RE - 953 - Sessão: 26/08/2016 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face de sentença que aprovou com ressalvas as contas referentes ao exercício financeiro de 2014 do PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO - PTB de Giruá (fls. 85-86v.).

Em suas razões, o recorrente alega que é indispensável a abertura de conta bancária, a fim de permitir a correta análise da movimentação financeira do partido e que a sua falta constitui irregularidade insanável. Requer a reforma da sentença e o julgamento de desaprovação das contas (fls. 90-92v.).

O partido não apresentou contrarrazões (fl. 95) e, nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opina, preliminarmente, pela anulação da sentença e, no mérito, pelo provimento do recurso para desaprovar as contas, bem como pela aplicação da pena de suspensão do recebimento de verbas do Fundo Partidário pelo período de 12 meses (fls. 97-106).

É o relatório.

 

VOTOS

Dra. Maria de Lourdes Galvao Braccini de Gonzalez (relatora):

O recurso é tempestivo. O Ministério Público foi intimado da decisão em 20.04.16 (fl. 87) e o recurso interposto no dia 22 do mesmo mês (fls. 90-92v.), dentro do prazo previsto pelo art. 258 do Código Eleitoral.

 

 

Preliminar

Da nulidade por ausência de citação dos dirigentes do partido

De início, trato da questão suscitada pelo d. Procurador Regional Eleitoral, relativa à inclusão dos dirigentes partidários no polo passivo. Fundamentalmente, o Parquet Eleitoral sustenta (fls. 102-v) que:

No caso vertente, sendo as contas partidárias referentes ao exercício de 2014, face ao que prevê o art. 65 da Resolução TSE nº 23.464/15, o mérito continuará a ser examinado frente à ótica da Resolução TSE nº 21.841/2004, que regula aquele exercício, inclusive no aspecto da responsabilidade dos dirigentes partidários, mas as regras instrumentais devem seguir a Resolução TSE nº 23.464/15.

Em outras palavras, de acordo com a seguinte conclusão, direito processual e direito material revelam-se na mais perfeita compatibilidade: (a) os dirigentes partidários devem ser citados e incluídos como partes no processo, interpretação cristalina que se depreende do art. 38 da resolução de regência e das teorias da aplicação imediata e do isolamento das regras processuais; (b) eventual responsabilidade que lhes seja atribuída permanece sendo de natureza subsidiária, no caso concreto, por refletir a norma de direito material vigente para as contas partidárias do exercício de 2014; (c) porém, a satisfação da obrigação, seja em relação ao partido, seja em relação aos responsáveis legais, não mais necessitará da instauração de tomada de contas especial, devendo dar-se via cumprimento de sentença, nos próprios autos da prestação de contas, o que pressupõe a regular citação.

Além disso, a intimação ou a citação da agremiação e de seus dirigentes não caracterizam uma sanção, pelo contrário, traduzem o direito à ampla defesa e ao contraditório constitucionalmente protegidos. Direito que deve ser assegurado, inclusive, sob pena de eventual futura alegação de nulidade.

Por fim, vale ressaltar que a nova Resolução apenas criou a possibilidade dos dirigentes defenderem-se. Não há falar em alteração do julgamento de mérito pela adoção das novas disposições atinentes à intimação do presidente e do tesoureiro do partido, haja vista que, conforme já analisado acima, a Lei nº 9.096/95, em seus artigos 34, II e 37, já previa a possibilidade de responsabilização dos dirigentes pela falta de prestação de contas ou pelas irregularidades constatadas na escrituração e na prestação de contas, bem como, no mesmo sentido, os arts. 18, 20, 28 e 33, da Resolução TSE nº 21.841/04. [...] (Grifos do original.)

E, muito embora as consideráveis razões, mantenho a decisão no sentido de que os dirigentes não integrem a demanda. Com a devida vênia, não há como admitir que a vinda ao processo, para responsabilização inédita dos dirigentes partidários, seja caracterizada como norma de cunho instrumental.

À evidência, nas prestações de contas já em tramitação no tribunal (incluindo o caso posto) quando do advento da Resolução TSE n. 23.464/15, a formação do litisconsórcio necessário poderia interferir no mérito das contas, conforme o acórdão da PC n. 64-65, de relatoria do Dr. Leonardo Saldanha, julgada na sessão de 23.6.2015, em que, por unanimidade, foi determinada a exclusão dos dirigentes partidários do feito.

Depois disso, no julgamento do Agravo Regimental na PC n. 79-63, referente ao exercício do ano de 2014, também de relatoria do Dr. Leonardo e ocorrido na sessão de 06.8.2015, esta Corte assentou que a Resolução TSE n. 23.432/14 alterou a forma de responsabilização dos dirigentes partidários, circunstância que dispõe sobre o mérito:

Agravo Regimental. Prestação de contas. Partido político. Exercício financeiro de 2014.

Interposição contra decisão monocrática que determinou a exclusão dos dirigentes partidários do feito, mantendo-se apenas a agremiação como parte. Vigência da novel Resolução TSE n. 23.432/14, instituindo mudanças de procedimentos, como a formação de litisconsórcio necessário entre partido e dirigentes.

Previsão inserida no novo texto legal, limitando a sua aplicação em matéria que envolva o mérito das prestações de contas de exercícios anteriores a 2015, a fim de evitar eventual descompasso com o princípio basilar da segurança jurídica e da estabilidade das relações processuais. A responsabilização dos dirigentes partidários pelas irregularidades nas contas dos partidos diz respeito ao direito material, e não ao direito processual.

