PET - 572 - Sessão: 18/05/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de pedido de perda de mandato eletivo por infidelidade partidária ajuizada pelo PARTIDO DA REPÚBLICA – PR em desfavor de VOLNEI DA SILVA ALVES, deputado estadual eleito pelo PR nas eleições de 2014 e 1º vice-presidente da agremiação, e PARTIDO SOCIAL CRISTÃO – PSC.

Narra a inicial que, no dia 16.01.2016, antes do prazo de desfiliação autorizado pela EC 91/16, o requerido, único deputado estadual eleito pelo PR, filiou-se ao Partido Social Cristão, em evento financiado e organizado pela assessoria do próprio parlamentar, o qual foi realizado com a finalidade específica de noticiar a assinatura da ficha de filiação. A migração de partido seria notória, fato divulgado pelo PSC e pela imprensa, conforme seguintes elementos de prova: a) fotografias que retratam o deputado com líderes do PSC e a solenidade destinada à assinatura da ficha de filiação; b) filmagem de discurso do requerido; c) cópia do contrato de locação para a convenção do PSC, no qual consta como locatário o assessor parlamentar do requerido; d) migração do assessor parlamentar do deputado para o PSC, com permanência de suas atividades no gabinete do demandado; e) vídeo no qual o presidente do PSC convoca filiados a comparecem ao evento, porque o partido agora teria um deputado; f) matéria publicada por emissora de rádio afirmando que o parlamentar deixaria o partido em março; g) confecção de um banner do PSC com inscrição do nome do demandado; h) e-mails relatando que filiados ao PR estariam promovendo desfiliações por orientação do deputado Volnei; i) e-mail em que um vereador eleito pelo PSC pede apoio ao demandado. Concluiu que houve ato de infidelidade partidária suficiente para a determinação da perda do cargo eletivo. Requereu o afastamento liminar de Volnei da Silva Alves do exercício do mandato (fls. 2-16). Juntou prova documental e mídia com vídeos do evento (fls. 17-50) e postulou a oitiva de testemunhas (fls. 51-52).

A liminar foi indeferida e o PR foi intimado para emendar a petição inicial a fim de promover a citação do partido para o qual teria migrado o mandatário pretensamente infiel (fl. 54 e verso).

Cumprida a determinação (fl. 57), e expedidas as cartas de citação (fls. 69-70), os requeridos ofereceram respostas.

O Partido Social Cristão suscitou preliminar de falta de interesse processual, devido à ausência de prova da desfiliação do detentor do cargo eletivo, que permanece filiado ao PR; e arguiu sua ilegitimidade passiva ad causam em face da inexistência de prova da filiação ao PSC. Requereu a extinção do feito sem resolução de mérito e a declaração da inexistência do direito material pleiteado (fls. 72-78).

Volnei da Silva Alves respondeu à ação aduzindo preliminar de ausência de citação, ao argumento de que, embora tenha sido procurado para assinatura de um AR, a sua citação deveria ser pessoal. Alega carecer ao autor interesse de agir, em face da permanência de sua filiação ao PR e da inexistência de ato de desfiliação. Considera ser caluniosa a afirmativa de que se encontra filiado ao PSC, e que o demandante forjou provas nesse sentido. Disse que a ação representa perseguição partidária, ausente apuração dos fatos em processo intrapartidário. Explica que “por ser missionário próprio das palavras do Livro do Antigo Testamento, tornou-se popular entre os filiados e membros do Partido Social Cristão”. Narra receber convites para palestras e uma possível coligação entre o PR e o PSC devido à sua atividade como missionário. Afirma ter sido visitado, em seu gabinete, por um amigo pessoal, integrante da direção do PSC, acompanhado de outro filiado à legenda. Assinala ter apenas comparecido ao evento promovido pelo PSC na condição de palestrante, razão pela qual seu nome foi grafado no banner, material que lhe foi entregue como lembrança. Entende tratar-se de mera especulação a matéria divulgada na imprensa relativa à sua migração partidária. Refere terem sido enviados, em datas muito próximas, os e-mails mencionados na inicial, e que o vídeo no qual o presidente do PSC menciona a sua provável filiação ao partido consistiu em “artimanha da propaganda para atrair mais pessoas ao evento”. Defende que seu assessor parlamentar apenas prestou ajuda ao PSC na busca de espaço para a solenidade partidária, tendo assinado o contrato de locação na ausência de um filiado ao PSC para firmá-lo (fls. 103-114). Arrolou testemunhas e juntou documentos (fls. 115-117).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral apresentou parecer de mérito pela procedência dos pedidos (fls. 119-126).

