano Ribeiro de Almeida (PDT) - relativamente ao pleito de 2012 em Alvorada, descrita nos fatos elencados sob os ns. 1, 2 e 3, e imputada como crime de desobediência aos então presidentes das agremiações partidárias municipais Miro Joaquim dos Santos (PRB), Marenilda Silva de Bortoli (PTB) e Dilson Rui Pila da Silva (PDT), integrantes da Coligação Alvorada de Um Novo Tempo - amolda-se ao delito previsto no art. 347 do CE.

Para bem contextualizar a questão, ressalto que, relativamente ao mesmo substrato fático, este Tribunal confirmou condenação imposta à Coligação Alvorada de Um Novo Tempo (PRB/PDT/PTB/PMDB/PSL/PTN/PR/PPS/DEM/PRTB/PHS/PMN/PV/PSDB/PCdoB/PTdoB) e a seu candidato ao cargo de prefeito, EDSON DE ALMEIDA BORBA (filiado ao PTB), afastando, no entanto, a sanção pecuniária a eles imposta (decisão transitada em julgado em 22.9.2012):

Recurso. Propaganda eleitoral mediante alto falantes. Eleições 2012. Representação julgada procedente pelo juízo de primeiro grau. Condenação em face da realização de propaganda eleitoral utilizando-se de motocicleta com alto falantes, em distância inferior a 200 metros do foro.

Preliminar de suspeição do magistrado afastada ante o fato de que o juiz possui o exercício cumulativo do poder de polícia e da jurisdição eleitoral, as quais não se confundem.

No mérito, mantém-se a condenação, estando comprovadas a autoria e a materialidade da conduta irregular, devendo ser afastada a sanção pecuniária por falta de previsão legal.

Parcial provimento.

(TRE/RS – RE 60-34.2012.6.21.0074 – Relatora Desª ELAINE HARZHEIM MACEDO – J. Sessão de 19.9.2012.)

Posto isso, prossigo.

2.1 Tipicidade

Primeiro, importa averiguar a tipicidade das condutas em questão, a partir do exame do processo autuado na 74ª ZE - Alvorada - na Classe PET, sob o n. 60-34.2012 (e que redundou na Representação Eleitoral acima retratada), na qual se deu a determinação judicial que fundamenta a acusação de desobediência.

Consoante jurisprudência firmada no STJ, largamente aplicada, o crime de desobediência exige, para sua configuração, que não exista a previsão de sanção de natureza civil, processual ou administrativa, restando a criminalização do descumprimento como derradeira alternativa à administração da justiça, exceto nas hipóteses em que a lei expressamente facultar a cumulação:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS. LEI MARIA DA PENHA. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. ATIPICIDADE.

1. O crime de desobediência é um delito subsidiário, que se caracteriza nos casos em que o descumprimento da ordem emitida pela autoridade não é objeto de sanção administrativa, civil ou processual.

[…]

3. Agravo regimental improvido.

(STJ – AgRg no REsp 1476500 – Relator Min. WALTER DE ALMEIDA GUILHERME – Publ.: 19.11.2014.)

 

ALEGADO CRIME DE DESOBEDIÊNCIA – ART. 347 DO CÓDIGO ELEITORAL - COMINAÇÃO DE MULTA PARA HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO DA DETERMINAÇÃO JUDICIAL - ATIPICIDADE DA CONDUTA - PRECEDENTES - CONFIRMAÇÃO DA LIMINAR - CONCESSÃO DA ORDEM.

"Consoante firme jurisprudência desta Corte, para a configuração do delito de desobediência de ordem judicial é indispensável que inexista a previsão de sanção de natureza civil, processual ou administrativa, salvo quando a norma admitir expressamente a referida cumulação".[STJ, HC 16.940, Rel. Min. Jorge Scartezzini]

(TRE/SC – HC 24871 – Relator Juiz NELSON MAIA PEIXOTO – Publ.: 18.10.2012.)

No referido julgado, como visto, apesar de o magistrado de origem ter cominado sanção de multa quando do exame da propaganda que ensejou a ordem de cessação posteriormente descumprida, em sede de recurso este Tribunal afastou a penalidade, por ausência de previsão legal.

Ausente previsão normativa de sanção para a propaganda irregular transmitida por veículo com aparelhagem de som, cabível, em tese, a penalização por crime de desobediência e justificada a análise da materialidade e a autoria do delito em apreço.

