RE - 2968 - Sessão: 28/04/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO - PMDB de Guaporé contra sentença que desaprovou suas contas referentes ao exercício de 2014, em virtude do recebimento de doações de filiados que ocupam cargos de chefia e direção na administração pública. A magistrada sentenciante determinou, ainda, o recolhimento de R$ 3.000,00 ao Tesouro Nacional, bem como a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 8 (oito) meses (fls. 84-86).

O partido alega que duas das três doações consideradas como de fontes vedadas são de filiados que exercem a função de assessoramento; já a terceira doação adveio de vereador eleito, tendo o mesmo contribuído em anos anteriores, quando não exercia a vereança. Sustenta que os recursos arrecadados foram necessários para a manutenção da agremiação. Requer o reconhecimento da legalidade de todas as contribuições glosadas pela assessoria técnica do cartório eleitoral e, subsidiariamente, pede a exclusão dos valores atinentes às contribuições dos dois assessores, por não se enquadrarem no conceito de autoridade pública (fls. 90-93).

Contra-arrazoado o recurso (fls. 95-96), os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opina pelo desprovimento da irresignação, ao efeito de manter desaprovadas as contas (fls. 99-107).

É o sucinto relatório.

 

 

 

VOTO

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no DJERS de 05.02.2016, uma sexta-feira (fl. 88), e o recurso interposto no dia 10.02.2016, quarta-feira (fl. 90), dentro do prazo previsto no artigo 258 do Código Eleitoral.

As contas da agremiação foram desaprovadas em razão do recebimento de recursos provenientes de fontes vedadas, consistente em doações de pessoas ocupantes de cargos demissíveis ad nutum da administração pública.

O artigo 31, II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38.

O conceito de autoridade pública abrange os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/2007, editada em razão da resposta à Consulta 1428, com a seguinte ementa:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(CONSULTA n. 1428, Resolução n. 22585 de 06.09.2007, Relator Min. JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Relator designado Min. ANTONIO CESAR PELUSO, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.)

(Grifei.)

Constato, entretanto, que a sentença monocrática merece reforma parcial, haja vista o entendimento externado por esta Corte de que os cargos de assessores não se amoldam à definição de autoridade, pela natureza de suas atividades, a qual não engloba atos de direção ou chefia, condição sine qua non para caracterizar recursos oriundos de fonte vedada.

A ilustrar, cito o seguinte precedente, de relatoria do Des. Luiz Felipe Brasil Santos, sessão de 12.11.2014, cuja ementa encontra-se assim vazada:

Recurso Eleitoral. Prestação de Contas Anual. Exercício 2012. Partido Democrático Trabalhista - PDT de Taquara. Contas desaprovadas. Preliminar de impugnação de documentos como prova válida. Exame remetido à análise da questão de fundo. Preliminar de cerceamento de defesa afastada, em face de haver, nos autos, comprovação de que o partido teve oportunidade de se manifestar sobre documentos acostados. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades. Configuradas doações de fonte vedada. Servidores ocupantes de cargos demissíveis ad nutum.

Afastadas do cálculo do valor a ser recolhido ao Fundo Partidário as doações de assessores e procuradores jurídicos, os quais não são considerados autoridades. Deram parcial provimento ao recurso, apenas ao efeito de reduzir o valor recolhido ao Fundo Partidário.

(Recurso Eleitoral n. 8303, Acórdão de 12.11.2014, Relator DES. LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 207, Data 14/11/2014, Página 02)

(Grifei)

Ressai do acervo probatório que Anderson Bettanin e Marisete Favretto ocupam o cargo de assessores da Assembleia Legislativa do RS (fl. 76), tendo cada um deles doado R$ 1.200,00, totalizando R$ 2.400,00, quantia que deve ser subtraída do montante de R$ 3.000,00, restando, assim, apenas R$ 600,00 como valor advindo de fonte vedada. Isso porque o doador da citada quantia é ocupante de cargo eletivo, vereador Fernando Postal, estando enquadrado no conceito de agente político.

