RE - 11427 - Sessão: 18/08/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - PMDB de Montenegro contra sentença que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira do exercício de 2012, em virtude da realização de despesas junto a pessoas jurídicas sem emissão de nota fiscal, recebimento de recursos e quitação de despesas sem o prévio trânsito pela conta bancária, recebimento de sobras de campanha de candidato não registrado no Demonstrativo de Sobras de Campanha e recebimento de R$ 2.653,00 oriundos de fontes vedadas.

Em sua irresignação (fls. 155-157), o recorrente argumenta que as contribuições foram realizadas de acordo com o estatuto partidário e em conformidade com o entendimento que prevalecia à época, de que tais contribuições eram legais. Requer a reforma da decisão recorrida.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença em face da exclusão dos dirigentes partidários do feito e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 165-178).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no dia 12 de maio de 2016 (fl. 152), quinta-feira, e o recurso interposto no dia 16 do mesmo mês (fl. 155), segunda-feira, primeiro dia útil após o encerramento do prazo de 3 dias previsto pelo art. 258 do Código Eleitoral.

Preliminarmente, a Procuradoria Regional Eleitoral suscitou a nulidade do feito, por exclusão, pelo magistrado de primeiro grau, das pessoas físicas responsáveis pelas contas partidárias (fl. 129v.).

Não merece ser acolhida a preliminar. Os autos tratam de contas relativas ao exercício financeiro de 2012, período no qual não era exigida a participação dos responsáveis na prestação das contas. Diante disso, esta Corte firmou entendimento no sentido de que a inclusão dessas pessoas no processo de prestação e contas é norma de direito material, pois pode levar ao reconhecimento da responsabilidade solidária dos dirigentes partidários pelas irregularidades das contas. Transcrevo a seguinte ementa, que ilustra esse entendimento:

Prestação de contas. Partido político. Diretório Estadual. Contribuição de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2012.

Preliminar. Vigência da Resolução TSE n. 23.432/14. Inaplicabilidade in casu, em consonância a entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de manter apenas a agremiação partidária como parte, a partir da análise do caso concreto e da fase processual em que se encontra o feito. Conclusão que não importa em juízo definitivo sobre o tema e nem em exclusão da responsabilidade prevista em lei, podendo ser revista em outros processos. Exclusão dos responsáveis da condição de parte.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de contribuições de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridades, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Fixação do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário em um mês. Aplicação do princípio da razoabilidade.

Determinado o recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Desaprovação.

(PC 64-65, Rel. Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julg. em 23.6.2015.)

Deixa-se, portanto, de acolher a preliminar suscitada.

No mérito, as contas da agremiação recorrente foram desaprovadas em razão de diversas irregularidades: realização de despesas junto a pessoas jurídicas sem emissão de nota fiscal, movimentação de recursos financeiros sem trânsito pela conta bancária, existência de sobras de campanha de candidato não registradas no Demonstrativo de Sobras de Campanha e recebimento de R$ 2.653,00 oriundos de fontes vedadas.

O recorrente direciona seu inconformismo apenas à glosa dos valores recebidos de autoridades como fonte vedada. Argumenta a legalidade das contribuições sob a alegação de que autorizadas pelo estatuto partidário e que, quando realizadas, o entendimento era outro.

Sem razão o recorrente.

O art. 31, II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38

No conceito de autoridade pública previsto no artigo referido inserem-se os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.) (Grifei.)

Reproduzo trechos extraídos do referido acórdão, que bem explicitam a decisão:

[…] podemos concluir que os detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, e por via reflexa os dos Estados e dos Municípios, são considerados autoridade pública, ante a natureza jurídica dos cargos em comissão, bem como das atividades dele decorrentes.

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

Esse recebimento poderia quebrar o equilíbrio entre as agremiações partidárias. Contraria o princípio da impessoalidade, ao favorecer o indicado de determinado partido, interferindo no modo de atuar da administração pública. Fere o princípio da eficiência, ao não privilegiar a mão de obra vocacionada para as atividades públicas, em detrimento dos indicados políticos, desprestigiando o servidor público. Afronta o princípio da igualdade, pela prevalência do critério político sobre os parâmetros da capacitação profissional.

