RE - 9836 - Sessão: 25/10/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto conjuntamente pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT DE SÃO SEBASTIÃO DO CAÍ, por CEZAR DUTRA, presidente da agremiação, e por CESAR HENRIQUE KLEIN, na condição de tesoureiro, contra a sentença que julgou não prestadas suas contas do exercício financeiro de 2014, em virtude da ausência de juntada de procuração outorgada ao advogado que apresentou a contabilidade, fixando-lhe a pena de suspensão de repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo tempo em que o partido permanecer omisso (fl. 64 e verso).

Em suas razões, sustenta que as tentativas de intimação realizadas pelo cartório eleitoral foram dirigidas, de forma equivocada, ao endereço antigo do partido. No mérito, afirma que, por descuido, foi apresentada prestação de contas sem a respectiva procuração outorgada a advogado da agremiação e que a questão estaria resolvida com a juntada do instrumento de mandato acostado à peça recursal (fls. 70-71).

Os autos foram remetidos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 76-80v.).

Ao receber os autos, verifiquei que o instrumento de mandato conferido ao advogado que assina a peça recursal foi outorgado apenas por CEZAR DUTRA, presidente do partido, e concedi aos demais recorrentes prazo de cinco dias para sanarem o vício de representação processual e juntarem a respectiva procuração, sob pena de não conhecimento do recurso em relação às partes sem representação nos autos, nos termos do art. 76, § 2º, do CPC (fl. 82). Contudo, o prazo transcorreu sem qualquer manifestação (fl. 85).

É o relatório.

 

VOTO

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo, uma vez que foi interposto em 21.6.2016 (terça-feira), dentro do prazo de 3 dias da juntada do aviso de recebimento da intimação por carta dirigida aos recorrentes (17.6.2016, sexta-feira), conforme certidão da fl. 69.

Na mesma certidão, consta que a carta de intimação dirigida a Cesar Henrique Klein foi enviada para o endereço do partido. Sobre essa circunstância, penso que a apresentação do recurso em nome do tesoureiro, no qual é consignado expressamente que o recorrente “se dá por intimado” (fls. 70-71), faz crer que esse teve ciência da decisão, motivo pelo qual dou como suprida a necessidade de intimação.

Verifico que o Partido Democrático Trabalhista - PDT de São Sebastião do Caí, Cezar Dutra e Cesar Henrique Klein apresentaram o recurso conjuntamente, mas o advogado subscritor da peça recursal tem poderes apenas para representar Cezar Dutra, única parte que consta outorgando poderes na procuração da fl. 72.

Intimados para sanar o vício de representação processual (fl. 82), os recorrentes permaneceram inertes (fl. 85), o que deve acarretar o não conhecimento do recurso em relação ao partido e ao tesoureiro.

Presentes os demais pressupostos recursais, o apelo de Cezar Dutra merece ser conhecido.

2. Mérito

No mérito, a sentença deve ser mantida, uma vez que o partido não apresentou suas contas com a respectiva procuração outorgada pela pessoa jurídica do partido político ao advogado que oferece a contabilidade, conforme inteligência do art. 37, § 6º, da Lei n. 9.096/95, do art. 29, inc. XX, da Resolução TSE n. 23.464/15, do art. 1º, inc. I, al. “f”, da Portaria TSE n. 107/15 e do art. 1º da Resolução TRE-RS n. 239/13.

É importante que os responsáveis do partido atentem para o fato de que a pessoa jurídica do partido político não se confunde com a pessoa física de seus dirigentes, de modo que a procuração outorgada por Cezar Dutra, em nome próprio, não supre a necessidade de atendimento do requisito da constituição de advogado pelo partido político que presta contas.

Visando regularizar a representação processual, ocorreram reiteradas tentativas de comunicação por parte do Juízo da 11ª Zona, dirigidas aos endereços fornecidos pela própria agremiação à Justiça Eleitoral, observadas as formalidades legais. Contudo, nenhuma restou exitosa.

Transcrevo passagem do parecer do Ministério Público Eleitoral (fls. 76-80v.), que bem analisou a questão:

[…] houve diversas tentativas de chamamentos para que fosse feita a regularização da representação processual: por meio da expedição de cartas de intimação e de citação, por “AR”, seja para o último endereço informado nos autos pelo prestador (fl. 02), seja para o endereço que se encontra nos assentamentos do partido mantidos junto à Justiça Eleitoral (fl. 39), seja por editais, como comprovam os documentos às fls. 48-49, 52, 56-59 e 61.

Cumpre destacar, ainda, o entendimento do TRE/RS a respeito do tema, exarado no julgamento da Prestação de Contas nº 247-07.2011.6.21.00, em 15/09/2011:

"[...] Veja-se que não é possível aplicar ao caso as disposições pertinentes à citação do réu no processo civil, o qual exige o esgotamento de todas as tentativas de citação antes do uso da modalidade editalícia, pois naquele processo o maior rigor justifica-se pelo absoluto desconhecimento da parte a respeito da existência de um processo contra ela ajuizado.

No presente caso, diferentemente, os candidatos já estão cientes da sua obrigação de prestar contas, como mais uma etapa do procedimento eleitoral.

Assim, descumprido o prazo legal pela recorrente, dirigida notificação para o seu endereço, não sendo encontrada em três tentativas diferentes, e após fictamente notificada, não pode alegar que desconhecia tal omissão para ter suas contas apreciadas após passados 6 meses do prazo legal [...]". (Grifado.)