Para exame da prefacial de nulidade por falta de citação, solicitei informações à Secretaria Judiciária (fl. 128), a qual manifestou-se informando o que segue (fl. 132):

Antes do retorno do Aviso de Recebimento - AR, o PSC apresentou resposta e juntou procuração em 16/02/2016 (fls. 72-97).

Igualmente, antes do retorno do AR, em 18/02/2016, o requerido Volnei Silva Alves protocolou instrumento de mandato, constituindo procurador, que retirou, nesta mesma data, os autos em carga com a finalidade de apresentar resposta (fl. 98-102). O processo foi devolvido ao Cartório em 23/02/2016 com a Resposta protocolada sob o n. 5.622/2016 (fls. 103-117).

Em 24/02/2016 os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, retornando com parecer em 29/02/2016, sendo conclusos nessa mesma data (fls. 118-127).

Por fim, cabe informar que o AR referente à Carta de Citação n. 006/2016 foi devolvido na CORIP em 07/03/2016, com a assinatura de Aline O Coitinho, Identidade n. 2090604341, como recebedora (fl. 131).

O AR relativo à carta de citação enviada a Volnei da Silva Alves foi juntado à fl. 133, em 10.3.2016.

Em nova petição, o parlamentar requereu o julgamento antecipado do feito sob a alegação de que há falta de interesse de agir, uma vez que o primeiro suplente a assumir o cargo eletivo seria de outro partido que não o PR, devido à coligação com outras legendas formada nas eleições de 2014. Asseverou que o partido requerente ajuizou a ação com abuso de poder, e que as provas acostadas com a inicial foram obtidas por meios ilícitos, caracterizando fraude e má-fé. Postulou a extinção do feito e invocou a existência de fumaça do bom direito e de perigo da demora, devido ao prejuízo causado em sua imagem por meio de informações no sentido de que seu mandato estaria em risco (fls. 135-141). Juntou novos documentos (fls. 142-185).

Com a decisão das fls. 187-188 afastei as preliminares de: a) falta de interesse de agir por ausência de suplentes, uma vez que o PR elegeu suplentes aptos a assumir o mandato eletivo em caso de procedência da ação; e b) nulidade por ausência de citação, por inexistência de previsão no sentido de que os deputados estaduais usufruam da prerrogativa de citação pessoal, e em razão do comparecimento espontâneo do demando, que ofereceu defesa de mérito, juntou provas e arrolou testemunhas. O enfrentamento das demais prefaciais, por tangenciarem o mérito, foi postergado para a decisão final.

O pedido de oitiva de testemunhas foi indeferido e a instrução foi encerrada, com abertura de prazo para apresentação de alegações finais.

O Partido Social Cristão manifestou-se reiterando as preliminares de ilegitimidade passiva ad causam e de falta de interesse do Partido da República, devido à ausência de provas de ato de desfiliação partidária (fls. 192-195).

Volnei da Silva Alves sustentou que permanece filiado ao Partido da República e reiterou a preliminar de falta de interesse do PR, entendendo que o suplente a assumir eventual cargo eletivo seria de outro partido, o PCdoB, agremiação que integrou coligação com o PR nas eleições de 2014. Alegou que sofre perseguição partidária do presidente do Partido da República, Sr. Cajar Nardes, o qual, unido com o secretário-geral do PR, teria roubado a senha do seu e-mail particular e o contrato de locação do evento ocorrido no dia 16.1.2016, documento que estava junto aos pertences pessoais do assessor parlamentar do requerido Volnei. Assevera que os e-mails colacionados, nos quais filiados ao PR afirmam terem sido convidados pelo mandatário a migrar para o PSC, foram forjados, e que Cajar Nardes editou o vídeo anexado aos autos a fim de denegrir sua imagem e impedir a sua assunção ao cargo de presidente do Partido da República (fls. 197-203).

