RE - 2245 - Sessão: 31/08/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - PMDB de Esteio contra sentença que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira do exercício de 2014, em virtude da inexistência de extratos bancários e diante do recebimento de doações de fonte vedada, determinando o recolhimento do valor de R$ 17.130,00 ao Tesouro Nacional e a suspensão de repasses do Fundo Partidário pelo período de 12 meses (fls. 162-164).

Em sua irresignação (fls. 168-169), o recorrente argumenta que as contribuições foram autorizadas pelo estatuto partidário e foram realizadas por servidores detentores de cargos de chefia e assessoramento, que não se confundem com autoridades públicas. Alega, ainda, ter demonstrado toda a movimentação financeira por meio de seus balancetes. Requer a reforma da decisão recorrida.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 174-187v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no dia 27 de abril de 2016 (fl. 170), mesmo dia em que foi interposto o recurso (fl. 167), dentro, portanto, do prazo de 3 dias previsto pelo art. 258 do Código Eleitoral.

Preliminarmente, a Procuradoria Regional Eleitoral suscitou preliminar de nulidade do feito, por ausência de citação das pessoas físicas responsáveis pelas contas partidárias.

Não merece ser acolhida a preliminar. Os autos tratam de contas relativas ao exercício financeiro de 2014, período no qual não era exigida a participação dos responsáveis na prestação das contas. Diante disso, esta Corte firmou entendimento no sentido de que a inclusão dessas pessoas no processo é norma de direito material, pois pode levar ao reconhecimento da responsabilidade solidária dos dirigentes partidários por eventuais irregularidades das contas. Transcrevo a seguinte ementa, que ilustra esse entendimento:

Prestação de contas. Partido político. Diretório Estadual. Contribuição de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2012.

Preliminar. Vigência da Resolução TSE n. 23.432/14. Inaplicabilidade in casu, em consonância a entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de manter apenas a agremiação partidária como parte, a partir da análise do caso concreto e da fase processual em que se encontra o feito. Conclusão que não importa em juízo definitivo sobre o tema e nem em exclusão da responsabilidade prevista em lei, podendo ser revista em outros processos. Exclusão dos responsáveis da condição de parte.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de contribuições de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridades, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Fixação do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário em um mês. Aplicação do princípio da razoabilidade.

Determinado o recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Desaprovação.

(PC 64-65, Rel. Dr. Leonardo Tricot Saldanha, julg. Em 23.6.2015.)

Deixa-se, portanto, de acolher a preliminar suscitada.

No mérito, as contas da agremiação recorrente foram desaprovadas devido à ausência de documentos essenciais para demonstrar a movimentação financeira e diante do recebimento de recursos provenientes de fontes vedadas.

O recorrente argumenta ter comprovado a circulação dos recursos partidários e aduz que as doações consideradas irregulares são originárias de detentores de cargos em comissão, e não de autoridades públicas.

A sentença merece parcial reforma.

A agremiação deixou de apresentar documentos imprescindíveis à segura fiscalização contábil, como apontou o parecer conclusivo (fl. 143):

[...] Não foram apresentados os extratos bancários, o demonstrativo de controle de despesas com pessoal e o demonstrativo de fluxos de caixa foi apresentado em branco, sem a devida contabilização, em desacordo com a legislação contábil eleitoral (Resolução CFC n. 1.409/12; art. 176, inc. I, da Lei n. 6404/76; orientação ASEPA n. 2 e Resolução TSE n. 23.432/14, art. 29, § 1º, incs. V e XVIII.)

Na busca pelo efetivo controle do ingresso de recursos e realização de despesas, a legislação estabelece que “as doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político ou por depósito bancário diretamente na conta do partido político” (na redação original do art. 39, da Lei 9096/95, vigente à época do exercício financeiro), reforçando a importância de manter conta bancária e apresentar seus extratos como documentos necessários à demonstração segura da movimentação financeira do partido.

Sem a apresentação dos extratos bancários, as informações prestadas não se revestem da segurança suficiente para o efetivo controle das contas partidárias, conforme já se manifestou a jurisprudência:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral. Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n. 3350, Acórdão de 25.01.2016, Relator DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 16, Data 29.01.2016, Página 4.)

 

EMENTA - PRESTAÇÃO DE CONTAS - PARTIDO POLÍTICO - DIRETÓRIO ESTADUAL - EXERCÍCIO FINANCEIRO 2012 - LEI N. 9.096/95 E RESOLUÇÃO TSE N. 21.841/04 - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS - CONTAS DESAPROVADAS.

1. A ausência de documentos exigidos pela legislação, dentre eles os extratos bancários consolidados e definitivos, impede o efetivo controle da Justiça Eleitoral sobre as contas dos partidos políticos, ensejando a sua desaprovação.

2. A ausência de movimentação financeira por parte do partido ou ausência de recebimento de quotas do fundo partidário não afasta a agremiação partidária da obrigatoriedade de apresentar os documentos indispensáveis elencados no artigo 13 da Lei nº 9.096/95, os quais são essenciais para a comprovação do não recebimento de recursos.

