RE - 1477 - Sessão: 26/07/2016 às 17:00

RELATÓRIO

O PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO – PMDB, de Pinheirinho do Vale, interpõe recurso contra sentença que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira do exercício de 2014 e aplicou a penalidade de suspensão de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano, em virtude da ausência de extratos bancários relativos aos meses de janeiro e fevereiro (fls. 75-76v).

Em suas razões, o recorrente alega que a ausência dos extratos deve-se ao fato de a conta ter sido encerrada pelo banco, no exercício anterior, por ausência de movimentação, tendo sido reaberta em março de 2014, após regularização do diretório municipal. Sustenta que diretórios de municípios pequenos, como é o caso de Pinheirinho do Vale, não costumam ter atividades permanentes, as quais ocorrem, em regra, em períodos eleitorais, bem ainda, que a ausência de apenas dois extratos não causou prejuízo à contabilidade. Requer a reforma da sentença para o fim de aprovar as contas. Alternativamente, pede a aprovação com ressalvas.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que suscitou preliminar de nulidade por ausência de citação dos responsáveis partidários e, no mérito, opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 90-99v).

Na sessão, em questão de ordem, o d. Procurador Regional Eleitoral ressaltou que a condução do julgamento criou uma situação inovadora.  Argumentou que o voto divergente suscitou novos fundamentos, e, visto que a manifestação do Ministério Público se dá no início, entendia que, eventual e excepcionalmente, poderia lhe ser facultada a palavra.

Acrescentou que a relevância da manutenção da conta por parte dos órgãos partidários, para fins de verificação da regularidade do recebimento e gastos dos recursos, seria indispensável, tanto que na legislação não há brecha que permita a inexistência de conta por sequer um dia, não se tratando de mero formalismo legal.

Por fim, concluiu que "[...] talvez a inexistência de conta – encerramento e reabertura de nova conta por um período bastante curto –, devesse ser levado em consideração no momento de se aplicar a penalidade de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário, mas não quanto à decisão de desaprovação das contas."

É o relatório.

 

VOTOS

Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja (relatora):

Eminentes Colegas:

 

Tempestividade

O recorrente foi intimado da sentença em 28.4.2016, quinta-feira (fl. 78), e a peça recursal protocolada em 03.5.2016, terça-feira, fora do prazo de três dias estatuído no art. 258 do Código Eleitoral, fato que, em tese, levaria à sua intempestividade.

Todavia, ao tempo da interposição do recurso, não havia, no âmbito da Justiça Eleitoral, norma que disciplinasse a contagem de prazo depois do advento do Código de Processo Civil, o qual instituiu, no art. 219, que sejam computados apenas os dias úteis.

Tal lacuna foi suprida com a publicação, pelo Tribunal Superior Eleitoral, da Resolução n. 23.478, em 15.6.2016, a qual disciplina que “Em razão da especialidade da matéria, as ações, os procedimentos e os recursos eleitorais permanecem regidos pelas normas específicas previstas na legislação eleitoral e nas instruções do Tribunal Superior Eleitoral” (art. 2º) e dispõe, no art. 7º, que “O disposto no art. 219 do Novo Código de Processo Civil não se aplica aos feitos eleitorais”.

Assim, tendo o recurso sido interposto antes da publicação da mencionada resolução, deve ser conhecido.

 

 

Preliminar

Inicialmente, abordo a questão suscitada pelo douto procurador regional eleitoral em seu parecer, relativa à inclusão dos dirigentes partidários como parte da presente prestação de contas.

No ponto, este Tribunal sedimentou a posição de que as regras que versam sobre a responsabilização solidária dos dirigentes possuem cunho material, devendo ser aplicadas apenas às prestações de contas relativas ao ano de 2015 e seguintes.