O Partido da República invocou os argumentos expostos no parecer ministerial das fls. 119-126, o art. 1º da Constituição Federal, e requereu a procedência dos pedidos (fls. 205-207).

A Procuradoria Regional Eleitoral ratificou o parecer de mérito das fls. 119-126, que opinou pelo julgamento de procedência dos pedidos, ressaltando o interesse jurídico do PR no feito, uma vez que elegeu suplente para o cargo de deputado estadual no pleito de 2014 (fls. 209-210v.).

Após conclusos os autos para julgamento, o Partido Social Cristão juntou petição e documentos (fls. 214-216), demonstrando que o mandatário requereu sua desfiliação partidária do Partido da República em 2.3.2016, e filiou-se ao PSC em 17.3.2016, em observância ao prazo estabelecido na EC 91/16.

Ato contínuo, o Partido da República manifestou-se pela ciência dos fatos e requereu o imediato julgamento do feito (fls. 219-220).

Determinei abertura de nova vista à Procuradoria Regional Eleitoral (fl. 222), que se manifestou no sentido da ratificação do parecer de mérito pela procedência do pedido de declaração da desfiliação partidária sem justa causa, consignando que os novos documentos juntados embasam o raciocínio de que os fatos discutidos no feito são anteriores à promulgação da EC 91/16 (fls. 226-227).

É o relatório.

 

VOTOS

Dr. Leonardo Tricot Saldanha (Relator)

Antes de adentrar no exame do mérito, passo ao enfrentamento das preliminares suscitadas, observando que as alegações de falta de interesse por ausência de suplentes do PR, e de nulidade por ausência de citação pessoal do parlamentar, foram devidamente afastadas pela decisão das fls. 187-188, contra a qual não se insurgiram as partes.

Apenas porque foi reiterada a arguição em sede de alegações finais, no sentido de que não haveria suplentes do PR a assumir o mandato na hipótese de eventual vacância do cargo eletivo, cumpre frisar o entendimento do STF no sentido de que o direito de preenchimento da vaga é do partido político detentor do mandato, e não da coligação partidária:

LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. PREENCHIMENTO DE VAGA DECORRENTE DE RENÚNCIA A MANDATO PARLAMENTAR. PARTIDO POLÍTICO. COLIGAÇÃO PARTIDÁRIA. Questão constitucional consistente em saber se a vaga decorrente de renúncia a mandato parlamentar deve ser preenchida com base na lista de suplentes pertencentes à coligação partidária ou apenas na ordem de suplentes do próprio partido político ao qual pertencia o parlamentar renunciante.

1. A jurisprudência, tanto do Tribunal Superior Eleitoral (Consulta 1.398), como do Supremo Tribunal Federal (Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604), é firme no sentido de que o mandato parlamentar conquistado no sistema eleitoral proporcional também pertence ao partido político.

2. No que se refere às coligações partidárias, o TSE editou a Resolução n. 22.580 (Consulta 1.439), a qual dispõe que o mandato pertence ao partido e, em tese, estará sujeito à sua perda o parlamentar que mudar de agremiação partidária, ainda que para legenda integrante da mesma coligação pela qual foi eleito.

3. Aplicados para a solução da controvérsia posta no presente mandado de segurança, esses entendimentos também levam à conclusão de que a vaga deixada em razão de renúncia ao mandato pertence ao partido político, mesmo que tal partido a tenha conquistado num regime eleitoral de coligação partidária. Ocorrida a vacância, o direito de preenchimento da vaga é do partido político detentor do mandato, e não da coligação partidária, já não mais existente como pessoa jurídica.

4. Razões resultantes de um juízo sumário da controvérsia, mas que se apresentam suficientes para a concessão da medida liminar. A urgência da pretensão cautelar é evidente, tendo em vista a proximidade do término da legislatura, no dia 31 de janeiro de 2011.

5. Vencida, neste julgamento da liminar, a tese segundo a qual, de acordo com os artigos 112 e 215 do Código Eleitoral, a diplomação dos eleitos, que fixa a ordem dos suplentes levando em conta aqueles que são pertencentes à coligação partidária, constitui um ato jurídico perfeito e, a menos que seja desconstituído por decisão da Justiça Eleitoral, deve ser cumprido tal como inicialmente formatado.

