PET - 4554 - Sessão: 18/07/2016 às 17:00

RELATÓRIO

 Cuida-se de ação de decretação de perda de mandato eletivo formulada pelo PARTIDO POPULAR SOCIALISTA - PPS em face de FELIPE SCHOSSLER (vereador de Estrela/RS), com base em alegada desfiliação partidária sem justa causa, nos termos do art. 22-A da Lei n. 9.096/95 (fls. 02-04).

O autor narra que, em 06 de abril de 2016, o requerido desfiliou-se imotivadamente do PPS, sem que tivesse amparado pela justa causa introduzida pela Lei n. 13.165/15, visto que fora do período previsto para mudança de partido. Requer, portanto, a decretação da perda do cargo eletivo.

Após análise do pedido, determinei a citação do demandado e, por economia processual e celeridade, do PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO DE ESTRELA.

Em sua resposta (fls. 29-41), o vereador Felipe Schossler argui a decadência do direito de ação do demandante e, no mérito, alega estar amparado pela justa causa prevista na Lei n. 13.165/15, que incluiu o art. 22-A na Lei n. 9.096/95, visto que se filiou ao PTB em 05 de março de 2016. Afirma não ser possível se falar em duplicidade de filiação e pede a improcedência da ação, juntando documentos.

O PTB de Estrela, em sua resposta, reproduz os termos da defesa do vereador (fls. 96-101), à exceção da matéria relativa à dupla filiação.

Em seu parecer (fls. 108-112), a Procuradoria Regional Eleitoral refutou a configuração da decadência, apontou a existência de justa causa e manifestou-se pela improcedência do pedido.

Não sendo o caso de instrução probatória, abriu-se prazo para alegações finais, quando o PTB (fls. 118-120) e Felipe Schossler (fls. 122-124) reforçaram o argumento da existência de justa causa e o PPS manteve-se silente (fl. 125).

A Procuradoria Regional Eleitoral ratificou o parecer exarado anteriormente.

É o relatório.

 

VOTO

Preliminar

Da decadência

A Resolução TSE n. 22.610/07, não obstante a superveniência das alterações promovidas pela Lei n. 13.165/15, continua a ser o diploma que disciplina o processo de perda de cargo eletivo.

Tal resolução determina, no parágrafo segundo de seu primeiro artigo, que “Quando o partido político não formular o pedido dentro de 30 (trinta) dias da desfiliação, pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 (trinta) subseqüentes, quem tenha interesse jurídico ou o Ministério Público eleitoral”.

No caso em análise, o vereador requerido postula a declaração da decadência do direito de ação e colaciona certidão da Justiça Eleitoral dando conta de que está regularmente filiado ao PTB de Estrela desde 05.3.2016.

A ação foi distribuída em 20.4.2016 e, com a inicial, o requerente junta cópia de comunicação de desfiliação recebida em 06.4.2016 (fl. 06).

Acerca da interpretação do prazo decadencial para propositura da ação, cabe transcrever o precedente do Tribunal Superior Eleitoral trazido pelo Parquet em seu parecer:

Ação de perda de cargo eletivo. Prazo. Termo inicial.

- A data a ser considerada como termo inicial do prazo para a propositura de ação de perda de mandato eletivo, previsto no art. 1º, § 2º, da Resolução TSE n. 22.610/2007, é a da primeira comunicação feita ao partido político, e não a realizada perante a Justiça Eleitoral.

Agravo não provido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 242755, Acórdão de 16.10.2012, Relator Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 214, Data 07.11.2012, Página 72.) (Grifei.)

Assim, noticiado nos autos que o PPS foi comunicado do desligamento de seu filiado em 06.4.2016 (fl. 06) – e não havendo impugnação desse dado ou qualquer prova de que o requerido tenha feito comunicação formal anterior ao partido -, é de ser afastada a arguição de decadência do direito de ação em relação à demanda proposta em 20.4.2016.

Mérito

Da justa causa: as “janelas”

A partir de 2007, valendo-se do poder de interpretar a Lei Fundamental, inclusive da prerrogativa extraordinária de (re)formulá-la, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a fidelidade partidária como valor impregnado de elevada significação político-jurídica, cuja observância, pelos detentores de mandato legislativo, representa expressão de respeito tanto aos cidadãos que os elegeram (vínculo popular) quanto aos partidos políticos que lhes propiciaram a candidatura (vínculo partidário) (MS 26.603).