A propósito, no julgamento do Agravo Regimental na PC n. 79-63, em 06.8.2015, referente ao exercício do ano de 2014, de relatoria do Dr. Leonardo Tricot Saldanha, esta Corte assentou que a Resolução TSE n. 23.432/14 alterou a forma de responsabilização dos dirigentes partidários, circunstância que dispõe sobre o mérito:

Agravo Regimental. Prestação de contas. Partido político. Exercício financeiro de 2014.

Interposição contra decisão monocrática que determinou a exclusão dos dirigentes partidários do feito, mantendo-se apenas a agremiação como parte. Vigência da novel Resolução TSE n. 23.432/14, instituindo mudanças de procedimentos, como a formação de litisconsórcio necessário entre partido e dirigentes.

Previsão inserida no novo texto legal, limitando a sua aplicação em matéria que envolva o mérito das prestações de contas de exercícios anteriores a 2015, a fim de evitar eventual descompasso com o princípio basilar da segurança jurídica e da estabilidade das relações processuais. A responsabilização dos dirigentes partidários pelas irregularidades nas contas dos partidos diz respeito ao direito material, e não ao direito processual.

Cabe aos responsáveis pela administração dos recursos movimentados pelo partido responder, na esfera cível, por improbidade administrativa pela má aplicação dos recursos provenientes do Fundo Partidário. São passíveis, igualmente, de responder na seara criminal por ofensa à fé pública eleitoral.

Prevalência do princípio do tempus regit actum. Aplicação, in casu, das disposições da Resolução TSE n. 21.841/04, que não previa a apuração da responsabilidade solidária aos dirigentes partidários no julgamento das contas. Provimento negado. (Ag. Reg. na PC n. 79-63, Publicação em 10.82015, Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS n. 144, Pag. 3).

Portanto, por entender que a Resolução TSE n. 21.841/04 não previa a apuração da responsabilidade solidária dos dirigentes partidários no julgamento das contas, afasto a preliminar suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral.

 

Mérito

O recorrente teve as contas relativas ao exercício de 2014 desaprovadas em razão da ausência de extratos bancários referentes aos meses de janeiro e fevereiro, sendo sancionado com a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano.

Anoto que o parecer conclusivo apontou outras irregularidades, como ausência de peças obrigatórias, as quais foram sanadas pelo partido por ocasião da apresentação da defesa, permanecendo a irregularidade relativa aos extratos bancários.

A agremiação sustenta que a conta bancária foi encerrada pela instituição financeira, por ausência de movimentação, em maio de 2013 e reaberta em março de 2014, data a partir da qual passou a movimentar recursos. Argumenta que a ausência de apenas dois extratos não compromete a regularidade das contas.

Todavia, sem razão o partido.

A Resolução TSE n. 21.841/04, aplicável ao mérito das contas em análise, elenca, no art. 14, incs. I e II, as peças obrigatórias que devem instruir a prestação de contas dos partidos políticos, dentre elas: “extratos bancários consolidados e definitivos das contas referidas no inciso anterior, do período integral do exercício ao qual se refere a prestação de contas”. (Grifei.)

Sem a apresentação dos extratos bancários, as informações prestadas não se revestem da segurança suficiente para o efetivo controle das contas partidárias, conforme já se manifestou a jurisprudência:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral. Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n. 3350, Acórdão de 25.1.2016, Relator DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 16, Data 29.01.2016, Página 4)

 

EMENTA - PRESTAÇÃO DE CONTAS - PARTIDO POLÍTICO - DIRETÓRIO ESTADUAL - EXERCÍCIO FINANCEIRO 2012 - LEI N. 9.096/95 E RESOLUÇÃO TSE N. 21.841/04 - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS - CONTAS DESAPROVADAS.

1. A ausência de documentos exigidos pela legislação, dentre eles os extratos bancários consolidados e definitivos, impede o efetivo controle da Justiça Eleitoral sobre as contas dos partidos políticos, ensejando a sua desaprovação.