2.2 Materialidade e autoria

No que diz com a materialidade, o crime em pauta é o de desobediência, o qual se configuraria, na espécie, pelo descumprimento de ordem judicial, nos termos do art. 347 do CE:

Art. 347. Recusar alguém cumprimento ou obediência a diligências, ordens ou instruções da Justiça Eleitoral ou opor embaraços à sua execução:

Pena - detenção de três meses a um ano e pagamento de 10 a 20 dias-multa.

A prova pertinente à materialidade do delito se faz mediante a comprovação da prolação da ordem, com a respectiva notificação das partes, bem como a comprovação de que houve o descumprimento.

No presente caso, a decisão judicial alegadamente violada foi exarada nos autos do processo Classe PET n. 60-34.2012. Tal feito teve por objeto a veiculação de propaganda do candidato à eleição majoritária Edson de Almeida Borba.

Veja-se o teor da decisão (fl. 19v.):

[…] Ante o exposto, no exercício do poder de polícia a mim conferido pelo art. 76, pár. 2º, da Resolução nº 23.370/2011 – TSE, determino a intimação de todos os partidos da COLIGAÇÃO “ALVORADA POR UM NOVO TEMPO”, na pessoa dos presidentes dos respectivos diretórios municipais, com a advertência de que, em caso de nova incursão na propaganda irregular, será determinada a lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência em desfavor de todos os intimados, sem prejuízo de providências outras previstas na legislação vigente, a fim de fazer cessar a infração.

Quanto à comunicação da ordem judicial, no que diz com os ora recorrentes, resta evidenciado nos autos que Marenilda, presidente do PTB; Dilson Rui, presidente do PDT; e Miro, presidente do PRB, foram devidamente intimados na data de 10.8.2012 (fls. 21, 26 e 28, respectivamente).

É de ser destacado que os integrantes do polo passivo do processo classe PET eram o candidato acima referido, titular da propaganda irregular, e a Coligação Alvorada Por Um Novo Tempo, a qual não foi intimada mediante seu representante legal, e sim através dos diretórios municipais dos partidos políticos que a compuseram, consoante se verifica no excerto supratranscrito.

Nesse ponto, a questão da materialidade mescla-se à da autoria.

Examinei com atenção o caderno probatório.

A prova testemunhal não se revelou decisiva ao deslinde. Assisti ao vídeo da audiência na qual prestaram depoimentos as testemunhas arroladas, bem como interrogados os réus ora recorrentes (fls. 371-373; áudio à fl. 381).

A única testemunha de acusação arrolada, o chefe de cartório da 74ª Zona Eleitoral, Leandro Teixeira Abreu, não referiu nomes e afirmou que não lembrava com exatidão dos fatos em razão do tempo decorrido desde a ocorrência. Confirmou, ademais, os atos judiciais decisórios sucedidos no processo subjacente.

Já no condizente às testemunhas da defesa, disseram que nada sabiam sobre os fatos em si, objeto da denúncia, limitando-se a dizer que, no âmbito da Coligação Alvorada de Um Novo Tempo, à época do período eleitoral de 2012 em Alvorada, havia instruções claras de seus dirigentes acerca da obediência aos ditames da legislação eleitoral, como os referentes à veiculação de propaganda eleitoral em vias públicas.

Nessa linha, os depoimentos de Gerson Luiz Mendes Carneiro, Herta Coutinho Seroti, Rita de Cássia dos Santos, Jacinto Girelli Neto, candidatos a vereador por aquela coligação, bem como Otacílio Mendes Correa (atuava na Executiva do PTB), compromissados em juízo, e de Luciano Kortz Medeiros e Josemar de Oliveira Moreira, candidatos a vereador pela referida coligação e ouvidos como informantes.

À derradeira, ao serem interrogados, os ora recorrentes foram unânimes ao negar os fatos a eles atribuídos.

Efetivamente, é da prova documental encartada que se retira os elementos essenciais à resolução da questão posta em juízo.

Compare-se, pois, a PET n. 60-34.2012, na qual proferida a ordem, com a formação dos autos de notícia-crime em que processadas as alegadas desobediências:

i) Notícia-Crime n. 34-65.2014

Noticiados: Marenilda e Miro.

