RE - 770 - Sessão: 09/09/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - PMDB de Triunfo contra sentença do Juízo da 133ª Zona Eleitoral, que desaprovou as contas referentes ao exercício financeiro de 2011 e determinou a proibição do repasse de recursos do Fundo Partidário pelo período de 12 (doze) meses (fls. 125-127 v.).

Alega, preliminarmente, ausência de fundamentação da sentença e cerceamento de defesa. No mérito, aduz que não contou, à época, com movimentação financeira, e tampouco “com pessoal técnico capaz de realizar as difíceis prestações de contas perante a Justiça Eleitoral”. Sustenta não ser proporcional conferir ao diretório municipal o mesmo rigor conferido aos diretórios estadual e nacional. (fls. 131-137).

Foram os autos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 141-146).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

Preliminares

1. Preliminar de nulidade de ausência de fundamentação.

O PMDB de Triunfo recorre da decisão do Juízo da 133ª Zona Eleitoral, que desaprovou as contas do partido e aplicou a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 12 (doze) meses. Entende, todavia, que a decisão carece de fundamentação e seria, portanto, nula.

Não procede.

Previsão de índole constitucional (art. 93, inc. IX, da CF), a fundamentação das decisões judiciais obedece, desde 18.3.16, o roteiro delineado no art. 489, § 1º e seus incisos, do novo Código de Processo Civil. Conforme tais balizas, não terá sido fundamentada a decisão judicial que 1) limitar-se a indicar artigo de lei; 2) empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem indicar a respectiva incidência; 3) invocar motivos que serviriam para embasar qualquer decisão; 4) não enfrentar os argumentos deduzidos pelas partes, capazes de infirmar a conclusão adotada pelo julgador; 5) invocar precedente ou enunciado de súmula, sem demonstrar a pertinência à hipótese em discussão; e 6) deixar de seguir enunciado de súmula ou precedente invocado, sem demonstrar a existência de distinção no caso concreto, ou superação do entendimento.

Observadas tais premissas, a sentença foi bem fundamentada. Ela indica as irregularidades praticadas e os dispositivos legais desobedecidos; pondera acerca do comportamento do recorrente, no decorrer da demanda; considera os argumentos da agremiação e do Ministério Público Eleitoral, exara juízo sobre as práticas ou omissões.

Trata-se de manifestação judicial hígida, não sendo razoável arguir nulidade por ausência de fundamentação. Nessa linha, transcrevo trechos que explicitam a fundamentação esgrimada pelo juízo de origem:

(…)

Para permitir a aplicação dos procedimentos técnicos de exame pela Justiça Eleitoral, é indispensável que a prestação esteja composta pelos documentos elencados no art. 29 da resolução TSE 23.432/14. No presente caso, tal preceito não foi observado pelo prestador, uma vez que as contas apresentadas encontram-se eivadas de irregularidades formais, conforme apontado no parecer conclusivo da fl. 066, verificando-se, inclusive, ausência de praticamente todos os extratos bancários, o que inviabiliza a aferição da real movimentação financeira do exercício em exame, bem como das ausências das Prestações de Contas dos exercícios de 2009 e 2010, as quais deveriam ter sido entregues pelo Diretório Municipal até a data de 30 de abril de 2010 e 2011, respectivamente.

(…)

Ainda, no que concerne às irregularidades apontadas, como bem salienta o MPE em seu parecer (fls. 069-071), “não se pode considerar que as falhas apontadas sejam meras irregularidades ou erro material de pequena repercussão. Tais falhas, portanto, não podem ser desprezadas, sob pena de se tornar inúteis as prestações de contas, cujo escopo é garantir a lisura da arrecadação e a consistência das contas”.

Afasto a preliminar.

2. Preliminar de nulidade por ausência do devido processo legal.

A grei partidária suscita segunda preliminar, de ausência do devido processo legal. Relata ter requerido oitiva de testemunhas, sendo que a sentença fora prolatada sem a referida produção de prova.

Também esta preliminar é de ser afastada.