Dessa forma, ainda que partido e responsáveis legais já estivessem cientes, por imposição legal, da obrigação de prestar contas, mediante procurador, percebe-se que mesmo assim houve o exaurimento dos meios de localização para que sanassem o vício. Logo, o julgamento das contas como não prestadas é consequência da omissão do prestador, que, além de não apresentar as contas voluntariamente por meio de advogado constituído, se manteve inerte às comunicações enviadas aos endereços informados pelo próprio partido – e, portanto, válidos -, assim como no tocante aos chamados fictos.

Nesses termos, devem, portanto, ser consideradas conformes as intimações para regularização processual realizadas nesses autos.

O processo de prestação de contas possui caráter jurisdicional, sendo imprescindível o acompanhamento por advogado, profissional indispensável à administração da justiça, nos termos do art. 133 da Constituição Federal.

Dispõe a Resolução TSE n. 23.432/14, vigente à época da apresentação dos documentos, que

Art. 29. O processo de prestação de contas partidárias tem caráter jurisdicional e se inicia com a apresentação ao órgão da Justiça Eleitoral competente:

I – da escrituração contábil digital, encaminhada por meio do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED); e

II – das peças complementares encaminhadas por sistema estabelecido e divulgado pela Justiça Eleitoral na página do Tribunal Superior Eleitoral na internet.

§ 1º As peças complementares, de que trata o inciso II deste artigo são:

[…]

XX – instrumento de mandato para constituição de advogado para a prestação de contas, com a indicação do número de fac-símile pelo qual o patrono do órgão partidário receberá as intimações que não puderem ser publicadas no órgão oficial de imprensa;

Da mesma resolução, determina o art. 45, inc. V, al. “b”, que a Justiça Eleitoral deverá julgar não prestadas as contas quando não forem apresentados os documentos relacionados no art. 29.

Idêntico teor é veiculado pelo art. 46 da Resolução TSE n. 23.464/15, diploma que atualmente regula os aspectos processuais do processo de prestação de contas:

Art. 46. Compete à Justiça Eleitoral decidir sobre a regularidade das contas partidárias, julgando:

IV - pela não prestação, quando:

b) não forem apresentados os documentos e as informações de que trata o art. 29 desta resolução, ou o órgão partidário deixar de atender às diligências determinadas para suprir a ausência que impeça a análise da movimentação dos seus recursos financeiros.

A jurisprudência, do mesmo modo, é pacífica no sentido de que a falta de constituição de advogado na prestação de contas conduz ao entendimento de não ter havido a entrega da contabilidade.

Para elucidar a questão, colaciono julgados do Tribunal Superior Eleitoral e deste Regional que sufragam o mesmo posicionamento:

ELEIÇÕES 2014. PRESTAÇÃO DE CONTAS. LEGITIMIDADE PROCESSUAL. INTIMAÇÃO. NÃO CONSTITUIÇÃO DE ADVOGADO. CONTAS NÃO PRESTADAS. INSTRUÇÃO. COMPETÊNCIA. TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL.

1. Somente o Tribunal Superior Eleitoral detém competência para regulamentar o processo eleitoral, não devendo ser reconhecida validade à instrução que regulamenta o processo de prestação de contas no âmbito de Tribunal Regional Eleitoral. A unicidade do direito eleitoral em todo o território nacional impede que as Cortes Regionais, ainda que com induvidosos bons propósitos, editem ato normativo para regulamentar a legislação vigente. Precedentes.

2. O processo de prestação de contas, a partir da edição da Lei nº 12.034/2009, adquiriu natureza jurisdicional, sendo obrigatória, portanto, a representação da parte em juízo por advogado devidamente constituído.

3. Nos termos da legislação processual, não sendo atendido o despacho para a regularização da representação processual pelo autor no prazo determinado, o feito deve ser extinto sem o julgamento do mérito.

4. Nessa hipótese, as contas são reputadas como não apresentadas, pois o resultado do julgamento decorre da ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, por falta de capacidade postulatória, que impede o exame do mérito da pretensão deduzida em juízo, quando não sanado no prazo determinado.

Recurso especial não provido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 213773, Acórdão de 01.7.2016, Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 19.8.2016, Página 125-126.)

 

Prestação de contas de campanha. Partido político. Caráter jurisdicional. Art. 33, § 4º, da Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014. Renúncia dos poderes de representação pelos procuradores do partido. Não se conhece das contas quando apresentadas por pessoa sem capacidade postulatória e sem posterior convalidação dos atos por representante habilitado, em virtude de sua natureza jurisdicional. Suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário. Contas consideradas não prestadas.

(Prestação de Contas n. 164921, Acórdão de 09.12.2015, Relator DR. HAMILTON LANGARO DIPP, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 91, Data 11.12.2015, Página 6.)

Assim, deve ser mantida a decisão recorrida.

Por fim, ressalva-se que, após o trânsito em julgado desta decisão, a agremiação partidária poderá requerer a regularização da situação de inadimplência, afim de suspender as consequências da proibição do repasse de recursos do Fundo Partidário.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo não conhecimento dos recursos do Partido Democrático Trabalhista – PDT de São Sebastião do Caí e de Cesar Henrique Klein, e, em relação ao recurso de Cezar Dutra, pelo desprovimento.