Autos formados a partir de decisão exarada no processo RP n. 65-56.2012, na qual o juízo de origem entendeu que a veiculação de propaganda dos representados ldefonso Milcharek e Coligação Avança Alvorada (PRB/PTB) configuraria o crime de desobediência por parte de Marenilda e Miro.

ii) Notícia-Crime n. 29-43.2014

Noticiados: Miro e Marenilda.

Autos formados a partir de decisão exarada no processo RP n. 63-86.2012, na qual o juízo de origem entendeu que a veiculação de propaganda dos representados Nadir Terezinha da Rosa Machado e Coligação Avança Alvorada (PRB/PTB) configuraria o crime de desobediência por parte de Marenilda e Miro.

iii) Notícia-Crime n. 32-95.2014 – Termo de Ocorrência Circunstanciado

Noticiados: Dilson Rui e José Pedro Vilant.

Autos formados a partir de decisão exarada no processo RP n. 71-63.2012, na qual o juízo de origem entendeu que a veiculação de propaganda dos representados Tiano Ribeiro de Almeida e Coligação União por Alvorada (PDT/PSL) configuraria o crime de desobediência por parte de Dilson Rui.

Note-se, então, que a ordem proferida no processo sob a classe PET destinava-se à propaganda do candidato à eleição majoritária Edson de Almeida Borba e da coligação Alvorada De Um Novo Tempo, ao passo que a desobediência teria sido praticada quanto a propagadas diversas, de candidatos distintos (Ildelfonso Milcharek, Nadir Terezinha da Rosa Machado e Tiano Ribeiro Almeida), concorrentes às eleições proporcionais, cujos representados eram tais candidatos à vereança e as coligações Avança Alvorada e União Por Alvorada.

Não desconheço que os partidos PTB, PDT e PRB, presididos pelos recorrentes Marenilda, Dilson Rui e Miro, respectivamente, integravam tanto a coligação majoritária como as coligações proporcionais apontadas, já que a Coligação Avança Alvorada era formada pelos partidos PRB e PTB, a coligação União Por Alvorada era formada pelos partidos PDT e PSL e a coligação Alvorada de Um Novo Tempo era formada pelos partidos PPS, PRB, PCdoB, PSL, PRTB, PTdoB, PMN, PV, DEM, PDT, PMDB, PTB, PHS, PSDB, PR e PTN.

Contudo, a faculdade de coligar-se de forma diversa para as eleições proporcionais e as eleições majoritárias não funde os partidos políticos às suas coligações, tampouco as funde entre si.

De fato, o que ocorre aqui é que o magistrado, a partir de decisão proferida na PET n. 60-34.2012 - dirigida à Coligação Alvorada De Um Novo Tempo com a advertência de lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência “em caso de nova incursão na propaganda irregular”, quanto à irregularidade da veiculação da propaganda de Edson de Almeida Borba - tomou por desobediência a veiculação de outras propagandas, atinentes a candidatos distintos, pertencentes a coligações diversas, porquanto padeciam de irregularidade similar, capituladas no mesmo artigo de lei.

A função protetiva do bem jurídico tutelado, atribuída ao poder de polícia sobre a propaganda irregular, resta expressamente restrita “às providências necessárias para inibir práticas ilegais”, nos termos do §2º do art. 41 da Lei das Eleições. Quantificar essas medidas, apurando sua exatidão, ou seu eventual excesso, bem como apurar a sua suficiência para o fim de afastamento da imputação criminal em tela, adentra seara por demais movediça.

Todavia, desse pantanoso terreno não me posso afastar, pois nele se encontra o cerne do problema, o qual, no caso, reside no fato de que, do momento em que realizada a comunicação da decisão até o momento em que considerada desobedecida a ordem judicial, ocorreu confusão quanto às partes processuais envolvendo a coligação majoritária, as coligações proporcionais e os partidos que as integraram.

A uma, porque o legitimado a responder por uma coligação é aquele instituído como seu representante, e não os presidentes dos diretórios municipais dos partidos que a integram, eis que, nos termos da Lei n. 9.504/97, art. 6º e §1º, as coligações são pessoas jurídicas pro tempore, não se confundindo com as pessoas individuais dos seus partidos políticos.

Assim, os dirigentes partidários não são legitimados a responder pelas coligações que integram, salvo na hipótese de cumularem a presidência partidária com a função de representantes de coligação.

