RE - 7353 - Sessão: 16/02/2016 às 17:00

RELATÓRIO

A empresa CGM CONSULTORES E CIA. LTDA. interpôs o presente recurso eleitoral de sentença proferida pelo Juízo da 1ª Zona Eleitoral, pela qual restou condenada ao pagamento de multa equivalente a cinco vezes a quantia doada para campanha eleitoral, nos termos do § 2º do art. 81 da Lei n. 9.504/97.

De acordo com o magistrado, a recorrente agiu em contrariedade ao art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97, o qual estabelece o limite de doação para campanhas eleitorais em 2% dos rendimentos brutos auferidos pela pessoa jurídica no exercício fiscal anterior ao pleito.

Em suas razões (fls. 95-99), a recorrente alega, em preliminar, a ilicitude da prova, face à violação do sigilo fiscal, pois ausente decisão judicial que autorizaria a Receita Federal a fornecer informações a respeito das doações efetuadas por parte da empresa. No mérito, requer a reforma da decisão de primeiro grau, com a improcedência da ação.

Nas suas contrarrazões o Ministério Público Eleitoral menciona, preliminarmente, que o TSE autorizou, por meio da Resolução TSE n. 23.406/14, a Receita Federal a prestar em caráter geral as informações acerca das doações eleitorais acima do limite, de forma a não se falar em ilicitude da prova obtida. E quanto ao mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 103-106).

Nesta instância, os autos foram encaminhados com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, a qual entendeu que a preliminar arguida pela recorrente não merece acolhimento e, no mérito, opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 109-114v.).

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

A presente demanda versa sobre doação realizada por pessoa jurídica e, considerando as alterações legislativas acerca da matéria e as decisões do Supremo Tribunal Federal, faz-se necessário proceder à análise dessas modificações antes de adentrarmos ao mérito.

Neste sentido, registro que em 29 de setembro de 2015 foi publicada a Lei n. 13.165, a também chamada Minirreforma Eleitoral ou Reforma Política. O art. 15 da mencionada lei revogou expressamente o art. 81 da Lei n. 9.504/97, que permitia doações de pessoas jurídicas às campanhas eleitorais até o limite de 2% do faturamento bruto do ano anterior à eleição.

Desta forma, surge a questão de se verificar se a nova lei teria aplicação retroativa para alcançar as doações realizadas na vigência do art. 81 da Lei n. 9.504/97, hoje revogado expressamente.

Entendo que, se houve a doação de bens ao tempo em que disciplinada essa relação jurídica sob o império do art. 81 da Lei n. 9.504/97, é este o dispositivo legal a ser aplicado. E se houve excesso ao limite permitido pela lei (2%), fica o doador sujeito às consequências do seu ato, no caso, as previstas nos §§ 2º e 3º do art. 81 da Lei n. 9.504/97, os quais transcrevo:

Art. 81. As doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações.

[...]

§ 2º A doação de quantia acima do limite fixado neste artigo sujeita a pessoa jurídica ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso.

§ 3º Sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, a pessoa jurídica que ultrapassar o limite fixado no § 1º estará sujeita à proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o Poder Público pelo período de cinco anos, por determinação da Justiça Eleitoral, em processo no qual seja assegurada ampla defesa.

Ressalto, ainda, que o STF em recente decisão, proferida na ADI n. 4650, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais que autorizavam as contribuições de Pessoas Jurídicas às campanhas eleitorais.

Todavia, ficou assentado na decisão de julgamento, publicada em 25 de setembro de 2015, que os efeitos apenas seriam aplicáveis às eleições de 2016.

Consequentemente, hígidas as disposições que normatizavam as doações de pessoas jurídicas no pleito de 2014, especialmente o art. 81 da Lei n. 9.504/97 e com esse escopo analisarei o presente recurso.

1. Admissibilidade

1.1 Tempestividade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal.

1.2 Preliminar de prova ilícita

Em suas razões (fls. 95-99), a recorrente alega, em preliminar, a quebra de sigilo efetuada pela Receita Federal sem que houvesse a devida autorização judicial, de forma a invadir a sua privacidade. Neste sentido, requer que a prova seja tida como ilícita e a presente demanda seja julgada extinta.

Sem razão a recorrente.

A Resolução TSE n. 23.406/14 autorizou, expressamente, que a Justiça Eleitoral possa solicitar à Receita Federal a relação de doadores que excederam o limite legal para doações, haja vista a sua função fiscalizatória.

Neste sentido, vieram aos autos as informações juntadas à inicial, fornecidas pela Receita Federal, esclarecendo que a pessoa jurídica representada estava dentre aqueles que excederam o limite de doação.

Ressalva-se que os documentos se limitaram a informar a identificação nominal da empresa doadora, não contendo nenhum dado protegido por sigilo fiscal, em consonância com o disposto no § 5º do art. 25 da Resolução TSE n. 23.406/14.

Ademais, os dados específicos a respeito do faturamento da empresa, constantes do Anexo I vieram aos autos devidamente amparados por decisão judicial autorizando o afastamento do sigilo fiscal (fl. 51).

Nesta esteira de entendimento, não vislumbro qualquer indício de prova ilícita.

Passo ao exame do mérito.

2. Mérito

Da análise dos autos resta incontroverso que o recorrente efetuou doação para campanha eleitoral do candidato ao governo do Estado do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori, nas Eleições 2014, no montante de R$ 5.000,00 (fl. 06).

Ainda, segundo informações disponibilizadas pela Receita Federal, no ano-calendário de 2013 o rendimento bruto auferido pela CGM CONSULTORES E CIA. LTDA. foi de R$ 203.000,00, tendo a doação excedido em R$ 940,00 o limite legal, pois a empresa somente poderia ter doado a quantia máxima de R$ 4.060,00 (2% do seu faturamento bruto auferido).

Assim, o juízo sentenciante aplicou a multa de R$ 4.700,00, cominada em seu patamar mínimo, ou seja, cinco vezes o valor excedido, à luz do art. 81, § 2º, da Lei n. 9504/97, segundo o qual a doação de quantia acima do limite fixado neste artigo sujeita a pessoa jurídica ao pagamento de multa no valor de 5 a 10 vezes a quantia em excesso.

Todavia, em suas razões de recurso, a apelante aduz que o montante excedente não tem o condão de caracterizar abuso de poder econômico, por se tratar de valor ínfimo, devendo ser observado sob a ótica do princípio da razoabilidade. Ainda, no que diz respeito à alegação de inexpressividade da quantia doada, argumenta não restar configurada conduta potencial apta a influenciar o resultado do pleito.

Entretanto, resta evidente que a doação feita pela empresa ultrapassou o limite de 2% do seu faturamento auferido no ano anterior à eleição, no montante apurado pelo juízo de primeiro grau.

Neste sentido, conforme destacou o magistrado, não cabe aqui a eventual aplicação do princípio da insignificância na doação realizada. Uma vez provada a realização de doação acima do limite legal, a aplicação da multa é impositiva, independentemente da boa-fé do doador.

A conduta tipificada no art. 81 da Lei n. 9.504/97 é objetiva, sendo despiciendo indagar acerca do dolo específico, ou grau de culpa, uma vez ultrapassado o teto de doação. A ilustrar, julgados da Corte Superior Eleitoral:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL.

[…]

8. A aplicação de multa eleitoral por afronta ao art. 81 da Lei das Eleições decorre da inobservância do teto estabelecido na legislação eleitoral e não ofende os princípios da igualdade e da proporcionalidade, tendo em vista que estabelece critério objetivo e igualitário para todas as empresas.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 51093 - Rio de Janeiro/RJ. Acórdão de 13.10.2015. Relatora Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA).

 

ELEIÇÕES 2010. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO PARA CAMPANHA ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA.

1. É constitucional o art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/1997. Os limites de doação de pessoas jurídicas às campanhas eleitorais seguem critérios objetivos proporcionais ao faturamento dos doadores.

2. A multa aplicada no mínimo legal não fere princípios constitucionais.

3. Afastada a condenação ao pagamento de correção monetária a partir da realização da doação Necessidade do trânsito em julgado. Art. 3º da Res. TSE n. 21.975/2004.

4. Agravo regimental parcialmente provido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 11591 - São Paulo/SP. Acórdão de 20.8.2015. Relator Min. GILMAR FERREIRA MENDES).

Assim, ante o exposto, entendo estar superada a preliminar, e na linha do parecer ministerial, VOTO pelo desprovimento do recurso, a fim de manter a decisão de primeiro grau.

É como voto, Senhor Presidente.