RE - 6160 - Sessão: 20/07/2016 às 17:00

RELATÓRIO

O PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO - PTB de Crissiumal interpõe recurso contra sentença que desaprovou suas contas referentes à movimentação financeira do exercício de 2013 com fundamento na ausência de conta bancária e, por conseguinte, não apresentação de extratos bancários, determinando a suspensão das cotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano (fls. 45-47).

Em suas razões, o recorrente sustenta, preliminarmente, a nulidade do relatório conclusivo porque assinado pela estagiária e, no mérito, a inviabilidade de manutenção de conta bancária diante dos valores irrisórios movimentados pela agremiação, exclusivamente a partir de modestas contribuições de filiados, requerendo, ao fim, a aprovação das contas com ressalvas (fls. 50-55).

A Procuradoria Regional Eleitoral pugna, em preliminar, pela nulidade da sentença e retorno dos autos à origem, com base na inabilitação técnica da signatária do parecer conclusivo e na ausência de citação dos dirigentes partidários (art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15). No mérito, opina pelo desprovimento do recurso, pelo repasse ao Tesouro Nacional de R$ 455,00 – sendo R$ 405,00 oriundos de fonte vedada e R$ 50,00 de origem não identificada – e pela suspensão do recebimento de verbas do Fundo Partidário até que seja esclarecida a origem dos recursos e, após, pelo período de 12 meses (fls. 59-74).

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

2. Preliminares

2.1. Preliminar de nulidade da sentença por inabilitação técnica do estagiário responsável e pela deficiência substancial do parecer conclusivo

O recorrente alega a nulidade do parecer técnico conclusivo (fls. 34-35), tendo em vista que firmado pela estagiária do cartório eleitoral, que não estaria legalmente habilitada para tanto.

Entendo que, na hipótese, a nulidade deve ser reconhecida.

Com efeito, trata-se de parecer conclusivo de peça de natureza técnica, indispensável ao exame das contas e de suma importância para a investigação da veracidade e legitimidade da contabilidade partidária.

Tais características são extraídas dos preceitos da Resolução TSE n. 23.464/15, que, no ponto, mantém a mesma substância de suas antecessoras. Assim, exige-se que o parecer conclusivo seja elaborado por unidade técnica responsável (art. 34, caput), a qual, inclusive, está instrumentalizada com a prerrogativa para solicitar informações diretamente dos partidos, doadores, órgãos e entidades públicas (art. 35, § 3º, incs. I a IV).

Ademais, como bem referiu o douto Procurador Regional Eleitoral em seu parecer (fl. 60v):

Portanto, diante dos referidos dispositivos, observa-se que a unidade técnica possui papel relevante nos processos de prestação de contas, sendo não só a responsável por verificar as possíveis irregularidades cometidas, mas a única capaz de o fazer, diante da complexidade da análise, que exige conhecimentos técnicos.

Destarte, a análise técnica constitui fase essencial à apuração da regularidade das contas e, assim, crucial para o exercício do contraditório e para a formação da convicção do magistrado no julgamento do processo.

O art. 63 da Resolução n. 23.464/15 aponta critérios para escolha do examinador das contas, permitindo que a designação recaia sobre “pessoas idôneas da comunidade, devendo a escolha recair preferencialmente naqueles que possuem formação técnica compatível, dando ampla e imediata publicidade de cada requisição”.

A jurisprudência, na mesma linha, consolidou o entendimento de que se dispensa a formação contábil para a indicação, porém não se prescinde que o responsável seja pessoa idônea e detenha as qualificações necessárias à realização da tarefa.

Na hipótese concreta, a Portaria n. 03/2015 do Juízo da 91ª Zona Eleitoral nomeou, além dos servidores efetivos do cartório eleitoral, a estagiária, a qual subscreveu, nessa qualidade e de forma independente, a apreciação técnica das contas.

Ao contrário do que se vislumbra nos autos, o ordenamento jurídico não autoriza que estagiários, nessa condição, pratiquem atos técnicos de forma não supervisionada por profissionais aptos, inclusive como forma de proteção a eventuais responsabilizações jurídicas por condutas dolosas ou culposas. Nesse sentido, é expresso o art. 1º, caput, da Lei n. 11.788/08:

Art. 1º Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos. (Grifei.)

Com razão, o recorrente ilustra sua irresignação com cópias dos pareceres conclusivos emitidos no processamento de suas contas dos exercícios de 2009 e 2011 (fls. 54-55), subscritos pelo chefe de cartório eleitoral.

Esse procedimento encontra seu esteio no art. 4º, inc. X, da Resolução TRE-RS n. 162/06 e, embora não se apresente como de acolhimento obrigatório pelos juízos eleitorais, traduz-se em uma recomendação sobre a designação do responsável pela análise da contabilidade partidária, a dar solução à referida mácula.

Não bastassem os aspectos jurídico-formais que conduzem à nulidade do ato, o parecer conclusivo está eivado de deficiências técnicas capazes de atestar materialmente a inabilitação da signatária para o exame das contas.

