RE - 3981 - Sessão: 15/06/2016 às 17:00

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL interpôs recurso contra decisão do Juízo da 97ª Zona Eleitoral – Esteio, que julgou parcialmente procedente representação por doação acima do limite legal, pessoa jurídica, condenando JORGE CRISTIANO DA VEIGA ao pagamento de multa no valor de R$ 45.000,00.

Postulou a aplicação da sanção de proibição de participar de licitações públicas e contratar com o Poder Público pelo prazo de 5 anos, consoante previsto no § 3º do art. 81 da Lei n. 9.504/97.

O recorrido não apresentou contrarrazões e, nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso, por intempestivo e, no mérito, pelo seu desprovimento.

O feito foi julgado na sessão de 26 de janeiro de 2016, não sendo conhecido o recurso ministerial, em face de sua intempestividade.

Os autos retornaram à origem, sobrevindo informação do Parquet no sentido de que interpôs o recurso tempestivamente, pois intimado em 10 de agosto de 2015, apresentou o apelo em 12 de agosto de 2015.

Foram juntadas informação e certidão cartorárias às fls. 86-88.

O juízo a quo determinou a remessa dos autos ao TRE.

Foi oportunizada nova vista à Procuradoria Eleitoral.

É o relatório.

 

 

 

VOTO

Preliminarmente

A informação das fls. 86-87 e a certidão da fl. 88, da lavra do chefe de cartório substituto da 97ª Zona Eleitoral dão conta da ocorrência de erro cartorário quando da protocolização do recurso do Ministério Público, o que ocasionou a rejeição da irresignação por intempestividade (acórdão das fls. 72-73v.).

Por certo, o erro do serventuário da justiça não pode prejudicar a parte. Observo, por pertinente, que o recorrente arguiu a nulidade na primeira oportunidade que lhe sobreveio para falar no processo.

Conjugados o erro cartorário e a arguição oportuna de sua ocorrência, tenho que é de se reconhecer a nulidade da decisão que não conheceu do recurso por intempestividade.

Nesse sentido, trago os seguintes precedentes:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ART. 511 DO CPC. PREPARO DA APELAÇÃO. COMPROVANTE. RECOLHIMENTO NA DATA DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. ERRO CARTORÁRIO RECONHECIDO NA ORIGEM. DESERÇÃO AFASTADA.

1. Comprovado o preparo no ato de interposição do recurso de apelação, deve ser afastada a deserção.

2. Certificado pelo cartório o erro na aposição da data do protocolo, não pode ser imputada a responsabilidade ao patrono da causa.

3. Correto cumprimento do art. 511 do CPC.

4. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

(STJ, REsp 1287866/PR, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 8.5.2012, DJE 14.5.2012).

 

PROCESSUAL CIVIL - NULIDADE - ALEGAÇÃO - PRIMEIRA OPORTUNIDADE QUE A PARTE TIVER PARA FALAR NOS AUTOS - ART. 245 DO CPC - PRAZO PARA O RECURSO COMEÇA A CORRER NA DATA EM QUE A PARTE TOMA CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA SENTENÇA OU DO ACÓRDÃO - DESNECESSIDADE DE NOVA INTIMAÇÃO.

I - A nulidade deve ser arguida na primeira oportunidade que a parte tiver para falar nos autos. Se o acórdão transitou em julgado por irregularidade da intimação, que, por erro do cartório, foi feita em nome de advogado que não mais representava a parte, e esta só tomou conhecimento do fato quando foi intimada da baixa dos autos para início da execução, pode peticionar ao juiz de primeira instância alegando a nulidade.

II - Se a parte comparece aos autos para arguir a irregularidade da intimação do acórdão, demonstrando, via de consequência, conhecimento do ato, correto o entendimento que fixa neste momento o termo inicial do prazo recursal. Precedentes.

III - Recurso não conhecido.

(STJ, REsp 245.647/SC, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA, julgado em 19.02.2001, DJ 02.4.2001, p. 290).