O instituto da fidelidade partidária, vinculando o candidato eleito ao partido, passou a vigorar a partir da resposta do Tribunal Superior Eleitoral à Consulta n. 1.398, em 27 de março de 2007. Foram fixadas também algumas ressalvas, diante de situações específicas, tais como mudanças na ideologia do partido ou perseguições políticas, a serem definidas e apreciadas caso a caso pela Justiça Eleitoral, em que o abandono de legenda não ensejaria a extinção do mandato do parlamentar.

Estas ressalvas foram elencadas no parágrafo primeiro do artigo primeiro da Resolução TSE n. 22.610/07: incorporação ou fusão do partido; criação de novo partido; mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; e grave discriminação pessoal.

Recentemente, a Lei n. 13.165/15 disciplinou a questão ao incluir o art. 22-A na Lei n. 9.096/95. Atualmente, consideram-se justa causa para a desfiliação partidária somente as hipóteses de mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação política pessoal; e mudança de partido efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, ao término do mandato vigente.

Suprimiram-se as disposições que fomentavam a criação/incorporação/fusão de partidos políticos e criou-se uma “janela”, período no qual seria permitida a mudança de agremiação por detentor de mandato, sem configuração de infidelidade partidária.

A “janela” prevista na Lei dos Partidos Políticos permite que o eleito mude de partido sem perder o cargo, se o fizer no último ano de seu mandato e dentro do período de 30 dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição.

Atualmente, o “prazo de filiação exigido em lei” é de seis meses (art. 9º da Lei n. 9.504/97). O Calendário Eleitoral (Resolução TSE n. 23.450/15) prevê como sendo o dia 02.4.2016 a “data até a qual os que pretendam ser candidatos a cargo eletivo nas eleições de 2016 devem estar com a filiação deferida no âmbito partidário, desde que o estatuto partidário não estabeleça prazo superior” a seis meses.

Essa regra é permanente.

Em 2016, com a edição da Emenda Constitucional n. 91/16, criou-se nova “janela”, desta vez autorização constitucional e temporária, que terá exaurida a sua eficácia após o prazo que se encerra nesse ano.

A emenda previu que, no período entre 19.02.2016 e 19.3.2016, o político detentor de mandato eletivo poderia sair do partido pelo qual eleito, sem perder o mandato por infidelidade partidária.

Conforme manifestei no voto-vista que proferi na PET 5-72, no qual fiz digressão que deixo de transcrever aqui, mas que justifica meu posicionamento, assentei que é inválida a regra que garante a permanência do mandato ao parlamentar apenas por uma questão de forma, em que pese o conteúdo tenha ferido de morte o princípio da fidelidade partidária.

Deve ser afastada a concepção formalista e positivista no sentido de que somente a desfiliação formalmente levada a termo seria capaz de gerar efeito jurídico. Essa compreensão nega força jurígena aos fatos, como se não fossem eles a fonte primária do Direito.

No caso destes autos, os fatos a que me refiro são as notícias de jornais (fls. 45 e 46), a demonstrar que a comunidade tinha ciência da mudança de partido do vereador Felipe Schossler antes do comunicado formal ao PPS (noticiado em 11 e 10 de março, respectivamente).

Assim, a data a ser considerada, para fins de desfiliação, é 05 de março de 2016 (data informada na certidão da Justiça Eleitoral da fl. 44), o que faz com que o demandado esteja albergado tanto pela justa causa prevista no art. 22-A, parágrafo único, inc. III, da Lei dos Partidos Políticos, quanto pela “janela” prevista na Emenda Constitucional n. 91/16.

Anoto, ainda, que, conforme disposto no parágrafo único do art. 22 da Lei n. 9.096/95: “Havendo coexistência de filiações partidárias, prevalecerá a mais recente”. Como afirmado pelo PPS na inicial, Felipe se filiou àquela agremiação em 06.10.2011, de forma que a filiação mais recente, e que portanto prevalece, é aquela informada pelo PTB, qual seja, 05.3.2016.

Desse modo, verificada a filiação do vereador requerido ao PTB, no prazo previsto no art. 22-A, parágrafo único, inc. III, da Lei dos Partidos Políticos, deve-se reconhecer a justa causa para a sua desfiliação do PPS de Estrela. De igual forma, considerando como data da desfiliação o dia 05.3.2016, reconheço estar o requerido amparado pela faculdade prevista na Emenda Constitucional n. 91/16.

DIANTE DO EXPOSTO, afastada a preliminar, voto pela improcedência da ação.