[…]

[...] Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

Dessa forma, quando realizadas as doações – em 2012 – , diferentemente do alegado pelo partido, o próprio TSE já havia firmado o entendimento no sentido de considerá-los como autoridades públicas.

A vedação decorrente do entendimento firmado pela Corte Superior na aludida consulta vem sendo confirmada pelos Tribunais, como se verifica pelas seguintes ementas:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator DR. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015, Página 02.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008.

Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/2007 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95.

Desaprovação das contas pelo julgador originário.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático.

Provimento negado.

(TRE – RS, RE 100000525, Relatora Desa. Federal Elaine Harzheim Macedo, 25.4.2013.)

Na hipótese, conforme se depreende do parecer conclusivo (fl. 126), a agremiação recebeu um total de R$ 2.653,00, dos seguintes filiados ocupantes de cargos de chefia na administração municipal: Ereni Maciel Szulczewski – Secretária-Geral – R$ 1.015,00; José Francisco Vieira da Silva – Diretor de Desporto, Secretário Municipal de Meio Ambiente e Diretor de Transporte e Trânsito – R$ 478,00 e Renato Antonio Kranz – Secretário Municipal de Educação e Cultura e Diretor de Departamento de Educação – R$ 1.160,00, os quais se enquadram no conceito de autoridade pública, nos termos em que definido pela jurisprudência.

Ainda sobre este ponto, convém referir que a sentença determinou o recolhimento do montante irregular (R$ 2.653,00) para o Fundo Partidário. Contudo, esta Corte já se posicionou no sentido de que o referido valor deve ser transferido ao Tesouro Nacional, tendo em vista a natureza procedimental da norma sobre o destino da verba irregular, como se verifica pela seguinte ementa:

Prestação de contas anual. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012.

Verificada a existência de recursos de origem não identificada, bem como de arrecadações oriundas de fontes vedadas, realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, na condição de autoridades e desempenhando funções de direção ou chefia. No caso, Chefe de Gabinete, Coordenador-Geral e Diretor.

Nova orientação do TSE no sentido de que tais verbas – de origem não identificada e de fontes vedadas – devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto na Resolução TSE n. 23.464/15.

Aplicação dos parâmetros da razoabilidade para fixar a sanção do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário em um mês.

Desaprovação.

(TRE-RS - PC 72-42 ,Rel. Dra. MARIA DE LOURDES GALVÃO BRACCINI DE GONZALEZ. Sessão de 04.5.2016.)

Por fim, no tocante à suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, fixado pelo prazo de um ano na sentença, este Tribunal tem entendido pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que prevê suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, aplicando-se os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

No mesmo sentido o Tribunal Superior Eleitoral utiliza tais parâmetros, a fim de verificar a adequação da sanção. Destaco o seguinte precedente:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI 9.096/95. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 36, II, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA.

1. Na espécie, o TRE/SC, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, concluiu que o recebimento de recursos no valor de R$ 940,00 oriundos de fonte vedada de que trata o art. 31, II, da Lei 9.096/95 – doação realizada por servidor público ocupante de cargo público exonerável ad nutum – comporta a adequação da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.

2. De acordo com a jurisprudência do TSE, a irregularidade prevista no art. 36, II, da Lei 9.096/95 – consistente no recebimento de doação, por partido político, proveniente de fonte vedada – admite a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção.

3. Agravo regimental não provido.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, Acórdão de 29.8.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 180, Data 19.9.2013, Página 71.)

No caso dos autos, o partido arrecadou o total de R$ 2.823,00, dos quais R$ 2.653,00, equivalente a 94%, se originam de fonte vedada. Embora corresponda a quase totalidade dos recursos arrecadados, o montante irregular é bastante reduzido. Ademais, não se verifica má-fé do ente partidário, de forma que a suspensão do repasse do Fundo Partidário por elevado período de tempo restaria desproporcional, podendo a sanção de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário ser reduzida para o período de quatro meses.

Ante todo o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, apenas para reduzir a pena de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário para quatro meses, determinando que o recolhimento dos recursos oriundos de fonte vedada seja feito ao Tesouro Nacional.