RC - 12547 - Sessão: 27/07/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra decisão do Juízo da 110ª ZE, que julgou improcedente a denúncia oferecida contra PEDRO MOACIR BRAGA FERREIRA, pelo delito de inscrição fraudulenta de eleitor (duas vezes) previsto no art. 290 do Código Eleitoral, conforme o terceiro e o quarto fatos, assim descritos na inicial:

3º fato:

Em data e local não precisamente apurados, mas no ano de 2012, o denunciado PEDRO MOACIR BRAGA FERREIRA induziu Luan Batista da Silva Costa a se inscrever eleitor em Imbé/RS, com infração ao disposto no artigo 42 do Código Eleitoral.

4º fato:

Em data e local não precisamente apurados, mas no ano de 2012, o denunciado PEDRO MOACIR BRAGA FERREIRA induziu Romário Jacobs de Oliveira a se inscrever eleitor em Imbé/RS, com infração do disposto no artigo 42 do Código Eleitoral.

A denúncia foi recebida no dia 7.11.2014 (fl. 109) relativamente a três acusados: LUAN BATISTA DA SILVA COSTA, ROMÁRIO JACOBS DE OLIVEIRA e PEDRO MOACIR BRAGA FERREIRA. Os réus LUAN e ROMÁRIO aceitaram ofertas de suspensão condicional do processo (fls. 123-127).

No que concerne ao recorrido, Pedro Moacir, houve citação e apresentação de defesa prévia (fls. 115-116), na qual houve manifestação no sentido de que desconhece os codenunciados Luan e Romário, bem como que os fatos narrados na denúncia jamais ocorreram.

Foi realizada a instrução, com a oitiva de VILMA DOS SANTOS, AIRTON FELISBERTO DE OLIVEIRA, JANAÍNA ZORZATO, PAULO ROBERTO FRAMIL FERNANDES e SÉRGIO LUIS FALEIRO. Em seguida, apresentaram alegações finais a acusação (fls. 229-230) e a defesa (fls. 235-237).

Na sentença (fls. 247-252) o juízo a quo considerou demonstrada a materialidade dos delitos. Contudo, entendeu duvidosa a autoria, fundamentalmente porque não haveria como afirmar, sem sombra de dúvidas, que Pedro Moacir teria sido o autor dos delitos.

Em suas razões de recurso (fls. 258-260) o Parquet de 1º Grau propõe a reforma de decisão, ao argumento central de que tanto a materialidade quanto a autoria restaram demonstradas. Indica trechos de testemunhos para corroborar o posicionamento de que os tipos penais teriam sido cometidos pelo recorrido.

Os autos vieram ao 2º Grau sem as contrarrazões de recurso. O d. procurador regional eleitoral opinou pela necessidade de manifestação expressa do recorrido, por meio do oferecimento de contrarrazões (fl. 267). Foi determinada nova intimação da defesa (fl. 269); apresentada resposta ao recurso (fls. 304-308).

Os autos, então, foram remetidos novamente à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo provimento do recurso do Ministério Público Eleitoral (fls. 310-318).

É o relatório.

 

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo. O Ministério Público Eleitoral foi intimado no dia 02.10.2015, conforme certificado à fl. 257, e o recurso foi interposto na mesma data (fl. 258), dentro do prazo de 10 (dez) dias, conforme o art. 362 do Código Eleitoral.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

 

MÉRITO

Foi imputada, ao recorrido, a conduta tipificada no art. 290 do Código Eleitoral:

Indução à inscrição fraudulenta de eleitor

art. 290 Induzir alguém a se inscrever eleitor com infração de qualquer dispositivo deste Código.

Pena - Reclusão até 2 anos e pagamento de 15 a 30 dias-multa.

Na doutrina, o delito é tratado, dentre outros, por Suzana de Camargo Gomes, que estabelece dois elementos fundamentais para a ocorrência (Crimes Eleitorais. Editora RT, 4ª Edição, 2010, p. 100).

[…]

Portanto, dois elementos devem estar presentes para que se dê a consumação do crime, sendo o primeiro expresso no induzimento à inscrição, e o segundo consistente na violação das normas eleitorais. De sorte que o mero auxílio prestado com o fim de que venha a pessoa a alistar-se não caracteriza o delito em questão, posto que inexistente, neste caso, a ofensa à lei eleitoral. Ao contrário, há o cumprimento da norma.

Aos fatos.

Eles ocorreram no ano de 2012, no Cartório da 110ª Zona Eleitoral, sediado em Tramandaí, e relativos à transferência de títulos de dois eleitores no Município de Imbé, municipalidade também sob a circunscrição eleitoral da referida 110ª ZE.

Conforme o recorrente, Pedro Moacir Braga Ferreira, o “Pedro da ONG”, teria induzido os eleitores Luan Batista da Silva Costa e Romário Jacobs de Oliveira (que, também denunciados, aceitaram a suspensão condicional do processo) a se inscreverem de forma fraudulenta (art. 290 do CE) – tese não acolhida pelo juízo sentenciante.

À análise da prova.

Não há elementos suficientes para a construção de um juízo condenatório.

Isso porque inexistem provas, nos autos, que deem guarida à tese da ocorrência de indução ao ato de inscrição fraudulenta. As inscrições fraudulentas de Luan e Romário, de fato, têm as suas ocorrências estampadas. Contudo, a escassez de informações traz dúvida razoável sobre a autoria de Pedro Moacir relativamente à indução, como asseverado na sentença.

Senão, vejamos.

O recurso da Promotoria Eleitoral sustenta que “[…] conforme o relatório da Autoridade Policial, o acusado Pedro já teria tido esta mesma conduta em outras ocasiões, em feitos similares, sendo apontado como responsável pela transferência de títulos eleitorais de Capão da Canoa para a cidade de Imbé” (fl. 259v).

Tal argumento não é apto a embasar a reforma da decisão absolutória. Se, em ocasiões anteriores, Pedro Moacir teria induzido eleitores à inscrição fraudulenta, tal conduta deveria ter sido, ao tempo e modo corretos, investigada e, chegando ao Poder Judiciário, analisada conforme as provas carreadas.

Nessa ordem de ideias, não é possível que, com base em supostos apontamentos de conduta ilícita que nem sequer fazem parte da presente demanda, seja dado provimento ao recurso do Parquet. Em outros termos: não se sabe em que “feitos similares”, em que “outras ocasiões”, Pedro Moacir “teria tido esta mesma conduta”, ou sido “apontado como responsável pela transferência de títulos eleitorais”.

E sob panorama semelhante deve encarar-se as manifestações havidas, ainda na fase policial, dos também denunciados Luan Batista e Romário de Oliveira, meras conjecturas.

Primeiro: cabe deixar claro que Luan não depôs no inquérito policial propriamente dito. A despeito do fato de Luan e Romário não terem sido ouvidos em juízo, cabe ressaltar que as circunstâncias da manifestação de Luan são muito precárias.

A ocasião em que Luan afirmou ter sido “convidado” a transferir o título eleitoral é bastante peculiar: tudo ocorreu em uma diligência policial no bairro em que morava – respondeu ao questionamento na porta da respectiva casa, como deixa clara a Informação n. 509/2013-DELINST/DRCOR/SR/DPF/RS, da Polícia Federal, constante às fls. 34-35:

“[…] Fomos então, na casa de Luan Batista da Silva Costa, na Rua Antúrios, 3630, em Capão da Canoa, e também lhe foi perguntado, o porque da confecção de seu título ter sido feito em Imbé com endereço falso, e Luan respondeu que Pedro da ONG esteve ali em seu bairro e convidou muitas pessoas a transferirem seus títulos para Imbé.

Ao ser questionado o que recebeu ou o que lhe foi prometido, Luan disse que nada recebeu e que não sabia que era crime tal prática.

Luan disse ainda, que Pedro e alguns de seus cabos eleitorais andavam pelo seu bairro em Capão da Canoa pedindo aos moradores que transferissem seus títulos para Imbé.[...]” (sic)

Ora, tal fato não pode caracterizar, de modo algum, depoimento em inquérito policial. Conforme documentação acostada aos autos, Luan contava com dezenove anos à época dos fatos (fl. 19), era morador de um bairro humilde e trabalhador da construção civil (fl. 17). Nesse contexto, friso que a Polícia Federal bateu à porta da casa onde Luan morava e lhe fez questionamentos – questionamentos, estes, nem sequer descritos na informação policial.

As respostas dadas, com o devido respeito, não podem ser levadas em consideração, mormente se não houve, posteriormente, ocasião de ratificação ou retificação do declarado, quer em sede de investigação policial, quer perante a Justiça Eleitoral.

Ademais, o próprio conteúdo da resposta é lacônico: mesmo que realizada em condições adequadas, ele não esclareceria a questão probatória primordial do presente processo. É fato incontroverso que o “Pedro da ONG” é Pedro Moacir Braga Ferreira; o que não restou claro é se Pedro Moacir realmente induziu Luan e Romário a cometerem fraude na transferência de domicílio.

E o depoimento de Romário igualmente não esclarece qualquer circunstância. Ele afirma que foi levado ao cartório eleitoral de Tramandaí para fazer o alistamento eleitoral. Sustenta, também, ter sido convencido a praticar tal ato, sem ter indicado qual pessoa o convenceu.

Ainda, o testemunho de Vilma é inconclusivo. Mesmo referida pela agente policial Janaína como a pessoa que teria identificado Pedro, Vilma não especifica o nome do acusado em seu depoimento e afirmou desconhecer a finalidade do documento que assinou, uma declaração de endereço. Do depoimento, apenas a informação já sabida: que “Pedro da ONG” se trata de Pedro Moacir Braga Ferreira.

Enfim, de todo o aparato da prova testemunhal, apenas a testemunha Airton afirmou que Romário (filho) e Luan (genro) teriam sido procurados para que fizessem o alistamento eleitoral em Imbé, mesmo residindo em outra localidade. Contudo, a conduta não foi atribuída diretamente a Pedro, mas sim “a um homem”, a um “cabo eleitoral desse Pedro aí”, referindo que “eles procuraram ele”. Aduz, ainda, não ter presenciado o fato, mas sim tomado ciência apenas à noite, quando chegou do trabalho, momento em que o “guri” (Romário, filho) teria contado que a transferência não tinha “dado certo”, conforme é possível verificar da oitiva da mídia da audiência, acostada à fl. 225 dos autos.

Ou seja, referências indiretas, reflexas, de “ouvir falar”. Sem conteúdo ou firmeza para suportar um juízo de condenação.

Em resumo, o panorama é de ausência de provas.

Pelo exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso do Ministério Público Eleitoral, mantendo a sentença de absolvição de PEDRO MOACIR BRAGA FERREIRA.