6. Liminar deferida, por maioria de votos.

(STF, MS 29.988-MC, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJE 7.6.2011.) (Grifei.)

O resultado das eleições proporcionais estaduais do pleito de 2014 demonstra que, apesar de ter integrado coligação com outras siglas partidárias, o PR elegeu suplentes para o cargo de deputado estadual, prevalecendo o interesse jurídico do partido em requerer a perda do mandato eletivo de parlamentar pretensamente infiel eleito pela sigla.

Relativamente à preliminar de ilegitimidade passiva ad causam do Partido Social Cristão, tem-se que a agremiação integra o feito devido à afirmação de que o deputado estadual requerido filiou-se ao PSC em 16 de janeiro de 2016. Nessas circunstâncias, oportunizou-se à legenda o mais amplo contraditório a fim de defender o cargo eletivo em disputa nos autos.

Demais disso, conforme referi na decisão da fl. 54 e verso, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral orienta-se no sentido de que o mandatário pretensamente infiel e seu novo partido são litisconsortes passivos necessários nas ações de infidelidade partidária:

ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CARGO. VEREADOR. AÇÃO PERDA DE CARGO ELETIVO POR DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DE PARTIDO POLÍTICO NA EXORDIAL. ACÓRDÃO REGIONAL QUE ASSENTOU A DECADÊNCIA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. AUSÊNCIA DE CERTEZA JURÍDICA ACERCA DA FILIAÇÃO A NOVO PARTIDO POLÍTICO NO MOMENTO DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO RECONHECIDA PELA JUSTIÇA ELEITORAL. SINGULARIDADE QUE AFASTA EVENTUAL DECADÊNCIA. RECURSO ESPECIAL AO QUAL SE DÁ PROVIMENTO.

1. O litisconsórcio passivo necessário entre o candidato eleito e a novel agremiação a que tenha se filiado é medida que se impõe em ações de perda de mandato eletivo por suposta infidelidade partidária, a teor do art. 4º da Res.-TSE nº 22.610/2007.

2. O art. 4º da Res.-TSE nº 22.610/2007 preconiza que tanto o mandatário (i.e., candidato eleito) quanto o (novo) partido em que esteja inscrito após a desfiliação devem ser citados para apresentar a resposta.

3. O litisconsorte passivo necessário reclama sua formação nos processos de perda de mandato eletivo por desfiliação partidária apenas e tão somente nas hipóteses em que o mandatário esteja filiado a novo partido político na data da propositura da ação, de sorte que descabe reconhecer a decadência do direito da ação pela ausência de indicação do litisconsorte sempre que a própria Justiça Eleitoral verificar que o parlamentar não se encontrava filiado a qualquer agremiação partidária.

4. No caso sub examine,

a) A despeito de haver ingressado com a presente ação tempestivamente, em 9.12.2013 (fls. 2), o Recorrente não promoveu a citação do Partido Republicano da Ordem Social (PROS) na exordial, resultando na extinção do processo com resolução do mérito, em virtude da assentada decadência.

b) Nada obstante, mostrou-se inviável a exigência de citação da agremiação para compor a lide, ante a ausência de certeza jurídica quanto à existência de nova filiação partidária, de acordo com documento emitido pela própria Justiça Eleitoral.

5. Recurso especial provido para afastar a decadência e determinar ao Tribunal Regional Eleitoral do Pará que prossiga na análise da desfiliação partidária como entender de direito.

(TSE, REspe n. 23517, rel. Min Luiz Fux, DJE 15.9.2015.)

Portanto, o PSC possui legitimidade para responder à ação, garantindo-lhe, assim, ampla defesa e contraditório.

As preliminares relativas à ausência de prova da desfiliação do parlamentar demandado, que permaneceria filiado ao PR, e de inexistência de filiação ao PSC, confundem-se com o mérito e com este serão ora analisadas, uma vez que o PR defende que o conjunto de documentos juntados aos autos comprovam a existência de desfiliação partidária e respectiva filiação ao partido PSC, circunstância que demanda análise probatória.

De acordo com a inicial, apesar da ausência de formalização escrita junto ao Partido da República e à Justiça Eleitoral, o Deputado Estadual Volnei da Silva Alves efetuou nova filiação partidária no Partido Social Cristão, em evento ocorrido no dia 16.1.2016.

Igualmente, de forma não oficial, afirma-se que o parlamentar requerido teria praticado atos políticos dando conta de sua desfiliação partidária e migração para o PSC.

Argumenta-se que, em janeiro de 2016, ciente da PEC que tramitava no Congresso Nacional e levou à edição da Emenda Constitucional n. 91 – a qual facultou a parlamentares o desligamento do partido pelo qual foram eleitos, sem prejuízo do mandato – o mandatário aliou-se ao PSC, assinou ficha de filiação e passou a integrar o partido.

Tais atos consubstanciariam infidelidade partidária, uma vez que a norma somente autorizou a migração nos trinta dias seguintes à data de sua promulgação, ocorrida em 19.2.2016.

Os fatos ensejadores de infidelidade partidária estariam caracterizados pelas seguintes provas acostadas aos autos:

a) fotos retratando o deputado com líderes do PSC em seu gabinete junto à Assembleia Legislativa, publicadas no site de relacionamentos facebook (fl. 3);

b) fotografias da convenção destinada à assinatura da ficha de filiação do parlamentar ao PSC, realizada no Hotel Ritter, em Porto Alegre, e filmagem do discurso promovido pelo requerido no local (mídia da fl. 24);

c) cópia do contrato de locação da sala em que foi realizado o evento, no qual consta como locatário o assessor parlamentar do deputado requerido, Altair Alves Pereira (fls. 26-32, 34 e 36);

d) desfiliação do assessor Altair Alves Pereira do PR, e sua respectiva filiação ao PSC, com permanência de atividades junto ao gabinete do parlamentar (fl. 37);

e) vídeo em que o presidente do PSC convoca filiados ao PSC a comparecerem no evento de filiação do requerido, no qual afirma que “o Partido Social Cristão do Rio Grande do Sul terá um deputado”, divulgado nas redes sociais facebook e whatsapp (mídia da fl. 24);

f) matéria publicada no portal da internet da emissora Rádio Guaíba, em 17.1.2016, sob o título “Missionário Volnei deixa PR em março” (fl. 6);

g) confecção de um banner do PSC no qual o nome do requerido consta como integrante da agremiação (fl. 7);

h) e-mails nos quais os presidentes de diretórios municipais do PR afirmam que eleitores estão promovendo desfiliações por orientação do demandado (fls. 40, 43-46);

i) e-mail enviado ao deputado requerido por vereador eleito pelo PSC, solicitando-lhe apoio (fls. 48-50);

j) nota divulgada no Jornal NH de 19.1.2016: “E-mail atribuído à assessoria do deputado estadual Missionário Volnei diz que ele trocou o PR pelo PSC – a assessoria do parlamentar gaúcho não confirma a informação” (fl. 166);

k) matéria veiculada no portal da internet da emissora Rádio Guaíba em 25.1.2016: “Alegando infidelidade partidária, PR quer cassar mandato do deputado Missionário Volnei”. No rodapé, lê-se “Deputado Missionário Volnei garante que segue no PR até 2018” (fl. 167);

l) reportagem publicada no Jornal do Comércio de 26.1.2016: “PR processa Missionário Volnei por infidelidade partidária” (fl. 168-169);

m) notícia compartilhada em blog da internet no dia 26.1.2016: “PR quer de volta o mandato do deputado Missionário Volnei. Preventivamente” (fl. 170);

n) aparte publicado no Jornal Correio do Povo de 30.1.2016: “Deputado Estadual Missionário Volnei começa a limpar a área para ingressar no PSC. Ontem, exonerou todos os Cargos em Comissão (CCs) do seu gabinete ligados ao partido da República (PR)” (fl. 171);

o) matéria veiculada no portal da internet da emissora Rádio Guaíba em 18.1.2016: “Deputado Missionário Volnei garante que segue no PR até 2018” (fl. 173);

p) reportagem publicada no Jornal Correio do Povo de 19.1.2016 afirmando: “O deputado Missionário Volnei (PR) está sendo sondado pelo PSC e tem expectativa de que aconteça uma alteração na legislação para possivelmente deixar a sigla” (fl. 174);

q) nota divulgada no Jornal Gazeta do Sul de 22.1.2016: “O troca-troca partidário também chegou à Assembleia Legislativa. O deputado estadual Missionário Volnei, que preside a CPI das Próteses, está ameaçando trocar o PR pelo PSC. […] A troca pode ocorrer em março ou apenas em 2018.” (fl. 175).

 

Observa-se que o caderno probatório traz farta documentação de atos caracterizadores de infidelidade partidária, evidenciando-se a delicadeza e a complexidade do exame do pedido de decretação de perda do cargo eletivo, em razão da ausência de juntada de prova da desfiliação do requerido do PR.

À presente ação aplicam-se as disposições previstas no art. 22-A da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.165/15, e na Resolução TSE n. 22.610/07, que asseguram aos partidos pleitearem a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária sem justa causa.

O caput do novel art. 22-A da Lei dos Partidos Políticos é categórico ao dispor que o direito de ação do partido político nasce com a desfiliação partidária do parlamentar: “Perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito”.

Esta prova não foi produzida pelo requerente.

Contudo, o Partido Social Cristão juntou petição e documentos (fls. 214-216), demonstrando que o mandatário requereu sua desfiliação partidária do Partido da República em 2.3.2016, e filiou-se ao PSC em 17.3.2016.

A consulta ao sistema de registro de filiações partidárias da Justiça Eleitoral – Filiaweb aponta que a desfiliação do Deputado Estadual Volnei da Silva Alves do Partido da República formalizou-se em 4.3.2016, data em que protocolou, perante a zona eleitoral, requerimento de desfiliação.

Até o dia 17.3.2016 Volnei não estava filiado a partido político.

Esta constatação bem evidencia que, na data do ajuizamento do feito, o mandatário permanecia filiado ao partido pelo qual foi eleito, o PR.

Em verdade, a ausência de desfiliação formal, quando do início da tramitação, é fato assumido pelo Partido da República na própria petição inicial, dado que a ação foi ajuizada justamente em vista da manifesta iminência de saída do mandatário para outra legenda em janeiro de 2016, antes do prazo que seria constitucionalmente autorizado, que se deu apenas a partir de fevereiro.

A Emenda Constitucional n. 91, de 18 de fevereiro de 2016, publicada no DOU de 19.2.2016, alterou a Constituição Federal para estabelecer a possibilidade, excepcional e em período determinado, de desfiliação partidária, sem prejuízo do mandato, nos seguintes termos:

Art. 1º É facultado ao detentor de mandato eletivo desligar-se do partido pelo qual foi eleito nos trinta dias seguintes à promulgação desta Emenda Constitucional, sem prejuízo do mandato, não sendo essa desfiliação considerada para fins de distribuição dos recursos do Fundo Partidário e de acesso gratuito ao tempo de rádio e televisão.

Art. 2º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.

Considerando a data da desfiliação contida nos assentamentos desta Justiça Especializada, 4.3.2016, verifica-se que foi observado o período de tempo previsto na emenda constitucional.

Bem observa-se que esta ação apresenta pedido sui generis de decretação de perda de cargo eletivo por desfiliação partidária não formalizada (que posteriormente veio a se concretizar, conforme demonstra a abundante prova dos autos).

Examinadas as circunstâncias específicas da causa - e nada obstante a discussão ética e moral que possa ser estabelecida quanto ao juízo de valor dos fatos retratados nos autos, a demonstrarem, estreme de dúvidas, ter ocorrido abandono partidário e migração informal para outra sigla antes do período autorizado pela Constituição Federal, tenho que o pedido deve ser analisado com criterioso rigor técnico e respeito aos requisitos formais legalmente previstos.

Há, nos autos, prova cabal e irrefragável de que o parlamentar, em janeiro de 2016, deixou a sigla partidária pela qual foi eleito, aliando-se à agremiação requerida.

A previsão do Partido da República foi certeira. Porém, apesar de real no plano dos fatos da vida, não há como acolher o pedido de perda do cargo, pois desfiliação, formalizada, realmente não havia.

Refleti muito sobre a questão porque o instituto da fidelidade partidária, embora muito caro à democracia e a todos os eleitores, vem sendo, paulatinamente, flexibilizado com o implemento dos chamados prazos de “janela”, instituídos pela reforma eleitoral de 2015 e pela EC n. 91 de 2016, com a finalidade de autorizar a mudança de partido sem prejuízo do cargo eletivo.

Ideal seria que as negociações ou arranjos que precedem as trocas partidárias se dessem nos bastidores da vida política, vindo à tona apenas o resultado desses acertos.

No caso em tela, no entanto, a negociação veio a público.

Porém, não há como considerar que durante esse período já havia ato de desfiliação suficiente para a determinação da perda do cargo eletivo, bastando, para isso, ter presente que o raciocínio inverso conduziria à possibilidade de o partido tomar o cargo de detentor de mandato que permanece filiado.

Ademais, o PR não estava desprotegido contra a atuação do mandatário, pois a Lei dos Partidos Políticos estabelece que a violação dos deveres partidários deve ser apurada e punida pelo competente órgão, na conformidade do que disponha o estatuto de cada partido (art. 23, Lei n. 9.096/95).

No ponto, ressalto que o art. 24 da Lei dos Partidos Políticos é expresso ao determinar o dever de disciplina partidária, ao dispor: “Na Casa Legislativa, o integrante da bancada de partido deve subordinar sua ação parlamentar aos princípios doutrinários e programáticos e às diretrizes estabelecidas pelos órgãos de direção partidários, na forma do estatuto”.

O art. 25, por sua vez, assegura aos partidos uma série de medidas a serem tomadas a fim de coibir atos de deslealdade dos filiados, possibilitando até mesmo que a agremiação promova o desligamento temporário do parlamentar da bancada:

Art. 25 - O estatuto do partido poderá estabelecer, além das medidas disciplinares básicas de caráter partidário, normas sobre penalidades, inclusive com desligamento temporário da bancada, suspensão do direito de voto nas reuniões internas ou perda de todas as prerrogativas, cargos e funções que exerça em decorrência da representação e da proporção partidária, na respectiva Casa Legislativa, ao parlamentar que se opuser, pela atitude ou pelo voto, às diretrizes legitimamente estabelecidas pelos órgãos partidários.

Desse modo, verifica-se que os fatos narrados constituem questões a serem discutidas de forma interna corporis pela agremiação partidária, de acordo com o estabelecido em seu estatuto.

A rigor, o exame dos autos demonstra que Volnei deveria ter sido imediatamente expulso do Partido da República. Penso que isso não ocorreu porque existe jurisprudência – anacrônica, no meu sentir - do Tribunal Superior Eleitoral, afirmando que a expulsão não gera perda do cargo eletivo. Por essa razão, o partido político fica com receio de expulsar o mandatário e perder o cargo. Na verdade, os casos de expulsão de filiado, por justa causa, deveriam equivaler-se às situações de perda de cargo por infidelidade partidária. Já houve decisão deste Tribunal, em 2011, em que destaquei que, se o mandatário praticou ações que o levaram a ser expulso, o cargo deveria permanecer com o partido (PET n. 29041, DEJERS de Data 05/12/2011). No referido processo, prevaleceu neste Tribunal o entendimento de que a expulsão não é óbice para que a agremiação proponha ação visando reaver o cargo eletivo. Mas, infelizmente, esse não é o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral. E é por isso que o Partido da República não expulsou o deputado Volnei da Silva Alves como, afinal de contas, deveria ter feito, dentro da materialidade.

Concluo, assim, que não deve ser decretada a perda do cargo eletivo na hipótese apresentada nos autos.

ANTE O EXPOSTO, afasto as preliminares suscitadas e VOTO pela improcedência dos pedidos.

 

(Por unanimidade, afastaram as preliminares e, no mérito, após o voto do relator que julgou improcedente a ação, no que foi acompanhado pela Dra. Gisele, Dra. Maria de Lourdes e Desa. Liselena, pediu vista o Des. Paulo Afonso. Aguarda o voto vista o Dr. Jamil. Julgamento suspenso.)