RE - 2904 - Sessão: 31/05/2016 às 17:00

 

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO POPULAR SOCIALISTA - PPS DE CAPELA DE SANTANA, PAULO RICARDO DA SILVA, MOACIR PRATES, LUCIANE MARIA HANAUER e LAZIER DE SOUZA GONÇALVES contra sentença que desaprovou as contas partidárias referentes ao exercício de 2014, em virtude da não contabilização das receitas e despesas decorrentes de doações estimáveis em dinheiro. A magistrada sentenciante, entendendo graves as irregularidades apontadas, determinou, ainda, a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 12 meses (fls. 177-178).

Em suas razões recursais, a agremiação requereu a reforma da sentença no sentido da aprovação das contas ou, subsidiariamente, da aprovação com ressalvas. Alegou a inexistência de qualquer movimentação de receitas e despesas financeiras ou patrimoniais, ainda que na forma de doações estimáveis em dinheiro (fls. 180-197).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral entendeu ausentes elementos mínimos que possibilitem a análise da movimentação dos recursos e opinou pela reforma da sentença, a fim de que sejam julgadas como não prestadas as contas, em vista da inobservância do art. 14 da Resolução TSE n. 21.841/04 (fls. 201-205).

É o sucinto relatório.

 

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no DJE-RS de 22.02.2016 (fl. 179) e o recurso interposto no dia 25.02.2016 (fl. 180), dentro do prazo previsto no art. 258 do Código Eleitoral.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

Preliminarmente, faz-se necessária a correção do aspecto subjetivo da demanda.

Deveras, esta Corte já sedimentou entendimento de que as regras que estabelecem a responsabilidade solidária dos dirigentes partidários possuem cunho material. Assim, sua aplicabilidade restringe-se às contas relativas ao ano de 2015 e seguintes, com escopo no art. 65, § 3º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Dessa forma, impõe-se, na hipótese, a exclusão dos dirigentes partidários do feito, tendo em vista que a nova forma de responsabilização consubstancia disposição sobre o mérito das contas, consoante iterativa jurisprudência desta Corte:

Prestação de contas anual. Partido político. Art. 34, § 4º, I, da Resolução TSE n. 23.432/14. Exercício financeiro 2013. Prefacial afastada. Manutenção apenas do partido como parte no processo. A aplicabilidade imediata das disposições processuais da Resolução TSE n. 23.432/14 não alcança a responsabilização dos dirigentes partidários, por se tratar de matéria afeta a direito material. Previsão inserida no caput do artigo 67 da aludida resolução, estabelecendo que as normas de natureza material somente se aplicam às prestações relativas aos exercícios financeiros a partir de 2015. A falta de movimentação financeira não afasta a obrigação da agremiação partidária de apresentar a sua prestação de contas. Ausência de peças essenciais à análise da contabilidade leva ao julgamento de não prestadas as contas. Suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, em observância ao estabelecido no art. 47 da Resolução TSE n. 23.432/14. Contas não prestadas.

(Prestação de Contas nº 12989, Acórdão de 23.02.2016, Relatora DESA. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 33, Data 26.02.2016, Páginas 2-3).

 

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. Exclusão dos dirigentes partidários do feito ao entendimento de que os responsáveis pelas contas do partido devem atuar como partes apenas nos processos relativos ao exercício financeiro de 2015 e posteriores, em conformidade com o disposto no "caput" do art. 67 da Resolução TSE n. 23.432/14. Caracterizado o ingresso de recurso de fonte vedada, em face do recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis "ad nutum", da administração direta e indireta, que detém a condição de autoridade, em contrariedade ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95. Determinação de transferência do montante recebido de fonte vedada ao Fundo Partidário. Recebimento de recursos do Fundo Partidário durante o período em que a distribuição de quotas se encontrava suspensa por decisão judicial transitada em julgado. Determinação de restituição do valor ao Erário. As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/2015, que deram nova redação ao art. 37 da Lei 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes de sua vigência. Incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para o cálculo do período de suspensão, estabelecido em quatro meses. Desaprovação.

(Prestação de Contas nº 7412, Acórdão de 17.12.2015, Relator DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 232, Data 18.12.2015, Páginas 3-4).

Assim, determino a exclusão de PAULO RICARDO DA SILVA, MOACIR PRATES, LUCIANE MARIA HANAUER e LAZIER DE SOUZA GONÇALVES, prosseguindo-se o feito apenas com o PARTIDO POPULAR SOCIALISTA - PPS DE CAPELA DE SANTANA como parte.

No mérito, as contas da agremiação recorrente foram desaprovadas em razão de as peças contábeis apresentadas noticiarem a inexistência de qualquer movimentação de receitas ou despesas e, igualmente, de qualquer recebimento de doações de bens ou serviços estimáveis em dinheiro.

Em suas razões recursais, a agremiação alegou que, de fato, não houve arrecadação ou gastos de recursos financeiros de qualquer natureza, nem mesmo a doação de bens ou serviços estimáveis em dinheiro. Sustenta o partido que não possui sede física nem mínima estrutura organizacional, utilizando-se dos recursos disponibilizados pela direção estadual e pela Câmara Municipal de Vereadores para o seu funcionamento, os quais, no seu entender, não constituiriam doações estimáveis em dinheiro.

Todavia, as razões do partido não merecem acolhida.

Com efeito, de acordo com o art. 13, parágrafo único, da Resolução TSE n. 21.841/04, a falta de recebimento de recursos em espécie não justifica a entrega de prestação de contas sem movimentação, devendo ser registrados os bens e direitos estimáveis em dinheiro recebidos em doação, empregados na manutenção e funcionamento do partido. Eis a redação do dispositivo citado:

Art. 13. […]

Parágrafo único. O não-recebimento de recursos financeiros em espécie por si só não justifica a apresentação de prestação de contas sem movimento, devendo o partido registrar todos os bens e serviços estimáveis em dinheiro recebidos em doação, utilizados em sua manutenção e funcionamento.