A uma, não foi a agremiação a requerer a referida prova. Tratou-se de pedido dos responsáveis pelas contas do partido, integrantes da diretoria partidária, representados por procuradora diversa, em razões de defesa (fls. 83-90). Os dirigentes partidários não recorreram.

Ou seja, trata-se de questão preclusa.

Ainda assim, friso que a produção de provas obedece a um princípio cerne: o da utilidade. Deverá ser produzida aquela prova que, ao menos hipoteticamente, possa ter a potência de influenciar a convicção do julgador, destinatário da prova. Nessa linha, sequer em tese os testemunhos teriam o condão de esclarecer as irregularidades apontadas.

A produção de prova testemunhal seria, em resumo, inútil.

Afastadas ambas as preliminares, passo ao exame do mérito.

Mérito

O PMDB de Triunfo teve suas contas do ano de 2011 desaprovadas, com a determinação de suspensão do repasse de verbas oriundas do Fundo Partidário por 12 (doze) meses. Fundamentalmente, a condenação se deu em virtude da ausência dos extratos bancários completos e da não apresentação do Livro Razão, com as formalidades exigidas.

As razões de reforma invocadas pelo PMDB de Triunfo são as seguintes: (1) ausência de dolo ou de má-fé no manejo das contas; (2) pouca significância dos valores envolvidos; (3) natureza formal das irregularidades; (4) desproporcionalidade das sanções aplicadas; (5) inexistência de dano ao erário; (6) ausência de pessoal capaz de realizar as prestações de contas, e (7) não eram os dirigentes partidários que realizavam ativamente a prestação de contas.

Pois bem.

De início, impõe salientar que as irregularidades possuem natureza grave, como ressaltado na sentença e indicado no parecer do d. Procurador Regional Eleitoral.

Isso porque sem a apresentação dos extratos bancários em sua completude, bem como do Livro Razão sem o revestimento das formalidades legais, as informações prestadas não se revestem da segurança para o controle das contas, conforme já se manifestou a jurisprudência:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral. Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n. 3350, Acórdão de 25.01.2016, Relator DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 16, Data 29.01.2016, Página 4.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS - PARTIDO POLÍTICO - DIRETÓRIO ESTADUAL - EXERCÍCIO FINANCEIRO 2012 - LEI Nº 9.096/95 E RESOLUÇÃO TSE N. 21.841/04 - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS - CONTAS DESAPROVADAS.

1. A ausência de documentos exigidos pela legislação, dentre eles os extratos bancários consolidados e definitivos, impede o efetivo controle da Justiça Eleitoral sobre as contas dos partidos políticos, ensejando a sua desaprovação.

2. A ausência de movimentação financeira por parte do partido ou ausência de recebimento de quotas do fundo partidário não afasta a agremiação partidária da obrigatoriedade de apresentar os documentos indispensáveis elencados no artigo 13 da Lei n. 9.096/95, os quais são essenciais para a comprovação do não recebimento de recursos.

(PRESTACAO DE CONTAS n. 29193, Acórdão n. 46985 de 25.3.2014, Relatora RENATA ESTORILHO BAGANHA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico do TRE/PR, Data 28.3.2014.)

Neste sentido, vale dizer que as falhas apontadas ferem os arts. 12 e 14, inc. II, al. n, da mencionada resolução, os quais dispõem que a prestação de contas ofertada deve "refletir a real movimentação financeira e patrimonial do partido político", mostrando-se obrigatório vir acompanhada das peças e documentos necessários à apreciação da contabilidade pela Justiça Eleitoral.

Além, o Livro Razão se reveste de formalidades a serem absolutamente observadas: deve ser encadernados; devem constar termos de abertura e encerramento; as folhas hão ser numeradas sequencialmente. Isso porque, tratando-se de prestação de contas, o que se busca é a verdade real e a proteção ao interesse público, prejudicados no caso concreto.

