RE - 5912 - Sessão: 18/02/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto por PERSONALIZA FORMULÁRIOS CONTÍNUOS LTDA. contra a decisão do juízo da 20ª Zona Eleitoral - Erechim - que julgou procedente a representação por doação acima do limite legal para condenar a empresa recorrente ao pagamento de multa no valor de R$ 33.403,80 e proibi-la de licitar e contratar com o Poder Público pelo prazo de 05 anos (fls. 72-73).

A empresa, em suas razões, argui, em preliminar, prescrição/decadência porque não teriam sido observados os prazos previstos na Resolução n. 23.406/2014. No mérito, pediu: a) redução do valor tido por excedente; b) aplicação das regras sobre doações realizadas por pessoas físicas (art. 23, § 7º, da Lei n. 9.504/97); c) afastamento da proibição de licitar e contratar com o poder público; e d) parcelamento da multa.

Com as contrarrazões, os autos foram encaminhados à Procuradoria Regional Eleitoral, a qual opinou pelo parcial provimento do recurso, ao efeito de afastar a sanção de proibição de licitar e contratar com o poder público.

É o relatório.

 

VOTO

Ressalto que esta Corte, em acórdão de minha relatoria, já enfrentou a matéria em relação às doações realizadas por pessoas jurídicas, fixando o entendimento no sentido de que as alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/2015, que revogaram o art. 81 da Lei n. 9.504/97, não têm aplicação aos fatos ocorridos antes da sua vigência:

Recursos. Representação. Doação para campanha eleitoral acima do limite legal. Pessoa jurídica. Art. 81, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2014.
Afastadas as preliminares de cerceamento de defesa e de intempestividade na apresentação da peça defensiva. Não vislumbrado prejuízo na referida ausência de intimação, já que a defesa teve a oportunidade de manifestar-se sobre o documento proveniente da Receita Federal. No tocante à tempestividade, não pode a omissão cartorária, relativa à ausência da data da juntada aos autos da notificação para contestar, vir em prejuízo à parte.
Doação de bem estimável em dinheiro consistente em material gráfico para propaganda. Inviável a pretendida aplicação do disposto no art. 23, § 7º, da Lei n. 9.504/97, pois trata-se de regramento direcionado às doações realizadas por pessoas físicas. Entendimento do Tribunal Superior Eleitoral neste sentido. Ultrapassados os limites impostos, que restringe a doação a dois por cento do faturamento bruto auferido pela pessoa jurídica no ano anterior à eleição, há incidência objetiva de sanção eleitoral.

As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/2015, que revogaram o art. 81 da Lei n. 9.504/97, não têm aplicação aos fatos ocorridos antes da sua vigência. Manutenção da multa imposta no patamar mínimo estabelecido pela legislação. Afastada, entretanto, a penalidade de proibição de licitar e contratar com o Poder Público, aplicável apenas nos casos de grave extrapolação dos limites impostos pelo parágrafo 2º do citado dispositivo.

Provimento parcial ao apelo da empresa recorrente.
Provimento negado ao recurso ministerial.
(RE 34-90.2015.6.21.0022, julgado em 18.11.2015.) (Grifei.)

Preliminar

Suscita a recorrente que teria havido descumprimento dos prazos previstos no art. 25, § 4º, II, da Resolução n. 23.406/14 do TSE, em relação ao cruzamento de informações feito pela Receita Federal e disponibilizadas ao Ministério Público.

A matéria já foi muito bem enfrentada pela sentença, razão pela qual peço vênia para transcrevê-la, no ponto (fl. 72 v.):

Quanto à preliminar suscitada pela ré, de inobservância dos prazos da Resolução TSE nº 23.406/2014, não lhe assiste razão, porquanto verifica-se dos documentos juntados aos autos que a entrega dos documentos ocorreu em 21/11/2014 (fl. 11), anterior, portanto, aos prazos previstos na legislação. Ademais, o cumprimento dos prazos pelo TSE e Receita Federal não é requisito inafastável para a viabilidade de oferecimento da presente representação eleitoral pelo Ministério Público Eleitoral, o qual obedece, exclusivamente, ao prazo decadencial de 180 dias, contado da diplomação dos eleitos, conforme disposições do art. 22 da Resolução TSE nº 23.398/2013, findado em 16/06/2015.

Assim, integralmente observados os limites temporais para propositura da ação, que ingressou em 11.06.2015 (fl. 02) quando o prazo encerrar-se-ia em 16.06.2015 (180 dias contados da diplomação).

Dessa forma, a ação é tempestiva, sendo irrelevante eventual descumprimento de prazo meramente procedimental.

Afasto a preliminar.

Mérito

Da leitura dos autos ressai, modo cristalino, que a doação ultrapassou o limite de 2% do faturamento auferido no ano anterior à eleição. A própria representada não nega a doação em excesso, mas argumenta que foi uma doação estimável em espécie e que estaria dentro dos parâmetros previstos no § 7º do art. 23 da Lei n. 9.504/97, in verbis:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

§ 1º As doações e contribuições de que se trata este artigo ficam limitadas:

I – no caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição;

(…)

§ 7o O limite previsto no inciso I do § 1º não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador, desde que o valor da doação não ultrapasse R$ 50.000,00; (alterado para R$ 80.000,00 pela Lei 13.165/2015)

Entretanto, referido regramento está direcionado às doações feitas por pessoas físicas, não sendo plausível fazer uso de interpretação extensiva para alcançar as pessoas jurídicas. Quisesse o legislador dar exata equivalência, teria assim procedido.

Por oportuno, trago decisão da lavra da Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura, de 16.06.2015, nos autos do Processo n. 61-72.2013.621.0045, que reformou decisão deste Regional:

Com efeito, o entendimento do TRE do Rio Grande do Sul diverge da jurisprudência desta Casa, a qual entende que o § 7° do artigo 23 da Lei das Eleições não é aplicável às pessoas jurídicas, cujas estão restritas ao valor de 2% (dois por cento) do faturamento bruto anual.

Nesse sentido, transcrevo ementas de julgados desta Corte Superior:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA . ART. 23, § 7º, DA LEI Nº 9.504/97. INAPLICABILIDADE. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. DESPROVIMENTO.

1. Os limites a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador para campanhas eleitorais (i.e.,limitadas R$ 50.000,00 cinquenta mil reais), ex vi do art. 23, § 7°, da Lei n° 9.504/97, aplicam-se apenas e tão somente a pessoas naturais, não incidindo sobre pessoas jurídicas, cuja doação deve observar o limite de 2% do seu faturamento bruto do ano anterior ao da eleição, tal como exige o art. 81, § 1°, da aludida lei. Precedentes: AgR-AI n° 2110-57/SP, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 5.8.2014; AgR-AI n° 183-61/PR, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 4.8.2014; AgR-AI n° 68-22/SP, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 22.4.2014.

2. O limite do valor de doação por pessoa previsto no art. 81, § 1º, da Lei nº 9.504/97 inclui tanto as em espécie quanto as em . Precedente: AgR-Al nº 3097-53, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 6.2.2012.

3. Agravo regimental desprovido.

(AgR-REspe nº 27-68/GO, rel. Min. LUIZ FUX, DJE de 27.10.2014.) (Sem grifos no original.)

(…)

Ante o exposto, com fundamento no artigo 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, DOU PROVIMENTO ao recurso especial para restabelecer a sentença de primeiro grau, a qual reconheceu a procedência da representação em razão de doação acima do limite legal e aplicou à recorrida a multa prevista pelo artigo 81, § 2º, da Lei nº 9.504/97 em seu mínimo legal. (Grifei.)

Assim, não procede a pretendida aplicação analógica.

De igual sorte, não prospera a pretensão da recorrente de considerar como base de cálculo do limite legal de doação o período de julho de 2013 a julho de 2014, ou seja, 12 meses anteriores ao ato (31 de julho de 2014).

Com efeito, à aferição do limite de doação deve ser considerado o ano-calendário anterior ao ano da doação, entendendo-se como o período de janeiro a dezembro de 2013, conforme documento de folha 27 do anexo I.

No caso em tela, a recorrente auferiu faturamento bruto de R$ 915.962,04, podendo doar, então, 2% desse montante, ou seja, R$ 18.319,24.

Como a doação foi de R$ 25.000,00, o excesso corresponde a R$ 6.680,76, exatamente o que foi considerado na sentença, que merece ser mantida neste particular, que fixou a multa em 5 vezes essa quantia, conforme o § 2º do art. 81 da Lei 9.504/97.

A recorrente postulou o parcelamento da multa.

O pedido é de ser rechaçado porque é de competência da Fazenda Nacional, encarregada de promover o correspondente executivo fiscal, a concessão de eventual parcelamento da dívida que, de qualquer sorte, deve estar definitivamente constituída para que se possa analisar a possibilidade de quitação em parcelas.

Quanto à proibição de participar de licitações públicas e contratar com o ente público, entretanto, tem razão a recorrente.

Firmou-se entendimento de que a aludida sanção não decorre automaticamente da prática do ilícito, mas depende, para a sua incidência, da gravidade da situação e de um juízo de proporcionalidade a ser realizado casuisticamente, inexistindo a obrigatoriedade de sancionamento cumulativo.

A ilustrar, os seguintes julgados:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. ART. 81 DA LEI 9.504/97. DECADÊNCIA. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. FATURAMENTO. GRUPO EMPRESARIAL. DESPROVIMENTO.
1. (...)
2. As sanções previstas no art. 81, §§ 2º e 3º, da Lei 9.504/97 não são cumulativas, motivo pelo qual sua incidência conjunta deve ser pautada pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Precedentes.
(…)

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 14825 - Belo Horizonte/MG. Acórdão de 11.03.2014. Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. ART. 81 DA LEI 9.504/97. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. (...)

2. (...)

3. As sanções previstas no art. 81, §§ 2º e 3º, da Lei 9.504/97 - respectivamente, multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso e proibição de participar de licitações públicas e de celebrar contratos com o Poder Público pelo período de cinco anos - não são cumulativas, de forma que a sua aplicação conjunta depende da gravidade da infração e deve ser pautada pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Precedente.

(...)

(TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 3623, Acórdão de 13.06.2013, Relator Min. JOSÉ DE CASTRO MEIRA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 9.8.2013, Página 166/167.)

Não evidenciada a má-fé no caso em apreciação, ao contrário, a empresa em momento algum negou a doação em excesso. Ademais, o montante reduzido da doação não revela situação grave a justificar tão severa penalidade, sendo a multa suficiente para sancionar o excesso de doação, o que me leva a prover o recurso neste tópico.

Diante do exposto, afastada a prefacial, VOTO pelo parcial provimento do recurso da PERSONALIZA FORMULÁRIOS CONTÍNUOS LTDA., ao efeito de, mantendo a multa de R$ 33.403,80, afastar a sanção de proibição de licitar e contratar com o Poder Público pelo prazo de 5 anos.

É o voto.