PET - 19302 - Sessão: 14/06/2016 às 17:00

RELATÓRIO

PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - PMDB de Novo Tiradentes ajuizou o presente pedido de decretação de perda de cargo eletivo em desfavor de RUDIMAR SCHIEVENIN e do PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO - PSB de Novo Tiradentes.

O requerente assevera que RUDIMAR pertencia ao quadro de filiados do PMDB de Nova Tiradentes desde 06.3.2003, e que em 28.9.2015, sem justa causa, comunicou sua desfiliação partidária. Postulou antecipação de tutela para o afastamento de RUDIMAR da Câmara de Vereadores, bem como, ao final, a procedência da ação, com a decretação da perda do mandato (fls. 02-07).

A liminar foi indeferida, conforme despacho constante à fl. 26.

Em sua defesa, RUDIMAR aduz a ocorrência de justa causa para a desfiliação, consistente em grave discriminação política pessoal, na forma estabelecida no art. 1º, IV, da Resolução TSE n. 22.610/07. Refere que foi afastado das reuniões de governo e do partido e que, quando levantou seu inconformismo com o tratamento discriminatório ao presidente da sigla, foi tratado com desprezo e aconselhado a retirar-se da agremiação. Sustenta que as restrições impostas pelo partido impossibilitaram-no de juntar qualquer documento formal requerendo a produção de prova testemunhal (fls. 45-49).

Procedeu-se à coleta de prova oral, mediante delegação ao juízo da 64ª Zona Eleitoral (fls. 81-83).

Após intimadas, transcorreu o prazo sem apresentação de alegações finais pelas partes (fl. 89).

O procurador regional eleitoral manifestou-se pela procedência da ação (fls. 90-92v.).

É o breve relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

1. Admissibilidade

A ação é tempestiva, porque ajuizada em 27.10.2015, ou seja, dentro do prazo de 30 dias da desfiliação partidária do requerido, ocorrida em 28.09.2015.

Em consulta à página eletrônica de divulgação dos resultados das eleições de 2012 é possível verificar que o PMDB de Novo Tiradentes possui suplentes com possibilidade de suceder, caracterizando o interesse jurídico na ação.

2. Mérito

A Resolução TSE n. 22.610/07 prevê as situações específicas que podem, a despeito da migração partidária, justificar que o detentor do mandato eletivo possa conservar o cargo, ainda que em sigla partidária distinta daquela pela qual obteve a consagração nas urnas.

O advento da Lei n. 13.165/15 não trouxe inovações significativas, uma vez que apenas fez constar no texto da Lei n. 9.096/95  o novo art. 22-A, abordando questão já sedimentada em patamar jurisprudencial e regulamentar.

Assim, foi acrescentado o art. 22-A na Lei 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos), estabelecendo como “justa causa”: mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação política pessoal e mudança de partido durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente.

Insta advertir que se trata de situações taxativas e excepcionais, uma vez que a regra posta é que o mandato obtido em eleição proporcional pertence ao partido político que obteve a vaga por ocasião do pleito.

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, reconhecendo a força normativa do princípio constitucional da fidelidade partidária, assentou que o mandato eletivo pertence à sigla, conforme ilustra a seguinte ementa:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. RESOLUÇÃO Nº 22.610/2007 DO TSE. INAPLICABILIDADE DA REGRA DE PERDA DO MANDATO POR INFIDELIDADE PARTIDÁRIA AO SISTEMA ELEITORAL MAJORITÁRIO. 1. Cabimento da ação. Nas ADIs 3.999/DF e 4.086/DF, discutiu-se o alcance do poder regulamentar da Justiça Eleitoral e sua competência para dispor acerca da perda de mandatos eletivos. O ponto central discutido na presente ação é totalmente diverso: saber se é legítima a extensão da regra da fidelidade partidária aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário. 2. As decisões nos Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604 tiveram como pano de fundo o sistema proporcional, que é adotado para a eleição de deputados federais, estaduais e vereadores. As características do sistema proporcional, com sua ênfase nos votos obtidos pelos partidos, tornam a fidelidade partidária importante para garantir que as opções políticas feitas pelo eleitor no momento da eleição sejam minimamente preservadas. Daí a legitimidade de se decretar a perda do mandato do candidato que abandona a legenda pela qual se elegeu. 3. O sistema majoritário, adotado para a eleição de presidente, governador, prefeito e senador, tem lógica e dinâmica diversas da do sistema proporcional. As características do sistema majoritário, com sua ênfase na figura do candidato, fazem com que a perda do mandato, no caso de mudança de partido, frustre a vontade do eleitor e vulnere a soberania popular (CF, art. 1º, parágrafo único; e art. 14, caput). 4. Procedência do pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade.

(ADI 5081, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 27.05.2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-162 DIVULG 18.08.2015 PUBLIC 19-08-2015.)  (Grifei.)

Há, portanto, que se analisar as circunstâncias alegadas no caso concreto e determinar se suficientemente provadas e enquadradas nas exceções legais. Outras conclusões fora dessa moldura devem ser tidas como hipóteses de infidelidade partidária.

No que concerne à justa causa pela grave discriminação pessoal alegada pelo requerido, a jurisprudência se dirigiu no sentido de exigir demonstração robusta de configuração desse fato e que tenha extrapolado os meros dissabores, embates e enfrentamentos comuns à vida intrapartidária.

In casu, o requerido não trouxe elemento documental capaz de corroborar suas afirmações de que teria sofrido grave discriminação pessoal pelo partido.