Acerca da possibilidade da declaração de tal nulidade, colaciono decisão do Tribunal Superior Eleitoral que bem ilustra a necessidade de revisão do processo quando este não tramitou dentro da normalidade, violando os princípios do devido processo legal e da ampla defesa:

ELEIÇÕES 2012. RECURSOS ESPECIAIS. QUERELA NULLITATIS INSANABILIS. CABIMENTO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. OFERECIMENTO. PRAZO. ALEGAÇÕES FINAIS. REPRESENTADO. AUSÊNCIA. NOTIFICAÇÃO. SENTENÇA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. VIOLAÇÃO. SÚMULA Nº 283/STF. INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. É de rigor a impugnação a cada um dos fundamentos autônomos adotados pela Corte Regional, sob pena de subsistirem as suas conclusões. Súmula nº 283/STF. In casu, não foi atacado o fundamento segundo o qual o próprio MPE, autor da representação, pugnou pela sua improcedência e, portanto, renunciou ao direito sobre o qual se fundava a ação.

2. A relativização da coisa julgada é admissível, ao menos em tese, apenas nas situações em que se evidencia colisão entre direitos fundamentais, fazendo-se uma ponderação dos bens envolvidos, com vistas a resolver o conflito e buscar a prevalência daquele direito que represente a proteção a um bem jurídico maior. Precedentes. (REspe nº 9679-04, Rel. Min. Nancy Andrighi, de 8.5.2012).

3. Na espécie, é plenamente cabível a relativização da coisa julgada, haja vista que, conforme delineado na moldura fática do acórdão regional, o processo alusivo à doação acima do limite legal, cuja sentença se busca tornar inexistente, porquanto eivada de vício transrescisório, não tramitou dentro da normalidade, em virtude da violação aos princípios do devido processo legal e da ampla defesa, os quais possuem envergadura constitucional.

4. Recursos a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral nº 27081, Acórdão de 24.6.2014, Relatora Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 159, Data 27.8.2014, Página 55-56).

Diante do necessário reconhecimento do erro cartorário, acolho o pedido do Ministério Público para declarar a nulidade do acórdão das fls. 72-73 e prosseguir em novo julgamento do recurso.

Tempestividade

Diante do contexto já abordado, anoto que o recorrente foi intimado, mediante carga dos autos, em 10.8.2015 (fl. 51), e apresentou a irresignação em 12.8.2015, tempestivamente.

Portanto, conheço do recurso.

Mérito

O recorrente postula a aplicação da sanção de proibição de participar de licitações públicas e de contratar com o ente público pelo prazo de cinco anos (art. 81, § 3º, da Lei 9.504/97, vigente ao tempo da doação).

Sem razão.

Firmou-se entendimento de que a aludida sanção não decorre automaticamente da prática do ilícito, mas depende, para a sua incidência, da gravidade da situação e de um juízo de proporcionalidade a ser realizado casuisticamente, inexistindo a obrigatoriedade de sancionamento cumulativo.

A ilustrar, os seguintes julgados:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. ART. 81 DA LEI 9.504/97. DECADÊNCIA. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. FATURAMENTO. GRUPO EMPRESARIAL. DESPROVIMENTO.

1. [...]

2. As sanções previstas no art. 81, §§ 2º e 3º, da Lei 9.504/97 não são cumulativas, motivo pelo qual sua incidência conjunta deve ser pautada pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Precedentes.

[…]

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 14825 - Belo Horizonte/MG. Acórdão de 11.3.2014. Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA).

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. ART. 81 DA LEI 9.504/97. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. [...]

2. [...]

3. As sanções previstas no art. 81, §§ 2º e 3º, da Lei 9.504/97 - respectivamente, multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso e proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o Poder Público pelo período de cinco anos - não são cumulativas, de forma que a sua aplicação conjunta depende da gravidade da infração e deve ser pautada pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Precedente.

[...]

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 3623, Acórdão de 13.6.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 9.8.2013, Página 166-167).

Em julgado originário desta Corte, ao analisar caso em que "a Representada não auferiu rendimentos no ano-calendário 2005 e realizou doação nas eleições de 2006 no valor de R$ 3.000,00, excedendo, neste montante, o limite previsto no art. 81, § 1°, da Lei 9.504/97, o Tribunal Superior Eleitoral consignou especificamente que é proporcional e razoável a cominação da multa em seu mínimo legal, correspondente a cinco vezes a quantia em excesso, porquanto a doação efetuada não se revestiu de gravidade que justifique sanções mais severas" (Recurso Especial Eleitoral n. 309887, Relator Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI).

O montante da doação discutida nestes autos não revela situação grave a justificar as severas penalidades pretendidas pelo recorrente, sendo a multa suficiente para sancionar o excesso de doação, o que me leva a desprover o recurso.

ANTE O EXPOSTO, voto no sentido de declarar a nulidade do acórdão das fls. 72-73, conhecer do recurso e, no mérito, negar-lhe provimento.