2. A ausência de movimentação financeira por parte do partido ou ausência de recebimento de quotas do fundo partidário não afasta a agremiação partidária da obrigatoriedade de apresentar os documentos indispensáveis elencados no artigo 13 da Lei nº 9.096/95, os quais são essenciais para a comprovação do não recebimento de recursos.

(PRESTACAO DE CONTAS n. 29193, Acórdão n. 46985 de 25.3.2014, Relatora RENATA ESTORILHO BAGANHA, Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 28.3.2014).

Conforme os arts. 4º e 13 da Resolução TSE n. 21.841/04, aplicável, em relação ao mérito, às contas em exame, é necessária a manutenção de conta bancária ainda que não tenha havido o recebimento de verbas de qualquer natureza, como adiante se observa:

Art. 4º O partido político pode receber cotas do Fundo Partidário, doações e contribuições de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro de pessoas físicas e jurídicas, devendo manter contas bancárias distintas para movimentar os recursos financeiros do Fundo Partidário e os de outra natureza (Lei nº.9.096/95, art. 39, caput).

 

Art. 13. (…)

Parágrafo único. O não-recebimento de recursos financeiros em espécie por si só não justifica a apresentação de prestação de contas sem movimento, devendo o partido registrar todos os bens e serviços estimáveis em dinheiro recebidos em doação, utilizados em sua manutenção e funcionamento.

Nesse sentido a jurisprudência desta Corte:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Arts. 4º, caput e 14, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014.

A abertura de conta bancária é obrigatória, independentemente de ter havido movimentação financeira no período. Falha de natureza grave que impede a apresentação de extratos bancários correlatos, os quais são imprescindíveis para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros, bem como para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira. Irregularidade insuperável, a comprometer, modo substancial, a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral.

As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes da sua vigência.

Redimensionamento do quantum de suspensão de cotas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 2743, Acórdão de 08.10.2015, Relator DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 187, Data 13.10.2015, Página 4).

Portanto, a ausência de conta bancária, ainda que no período de dois meses e, em consequência, de extratos bancários, compromete o controle e a confiabilidade das contas, visto servir para comprovar tanto a movimentação financeira quanto, eventualmente, a sua ausência.

Ainda que se compreenda as dificuldades enfrentadas pelos partidos políticos nos municípios do interior do Estado, esta circunstância não justifica o desconhecimento da lei, tampouco o seu descumprimento.

Dessa forma, as omissões do partido frustraram a análise técnica das contas, restando correto o juízo de desaprovação, com base na al. “a”, inc. III, do art. 24 da Resolução TSE n. 21.841/04.

A desaprovação das contas leva à aplicação da segunda consequência do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, em sua redação original, relativa à suspensão de novas quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um a doze meses.

O juízo originário aplicou a sanção no patamar máximo: doze meses.

Todavia, a sanção merece ser apreciada para melhor adequar-se às particularidades do caso concreto e, com isso, atender aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade que devem balizar a sua dosimetria.

Nesse sentido, entendo que a natureza e a gravidade das falhas, o nível de organização e estrutura do órgão partidário e a dimensão do município em que instalado autorizam, na hipótese dos autos, o redimensionamento da penalidade para um mês de suspensão.

Desse modo, a sentença merece reforma apenas no ponto em que cominou ao partido a pena de suspensão das quotas do Fundo Partidário pelo período de doze meses, reduzindo-se esse prazo para um mês de suspensão.

Ressalto, por fim, que a jurisprudência deste Tribunal está consolidada no sentido da não aplicação da Lei n. 13.165/15 (Reforma Eleitoral) aos processos que já tramitavam antes da sua publicação.

Diante do exposto, VOTO no sentido de rejeitar a preliminar suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral e, no mérito, negar provimento ao recurso, reduzindo, de ofício, o período de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário de doze para um mês, com base no art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95.

É como voto, Senhora Presidente.

 

(Após votar a relatora, que negava provimento ao recurso, pediu vista o Dr. Silvio. Os demais relatores aguardam o voto-vista. Julgamento suspenso.)