As testemunhas da defesa, da mesma forma, não ofereceram melhor suporte aos argumentos.

A testemunha Cerinei Scaravonato afirma que não presenciou pessoalmente Adriano Oliveira Pelisollo, presidente do PMDB, discriminando ou praticando ato desabonatório à conduta do requerido. A testemunha noticia apenas que "ouviu dizer que a administração municipal não subsidiava o que o vereador colocava", o qual, por isso, não conseguiu concretizar suas propostas de campanha.

Por sua vez, a testemunha Antônio Alberto Kern relatou que RUDIMAR retirou-se do partido porque "o que era sugerido pelo vereador não era aceito". Afirmou que "tinha perseguição, sim"; porém não a presenciou pessoalmente. Disse que ouviu falar em perseguição porque "os gestores não aprovavam as propostas do vereador e porque as palavras do vereador não tinha valores".

A comprovação de grave discriminação exige um acervo probatório consistente relativo a fatos injustos, segregatórios ou vexatórios contra o filiado. Não basta para tanto a referência inespecífica a boatos, sentimentos ou qualquer sorte de ilações subjetivas, tal como se vislumbra nos autos.

Nesse sentido é a jurisprudência pacífica desta Corte Regional:

Ação de perda de cargo eletivo por desfiliação partidária. Pretensão de reaver cargo de vereador que se desligou da agremiação de origem para filiar-se a outro partido.

Preliminar de decadência afastada. Inconsistência da tese arguida pela defesa em sustentação oral.

Não caracterizada a alegada excludente contidas no inciso IV do § 1º do artigo 1º da Resolução TSE n. 22.610/07.

Para a caracterização da grave discriminação descrita na legislação, exige-se a prova robusta da segregação individual e injusta que torne insustentável a permanência do mandatário na agremiação, sendo insuficientes os naturais desentendimentos decorrentes do choque de opiniões ou de perda de distinção no âmbito partidário, bem como eventual aspiração por cargo de maior relevo no próximo pleito.

Procedência.

(Petição n. 32416, Acórdão de 19.06.2012, Relator DR. EDUARDO KOTHE WERLANG, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 109, Data 25.06.2012, Página 11.)  (Grifei.)

Dessa forma, o requerido não comprovou justa causa a legitimar seu desligamento do partido.

Cumpre consignar que os fatos aludidos pela defesa, mesmo em tese, não configurariam grave discriminação. Os embates de ideias e propostas são fatos ínsitos ao funcionamento interno dos partidos e dos governos.

É comum que, na busca da conciliação para a acomodação dos atores e interesses políticos na gestão de governo, algum participante julgue-se excluído ou que suas propostas não sejam acolhidas.

Em reforço, insta transcrever elucidativa passagem do voto do Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy, no julgamento da PET 185-25, sessão 19.04.2016:

Essa, aliás, a leitura que a jurisprudência tem realizado nos últimos anos, e como a que tomou o egrégio TRE de Minas Gerais ao asseverar que questões de meros conflitos internos não podem ser consideradas como justa causa, já que, no mundo político, a divergência é fato trivial entre membros de uma mesma legenda. (TRE-MG, Petição nº 263, Ac. de 27/04/2010, Rel. Benjamin Alves Rabello Filho.)

Portanto, a caracterização de uma discriminação grave o suficiente para justificar a saída do partido “exige a individualização de atos que indiquem a segregação ou preterição do parlamentar por motivos injustos, não razoáveis ou preconceituosos que tornem insustentável a permanência do mandatário na agremiação” (TRE-SP, Avulso nº 5196, Ac. de 06/09/2011, Rel. Alceu Penteado Navarro).

É por isso que "o mero aborrecimento ou perda de espaço político, no âmbito da agremiação partidária, não estão elencadas dentre aquelas hipóteses de justa causa previstas no art. 1º, § 1º, da Resolução TSE nº 22.610/07” (TRE-RJ, Req nº 554, Ac. nº 36.061 de 16/09/2008, Rel. Paulo Troccoli Neto).

Também “pequenas insatisfações do parlamentar não podem servir como justificativa para mudança do partido político” (TRE-RJ, Pet 38.886, Relator Luiz Márcio Vitor Alves Pereira, j. em 14/06/10).

Assim, se excluem da justa causa pela grave discriminação aquelas situações decorrentes dos embates políticos, uma vez que a “existência de divergências políticas é natural no âmbito da disputa partidária” (TRE-RJ, Req. nº 578, Ac. nº 34.879 de 04/08/2008, Rel. Márcio André Mendes Costa).

Com essas considerações, entendo não caracterizada a grave discriminação ou qualquer das demais hipóteses de justa causa enumeradas no art. 22-A, parágrafo único, da Lei n. 9.096/95.

Assim, merece amparo o pedido do requerente, no sentido de recuperar a vaga parlamentar.

Nos termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a vaga deve ser preenchida pelo primeiro suplente do partido, ainda que tenha composto coligação nas eleições pretéritas.

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO por julgar procedente o pedido promovido pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO DE NOVO TIRADENTES, decretando a perda do mandato eletivo de RUDIMAR SCHIEVENIN, com execução imediata do presente acórdão, nos termos do art. 10 da Resolução TSE n. 22.610/07.

Comunique-se a presente decisão à mesa da Câmara Municipal de Novo Tiradentes para o devido cumprimento, devendo assumir a respectiva cadeira o primeiro suplente do PMDB eleito no pleito de 2012, conforme consta no resultado oficial divulgado pela Justiça Eleitoral naquele município.

É como voto, senhora Presidente.