Cabe aos responsáveis pela administração dos recursos movimentados pelo partido responder, na esfera cível, por improbidade administrativa pela má aplicação dos recursos provenientes do Fundo Partidário. São passíveis, igualmente, de responder na seara criminal por ofensa à fé pública eleitoral.

Prevalência do princípio do tempus regit actum. Aplicação, in casu, das disposições da Resolução TSE n. 21.841/04, que não previa a apuração da responsabilidade solidária aos dirigentes partidários no julgamento das contas. Provimento negado. (Ag. Reg. na PC n. 79-63, Publicação em 10.8.2015, Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS n. 144, Pag. 3.)

Amparada em tais precedentes, afasto a preliminar.

 

Mérito

Da ausência de abertura de conta bancária

O Partido Trabalhista Brasileiro - PTB de Giruá teve suas contas relativas ao exercício de 2014 aprovadas com ressalvas. A Juíza Eleitoral pontuou que:

Realizada a análise técnica das contas, verificou-se que o partido não recebeu recursos do Fundo Partidário, uma vez que não há indícios de repasse desses recursos por parte dos diretórios nacional e estadual. No entanto, foram verificadas impropriedades e irregularidades nas contas analisadas que dizem respeito à ausência de conta e extratos bancários e de escrituração contábil de despesa no período de competência da prestação de contas. A análise técnica também não atestou a movimentação financeira do partido, em razão da ausência de conta e extratos bancários. [...]

Dessa forma, entendo que não houve má-fé ou desídia do partido, pois assim que teve conhecimento das falhas apontadas, providenciou as correções que se faziam possíveis, trazendo aos autos todos os esclarecimentos necessários à análise das contas. (Fls. 85-86v.)

Entretanto, esta Corte tem entendido que a abertura de conta bancária, para o registro da movimentação financeira e a apresentação dos extratos bancários correspondentes, constitui providência imprescindível, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido Político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício de 2014. Irresignação contra decisão que desaprovou suas contas relativas ao exercício financeiro em exame e aplicou a penalidade de suspensão de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano.

As disposições dos artigos 4º e 13, ambos da Resolução TSE n. 21.841/04, tornam obrigatória a abertura de conta bancária, ainda que não tenha havido movimentação financeira no período. Sua ausência e, em decorrência, dos respectivos extratos bancários, comprometem o controle e a confiabilidade das contas. Aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para, de ofício, reduzir a penalidade de suspensão das quotas do Fundo Partidário para o período de dois meses. Provimento negado. (PC RE n. 17-96, Relatora Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja. Julgado em 25.02.2016.)

 

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral.

Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado. (PC RE n. 33-50, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz. Julgado em 25.01.2016.)

De acordo com o disposto nos arts. 4º e 13 da Resolução TSE n. 21.841/04, necessária a manutenção de conta bancária ainda que não tenha havido o alcance de verbas de qualquer natureza à sigla partidária, como adiante se observa:

Art. 4º O partido político pode receber cotas do Fundo Partidário, doações e contribuições de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro de pessoas físicas e jurídicas, devendo manter contas bancárias distintas para movimentar os recursos financeiros do Fundo Partidário e os de outra natureza (Lei nº 9.096/95, art. 39, caput).

 

Art. 13. (…)

Parágrafo único. O não-recebimento de recursos financeiros em espécie por si só não justifica a apresentação de prestação de contas sem movimento, devendo o partido registrar todos os bens e serviços estimáveis em dinheiro recebidos em doação, utilizados em sua manutenção e funcionamento.

Nesse sentido, vale dizer que as falhas apontadas ferem os arts. 1º e 14 da mencionada resolução, os quais dispõem, respectivamente, que a prestação de contas ofertada deve refletir a real movimentação financeira e patrimonial do partido político, mostrando-se obrigatório vir acompanhada das peças e documentos necessários à apreciação da contabilidade pela Justiça Eleitoral.

Daí, as irregularidades presentes comprometem o controle e confiabilidade das receitas e despesas, não autorizando a aprovação das contas em virtude da aplicação do princípio da transparência.

Ademais, ainda que se compreendam as dificuldades por que passam os partidos políticos nos municípios de menor porte, essa circunstância não permite o desconhecimento da lei, tampouco o seu descumprimento.

Assim, as omissões do partido frustraram o emprego dos procedimentos técnicos de análise das contas, restando prejudicado o seu exame, determinando forte juízo de reprovação, com base nas alíneas “a”, “b” e “c” do inc. III do art. 24 da Resolução TSE n. 21.841/04, de forma a ser fixada como consequência a pena de suspensão de repasse de verbas do Fundo Partidário.

Em relação a essa penalidade, julgo que, em consonância com a jurisprudência deste Tribunal, a qual tem entendido pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, na redação anterior à Lei  n. 13.165/15 – suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses -, a aludida sanção deve limitar-se a 2 (dois) meses, adotando-se os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, em razão da natureza da falha apontada e das circunstâncias do caso ora analisado.

Ressalto, por fim, que a jurisprudência deste Tribunal está consolidada no sentido da não aplicação da Lei n. 13.165/15 (Reforma Eleitoral) aos processos que já tramitavam antes da sua publicação.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para o fim de desaprovar as contas do PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO - PTB de Giruá referentes ao exercício de 2014 e determinar a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo período de 02 meses.