RC - 1766 - Sessão: 20/07/2016 às 17:00

Pedi vista para analisar a questão do limite da futura sentença diante da anulação de ofício em benefício do acusado absolvido, e não como decorrência do recurso da acusação.

A melhor reflexão me fez ver que não se trata de caso de anulação da sentença por falta de alegações finais. Ocorre que o acusado não sofreu qualquer prejuízo com a deficiência defensiva, na medida em que foi absolvido.

A meu ver, não há nulidade, inclusive absoluta, sem prejuízo, conforme expressa determinação do art. 563 do CPP, "Art. 563.  Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa." Nesse sentido, manifesta-se a jurisprudência do STF:

“HABEAS CORPUS” – EXTINÇÃO LIMINAR DO PROCESSO POR DECISÃO MONOCRÁTICA DO MINISTRO- -PRESIDENTE DESTA CORTE SUPREMA – LEGITIMIDADE – IMPETRAÇÃO CONTRA ATOS JUDICIAIS EMANADOS DE ÓRGÃOS COLEGIADOS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (PLENÁRIO OU TURMAS) OU PROFERIDOS POR QUAISQUER DE SEUS JUÍZES – INADMISSIBILIDADE – SÚMULA 606/STF – APLICAÇÃO ANALÓGICA – PRECEDENTES – RESSALVA DA POSIÇÃO PESSOAL DO RELATOR DESTA CAUSA, QUE ENTENDE CABÍVEL O “WRIT” EM CASOS COMO ESTE – PRETENDIDO RECONHECIMENTO, ADEMAIS, DE NULIDADE ABSOLUTA EM FACE DA PARTICIPAÇÃO, NO JULGAMENTO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO, DE MINISTRO SUPOSTAMENTE IMPEDIDO – ATUAÇÃO DESINFLUENTE NO RESULTADO DO JULGAMENTO, UNÂNIME, DO RECURSO – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUALQUER PREJUÍZO PARA O RECORRENTE – “PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF” – PRECEDENTES – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. (HC 129430 AgR, Relator  Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 17.3.2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-103 DIVULG 19.5.2016 PUBLIC 20.5.2016.)

 

Embargos de declaração nos embargos de declaração na ação penal. Embargos com caráter nitidamente protelatório. Pretensão à revisão da pena aplicada. Ausência de omissão, contradição ou obscuridade a ser sanada. Impossibilidade de reexame da causa. Aventada ausência de comunicação à Câmara dos Deputados sobre o recebimento da denúncia (CF, art. 53, § 3º). Nulidade absoluta. Não ocorrência. [...]. 4 .Além da arguição opportune tempore da suposta nulidade, seja ela relativa ou absoluta, a demonstração de prejuízo concreto é igualmente essencial para o seu reconhecimento, de acordo com o princípio do pas de nullité sans grief, presente no art. 563 do Código de Processo Penal. Precedentes. 5. Não conhece a Corte dos embargos de declaração. (AP 481 EI-ED, Relator  Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 20.3.2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-154 DIVULG 08.8.2014 PUBLIC 12.8.2014.)

 

HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. DIREITO DE REPERGUNTAS PELO DEFENSOR DO RÉU AOS DEMAIS CORRÉUS. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 188 DO CPP. NULIDADE ABSOLUTA. EFETIVO PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. NECESSIDADE. EXCESSO DE PRAZO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. COMPLEXIDADE DA AÇÃO PENAL. INEXISTÊNCIA DE INÉRCIA OU DESÍDIA DO PODER JUDICIÁRIO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. I – O art. 188 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 10.792/2003, passou a dispor que, após as perguntas formuladas pelo juiz ao réu, podem as partes, por intermédio do magistrado, requerer esclarecimentos ao acusado. II – O indeferimento de reperguntas pelo defensor de um dos réus aos demais corréus ofende os princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório e da isonomia, gerando nulidade absoluta. Precedentes. III – Contudo, o entendimento desta Corte também é no sentido de que, para o reconhecimento de eventual nulidade, ainda que absoluta, faz-se necessária a demonstração do efetivo prejuízo, o que não ocorre na espécie. Precedentes. IV – A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que não procede a alegação de excesso de prazo quando a complexidade do feito, as peculiaridades da causa ou a defesa contribuem para eventual dilação do prazo. Precedentes. V – Ordem denegada. (HC 116132, Relator Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 17.9.2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 02.10.2013 PUBLIC 03.10-2013.)

Por conseguinte, a interpretação da Súmula 523 do STF, "No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu", deve ser no sentido de que só deve ser pronunciada nulidade absoluta em caso de sentença condenatória, jamais em sentença absolutória!

No mesmo sentido, o precedente do TRF3:

HABEAS CORPUS. ANULAÇÃO DE SENTENÇA ABSOLUTÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA DEFESA PARA APRESENTAR ALEGAÇÕES FINAIS. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. CORREÇÃO DE ERRO MATERIAL NO DISPOSITIVO. ANÁLISE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é uníssona no sentido de que, tanto nos casos de nulidade relativa quanto nos casos de nulidade absoluta, o reconhecimento de vício que enseje a anulação de ato processual exige a efetiva demonstração de prejuízo ao acusado, à luz do art. 563 do Código de Processo Penal (pas de nullité sans grief), o que não restou evidenciado na hipótese. Não há nulidade da sentença, eis que o defensor do paciente foi devidamente intimado por precatória para apresentar seus memoriais, o que efetivamente ocorreu (TRF3, HC 00299045520144030000, Quinta Turma, Des. Federal Paulo Fontes, e-DJF3 Judicial 1 DATA 09.02.2015).

A matéria, quanto ao reconhecimento da nulidade sem que o recurso da acusação a tivesse levantado (o réu, absolvido, não tinha interesse), encontra-se sumulada pelo STF: "Súmula 160: É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício".

Por fim, caso este colegiado entenda que é caso de reconhecimento de ofício da nulidade, afigura-se-me adequado vedar a prolação de sentença condenatória, pois que a anulação se daria em razão de um princípio de garantia processual do acusado, não lhe podendo trazer prejuízo, por interpretação analógica do art. 617 do CPP e da Súmula n. 160 do STF. Vale lembrar que mesmo uma sentença absolutória proferida por juiz incompetente não poderá ser substituída por outra mais grave, se não houver recurso acusatório no ponto, conforme entendimento do STJ:

O princípio do juiz natural, previsto como direito fundamental no inciso XXXVII do artigo 5º da Constituição Federal, é instituído essencialmente em favor daquele que é processado, a quem se confere o direito de ser julgado por quem esteja regular e legitimamente investido dos poderes de jurisdição, não sendo concebível que uma garantia estabelecida em favor do acusado seja contra ele invocada, a fim de possibilitar o agravamento de sua situação em processo no qual apenas ele recorreu. Precedente. [...]. (HC 114.729/RJ, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 21.10.2010, DJe 13.12.2010).

Ante o exposto, com a devida vênia, divirjo do entendimento da e. relatora, para afastar a declaração de nulidade, devendo a mesma prosseguir no exame do recurso da acusação. Se vencida minha posição, proponho seja acrescida ao voto da relatora a ressalva de impossibilidade de condenação na nova sentença a ser proferida.