Ressalto não ignorar a realidade de diretórios municipais e comissões provisórias em pequenos municípios do interior, cujos funcionamentos se dão frequentemente com mínima estruturação organizacional e logística, por meio de recursos pessoais de seus dirigentes e filiados e com a utilização da cedência de estruturas públicas e comunitárias.

Contudo, tais peculiaridades não desobrigam os órgãos partidários do dever constitucionalmente qualificado de prestação de contas à Justiça Eleitoral, consoante o art. 17, inc. III, da CF/88.

A agremiação argumenta que se utiliza gratuitamente das casas legislativas para a realização de suas reuniões e convenções, com esteio no art. 51 da Lei n. 9.096/95, e que recebe suporte instrumental do diretório regional para seu funcionamento – hipóteses que, a seu juízo, não estariam sujeitas à contabilização, por não configurarem doações estimáveis em dinheiro.

Entretanto, as supostas exceções aduzidas não encontram amparo na legislação eleitoral. Com efeito, a licitude ou gratuidade dessas situações não lhes afastam a qualidade de bens ou serviços estimáveis em dinheiro recebidos em doação para manutenção e funcionamento do partido para os efeitos do art. 13, parágrafo único, da Resolução TSE n. 21.841/04.

Ademais, o órgão partidário não apresentou a comprovação da abertura de conta bancária nem os extratos correspondentes, inobservando a determinação do art. 14, inc. II, alínea n, da Resolução TSE n. 21.841/04. Tais documentos são imprescindíveis tanto para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros quanto para comprovar a alegada ausência de movimentação desses recursos, conforme entendimento consolidado na jurisprudência deste Tribunal:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral. Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado.

(Recurso Eleitoral nº 3350, Acórdão de 25.01.2016, Relator DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 16, Data 29.01.2016, Página 4).

 

Recurso. Prestação de contas. Partido político. Arts. 4º, caput e 14, inc. II, n, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. A abertura de conta bancária é obrigatória, independentemente de ter havido movimentação financeira no período. Falha de natureza grave que impede a apresentação de extratos bancários correlatos, os quais são imprescindíveis para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos financeiros, bem como para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira. Irregularidade insuperável, a comprometer, modo substancial, a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral. As alterações introduzidas pela Lei 13.165/2015, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes da sua vigência. Redimensionamento do quantum de suspensão de cotas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral nº 2743, Acórdão de 8.10.2015, Relator DES. PAULO ROBERTO LESSA FRANZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 187, Data 13.10.2015, Página 4).

Por sua vez, a Procuradoria Regional Eleitoral, não vislumbrando elementos mínimos para análise da movimentação dos recursos, opina pelo julgamento das contas como não prestadas. Entendo, contudo, que a posição do Parquet, embora respeitável, não deve ser acolhida.

Primeiramente, a consideração de não prestação das contas não foi objeto de qualquer insurgência recursal e resultaria em efeitos jurídicos mais gravosos do que aqueles carreados pela sentença de desaprovação. Dessa forma, tal pronunciamento consubstanciaria em vedada reformatio in pejus.

Em segundo, a prestação de contas apresentou documentação e informações mínimas para a aplicação dos procedimentos técnicos de exame, bem como a agremiação prestou as justificativas sobre as desconformidades apontadas. Todos esses elementos, em seu conjunto, embora parciais quanto ao atendimento da legislação e insuficientes para atestar a regularidade da contabilização, não desnaturam o cumprimento do dever jurídico de prestação de contas.

Assim, as irregularidades comprometem a confiabilidade e transparência das contas, ensejando a sua desaprovação com base no art. 27, III, da Resolução TSE n. 21.841/04, mantendo-se a sentença nesse aspecto.

No tocante ao sancionamento, em consequência da rejeição das contas, o juiz eleitoral de primeira instância determinou a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo período de 12 meses.

Apesar de não constituir objeto explícito da inconformidade recursal, a dosimetria da suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário deve ser apreciada de ofício para melhor conformação aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, como efetivação do devido processo legal em seu viés substantivo.

Guardando-se igual escopo, aludido princípio não deve ser compreendido tão somente em seu viés de equivalências entre o total de recursos movimentados em cotejo com o montante tido como fonte de irregularidades. Paralelamente a tal critério, devem ser analisados os demais elementos objetivos e subjetivos do processo, a fim de bem dimensionar a medida justa do sancionamento, com todas as suas atenuantes e agravantes.

Nesse passo, entendo que, tratando-se de diretório partidário municipal de modesta envergadura, localizado em município do interior com apenas 6.631 eleitores e detentor de parcos recursos, a natureza e a gravidade das falhas autorizam o redimensionamento da penalidade para um mês de suspensão.

Essa quantificação guarda consonância com os critérios encampados por esta Corte para casos análogos, como evidenciam as ementas dos recursos eleitorais n. 3350 e 2743, alhures transcritas.

 

Diante do exposto, VOTO, preliminarmente, pela exclusão, de ofício, de PAULO RICARDO DA SILVA, MOACIR PRATES, LUCIANE MARIA HANAUER e LAZIER DE SOUZA GONÇALVES do feito, com a respectiva retificação da autuação e, no mérito, pelo desprovimento do recurso, mantendo a desaprovação das contas do PARTIDO POPULAR SOCIALISTA - PPS de Capela de Santana, e, de ofício, pela redução do período de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para um mês, com fundamento no art. 27, inc. III, da Resolução TSE n. 21.841/04 e art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, com a redação dada pela Lei n. 12.034/09.