Ocorre que, em consulta realizada junto ao processo de registro de candidatura (RCAND) concernente, das respectivas coligações envolvidas, constato que tal situação não se concretizou no caso em apreço. O responsável pela Coligação Alvorada De Um Novo Tempo era Isac Batista, o da Coligação União Por Alvorada era Moisés Ribeiro Heberle e, por fim, o da Coligação Avança Alvorada era Cristiano Holstein. Verifico, ainda, a partir das representações por propaganda irregular em exame, que nenhum dos representantes das coligações foi chamado às respectivas lides, em referência, para responder por suas representadas.

A duas, porque as coligações proporcionais constituem entes distintos das coligações majoritárias, ainda que parte dos partidos políticos que compõem estas últimas possam ser os mesmos que integram as primeiras.

No caso, a ordem foi proferida em processo atinente à propaganda da coligação majoritária, PET n. 60-34.2012. Mas a desobediência teria sido constatada quanto à veiculação de propagandas irregulares promovidas pelas coligações proporcionais e apuradas nas Representações ns. 65-56.2012, 63-86.2012 e 71-63.2012, cujas cópias compõem os anexos do presente recurso criminal.

A três, porquanto o partido político, enquanto coligado, só detém legitimidade para integrar os feitos eleitorais quando chamado de forma solidária à sua coligação. Isso porque, no que atine às demandas processadas durante o pleito, uma vez formada uma coligação, é ela que detém a legitimidade, tanto ativa como passiva, e não os partidos que a compõem.

Nada obstante isso, verifico que apenas os partidos foram notificados da ordem e não as coligações, consoante se extrai das decisões exaradas na PET n. 60-34.2012 (“determino a intimação de todos os partidos da COLIGAÇÃO 'ALVORADA POR UM NOVO TEMPO', na pessoa dos presidentes dos respectivos diretórios municipais”), nas RP's ns. 63.86.2012 e 65-56.2012, de idêntico teor (“A COLIGAÇÃO AVANÇA ALVORADA já tinha sido intimada anteriormente, na pessoa dos respectivos presidentes dos diretórios municipais dos partidos, pelo que incorreram em crime de desobediência.”), e na RP n. 71-63.2012 (“Considerando que já não se trata da primeira infração ao mesmo dispositivo legal pela coligação representada, remeta-se cópia do presente julgado à 3ª DP de Alvorada para que proceda à lavratura de TC por crime de desobediência em desfavor dos presidentes dos diretórios municipais dos respectivos partidos políticos”).

A quatro, porque as agremiações partidárias das quais os réus eram presidentes não integraram o polo passivo da PET n. 60-34.2012, não podendo, então, serem tais dirigentes destinatários da ordem proferida nesse processo.

Nesse contexto, resta evidente que os partidos políticos, mesmo que tivessem integrado a lide de modo solidário às suas coligações - o que, repiso, não ocorreu no caso -, não poderiam ter sido chamados ao processo de forma apartada da legitimada principal, eis que não detêm capacidade para responder pela publicidade dos candidatos enquanto vigente a estrutura coligada.

Para além disso, há confusão quanto ao alcance da ordem à veiculação de propagandas diversas, que não pertenciam ao candidato à majoritária.

A decisão exarada na PET (“em caso de nova incursão na propaganda irregular, será determinada a lavratura de Termo Circunstanciado por desobediência”) era pertinente à propaganda do candidato da eleição majoritária Edson de Almeida Borba.

Nesse sentido, legítimo extrair-se que a “nova incursão na propaganda irregular” apta a ensejar o crime de desobediência seria a reprise da propaganda do candidato à eleição majoritária Edson de Almeida Borba, nas mesmas circunstâncias irregulares apuradas naqueles autos. Entretanto, o alegado descumprimento teria sido praticado em relação a propagandas apuradas em outros feitos (as RP's de ns. 71-63.2012, 63.86.2012 e 65-56.2012), pertinentes aos candidatos à eleição proporcional Ildelfonso Milcharek, Nadir Terezinha da Rosa Machado e Tiano Ribeiro de Almeida, os quais concorreram por coligações distintas daquela que figurou na PET e que era a destinatária da ordem.