É falha que, igualmente, não pode ser desconsiderada; entendê-la superável sinalizaria aos partidos políticos que não seria necessário obedecer a parâmetros contábeis importantes. A jurisprudência a considera como falha prejudicial ao exame das contas:

Prestação de contas. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. Destinação do percentual mínimo de 5% dos recursos oriundos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas para promover e difundir a participação política das mulheres. A inobservância dessa regra impõe o acréscimo de 2,5% no ano seguinte ao trânsito em julgado, bem como o recolhimento do valor correspondente ao erário, ante a proibição legal de utilização da quantia para outra finalidade (art. 44, V e § 5º da Lei n. 9.096/95). A apresentação de cópia dos Livros Diário e Razão contraria o disposto no art. 11, parágrafo único, da Resolução TSE n. 21.841/04, que prevê a autenticação do primeiro no ofício civil. Falha que compromete a análise da real movimentação financeira e patrimonial do partido. Suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário por um mês. Desaprovação.

(PC n. 6295, Acórdão de 12.4.2016, Relatora DRA. GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 64, Data 14.4.2016, Página 4.) (Grifei.)

 

Prestação de contas. Partido Político. Diretório Estadual. Exercício financeiro 2013. Entrega e autenticação tardia dos livros Diário e Razão. Descompasso em relação aos demonstrativos apresentados e os valores declarados à Justiça Eleitoral. Falhas que inviabilizam o controle da real movimentação financeira e patrimonial da agremiação. Falta de transparência da totalidade dos recursos utilizados no exercício em análise. Razoável e proporcional a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um mês. Desaprovação.

(PC n. 5739, Acórdão de 13.4.2016, Relator DR. EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 65, Data 15.4.2016, Página 3.) (Grifei.)

Daí, as irregularidades presentes comprometem o controle e confiabilidade das receitas e despesas, não autorizando a aprovação das contas em virtude da aplicação do princípio da transparência. Por exemplo, não é possível aferir a veracidade da afirmação do recorrente, no sentido de inexistência do dano ao erário, pois inexiste transparência suficiente para tanto.

E ainda que se compreendam as dificuldades pelas quais passam os partidos políticos do interior do estado, esta circunstância não permite o desconhecimento da lei, tampouco o descumprimento. Além disso, a cidade de Triunfo é de médio porte para os parâmetros regionais. O partido prestador de contas, igualmente, figura como um dos grandes atores do cenário político em qualquer município que se estabeleça, o que enfraquece (ainda mais) as alegações de carência de pessoal ou de inexistência de atuação efetiva dos dirigentes partidários na prestação de contas.

No que concerne ao prazo de suspensão de repasse das quotas de Fundo Partidário, determinado no patamar máximo, tenho que é de ser mantido.

Não se olvida que a Corte, mediante juízo de proporcionalidade e razoabilidade, amiúde reduz aquelas suspensões fixadas no patamar máximo previsto pela Resolução TSE n. 21.841/04, de 12 (doze) meses. Os parâmetros observados, para tal redução, são a gravidade, o valor e a percentual alcançado pelas irregularidades, bem como comportamento do partido político durante a prestação de contas.

Nesse último item: quando analisado o atuar da agremiação no presente processo, surge até mesmo certa perplexidade. A colaboração do PMDB de Triunfo na elucidação dos apontamentos foi nenhuma. Ao contrário, foram criados obstáculos ao desenvolvimento regular do feito. Nessa linha, cito dois eventos.

O primeiro, constante à fl. 58: o pedido do partido para que fossem concedidos 90 (noventa) dias para juntar extratos bancários. Ora, cediço que em tempos de rede mundial de computadores, e de absoluta informatização da rede bancária, soa absolutamente irrazoável o pedido, com nítido caráter protelatório.

O segundo, mais grave: a necessidade do Juízo da 133ª Zona Eleitoral em proferir despacho (em 13.08.2015, fl. 78) intimando a procuradora da agremiação para que devolvesse os autos ao cartório sob pena de busca e apreensão, após reiteradas tentativas de comunicação, pois a carga havia sido realizada em 19.5.2015. Ou seja, a carga dos autos durou praticamente 3 (três) meses.

Em resumo: (a) as falhas são graves; (b) as omissões do partido frustraram o emprego dos procedimentos técnicos de análise das contas, e (c) o atuar da agremiação, no transcorrer do processo, não merece incentivo.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo-se a sentença pelos próprios fundamentos.