E.Dcl. - 579 - Sessão: 21/06/2016 às 17:00

RELATÓRIO

A PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL opõe embargos de declaração, com pedido de atribuição de efeitos infringentes, em face do acórdão deste Tribunal que, por unanimidade, julgou os embargos de declaração opostos por Milton José Menusi e sanou omissão no acórdão das fls. 623-629 para o fim de consignar que ao réu está assegurado o direito de recorrer em liberdade (fls. 653-655v.).

Em suas razões, invoca o voto vencido prolatado pelo Des. Luiz Felipe Brasil Santos no julgamento da PET n. 27-33. Sustenta que o precedente do STF no HC n. 126.282, no qual foi assentada a possibilidade de imediata execução de acórdão penal condenatório,   é aplicável a todos os demais processos criminais, a fim de garantir segurança jurídica, pois o julgamento baseou-se no exame da compatibilidade das normas processuais penais. Faz referência a voto do Min. Teori Zavascki no julgado em questão, ao voto do Min. Edson Fachin, e ao acórdão do STF na Reclamação n. 4335. Defende que o TSE deve acatar o entendimento do STF, observando que o art. 257 do Código Eleitoral prevê, como regra, a ausência de efeito suspensivo aos recursos. Invoca o art. 363 do Código Eleitoral e o acórdão do TRE-SP nos embargos de declaração n. 8515. Reporta-se aos dados estatísticos de julgamentos de recursos divulgado pelo STF e assevera que os casos de absolvição são raríssimos, não sendo equivalentes aos julgados com decisões favoráveis à defesa, tais como aquelas que determinam o abrandamento da pena. Afirma que o acórdão embargado adotou opinião pessoal do relator, desprovida de amparo em dados oficiais. Entende ser contraditória a posição da Corte porque, ao mesmo tempo em que conclui pela existência de provas suficientes para a manutenção da condenação, afirma ser “temerária a relativização do princípio da presunção da inocência”. Finaliza ressaltando que a tese não compromete o referido princípio (fls. 681-684).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, todos os pontos invocados nos embargos, em tese caracterizadores de omissão e contradição, foram objeto de manifestação expressa no acórdão embargado, decisão que definiu a questão da execução provisória dos acórdãos penais condenatórios contrariamente à tese defendida pelo órgão ministerial.

A posição deste Tribunal de forma alguma poderia caracterizar contradição, pois a decisão condenatória em nada interfere na conclusão de que o réu pode recorrer em liberdade, não devendo ser recolhido à prisão até o trânsito em julgado da condenação, diretriz jurisprudencial que estava sendo observada pelo STF e demais tribunais do país até fevereiro de 2016.

No pertinente à insurgência contra o raciocínio deste relator quanto à realidade da Justiça Eleitoral, pondera-se que essa conclusão decorre do exercício da jurisdição eleitoral e da observância contínua da jurisprudência do TSE sobre os recursos criminais julgados pela Corte Superior Eleitoral.

E para demonstrar que as razões de embargos encontram solução no próprio julgado recorrido, colaciono o excerto do acórdão no ponto em que enfrentou o indigitado precedente do STF (fls. 654v.-655v.):

[...]

Por fim e, de ofício, verifico que a decisão foi omissa quanto ao direito de o embargante recorrer em liberdade.

Esta Corte, recentemente, na sessão de 10.5.2016, nos autos dos processos PET 2733 e PET 3510, de relatoria do Des. Luiz Felipe Brasil Santos, examinou requerimento, formulado pelo Procurador Regional Eleitoral, de imediata execução provisória de acórdão penal condenatório.

O pedido foi formulado em consequência do julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, do HC n. 126.292/SP, Relator o Ministro Teori Zavascki (publicado no DJE do STF em 17/05/2016), em que restou assentada, basicamente, a seguinte tese: “A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal”.

No entanto, a análise do mérito restou prejudicada em razão do voto vista, e vencedor, proferido pela Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja, no qual a vistora suscitou, de ofício, preliminar de incompetência deste Tribunal para julgar o requerimento, uma vez que o processo já havia ultrapassado a fase de exame de admissibilidade de recurso especial, consumando-se, assim, o esgotamento da jurisdição na instância ordinária.

No ponto, afora todos os argumentos invocados em contraposição ao entendimento firmado pelo STF, com os quais concordo, atinentes à proteção do princípio da presunção da inocência (art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal), o qual impede a antecipação do juízo condenatório, com o reconhecimento da culpabilidade do réu antes do trânsito em julgado da condenação, cumpre tecer outras considerações.