De fato, bem demonstrou a manifestação ministerial a existência de flagrantes e potencialmente relevantes falhas que não foram objeto de exame:

O parecer de fls. 34-35 apontou como irregularidade apenas a ausência de manutenção de conta bancária. Contudo, analisando os documentos de fls. 02-23 e os Anexos I e II, constatou-se a existência das seguintes irregularidades, as quais não foram observadas no mencionado parecer:

i) divergência entre o valor informado pelo partido e o constante nos documentos apresentados pelo próprio, em relação às contribuições de filiados e às doações de pessoas físicas, tendo em vista que, enquanto a agremiação informa ter recebido o valor de R$ 605,00 (seiscentos e cinco reais) (fls. 13-14), o valor, constante no Livro Razão (páginas 02 - Anexo II), soma R$ 655,00 (seiscentos e cinquenta e cinco reais). Assim, a diferença apresentada, no valor de R$ 50,00 (cinquenta reais), trata-se de recursos de origem não identificada;

ii) recebimento de doações procedentes de fonte vedada, mais precisamente do Vereador Marcos Sossmeier, no montante de R$ 405,00 (quatrocentos e cinco reais), totalizando, aproximadamente, 61,83% do total de receitas do partido (R$ 655,00).

Dessa forma, insta concluir pela nulidade também diante da insuficiência substancial do parecer técnico conclusivo.

Nessa senda, a despeito de seu caráter não vinculante em relação à decisão judicial, esta Corte Regional posiciona-se no sentido da imprescindibilidade do parecer técnico conclusivo para a apuração da fidedignidade das contas partidárias, conforme ilustra o seguinte julgado:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido Político. Diretório Municipal. Vício em notificação. Exercício financeiro de 2014.

Interposição de embargos de declaração recebidos como recurso. Insatisfação contra sentença que julgou não prestadas as contas pelo partido que não se manifestou em tempo hábil. Preliminar acolhida. Caracterizada a nulidade da notificação, pois entregue a pessoas alheias aos quadros da agremiação. Ausente prova da ciência do partido sobre o seu teor, em afronta à regularidade do feito, a provocar constrição ao direito da ampla defesa e do contraditório. Infringência ao rito previsto nas disposições processuais do art. 30, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.432/14. Contas julgadas não prestadas sem a emissão do parecer da unidade técnica e, por consequência, sem a manifestação do partido sobre o seu conteúdo. Nulidade de caráter absoluto. Fundamental a análise por parte do órgão técnico para a identificação de eventuais ilegalidades nas contas. Anulação da sentença e retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. Provimento.

(Recurso Eleitoral nº 6086, Acórdão de 13.4.2016, Relatora DESA. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 65, Data 15.4.2016, Página 2) – (Grifei.)

Tratando-se de fase essencial do procedimento de análise das contas, os vícios inquinadores do parecer técnico final acarretam a nulidade de todos os atos processuais posteriores.

Destarte, se a sentença guarda seu esteio em análise técnica que não revela elementos mínimos de suficiência, qualidade ou idoneidade, impõe-se o reconhecimento de nulidade como meio de preservação do devido processo legal em sua acepção substantiva, compreendida como o dever de uma resposta jurisdicional justa, racional e adequada.

Diante disso, impõe-se o retorno do feito à origem para renovação do exame técnico – o qual deverá ser elaborado por responsável nomeado pelo juízo eleitoral e detentor de idoneidade e conhecimento para a realização do exame –, seguindo-se o regular processamento do feito.

2.2. Preliminar de nulidade da sentença pela ausência de citação dos responsáveis partidários

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pela nulidade da sentença, entendendo necessária a citação dos responsáveis partidários, nos termos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.464/15, que assim dispõe:

Art. 38. Havendo impugnação pendente de análise ou irregularidades constatadas no parecer conclusivo emitido pela Unidade Técnica ou no parecer oferecido pelo Ministério Público Eleitoral, o Juiz ou Relator deve determinar a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa no prazo de 15 (quinze) dias e requeiram, sob pena de preclusão, as provas que pretendem produzir, especificando-as e demonstrando a sua relevância para o processo.

Sem razão o órgão ministerial. A inclusão, na prestação de contas, do presidente e do tesoureiro do partido não se coaduna com a posição que esta Corte tem adotado.

Isso porque este Tribunal tem entendido que o litisconsórcio previsto na nova regulamentação de contas partidárias é matéria que só deve ser aplicada nas prestações de contas dos exercícios financeiros do ano de 2015 em diante, por ser regra que interfere no exame do mérito do processo. O envolvimento desses indivíduos como partes pode levar ao reconhecimento da responsabilidade solidária dos dirigentes partidários pelas irregularidades constatadas nas contas.

Nesse sentido, transcrevo ementa que bem ilustra esse entendimento:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14. Exercício financeiro 2013.

Acolhida prefacial de nulidade da sentença prolatada imediatamente após parecer ministerial. Falta de citação do partido e dos responsáveis após o parecer técnico pela desaprovação das contas, em desacordo com o rito estabelecido no art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14.

Exclusão dos dirigentes partidários, manutenção apenas do partido como parte no processo. A aplicabilidade imediata das disposições processuais da Resolução TSE n. 23.432/14 não alcança a responsabilização dos dirigentes partidários, por se tratar de matéria afeta a direito material. Previsão inserida no caput do art. 67 da aludida resolução, estabelecendo que as normas de natureza material somente se aplicam às prestações relativas aos exercícios financeiros a partir de 2015.

Anulação da sentença com a remessa dos autos ao juízo de origem.

(TRE/RS - RE 29-47, Rel. Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julg. Em 25.2.2016)

Dessa forma, afasto essa preliminar suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral.

ANTE O EXPOSTO, rejeito a preliminar ministerial de inclusão dos responsáveis no polo passivo da ação, e VOTO por acolher a preliminar recursal, no sentido de anular a sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para que o juízo nomeie novo órgão técnico para renovação do exame das contas, desde a análise preliminar dos documentos, seguindo-se o regular processamento do feito.

É como voto, Senhora Presidente.

Destaco.

É como voto, Senhora Presidente.