RE - 2989 - Sessão: 01/09/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por SÉRGIO DILAMAR BITENCOURT DA ROCHA contra decisão do juízo da 112ª Zona Eleitoral, que julgou procedente a representação por doação acima do limite estabelecido no § 1º do art. 23 da Lei n. 9.504/97 e condenou o recorrente ao pagamento de multa no valor de R$ 266.813,95.

Em suas razões (fls. 128-135), o recorrente sustenta a decadência da ação e a nulidade da quebra do sigilo fiscal sem prévia autorização judicial. Alega inexistir dolo de fraudar a legislação eleitoral e a ocorrência de erro de tipo. Sustenta ser desproporcional a penalidade imposta no caso concreto. Requer a improcedência da representação.

Apresentadas contrarrazões (fls. 139-142), nesta instância, os autos foram encaminhados em vista ao Ministério Público Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 153-156).

É o relatório.

 

 

VOTO

Preliminares:

O recurso é tempestivo. O recorrente foi intimado da sentença em 14.3.2016 (fl. 125) e interpôs o recurso no dia 17 do mesmo mês (fl. 127), observando, portanto, o tríduo legal previsto no art. 34 da Resolução TSE n. 23.398/13.

Sustenta o recorrente a nulidade do acesso aos seus dados fiscais sem prévia autorização judicial.

Não prospera a preliminar suscitada. O Ministério Público Eleitoral recebeu da Receita Federal relação de doadores que, supostamente, teriam excedido o limite legal de doação, baseada no cruzamento de informações sobre os valores doados e a renda declarada à Receita Federal, nos termos do art. 25, § 4º, inc. II, da Resolução TSE n. 23.406/14:

§ 4º A verificação dos limites de doação observará as seguintes disposições:

I – O Tribunal Superior Eleitoral, após a consolidação das informações sobre os valores doados e apurados até 31.12.2014, as encaminhará à Receita Federal do Brasil até 10.1.2015;

II – a Receita Federal do Brasil fará o cruzamento dos valores doados com os rendimentos de pessoa física e faturamento da pessoa jurídica e, apurando indício de excesso, fará, até 31.3.2015, a devida comunicação ao Ministério Público Eleitoral, a quem incumbirá propor representação, solicitando a quebra do sigilo fiscal ao juiz eleitoral competente.

De posse dessa relação de doadores, na qual constou o nome do recorrente, sem qualquer informação fiscal a seu respeito (fls. 06-10), o órgão ministerial solicitou a quebra do sigilo fiscal do doador, que foi deferida pelo juízo (fl. 49). Em respeito a tal decisão, a Receita Federal remeteu as informações solicitadas (fl. 51).

Como se verifica, não houve acesso aos dados fiscais do recorrente sem prévia autorização judicial, pois estes somente vieram aos autos após decisão autorizando o acesso a tais informações.

 

Mérito:

No mérito, sustenta o recorrente a decadência da ação, pois teria sido distribuída após transcorridos 180 dias da diplomação. Alega, ainda, ausência de dolo de fraudar a legislação eleitoral e que houve erro de tipo, pois o recorrente acreditava ser possível doar 10% dos seus rendimentos em 2014, ano da eleição. Argumenta, também, não ser proporcional a multa aplicada.

No tocante à alegada decadência, verifica-se que a ação foi proposta no prazo regular de 180 dias, contados da diplomação, nos termos do art. 22, § 1º, da Resolução TSE n. 23.398/13.

A diplomação do beneficiário da doação ocorreu em 17.12.2014 (fls. 123-124), e a ação foi proposta no dia 12.6.2015 (fl. 02), antes do prazo fatal, que se daria em 15.6.2015.

Pouco importa que o feito tenha sido distribuído após, pois os efeitos da citação retroagem à data da propositura da ação, nos termos do art. 219, § 1º, do CPC/73, vigente à época do ajuizamento, conforme já decidiu o egrégio TSE:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO COM FUNDAMENTO NO ART. 23 DA LEI N. 9.504/1997. DOAÇÃO PARA CAMPANHA ACIMA DO LIMITE LEGAL. TEMPESTIVIDADE DA REPRESENTAÇÃO.

1. Ação ajuizada no TRE, órgão jurisdicional competente à época da propositura, interrompe a prescrição/decadência. Precedentes do TSE.

2. A interrupção da prescrição/decadência pela citação válida retroage à data da propositura da ação, nos termos do art. 219, § 1º, do CPC.

3. Considera-se proposta a representação, para fins de interrupção da prescrição/decadência, na data em que protolocada a petição inicial no juízo, nos termos do art. 263 do CPC. Precedentes do STJ.

4. A ressalva do art. 219, § 4º, do CPC somente é aplicável quando o atraso na citação se der por culpa do autor.

5. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 3456, Acórdão de 16.9.2014, Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 187, Data 06.10.2014, Página 34.)