A primeira questão a ser ressaltada é a de que a decisão do Supremo Tribunal Federal não foi unânime (7 a 4), e foi pontual, aplicável somente ao caso concreto em que foi prolatada, até porque não houve deliberação acerca de eventual extensão aos demais réus, em outros processos penais, que se encontrarem em igual situação.

Assim, o entendimento não é vinculante e não há notícia de que a questão tenha sido enfrentada pelo Tribunal Superior Eleitoral, sendo certo que pontos controversos ainda deverão ser esclarecidos.

Quanto aos dados estatísticos invocados pelos adeptos da tese, a Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais divulgaram notas sobre a questão, apontando que cerca de 30% dos recursos interpostos por pessoas condenadas têm obtido êxito perante as Cortes Superiores, principalmente em sede de habeas corpus, situação que evidencia ser temerária a adoção do entendimento pelo inegável risco de causar prejuízo irreparável a um inocente.

Além disso, há considerável diferença estatística na realidade da Justiça Eleitoral, pois o Tribunal Superior Eleitoral reforma grande volume de decisões condenatórios de Tribunais Regionais Eleitorais. No âmbito deste Tribunal, não localizei os dados estatísticos relativos aos resultados dos recursos julgados pelo TSE, mas é cediço que há inúmeras reformas de acórdãos criminais, o que mostra ser prudente a conservação do estado de inocência até o trânsito em julgado da decisão.

Penso ser temerária a relativização, que em verdade é a própria inversão, para o caso concreto, do princípio da presunção de inocência, diante do prejuízo causado com o encarceramento injusto do réu, circunstância que, posteriormente, poderá ser reconhecida pela Corte Superior Eleitoral.

Ademais, o tempo de prisão por decisão reformada na última instância não pode ser devolvido ao acusado, sendo cediço que a jurisprudência, nesses casos, sequer admite a possibilidade de indenização por parte do Estado.

Por fim, entendo que a orientação do STF não pode ser adotada pela Justiça Eleitoral, sob pena de configuração de um inegável contrassenso, pois para as ações cíveis eleitorais há previsão específica no §2º do art. 257 do Código Eleitoral, segundo a qual os recursos ordinários dirigidos ao TSE, interpostos contra acórdãos de Regionais que resultem em cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo, devem ser recebidos com efeito suspensivo.

É cediço que a independência entre as instâncias permite que sejam propostas ação cível e criminal, fundadas nos mesmos fatos, para apurar o cometimento de corrupção eleitoral.

Penso que não poderia ser admitido o cumprimento, antes do trânsito em julgado, da pena aplicada em sede de ação penal por corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral) e, ao mesmo tempo, determinar que a pena cominada na representação por captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei das Eleições) aguarde o trânsito em julgado para ser cumprida.

Em verdade, embora para alguns, a decisão do STF tenha significado um avanço, para outros representou verdadeiro retrocesso, tal e qual afirmaram os ministros do STF que proferiram votos divergentes quando do julgamento do HC n. 126.292/SP, sendo essa última a minha posição sobre o tema.

[...]

Existe uma abstrativização do controle de constitucionalidade, mas isso não faz com que todos os HC se tornem vinculantes. O próprio Min. Fachin já referiu que o exame deve ser realizado diante do caso concreto. ADI, ADC, ADPF e súmula vinculante têm efeito vinculante automático. O resto há de se discutir bastante.

E para corroborar o entendimento deste Tribunal no sentido de que o precedente em tela não é vinculante, anoto que o Supremo deve rediscutir a decisão que autorizou a prisão após julgamento na segunda instância na próxima quarta-feira, dia 22 de junho, data marcada para decisão de duas medidas cautelares nas ADC ns. 43 e 44, ajuizadas pelo Partido Ecológico Nacional e pela OAB, visando à definição do "alcance e âmbito de incidência dos princípios da presunção de inocência e da ampla defesa". Nas ações, da relatoria do ministro Marco Aurélio, julgador que, cumpre lembrar, votou pela não aplicação da tese de execução provisória da pena e restou vencido, a Ordem e o PEN sustentam que o princípio constitucional da presunção da inocência não permite a prisão enquanto houver direito a recurso.

Figuram nos processos, na condição de amicus curiae, o Instituto Ibero Americano de Direito Público - Capítulo Brasileiro (IADP), o Instituto de Defesa do Direito de Defesa Márcio Thomaz Bastos (IDDD), o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, admitidos na qualidade de terceiros interessados.

Com essas considerações, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.