CTA - 12518 - Sessão: 09/08/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de consulta formulada por TEREZINHA DA SILVA ROQUE, ocupante do cargo de Secretária Municipal de Educação e Cultura do Município de Estância Velha, na qual realiza a seguinte indagação (fl. 02):

Realizaremos nossa XXXV Feira do Livro no período de 14 a 19 de agosto de 2016 no Centro Municipal Cultural Novisol.

Em 2015, quando da Feira, tínhamos como uma das metas o “Vale Livro”, isto é, cada aluno dos 4.617 receberia um vale para adquirir um livro; entretanto, frente às dificuldades financeiras, aplicamos 78% do FUNDEB em Folha de Pagamento, não sendo possível cumprir tal meta.

Este ano, retomamos a meta contemplando 4.860 alunos da pré-escola ao 9º ano.

A referida meta, além da imensurável importância pedagógica, democratiza o acesso à leitura, pois todos os alunos da Rede Municipal de Ensino teriam possibilidade de adquirir um livro.

O recurso financeiro disponível é o do FUNDEB.

Considerando que o evento acontece no período correspondente ao calendário eleitoral, solicitamos esclarecimento, visto que é uma das metas da Feira do Livro que está na sua 35ª Edição.

Autuado o processo, a Coordenadoria de Gestão da Informação juntou farta legislação e jurisprudência pertinentes ao caso (fls. 5-67).

Após, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo não conhecimento da consulta (fls. 70-71v.).

É o relatório.

 

 

 

 

VOTOS

Dra. Maria de Lourdes Galvao Braccini de Gonzalez (relatora):

A legislação prevê a possibilidade de consulta ao Tribunal Regional Eleitoral, observados os requisitos do art. 30, VIII, do Código Eleitoral:

Art. 30. Compete, ainda, privativamente, aos Tribunais Regionais:

[...]

VIII – responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas, em tese, por autoridade pública ou partido político.

Como se vê, a legislação exige a formulação da consulta em tese, sem contornos a possibilitarem a identificação do caso concreto. Tal comando evita que o Tribunal se adiante na apreciação jurisdicional, sem, no entanto, ter ofertado as garantias do contraditório e da ampla defesa em dilação probatória adequada.

Na espécie, verifico que a consulente detém legitimidade para realizar a consulta, pois TEREZINHA DA SILVA ROQUE ocupa o cargo de Secretária de Educação e Cultura do Município de Estância Velha.

Atendido o requisito subjetivo, portanto.

Quanto ao requisito objetivo, a indagação diz respeito ao procedimento a ser adotado relativamente à distribuição de “vales-livro” a alunos da pré-escola ao 9º ano do município, durante a XXXV Feira do Livro, a ser realizada entre os dias 14 e 19 de agosto de 2016, na cidade de Estância Velha.

Acompanho o parecer do d. Procurador Regional Eleitoral e me posiciono pelo não conhecimento da consulta, devido ao alto grau de concretude alcançado pelo questionamento.

E realço o alto grau de concretude porque não olvido da relativização com que esta Corte tem operado no que concerne ao atendimento do requisito objetivo – abstração da dúvida formulada –, o que, em muitos casos, acompanho integralmente.

De fato, há casos em que o relevante interesse público molda a necessidade deste Tribunal em se manifestar sobre a situação objeto de consulta.

Todavia, o caso posto não tem apenas “contornos de caso concreto”, contornos esses que, em alguns casos, repito, temos atenuado e superado; trata-se de caso concreto em sua inteireza. Em termos breves, a consulente demanda resposta deste TRE para situação demasiado específica.

Lembro que recentemente (20.7.2016) foi julgada a Consulta n. 81-96, processo de minha relatoria:

Consulta. Prefeito. Indagação sobre aprovação de projeto de lei que verse sobre questões excepcionais de pagamentos de tributos, bem como a relação de tais exceções com a caracterização de renúncia de receita.

Reconhecida a legitimidade do consulente para propor a consulta, todavia, inviável o seu emprego para deslinde de situação fática específica, sob pena de enfrentamento de caso concreto. A necessária formulação em tese das indagações tem por desiderato a preservação de um estado de paridade de armas na campanha eleitoral, evitando-se a concessão de vantagens indevidas a eventuais candidatos que portem condição de autoridade pública, em prejuízo àqueles carecedores dessa prerrogativa.

Entendimento firmado no sentido de não apreciação de consultas após iniciado o período eleitoral.

Inobservado o requisito objetivo estabelecido no inc. VIII do art. 30 do Código Eleitoral.

Não conhecimento.

O julgamento foi por maioria, vencidos a Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja e o Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz.

Neste ponto do voto, estabeleço diálogo com os d. colegas apenas para frisar que o precedente citado era sensivelmente dotado de maior abstração (ou menor concretude) do que o caso sob exame.

E, mesmo assim, não comportou conhecimento.

Naquela ocasião, o Des. Federal Paulo Afonso observou que o conhecimento da consulta poderia aproveitar a outros gestores na mesma situação, prefeitos, pois tratava-se da possibilidade de estabelecimento de benefícios fiscais por parte do município. Sem dúvida é um argumento muito forte, de todo respeitável, e sou ciente de que a Dra. Gisele tem opinião semelhante, agregando ainda a posição pessoal de que a Justiça Eleitoral (e, ao final, os magistrados que a compõem) não poderia deixar de manifestar-se em questões relevantes, influentes na competição eleitoral.

Contudo, a situação posta é demasiado específica – aproveitaria apenas outras hipotéticas distribuições de “vales- livro” durante outras feiras do livro, circunstância que entendo pouco substancial sob o prisma da relevância para o quadro eleitoral.

Não se está aqui a afirmar que a questão veiculada na consulta não é importante.

Ao contrário. Tem, claro, sua relevância e nobreza, sobremodo se considerada a atual situação da educação básica em nosso país, permeada de mazelas. Daí, o ato administrativo de instituição do “vale-livro”, em si e em tese, seria medida absolutamente louvável em sua essência e seus intuitos.

Além disso, a promoção da feira do livro já atinge sua trigésima quinta edição, mostrando que, também hipoteticamente, não se estaria tratando de evento casuísta, pretendente de aproveitamento do período eleitoral.

De qualquer forma, e em resumo, é incabível o conhecimento da consulta, nos termos em que formulada.

A análise do caso como delineado somente poderia dar-se no curso de um processo judicial eleitoral propriamente dito, rodeado de elementos que permitissem o devido contraditório, com manifestação jurisdicional que emanasse efeito vinculativo e fosse submetida, ao final, à coisa julgada.

A consulta não pode ser conhecida, por espelhar caso concreto.

 

Diante do exposto, VOTO pelo não conhecimento da consulta.