RE - 3785 - Sessão: 01/09/2016 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso do Diretório do Partido Progressista do Município de Santo Antônio do Palma em face de sentença (fls. 102-105) que desaprovou a prestação de contas da agremiação, referente ao exercício financeiro de 2014.

Em suas razões (fls. 108-115), o recorrente pleiteia a aplicação do art. 6º, § 1º, da Resolução TSE n. 23.432/2014, argumentando que a exigência de abertura de conta bancária é flexibilizada quando o partido político não recebe recursos enumerados naquele dispositivo legal.

Aduz que a ausência de conta bancária deve ser tratada como mera impropriedade, já que a exigência traduz a criação de uma despesa desnecessária para o partido político, quando o próprio Tribunal Superior Eleitoral criou regra de exceção.

Requer o provimento do recurso para aprovar as contas partidárias.

Em contrarrazões, o Ministério Público afirma que a alegada ausência de movimentação financeira e patrimonial não exime o partido de apresentar a documentação exigida, de modo que deve ser mantida a desaprovação das contas.

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença por ausência de citação dos responsáveis para oferecimento de defesa, conforme prevê a Resolução TSE n. 23.464/15. No mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso e sustenta que a decisão de 1º grau é nula, pelo fato de ter aplicado os comandos da Lei n. 13.165/15, devendo os autos retornarem à origem (fls. 124-131v.).

É o relatório.

 

VOTO

PRELIMINARES

O recurso é regular, tempestivo e merece ser conhecido.

A Procuradoria Regional Eleitoral suscitou preliminar de nulidade da sentença em face da não observância das Resoluções TSE n. 23.432/14 e n. 23.464/15, que preveem a citação dos dirigentes partidários em caso de parecer técnico, ou ministerial, pela desaprovação das contas.

Sobre a questão, há entendimento consolidado no âmbito deste Tribunal: o litisconsórcio previsto na nova regulamentação de contas partidárias, por ser regra que interfere no exame do mérito do processo, é matéria a ser aplicada nas prestações de contas dos exercícios financeiros do ano de 2015 em diante, nos termos do caput do art. 67 da Resolução TSE n. 23.432/14, no sentido de que “as disposições previstas nesta Resolução não atingirão o mérito dos processos de prestação de contas relativos aos exercícios anteriores ao de 2015”.

Ainda, a vedação de interferência das novas regras no exame do mérito das contas também consta no art. 65 da Resolução TSE n. 23.464/15, que revogou a Resolução TSE n. 23.432/14. Esse é o entendimento desta Corte:

Agravo Regimental. Partido político. Omissão quanto a apresentação das contas com relação ao exercício financeiro de 2014. Interposição contra decisão monocrática que determinou a exclusão dos dirigentes partidários do feito, mantendo-se apenas a agremiação como parte. Vigência da novel Resolução TSE n. 23.432/14, instituindo mudanças de procedimentos, como a formação de litisconsórcio necessário entre partido e dirigentes. Previsão inserida no novo texto legal, limitando a sua aplicação em matéria que envolva o mérito das prestações de contas de exercícios anteriores a 2015, a fim de evitar eventual descompasso com o princípio basilar da segurança jurídica e da estabilidade das relações processuais. A alteração da natureza da responsabilidade dos dirigentes partidários pelas irregularidades nas contas dos partidos reflete diretamente no exame do mérito das contas, extrapolando o conteúdo processual das disposições com aplicação imediata. Prevalência do princípio do tempus regit actum. Aplicação, in casu, das disposições da Resolução TSE n. 21.841/04, que não previa a apuração da responsabilidade solidária aos dirigentes partidários no julgamento das contas. Provimento negado.

(TRE-RS, AgRg 11508, desta relatora, DEJERS de 08.9.2015.)

Além, a declaração de nulidade e a consequente baixa dos autos para reabertura da instrução não teria utilidade ao feito, pois as contas foram reprovadas em face da ausência de conta bancária, havendo registro de que o partido não movimentou recursos. No processo eleitoral vige o princípio do prejuízo, máxima prevista no art. 219 do Código Eleitoral: “Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo.”.

Portanto, considerando que a própria agremiação reconheceu não possuir conta bancária, eventual declaração de nulidade não resultaria em proveito ao processo.

Rejeito a preliminar.

 

MÉRITO

No mérito, o Diretório do Partido Progressista do Município de Santo Antônio do Palma demonstrou, documentalmente, que não movimentou recursos em espécie durante o exercício financeiro de 2014. Às fls. 71-73, o partido informou que não possui conta corrente, e que não realizou atividade no ano de 2014 porque “não houve campanha no âmbito municipal”.

Em sua sentença, o juiz eleitoral observou:

Não se desconhece a realidade dos Partidos Políticos de pequenos Municípios. Tal condição, entretanto, não justifica, por si só, o descumprimento da legislação. São inúmeras exigências impostas pela legislação, entretanto o Partido Progressista, que existe no Município há pelo menos 15 (quinze) anos, conforme informações do SGIP (http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/orgao-partidario), sequer possui uma conta bancária ativa. 

Os elementos constantes nos autos são frágeis para demonstrar inexistência de movimentação financeira. Veja-se, por exemplo, as receitas e despesas realizadas em 2014, ainda que estimáveis em dinheiro, referentes aos serviços profissionais exigidos pela própria apresentação das prestações de contas, não foram informados. Assim, o Partido Político vem, notoriamente e continuamente, descumprindo a Lei e impedindo a fiscalização sobre as contas, nos termos do art. 34 da Lei 9.096/95.

A Resolução TSE. n. 21.841/04, norma observada pelo partido durante o exercício de 2014, dispõe, em seu art. 10, que as despesas partidárias devem ser realizadas por cheques nominativos ou por crédito bancário identificado, observado, em qualquer caso, o trânsito prévio desses recursos em conta bancária. Além, o art. 4º prevê que o partido político pode receber quotas do Fundo Partidário, doações e contribuições de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro de pessoas físicas e jurídicas, devendo manter contas bancárias para movimentação dos valores oriundos do Fundo Partidário e os de outra natureza, nos termos do art. 39 da Lei n. 9.096/95.

E a jurisprudência deste Tribunal consolidou entendimento de que os partidos políticos devem, logo após seu estabelecimento no município, abrir conta bancária a fim de provar, por intermédio de extratos bancários zerados, a veracidade da afirmativa de que não movimentaram recursos em espécie:

Recurso. Prestação de contas. Exercício 2008. Aprovação com ressalvas no juízo originário. Ausência de abertura de conta bancária específica. Irresignação ministerial consignando a ocorrência de vício insanável.

Providência imprescindível para a aferição da movimentação financeira do partido e para comprovar, através dos extratos bancários, a alegada ausência de receitas e despesas. Circunstância que torna inviável o exame de regularidade das contas, impondo a sua desaprovação. Aplicação da suspensão das cotas do Fundo Partidário, de acordo com o art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, com a redação dada pela Lei n. 12.034/09. Dosimetria da sanção após consideração de critérios objetivos, consistentes na análise da gravidade das falhas, dos precedentes jurisprudenciais, do conjunto de irregularidades e do correspondente percentual impugnado em face do total movimentado pela agremiação. Razoabilidade e proporcionalidade para estipular em oito meses a perda das cotas do referido fundo. Provimento.

(TRE-RS, Prestação de Contas n. 195243, Acórdão de 11.11.2011, Relatora DESA. FEDERAL MARIA LÚCIA LUZ LEIRIA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 197, Data 16.11.2011, Página 9.)

 

Recurso. Prestação de contas anual de partido político. Arts. 10 e 13, parágrafo único, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2010.

Aprovação no juízo originário.

1. Contas zeradas. A apresentação de contas sem movimentação afronta a norma de regência. 2. A ausência de abertura de conta bancária inviabiliza a verificação da destinação dos recursos movimentados pelo partido, comprometendo a regularidade e a transparência da demonstração contábil. Omissões que ensejam a desaprovação das contas. Suspensão do recebimento das cotas do Fundo Partidário por quatro meses. Provimento parcial.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 4861, Acórdão de 26.11.2013, Relator LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 220, Data 28.11.2013, Página 4.)

 

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2014. Falta de abertura de conta bancária para o registro da movimentação financeira e da apresentação dos extratos bancários correspondentes. Providências imprescindíveis, seja para demonstrar a origem e a destinação dada aos recursos, seja para comprovar a alegada ausência de movimentação financeira à Justiça Eleitoral. Inaplicabilidade da norma que desobriga a apresentação das contas por órgãos partidários que não tenham movimentação financeira e que exclui a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário, haja vista a irretroatividade dos efeitos das alterações decorrentes da Lei n. 13.165/15, conforme entendimento firmado por este Tribunal. Readequação, de ofício, do prazo de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário para 1 (um) mês. Provimento negado.

(TRE-RS, Recurso Eleitoral n. 3350, Acórdão de 25.01.2016, Relator DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 16, Data 29.01.2016, Página 4.)

No caso dos autos, o Partido Progressista de Santo Antônio do Palma não providenciou a abertura de conta corrente e, consequentemente, não teve condições de apresentar os respectivos extratos do ano sob exame, carecendo de prova fidedigna a alegação de que não recebeu valores no exercício.

Além, como salientado no parecer da PRE, ausentes de apresentação o Livro Diário e o Livro Razão, circunstância a reforçar o juízo de reprovação. Note-se que tal desobediência, mesmo isoladamente, seria motivo para a desaprovação das contas, como o precedente desta Corte demonstra:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Diretório Estadual. Exercício de 2011.

Desaprovam-se as contas quando constatadas falhas que comprometem sua confiabilidade e regularidade. No caso, existência de recursos não identificados, omissão da apresentação dos Livros Razão e Diário e valor em conta contrariando o art. 10 da Resolução TSE n. 21.841/04.

Reforma da sentença para reduzir o prazo de suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário.

Provimento parcial.

(RE n. 48-73, Relatora Desa. Maria de Fátima Freitas Labarrère. Julgado em 16.10.14, DEJERS de 20.10.14, p.3.)

Assim, a desaprovação é medida impositiva, merecendo ser mantida a sentença do juízo de 1º grau.

Finalmente, trato da alegação de indevida incidência da Lei n. 13.165/15 ao caso dos autos, trazida pelo d. Procurador Regional Eleitoral, e que diz respeito, fundamentalmente, à espécie de sanção aplicada.

Em resumo, o representante do Parquet entende que a decisão é nula e os autos devem retornar à origem, pois a magistrada sentenciante, ao desaprovar as contas, aplicou a sanção prevista no art. 37-A da Lei n. 9.096/95, dispositivo trazido ao ordenamento jurídico pela Lei n. 13.165/15, a novel “minirreforma eleitoral”.

Tem boa dose de razão o Procurador Regional Eleitoral ao afirmar que esta não é a praxe decisória deste Tribunal. De fato, nos processos de prestação de contas, adotou-se a tese da não retroatividade da Lei n. 13.165/15, aplicando-se as regras vigentes à época dos fatos, e há fartura de precedentes nesse sentido. Daí, tratando-se de prestação de contas partidárias de exercício financeiro do ano de 2014, como o caso, aplicar-se-ia a pena de suspensão de recebimento de quotas do Fundo Partidário entre 1 e 12 meses, em juízo permeado de proporcionalidade.

Assim não agiu a magistrada, na origem.

Aplicou a legislação atualmente vigente, e não os comandos legais válidos à época dos fatos. De qualquer maneira, o decisum é valido, pois a fundamentação vem lastreada em entendimento minoritário (o de aplicação da atual legislação), mas legítimo.

Inviável decretar a nulidade da sentença sob tal argumento.

Ainda, diante da inexistência de recurso do Ministério Público Eleitoral, adequar, em grau recursal, o fundamento da condenação (sem declarar nula a sentença, apenas modificando a legislação aplicada) resultaria em reformatio in pejus, pois seria cominada suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, ainda que no mínimo de um mês, agravando-se as circunstâncias de condenação havidas em 1º grau de jurisdição.

Finalmente, não se olvida que este Tribunal já optou por anular a sentença diante da ausência de determinação de suspender o repasse de quotas do Fundo Partidário. Contudo, tratava-se de caso em que a decisão de 1º grau aplicou a lei regente à época dos fatos, omitindo-se relativamente à referida suspensão.

Ressalta-se que não é esse o caso dos autos, em que o magistrado da origem expressamente aplicou a Lei n. 13.165/15, não cabendo, portanto, a mesma solução jurídica precedentemente adotada.

Diante do exposto, VOTO para afastar a matéria preliminar e para desprover o recurso, mantendo a desaprovação das contas do Partido Progressista de Santo Antônio do Palma relativas ao exercício financeiro de 2014.