A propósito, esta Casa já enfrentou a questão da doação realizada por ocupantes de cargos eletivos, ao responder a consulta 109-98, sessão de 23.9.2015, cujo redator do acórdão, Dr. Leonardo Tricot Saldanha, assim se manifestou em seu voto:

São agentes políticos apenas o presidente da República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes do Executivo, isto é, Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados Federais e estaduais e Vereadores” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17 ed., 2004, p. 230). Do que se depreende, além dos detentores de cargo eletivo, são considerados agentes políticos os ministros e secretários estaduais e municipais, pois todos detém funções com poder de autoridade.

Da leitura de suas decisões mais recentes, o TSE consolidou entendimento no sentido de que os agentes políticos estão abrangidos pela vedação prevista no art. 12, inciso XII e § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14. A questão foi diretamente enfrentada pelo TSE no Agravo de Instrumento n. 8239, de 25.8.2015, na qual o PSDB de Santa Catarina invocou o art. 12, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14, e requereu que fosse considerado autoridade somente aqueles que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta, autorizando os que detenham mandato eletivo ou que exerçam cargo de assessoramento.

Na decisão, o Relator, Ministro Henrique Neves, asseverou: ressalto que, conforme assinalei no julgamento do REspe n. 49-30, da minha relatoria, o conceito de autoridade pública deve abranger os agentes políticos e servidores públicos, filiados ou não a partidos políticos, investidos de funções de direção ou chefia”. (DJE de 28.8.2015)

De ressaltar que o total de receitas do partido foi de R$ 16.156,00, dos quais R$ 600,00 são oriundos de fonte vedada, o que vem representar 3,71% do total de recursos arrecadados, percentual considerado pouco expressivo e que, na linha da jurisprudência da Corte Superior, permite a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar com ressalvas as contas, até porque não vislumbrada má-fé ou mesmo gravidade das circunstâncias no caso em tela.

A corroborar, a jurisprudência do TSE:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2010. PRESTAÇÃO DE CONTAS. IRREGULARIDADES. REVALORAÇÃO JURÍDICA DAS PREMISSAS FÁTICAS. POSSIBILIDADE. MONTANTE INEXPRESSIVO NO CONTEXTO DA CAMPANHA. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICAÇÃO. RECURSOS RECEBIDOS DE FONTE VEDADA. IMPOSIÇÃO DE DEVOLUÇÃO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO.

1. In casu, o deslinde da questão implica apenas na análise da realidade fática devidamente assentada pela Corte de origem.

2. O Tribunal a quo, ao retomar o julgamento dos embargos de declaração, registrou que a soma dos itens glosados correspondeu a 3,4% do montante arrecadado.

3. O TSE já decidiu que, diante do caso concreto, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar com ressalvas as contas nas quais as irregularidades verificadas não alcançam montante expressivo em relação ao total dos recursos movimentados na campanha. Precedentes.

4. Agravo regimental provido para acolher parcialmente o recurso especial e, reformando o acórdão regional, aprovar com ressalvas as contas do candidato, com a imposição de devolução de valores recebidos de fontes vedadas ao Tesouro Nacional.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral N. 8407 - São Paulo/SP. Acórdão de 25.08.2015. Relator Min. LUIZ FUX. Relator designado Min. JOSÉ ANTÔNIO DIAS TOFFOLI)

Nesse ponto, cumpre, de ofício, readequar a decisão a quo quanto à destinação dos recursos ilicitamente recebidos.

Com efeito, esta Corte já sedimentou o entendimento pela irretroatividade das disposições da Resolução TSE n. 23.464/15 no que concerne ao sancionamento de recolhimento dos recursos recebidos de fonte vedada. Dessa forma, a hipótese está regida pela Resolução TSE n. 21.841/04, a qual, em seu art. 28, inciso II, prevê que os referidos valores devem ser recolhidos ao Fundo Partidário, e não ao Tesouro Nacional.

Constato, outrossim, que o exame técnico realizado no cartório eleitoral identificou outras irregularidades, mas sequer foram objeto de recurso, pois não têm aptidão de comprometer as contas.

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, a fim de julgar aprovadas com ressalvas as contas do PMDB de Guaporé, com a imposição de recolhimento da quantia recebida de fonte vedada, R$ 600,00, ao Fundo Partidário.