Ademais, nos autos da RP n. 71-63.2012, a decisão (“Considerando que já não se trata da primeira infração ao mesmo dispositivo legal pela coligação representada, remeta-se cópia do presente julgado à 3ª DP de Alvorada para que proceda à lavratura de TC por crime de desobediência em desfavor dos presidentes dos diretórios municipais dos respectivos partidos políticos”) apontou para a configuração da desobediência não com suporte na reiteração da conduta objeto da ordem proferida na PET n. 60-34.2012, mas em infração ao mesmo dispositivo legal.

Tal situação não se coaduna com os contornos específicos do crime apontado, na medida em que para sua configuração é necessário que a ordem judicial descumprida tenha sido clara e específica, sem deixar margem a dúvidas quanto à exata conduta que não deve ser reprisada.

Não desconheço, como já demonstrado, a existência de condenação atrelada aos mesmos fatos na seara não criminal (TRE/RS – RE 60-34.2012.6.21.0074 – Rel. Desa. Elaine Harzheim Macedo – J. Sessão de 19.9.2012), conquanto tenha sido afastada a aplicação de multa por ausência de previsão legal.

Tal, no entanto, só vem a reforçar a conclusão que ora estou a delinear. Não só porquanto notória a independência entre as esferas, criminal e não criminal, no âmbito eleitoral, mas porque a condenação então referendada por este Tribunal não teve como destinatários os ora recorrentes.

Sigo, ainda.

Os pontos envolvendo legitimidade do destinatário e alcance da ordem tida por violada ligam-se, outrossim, ao dolo, elemento essencial para a configuração da apontada conduta criminosa.

Todo o contexto acima exposto, por si, já põe em questão o dolo do descumprimento.

Primeiramente, porque a decisão judicial direcionava-se ao candidato Edson de Almeida Borba e à Coligação Alvorada de Um Novo Tempo, cujo representante legal era Isac Batista e não os apontados como violadores da ordem. Nesse rumo, plausível o entendimento de que a veiculação das propagandas subsequentes, mesmo que tivessem sido efetuadas sob a responsabilidade dos recorrentes (e não foram, pois a responsabilidade era das respectivas coligações proporcionais), não se afigurariam, de forma indene de dúvida, como conduta imbuída do dolo de desobediência.

Em segundo lugar, porque a decisão tinha por objeto a propaganda do candidato Edson de Almeida Borba, não indicando, em nenhum momento, que outra forma de propaganda que padecesse de irregularidade similar incorreria em desobediência. Assim, a ordem, nos termos em que proferida, não poderia alcançar propaganda diversa para os fins do crime de desobediência.

Nesses termos, contaminada a possibilidade de ser apontado o elemento doloso, vez que a decisão, no mínimo, deixou margem à dúvida razoável quanto à conduta que poderia vir a configurar a alegada violação da ordem.

Dentro desse contexto, gize-se restar assente na jurisprudência que a configuração do crime em apreço requer a citação direta e específica da parte para o cumprimento de ordem, orientação ou diligência. E que o crime de desobediência apenas se perfectibiliza quando presente a vontade livre e consciente do agente, direcionada ao descumprimento do que lhe foi determinado pela Justiça Eleitoral, fazendo-se, portanto, inarredável a presença do dolo para a prática da conduta criminosa.

Nesse sentido:

AÇÃO PENAL. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA À ORDEM DA JUSTIÇA ELEITORAL. ART. 347 DO CÓDIGO ELEITORAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA VONTADE LIVRE E CONSCIENTE DE RECUSAR O CUMPRIMENTO DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA RETIRADA DE PROPAGANDA IRREGULAR. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO RÉU. DOLO NÃO COMPROVADO. ABSOLVIÇÃO. AÇÃO PENAL JULGADA IMPROCEDENTE.

1. O crime de desobediência previsto no art. 347 do Código Eleitoral aperfeiçoa-se com a verificação de que o agente agiu impulsionado por dolo, ou seja, consciente da ilegalidade do ato que está praticando, recusando o cumprimento ou obediência a diligências, ordens ou instruções da Justiça Eleitoral.

2. A doutrina penal acerca do tipo sub examine assenta que “o tipo subjetivo exige vontade livre e consciente de desobedecer ou recusar cumprimento. O elemento subjetivo do tipo, portanto, encontra-se no dolo. Mas basta o dolo genérico ou eventual, ou seja, a só intenção em desobedecer, sem se exigir que esse agir tenha um objetivo certo e especial”. (STOCO, Rui, Legislação Eleitoral Interpretada: Doutrina e Jurisprudência, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, 2. ed., p. 470).