Quanto à matéria de fundo, cuida-se de doação realizada por pessoa física, acima do limite legalmente estabelecido, previsto, à época da doação, no art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97:

art. 23.

§ 1º. As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas:

I – no caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição.

Registre-se que a recente Lei n. 13.165, de 29 de setembro de 2015, empreendeu mudanças na redação do artigo 23 em comento, mas manteve, na substância, a regra da doação por pessoa física limitada a 10% dos seus rendimentos.

Na hipótese, a sentença considerou que o limite de doação do recorrente era de R$ 46.637,21 e, como doou a quantia de R$ 100.000,00, excedeu o limite legal em R$ 53.362,79, resultando na multa de R$ 266.813,95, equivalente a 5 vezes o valor do excesso, conforme dispõe o art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

Os valores apontados na sentença encontram amparo probatório (fls. 29-30 do anexo e 09 dos autos) e não são contestados pelo recorrente, que sustenta ausência de intenção de fraudar a lei eleitoral e equívoco do doador a respeito da legislação.

No entanto, o referido artigo estabelece regra matemática, limitando as doações a 10% do rendimento bruto do ano anterior ao da eleição, sem questionar o elemento anímico do doador. O legislador busca com isso restringir os custos das campanhas eleitorais de forma objetiva e não sancionar eventuais abusos pessoais.

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. DECADÊNCIA NÃO VERIFICADA. PRAZO DE 180 DIAS. LICITUDE DA PROVA. DESNECESSÁRIA A CONFIGURAÇÃO DO ABUSO DO PODER ECONÔMICO OU MÁ-FÉ. REEXAME DE PROVA. MULTA APLICADA EM SEU MÍNIMO LEGAL. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. DESPROVIMENTO.

[...]

4. Basta o desrespeito aos limites objetivamente expressos no dispositivo legal para incorrer na penalidade prevista no art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97, sendo irrelevante a configuração do abuso do poder econômico ou de má-fé.

[...]

6. Agravo regimental desprovido.

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 91707, Acórdão de 11.3.2014, Relator Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 68, Data 09.4.2014, Página 37.)

Da mesma forma, o alegado equívoco do doador, que pensou poder doar 10% dos rendimentos brutos do ano da eleição, e não do ano anterior, não afasta a ilicitude da conduta. O limite de doação não é inovação legislativa, e envolve candidato e partido político, partes que têm ciência inequívoca da norma em comento, com quem o doador poderia ter buscado eventual esclarecimento. Ademais, a expressiva quantia despendida, R$ 100.000,00, demanda natural atenção do doador aos termos legais. Se de fato equivocou-se quanto aos termos legais, era perfeitamente possível ter conhecimento dos limites da doação, não sendo factível concluir que se tratou de um erro invencível.

No tocante à proporcionalidade da multa no caso concreto, o seu montante observou os limites legalmente estabelecidos entre o excesso e a penalidade, não sendo possível ao judiciário aplicar outros parâmetros, sob pena de malferir a norma legal, conforme já decidiu o egrégio TSE:

ELEIÇÕES 2010. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. NÃO OCORRÊNCIA DA DECADÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AFASTAMENTO DA MULTA OU FIXAÇÃO DO SEU VALOR AQUÉM DO LIMITE MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O princípio da insignificância não encontra guarida nas representações por doação acima do limite legal, na medida em que o ilícito se perfaz com a mera extrapolação do valor doado, nos termos do art. 81 da Lei das Eleições, sendo despiciendo aquilatar-se o montante do excesso. Precedentes: AgR-REspe n. 713-45/BA, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 28.5.2014; AgR-AI n. 2239-62/SP, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 26.3.2014.

2. Os postulados fundamentais da proporcionalidade e da razoabilidade são inaplicáveis para o fim de afastar a multa cominada ou aplicá-la aquém do limite mínimo definido em lei, sob pena de vulneração da norma que fixa os parâmetros de doações de pessoas física e jurídica às campanhas eleitorais.

3. Este Tribunal Superior assentou ser de 180 dias, a partir da diplomação, o prazo para formalizar a representação contra doadores, presente o extravasamento dos limites legais. Portanto, tendo em vista que a diplomação referente ao pleito de 2010 no Estado do Paraná ocorreu em 17.12.2010, e a representação por excesso de doação foi ajuizada pelo Parquet eleitoral no dia 10.6.2011, não há que se falar em decadência do direito de ação.

4. Agravo regimental desprovido.

(TSE, Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 2050, Acórdão de 15.12.2015, Relator Min. LUIZ FUX, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 60, Data 31.3.2016, Página 12.)

Não merece reparos, portanto, a bem-lançada sentença.

PELO EXPOSTO, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso.