RE - 3033 - Sessão: 21/06/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por SPE PARQUE FIGUEIRAS EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO LTDA. contra decisão do Juízo da 158ª Zona Eleitoral (fls. 117-121), que julgou procedente a representação por doação acima do limite legal ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, condenando a ora recorrente ao pagamento de multa no valor de R$ 37.500,00 (trinta e sete mil e quinhentos reais), nos termos do art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97.

Em suas razões recursais, alega a licitude da doação de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais) ao candidato Nelson Luiz da Silva, realizada por deliberação do grupo econômico do qual a empresa recorrente faz parte. Sustenta a necessidade de aferição de um critério genérico que considere a capacidade econômica além das informações da Receita Federal (fls. 139-148).

Com contrarrazões pela manutenção da decisão (fls. 156-157v.), os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso, com a manutenção da condenação à multa (fls. 166-171).

É o relatório.

VOTOS

Dr. Silvio Ronaldo Santos de Moraes (relator):

O recurso é regular, tempestivo e merece conhecimento.

Cuida-se de recurso em representação por doação acima do limite legal previsto no artigo 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97, dispositivo atualmente revogado pela Lei n. 13.165/15, mas que estava vigente à época da doação:

Art. 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações.

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a dois por cento do faturamento bruto do ano anterior à eleição.

Não obstante a revogação, a jurisprudência desta Corte está alinhada ao entendimento do TSE no sentido da inaplicabilidade das alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/2015, que revogaram o art. 81 da Lei n. 9.504/97, aos fatos ocorridos antes da sua vigência (Recurso Eleitoral n. 334, Acórdão de 03.03.2016, Relatora DESA. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 39, Data 07.03.2016, Página 3 ).

Na hipótese dos autos, está comprovada a doação efetuada pela representada no pleito de 2014, no valor de R$ 7.500,00 (fls. 7 e 100). Contudo, tendo sido constituída em 21.01.2014, a empresa estava impedida de doar para campanha eleitoral por ausência de faturamento em 2013, ano que antecedeu as eleições, sob pena de incidir na multa prevista no § 2º do art. 81 da Lei n. 9.504/97, cujo parâmetro para aplicação é o próprio valor despendido.

Essa é a linha da jurisprudência que acosto:

Recurso. Representação. Doação para campanha eleitoral acima do limite legal. Pessoa jurídica. Art. 81 da Lei n. 9.504/97. Eleições 2014.

Ausente o faturamento bruto no ano anterior ao pleito, conclui-se pela proibição da doação, caracterizando como excesso o próprio valor doado.

Confirmada a ilicitude, há incidência objetiva de sanção eleitoral. Manutenção da multa imposta no patamar mínimo estabelecido pela lei. Afastada, entretanto, a penalidade de proibição de licitar e contratar com o Poder Público.

Provimento parcial.

(TRE-RS – Recurso Eleitoral n. 1446, Acórdão de 28.4.2016, Relator DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 75, Data 02.5.2016, Página 5). (Grifei.)

REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. FATURAMENTO BRUTO, RECEITA BRUTA E OUTRAS RECEITAS OPERACIONAIS. INVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 279/STF e 7/STJ. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICÁVEL. ART. 23, § 7º, DA LEI Nº 9.504/97. INAPLICÁVEL ÀS PESSOAS JURÍDICAS. PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DE FATURAMENTO BRUTO NO ANO ANTERIOR AO DA ELEIÇÃO. DOAÇÃO ELEITORAL. IMPOSSIBILIDADE. MULTA. BASE DE CÁLCULO. VALOR DO EXCESSO QUE, NESSE CASO, É O MONTANTE INTEGRAL DA DOAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Verificar se o montante relativo à rubrica "outras receitas operacionais", no exercício de 2009, é apto e suficiente a conferir legalidade à doação eleitoral, demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que encontra óbice nas Súmulas 279/STF e 7/STJ.

2. O princípio da insignificância não se aplica às representações propostas com fulcro em doação eleitoral acima do limite legalmente estabelecido.

3. Não é aplicável às pessoas jurídicas o disposto no art. 23, § 7º, da Lei nº 9.504/97, que permite, sem caracterizar excesso, a doação para campanhas de até R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) em recursos estimáveis em dinheiro.

4. Não havendo faturamento bruto no exercício de 2009, ano anterior ao da eleição, a pessoa jurídica não poderia ter realizado doação para escrutínio de 2010. Assim, o excesso sobre o qual deve ser calculada a multa é o próprio valor doado.

5. Agravo regimental desprovido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 36485, Acórdão de 19.8.2014, Relatora Min. LAURITA HILÁRIO VAZ, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 163, Data 02.9.2014, Página 99). (Grifei.)

O juízo de origem, sob esse mesmo fundamento, entendeu manifesta a ilegalidade da doação.

A recorrente sustenta a tese do grupo econômico para amparar o ato, asseverando que o aporte para a concretização do propósito da empresa se dá com recursos dos sócios, visto que, em conjunto, as empresas integrantes do grupo possuem maior monta de recursos financeiros, o que abarcaria até doações de valores maiores do que o ora impugnado.

Sem razão, contudo.

O parâmetro para doação era calculado sobre o faturamento bruto da empresa doadora no ano anterior ao do pleito. No caso do grupo econômico, no qual cada empresa integrante possui CNPJ diferente, o quantum a ser doado é calculado de forma individual, e não sobre a receita do grupo. A responsabilidade solidária entre os seus componentes não se confunde, para efeito eleitoral, com o critério para avaliação da importância autorizada pela lei.

Essa é a orientação jurisprudencial:

ELEIÇÕES 2010. AGRAVO REGIMENTAL. REPRESENTAÇÃO COM BASE NO ART. 81 DA LEI Nº 9.504/1997. DOAÇÃO DE PESSOA JURÍDICA ACIMA DO LIMITE LEGAL. DESPROVIMENTO. 1. Juízo primeiro de admissibilidade do recurso especial eleitoral: ausência de usurpação de competência do TSE. Na linha da jurisprudência do TSE, "o Tribunal a quo pode adentrar no mérito recursal sem que isso implique usurpação de competência do TSE, uma vez que esta Corte não está vinculada ao juízo de admissibilidade realizado na instância de origem" (AgR-AI n. 325-06/PR, rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 7.11.2013). 2. Não há que falar em violação do art. 275 do Código Eleitoral quando o Tribunal de origem enfrenta todas as questões jurídicas relevantes para a solução do caso concreto, porém de forma contrária aos interesses da recorrente. A omissão que justifica a oposição de embargos de declaração "é aquela advinda do próprio julgamento e prejudicial à compreensão da causa, não aquela deduzida com o fito de provocar o rejulgamento da demanda ou modificar o entendimento manifestado pelo julgador" (ED-AgR-AI n. 10.804/PA, rel. Min. Marcelo Ribeiro, julgados em 3.11.2010). 3. O limite de doação estabelecido no art. 81 da Lei nº 9.504/1997 é calculado sobre o faturamento bruto da pessoa jurídica, não do grupo econômico à qual pertence. Precedentes. 4. Recurso desprovido.

(TSE – AgR-AI 183341 SP, Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Data de Julgamento 11.11.2014, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 233, Data 11.12.2014, Página 17). (Grifei.)

 

EMENTA. RECURSO ELEITORAL. DOAÇÃO. CAMPANHA ELEITORAL. PLEITO 2010. PESSOA JURÍDICA. INOBSERVÂNCIA DO LIMITE LEGAL. ART. 81 DA LEI N.º 9.504/97. PRAZO. 180 DIAS APÓS A DIPLOMAÇÃO. ALEGAÇÕES PRELIMINARES REJEITADAS. INOCORRÊNCIA DE PERDA DO DIREITO. OBSERVÂNCIA DO PRAZO. REGULARIDADE DA INTERPOSIÇÃO PELA PROCURADORIA REGIONAL EM JUÍZO ENTÃO COMPETENTE. RATIFICAÇÃO PELO PROMOTOR. LEGITIMIDADE ATIVA. OBTENÇÃO DOS DADOS FISCAIS. PROVIMENTO JUDICIAL. LEGALIDADE. PROVA DO FATO CONSTITUTIVO. CERTIDÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL. PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL. REJEIÇÃO. INSTITUIÇÃO UNA E INDIVISÍVEL. TESE DO GRUPO ECONÔMICO. INADMISSIBILIDADE. EMPRESA ESPECÍFICA COM CNPJ IDENTIFICADO NO RECIBO ELEITORAL. RENDIMENTOS AUFERIDOS, PELA EMPRESA, NO ANO ANTERIOR AO PLEITO. § 2.º DO ART. 81 CONSTITUCIONAL. PENALIDADE DISPOSTA LEGALMENTE. CONTROLE JUDICIAL. SANÇÃO APLICADA DE FORMA PROPORCIONAL E RAZOÁVEL ENTRE O MÍNIMO E O MÁXIMO. MULTA COMINATÓRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO. CONHECIMENTO. PROVIMENTO PARCIAL. […] Tendo sido a inicial acompanhada do recibo eleitoral, emitido quanto à doação feita, e de certidão, expedida pela Secretaria deste Regional, indicando o excesso de doação apurado pela Receita Federal, regularmente produzido em cumprimento de determinação judicial, não prosperam as alegações de inépcia da inicial pela inexistência da prova do fato constitutivo do pedido punitivo. A pessoa jurídica, que pode efetuar doações para campanhas eleitorais, de acordo com o art. 81 da Lei das Eleições, deve ser considerada como aquela indicada no recibo eleitoral, identificada e inscrita em CNPJ específico, sendo irrelevante se pertence ou não a grupo econômico, mesmo porque a existência de CNPJs diferentes identifica a existência de empresas diferentes, as quais possuem limites próprios para doações diversas, inexistindo, na seara eleitoral, a possibilidade de admitir, para efeito de apurar o limite legal de doação, a responsabilidade solidária entre as empresas que compõem o grupo. Embora a companhia detenha a totalidade do capital social da doadora, sendo, portanto, a única acionista, a mesma está inscrita em CNPJ diverso, a qual poderia efetuar doação independente da outra, daí porque apenas o faturamento auferido pela empresa com o CNPJ mencionado no recibo eleitoral é que pode ser considerado para efeitos do limite de doação. O limite de doação é dado pelo faturamento informado à Receita Federal na declaração de imposto de renda de pessoa jurídica, apresentada em exercício anterior ao do pleito. Não há que se falar em inconstitucionalidade do § 2.º do art. 81 da Lei n.º 9.504/97, sob a alegação de que o valor mínimo da multa (cinco vezes o excesso) seria abusivo, porquanto, apesar de bastante enérgico, esse rigor para doações para campanha acima do limite legal se faz necessário em razão dos valores envolvidos e resguardados pela legislação eleitoral e pela própria Constituição. Para o caso presente, é a penalidade, aplicada no mínimo legal, medida coercitiva e educativa suficiente, além de atender à justiça da causa e à finalidade da lei, mormente quando observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, como limitadores dos excessos e da discricionariedade. Improcedente a alegação de inconstitucionalidade do critério censitário de 2% do faturamento bruto do ano anterior à eleição por afronta ao art. 5.º, 14 §§ 9.º e 10 da Constituição. Ao estabelecer como critério o faturamento do ano anterior, quis impedir a criação de empresas apenas no ano da eleição para legitimar doações de valores de origem escusa. Por isso, apenas empresas já existentes, regularizadas, e que tenham contribuído ao Fisco é que podem efetuar doações para campanhas eleitorais. A disponibilidade do dinheiro não é suficiente para legitimar a doação, exigindo-se a demonstração do faturamento declarado ao Fisco pelas empresas regularmente constituídas. Restando comprovada que a doação em excesso é, de toda, ilícita, impõe-se, razoável e proporcionalmente, a incidência da pena de multa em seu mínimo legal (§ 2.º do art. 81 da Lei n.º 9.504/1997), já que à empresa doadora impunha-se o ônus de observar os ditames legais para prática da doação em comento. Em relação à penalidade de multa aplicada em face de doação ilegal, a atualização monetária deve incidir apenas a partir do trânsito em julgado, ou seja, da data em que ela se tornou exigível. Recurso conhecido e provido, parcialmente, apenas para corrigir a sentença para determinar a correção monetária do valor da multa a partir do trânsito em julgado da decisão. Decisão com resolução de mérito, nos termos do art. 269, inciso I, do CPC.

(TRE-MS – RE 9049 MS, Relator LUIZ CLÁUDIO BONASSINI DA SILVA, Data de Julgamento: 19.6.2012, Data de Publicação: DJE - Diário da Justiça Eleitoral, Tomo 608, Data 19.6.2012, Páginas 4-6). (Grifei.)

A norma tinha caráter objetivo, não cabendo ao intérprete ponderar sobre o porte da empresa e a sua capacidade econômica. Como visto no julgado acima, ao estabelecer como critério o faturamento do ano anterior ao pleito, o legislador pretendeu impedir a criação de empresas apenas no ano da eleição para legitimar doações de valores de origem escusa. Por isso, apenas pessoas jurídicas já existentes, regularizadas, e que tenham declarado rendimentos no ano que antecede as eleições podiam efetuar doações para campanhas eleitorais, limitadas a 2% do faturamento bruto.

Desse modo, não se sustenta o argumento da recorrente quanto à sua capacidade econômica, pois a disponibilidade do dinheiro não legitima a doação, exigindo-se a demonstração do que foi declarado à Receita Federal.

Segundo ela, seu faturamento de março de 2014 a fevereiro de 2015, conforme declaração da sua contadora, comprova que possuía recursos suficientes para autorizar o montante doado, respeitando o limite de 2% exigido pela norma eleitoral.

No entanto, essa circunstância não afasta a ilegalidade, pois o faturamento analisado é o declarado no ano anterior ao da eleição.

Ainda, trago recente decisão desta Corte que afirma a legitimidade dos dados fornecidos pela Receita como prova dos rendimentos alcançados pela pessoa jurídica:

Recurso. Representação. Doação para campanha eleitoral acima do limite legal. Pessoa jurídica. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014. Inaplicabilidade das alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15, que revogaram o art. 81 da Lei n. 9.504/97, aos fatos ocorridos antes da sua vigência. Utilização dos dados fornecidos pela própria empresa doadora perante a Receita Federal para fins de cálculo do limite para a doação eleitoral. Ultrapassados os limites impostos pelo art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97, que restringe a doação a dois por cento do faturamento bruto auferido pela pessoa jurídica no ano anterior à eleição, há incidência objetiva de sanção eleitoral. O documento particular, juntado com a finalidade de comprovar dividendos auferidos em participações em outras empresas, não se sobrepõe ao documento oficial emitido pela Receita Federal. Aplicação de multa no patamar mínimo legal. Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 3749, Acórdão de 10.3.2016, Relatora DRA. MARIA DE LOURDES GALVÃO BRACCINI DE GONZALEZ, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 44, Data 14.3.2016, Página 4.)(Grifei.)

Logo, identificada a ilicitude da doação, nada há o que reparar na sentença impugnada, que fixou multa de R$ 37.500,00 (trinta e sete mil e quinhentos reais), equivalente a cinco vezes o valor doado, e deixou de aplicar a proibição de participar de licitações públicas, haja vista o entendimento firmado de que essa penalidade não decorre automaticamente do ilícito, mas depende, para a sua incidência, da gravidade da situação e de um juízo de proporcionalidade a ser realizado sobre o caso.

Nos autos, não há evidência de má-fé por parte da representada. Ademais, o montante da doação não se mostra grave o suficiente para justificar tão elevada penalidade de proibição de participar de licitações e de contratar com o Poder Público, sendo a multa suficiente para sancionar o excesso da doação.

Assim, mostra-se adequada a decisão de primeiro grau, motivo pelo qual VOTO pelo desprovimento do recurso.

 

(Após votar o relator, negando provimento ao recurso, no que foi acompanhado pela Dra. Maria de Lourdes, pediu vista o Des. Carlos Marchionatti. Aguardam o voto-vista o Des. Paulo Afonso e o Dr. Jamil Bannura. Julgamento suspenso.)