(PRESTACAO DE CONTAS n. 29193, Acórdão n. 46985 de 25.3.2014, Relator RENATA ESTORILHO BAGANHA, Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 28.3.2014.)

Da mesma forma, verifica-se o recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas. Com efeito, o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38.

No conceito de autoridade pública previsto no artigo referido, inserem-se os detentores de cargos comissionados que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/07, editada em resposta à Consulta 1428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.9.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.)

(Grifei.)

Reproduzo trechos extraídos do referido acórdão, que bem explicitam a decisão:

[…] podemos concluir que os detentores de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta da União, e por via reflexa os dos Estados e dos Municípios, são considerados autoridade pública, ante a natureza jurídica dos cargos em comissão, bem como das atividades dele decorrentes.

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

Esse recebimento poderia quebrar o equilíbrio entre as agremiações partidárias. Contraria o princípio da impessoalidade, ao favorecer o indicado de determinado partido, interferindo no modo de atuar da administração pública. Fere o princípio da eficiência, ao não privilegiar a mão-de-obra vocacionada para as atividades públicas, em detrimento dos indicados políticos, desprestigiando o servidor público. Afronta o princípio da igualdade, pela prevalência do critério político sobre os parâmetros da capacitação profissional.

[…]

(...) Estamos dando interpretação dilatada. Estamos dizendo que autoridade não é somente quem chefia órgão público, quem dirige entidade, o hierarca maior de um órgão ou entidade. Estamos indo além: a autoridade é também o ocupante de cargo em comissão que desempenha função de chefia e direção.

[…]

Está claro. A autoridade não pode contribuir. Que é a autoridade? É evidente que o hierarca maior de um órgão ou entidade já não pode contribuir, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista, e, além disso, os ocupantes de cargo em comissão.

[…]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

A vedação decorrente do entendimento firmado pela Corte Superior na aludida consulta vem sendo confirmada por este Tribunal, como se verifica pelas seguintes ementas:

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Doação de fonte vedada. Art. 31, II, da Lei n. 9.096/95. Exercício financeiro de 2013.

Desaprovam-se as contas quando constatado o recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que detenham condição de autoridade, vale dizer, desempenhem função de direção ou chefia.

Redução, de ofício, do período de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, conforme os parâmetros da razoabilidade. Manutenção da sanção de recolhimento de quantia idêntica ao valor recebido irregularmente ao Fundo Partidário.

Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 2346, Acórdão de 12.3.2015, Relator DR. INGO WOLFGANG SARLET, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 45, Data 16.3.2015, Página 02.)

 

Recurso. Prestação de contas de partido político. Doação de fonte vedada. Exercício financeiro de 2008.

Doações de autoridades titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta, prática vedada pela Resolução TSE n. 22.585/07 e pelo inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95.

Desaprovação das contas pelo julgador originário.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Razoável e proporcional a aplicação, de ofício, de 6 meses de suspensão das quotas do Fundo Partidário, a fim de colmatar lacuna da sentença do julgador monocrático.

Provimento negado.

(TRE – RS, RE 100000525, Relatora Desa. Federal Elaine Harzheim Macedo, 25.4.2013.)

Na hipótese, os documentos das folhas 116 a 121 dos autos atestam que a agremiação recebeu a quantia de R$ 17.130,00 de ocupantes de cargos de chefia, como diretores, coordenadores e secretários, os quais se enquadram no conceito de autoridade pública, nos termos definidos pela jurisprudência.

Por fim, no tocante à suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, fixado pelo prazo de 01 ano na sentença, este Tribunal tem entendido pela aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que prevê suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, adotando-se os critérios de razoabilidade e proporcionalidade.

No mesmo sentido o Tribunal Superior Eleitoral utiliza tais parâmetros, a fim de verificar a adequação da sanção. Destaco o seguinte precedente:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI 9.096/95. SUSPENSÃO DE COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 36, II, DA LEI 9.504/97. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA.

1. Na espécie, o TRE/SC, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, concluiu que o recebimento de recursos no valor de R$ 940,00 oriundos de fonte vedada de que trata o art. 31, II, da Lei 9.096/95 – doação realizada por servidor público ocupante de cargo público exonerável ad nutum – comporta a adequação da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.

2. De acordo com a jurisprudência do TSE, a irregularidade prevista no art. 36, II, da Lei 9.096/95 -consistente no recebimento de doação, por partido político, proveniente de fonte vedada – admite a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade na dosimetria da sanção.

3. Agravo regimental não provido.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 4879, Acórdão de 29.8.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo 180, Data 19.9.2013, Página 71.)

No caso dos autos, o partido arrecadou o total de R$ 40.060,00, dos quais R$ 17.130,00 se originam de fonte vedada. Ademais, não houve a apresentação de extratos bancários, documentos essenciais para garantir a confiabilidade das contas. Dessa forma, entendo adequado para o caso fixar a pena de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 05 meses.

Ante todo o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, apenas para reduzir a pena de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para 05 meses.