O elemento subjetivo do tipo em questão é o dolo genérico, ou seja, a vontade livre e consciente de recusar cumprimento ou obediência a diligências, ordens ou instruções da Justiça Eleitoral ou opor embaraços à sua execução. (GOMES, Suzana de Camargo, Crimes Eleitorais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, 3. ed., p. 327).

3. In casu, a denúncia narra que:

i) o acusado fixou pintura em propriedade particular contendo propaganda eleitoral com área superior ao permitido pela legislação, sendo deferida medida liminar pela Justiça Eleitoral determinando que o réu retirasse a propaganda irregular no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.

ii) A notificação expedida para que o acusado cumprisse a ordem judicial foi recebida por terceiros e não foi informado ao Juízo eleitoral que o réu tivesse retirado a propaganda irregular.

[…]

(STF – AP/PA 596 – Relator Min. LUIZ FUX – DJE 6.02.2014.)

Este Tribunal já teve a oportunidade de se manifestar em casos como este, inclusive em processo recente da minha relatoria, fixando o entendimento de que a ausência da demonstração inequívoca de dolo remete ao juízo de improcedência:

Recurso criminal. Crime de desobediência. Art. 347 do Código Eleitoral. Eleições 2012.

Alegado descumprimento de determinação judicial para retirada de propaganda eleitoral irregular, veiculada em desacordo com o disposto no art. 6º, § 2º, da Lei n. 9.504/97.

1. Indispensável, para o aperfeiçoamento do delito, a inexistência de previsão de sanção de natureza civil, processual ou administrativa, exceto se a norma autorizar a cumulação. Ausência de previsão de pena de multa para a irregularidade apontada.

2. Não vislumbrada, entretanto, a vontade livre e consciente de desobedecer ou recusar cumprimento à ordem judicial. Caderno probatório a revelar a boa-fé do recorrente. Demonstrado o esforço despendido para a regularização do material de publicidade impugnado.

3. Reforma da sentença condenatória, diante da ausência do dolo genérico, elemento essencial para a configuração do tipo penal.

Provimento.

(TRE/RS – RC 38-58.2013.6.21.0100 – Relator Des. CARLOS CINI MARCHIONATTI – J. Sessão de 23.8.2016.)

 

Recurso criminal. Ação penal. Crime de desobediência tipificado no art. 347 do Código Eleitoral. Alegada recusa do denunciado, candidato ao cargo de deputado federal, em cumprir ordem exarada pelo Tribunal Regional Eleitoral em decisão liminar. Eleições 2010.

Juízo de improcedência no juízo originário, em observância ao princípio do in dubio pro reo, devido à insuficiência de provas da existência de dolo na conduta.

O tipo penal em exame aperfeiçoa-se apenas na sua forma dolosa, traduzida não apenas pela conduta livre e consciente, mas também pela vontade de não cumprir a ordem ou instrução da justiça eleitoral ou opor embaraços a sua execução, o que não comprovado no caso vertente.

Provimento negado.

(TRE/RS – RC 7537-83 – Relatora Desa. FEDERAL MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA – J. Sessão 20.02.2013.)

É justamente nesse sentido que estou a propor o meu voto.

Considerando o conjunto dos acontecimentos acima narrados, não vejo como, enfim, à luz dos vetores que regem o processo penal, concluir tenha havido a desobediência, dolosa, da ordem proferida nos autos do aludido processo sob a Classe PET n. 60-34.2012.

Dessa feita, por entender ausentes tais elementos, a absolvição dos ora recorrentes é medida que se impõe.

Por via de consequência, resta prejudicado o pedido do MPE relativo à prefacial de contrarrazões referente à dosimetria da pena, bem como quanto às prefaciais recursais atreladas à ilegitimidade passiva para a causa de Marenilda e Dilson Rui. Mesma sorte atinge o pedido concernente à execução provisória, formulado pelo Parquet eleitoral nesta instância.

 

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar recursal relativa à nulidade da sentença e à inépcia da denúncia, VOTO pelo provimento dos recursos interpostos por MARENILDA SILVA DE BORTOLI, DILSON RUI PILA DA SILVA e MIRO JOAQUIM DOS SANTOS, para o fim de absolvê-los, com fulcro no art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal.