RC - 742 - Sessão: 10/03/2016 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra decisão do Juízo Eleitoral da 131ª ZE, que julgou improcedente a denúncia oferecida contra TERESINHA DA SILVA DE MOURA pelos delitos de inscrição fraudulenta de eleitor e indução à inscrição fraudulenta,  previstos, respectivamente, nos arts. 289 e 290 do Código Eleitoral, conforme fatos assim descritos na denúncia:

1° fato:

No dia 26 de setembro de 2011, por volta das 14h, no Cartório Eleitoral da 131ª Zona Eleitoral de Sapiranga, então sito na Av. 20 de setembro, 3147, Bairro Centro, em Sapiranga – RS, os denunciados Teresinha da Silva de Moura e Leandro da Silva de Moura inscreveram-se fraudulentamente como eleitores.

Na ocasião, os denunciados preencheram requerimento de alistamento eleitoral, declarando falsamente residirem na Rua Campestre, nº 71, Bairro Centro, em Araricá – RS, no intuito de transferir seus títulos eleitorais no Município de Parobé para aquela Cidade.

 

2° fato:

No dia 26 de setembro de 2011, por volta das 14h, no Cartório Eleitoral da 131ªZona Eleitoral de Sapiranga, então sito na Av. 20 de Setembro, 3147, Bairro Centro, em Sapiranga – RS, a denunciada Teresinha da Silva de Moura induziu seu marido a se inscrever eleitor com infração de dispositivo do Código Eleitoral, qual seja o artigo 42, parágrafo único, do Código Eleitoral.

Na ocasião, a denunciada, na condição de curadora de seu marido, Milton Teixeira de Moura, o fez preencher requerimento de alistamento eleitoral, declarando falsamente residir na Rua Campestre, nº 71, Bairro Centro, em Araricá, no intuito de transferir seu título eleitoral no Município de Parobé para aquela cidade.

[...]

A denúncia foi recebida no dia 11 de janeiro de 2013 (fl. 101) relativamente a quatro acusados: TERESINHA DA SILVA DE MOURA, LEANDRO DA SILVA DE MOURA, DILSON ANTUNES e MARINA LUIZA ANTUNES. Os réus LEANDRO, DILSON e MARINA aceitaram ofertas de suspensão condicional do processo (fl. 197).

No que pertine à recorrida TERESINHA, ocorreu citação e apresentação de defesa prévia (fls. 165-167), na qual houve a alegação de ausência de má-fé na prática dos atos.

Realizada a instrução, apresentaram alegações finais a acusação (fls. 317-318v.) e a defesa (fls. 323-326).

Na sentença (fls. 344-346v.), o juízo considerou demonstrada a materialidade dos delitos, pelos (1) requerimentos de alistamento eleitoral formulados por TERESINHA, e (2) declarações de endereço, assinadas, no sentido de que o casal TERESINHA e MILTON residiam em Araricá.

Contudo, e ainda conforme a decisão, impunha-se reconhecer a atipicidade da conduta, diante da ausência do elemento subjetivo, qual seja o dolo específico (intenção de fraudar) descrita no art. 289 da Lei n. 4.737/65. O magistrado de origem entendeu que algumas contradições conduziam à dúvida acerca do fato de a denunciada ter residido, ou não, no endereço indicado no alistamento, de maneira que havia de prevalecer a prova de liame afetivo e familiar em relação à localidade e, portanto, atipicidade da conduta.

Em suas razões recursais, o Parquet de 1º Grau propõe a reforma de decisão, ao argumento central de que a materialidade e a autoria restaram demonstradas. Indica testemunhas e aduz que os tipos penais teriam sido cometidos pela recorrida.

Com as contrarrazões (fls. 368-372), os autos foram remetidos à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

 

VOTO

 

Tempestividade

O recurso é tempestivo. A decisão foi publicada no DEJERS em 4.9.2015 (fl. 349), e o recurso foi interposto no dia 10.9.2015 (fl. 350v.), dentro do prazo de 10 (dez) dias, estatuído no art. 362 do Código Eleitoral.

 

Mérito

Foram imputadas, à recorrida, as condutas tipificadas nos arts. 289 e 290 do Código Eleitoral:

Inscrição fraudulenta de eleitor

Art. 289 Inscrever-se fraudulentamente eleitor.

Pena - Reclusão até cinco anos e pagamento de cinco a 15 dias-multa.

 

Indução à inscrição fraudulenta de eleitor

Art. 290 Induzir alguém a se inscrever eleitor com infração de qualquer dispositivo deste Código.

Pena - Reclusão até 2 anos e pagamento de 15 a 30 dias-multa.

Os fatos ocorreram no mês de setembro de 2011, no Cartório Eleitoral da 131ª Zona Eleitoral, sediado em Sapiranga, com a finalidade de transferência de títulos de eleitor para o Município de Araricá, municipalidade também sob a circunscrição eleitoral da referida 131ª ZE.

Conforme o recorrente, TERESINHA teria se inscrito fraudulentamente (art. 289 do CE) e, também, induzido o esposo MILTON a se inscrever de forma fraudulenta (art. 290 do CE) – teses não acolhidas pelo Juízo sentenciante.

À análise da prova.

 

a) Da acusação de inscrição fraudulenta

Não há elementos suficientes para um juízo condenatório.

Isso porque inexistem provas, nos autos, que deem guarida à tese da ocorrência de fraude no ato de inscrição.

Note-se, de início, que a recorrida TERESINHA afirma ter residido, em 2011, no endereço declarado: Rua Campestre, n. 71, município de Araricá.

Tal afirmação não foi devidamente confrontada. São bastante nebulosas as circunstâncias do aluguel do imóvel, pois tanto o proprietário ALVÍCIO, quanto o filho dele, VALDEMIR, não trazem informações sobre a locação, apenas indicando a inexistência de um contrato e a ignorância de quem, afinal, residia de fato na casa.

E a escassez de informações traz dúvida razoável sobre a existência do elemento subjetivo do tipo, qual seja, o dolo específico de fraudar a inscrição eleitoral.

Some-se a isso o fato, bem indicado pelo d. Procurador Regional Eleitoral, de que o depoimento de PAULO JUAREZ DOS SANTOS, denunciante, é confuso e impreciso. Presidente do diretório municipal de uma agremiação partidária, à época dos fatos, realizou uma denúncia bastante genérica perante o Ministério Público Eleitoral, relatando suspeitar que políticos da cidade estejam prometendo vantagens a pessoas de outros municípios para que transfiram o título para a cidade (fl. 10).

Nada disso foi comprovado nos autos; aliás, sequer foram construídos indícios.

Finalmente, não há nos autos a informação acerca do modo pelo qual TERESINHA comprovou o domicílio eleitoral dela e do marido, MILTON, perante a Justiça Eleitoral, e tal elemento seria fundamental para um juízo condenatório, sobretudo quando considerada a notória amplitude que o conceito de domicílio eleitoral carrega.

Trago, nessa linha, o magistério de JOSÉ JAIRO GOMES (Direito Eleitoral. 8. ed. São Paulo, Atlas, p. 120).

No Direito Eleitoral, o conceito de domicílio é mais flexível que no Direito Privado. Com efeito, o art. 4º, parágrafo único, da Lei n. 6.996/82, dispõe que para efeito de inscrição, domicílio eleitoral é o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas”. É essa igualmente a definição constante no artigo 42, parágrafo único, do Código Eleitoral. Logo, o Direito Eleitoral considera domicílio da pessoa o lugar da residência, habitação ou moradia, ou seja, não é necessário haver o animus de permanência definitiva, conforme visto.

Note-se que ALVÍCIO, o proprietário do imóvel indicado como moradia por TERESINHA, corroborou, no testemunho, o vínculo afetivo que a recorrida possui com o município de Araricá, situação também reconhecida na sentença.

Em resumo: não há elementos que confirmem a ocorrência de fraude, de forma que a conduta se afigura atípica.

 

b) Da acusação de indução à inscrição fraudulenta

Igualmente, no relativo ao tipo previsto no art. 290 do Código Eleitoral, não há provas a suportar um juízo de condenação.

MILTON TEIXEIRA DE MOURA, esposo de TERESINHA, inscreveu-se eleitor de Araricá em 26.9.2011, tendo fornecido o mesmo endereço indicado pela recorrida: Rua Campestre, n. 71, Centro.

E as circunstâncias de provas são idênticas: os testemunhos carecem de precisão e contundência, não há referências à documentação apresentada para a comprovação do domicílio eleitoral.

Agregado a tal quadro, o argumento trazido pelo d. Procurador Regional Eleitoral, em seu parecer, fl. 381, o qual transcrevo e indico como razões de decidir:

Como visto anteriormente, não há prova razoável da ocorrência do elemento fraude na transferência do alistamento eleitoral de TERESINHA. Nesse contexto, também não haverá em relação à transferência de alistamento eleitoral de MILTON TEIXEIRA DE MOURA, marido de TERESINHA. Logo, conclui-se existir impedimento lógico para a ocorrência do crime de induzir alguém a inscrever-se fraudulentamente eleitor.

O panorama é de ausência de provas, também relativamente ao tipo do art. 290 do CE.

Pelo exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.