RE - 991 - Sessão: 29/01/2016 às 11:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto por JOSÉ AIRO LIMA DOS SANTOS contra decisão do Juízo da 82ª Zona Eleitoral – São Sepé – que julgou procedente representação por doação acima do limite legal ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, condenando o recorrente ao pagamento de multa no valor de R$ 9.937,85 (nove mil novecentos e trinta e sete reais e oitenta e cinco centavos) e declarando-o inelegível pelo prazo de 8 (oito) anos (fls. 71-78).

Em suas razões recursais, o recorrente sustenta ter agido de boa-fé, tendo se equivocado ao tomar por base o valor dos rendimentos do ano-calendário de 2014, bem como não ter, o magistrado, levado em consideração o fato de se tratar de valor insignificante, que desafiaria a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Alega estar desempregado, sem condições de prover o sustento próprio e da família com dignidade. Assevera que a inelegibilidade não pode ser declarada na sentença. Colaciona jurisprudência e pugna pelo provimento do recurso para o fim de ser julgada improcedente a representação. Alternativamente, postula a redução da multa aplicada e, ainda, seja afastada a declaração de inelegibilidade.

Por fim, requer sejam dados por prequestionados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Com as contrarrazões (fls. 91-93), os autos foram encaminhados à Procuradoria Regional Eleitoral, que se manifestou pelo desprovimento do recurso (fls. 99-102v.).

É o relatório.

 

VOTO

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo, visto que interposto dentro do tríduo legal estabelecido pelo art. 258 do Código Eleitoral.

Presentes os demais requisitos de admissibilidade, dele conheço.

2. Mérito

As doações realizadas por pessoas físicas ficam limitadas a dez por cento dos rendimentos obtidos no ano anterior à eleição, conforme estabelecia o art. 23, I, da Lei n. 9.504/97 (teor reproduzido no § 1º do mesmo art. pela Lei n. 13.165/15) in verbis:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei. (Redação dada pela Lei n. 12.034, de 29.9.09.)

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas:

I - No caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição; (Grifei.)

No caso, o recorrente obteve rendimentos brutos no ano anterior ao pleito no montante de R$ 19.124,39 (dezenove mil cento e vinte e quatro reais e trinta e nove centavos) (fl. 65).

De acordo com o inciso I do art. 23 da Lei n. 9.504/97, o representado, pessoa física, poderia doar até R$ 1.912,43 (um mil novecentos e doze reais e quarenta e três centavos). No entanto, a doação referente às eleições de 2014 alcançou a cifra de R$ 3.900,00 (três mil e novecentos reais) (fl. 65), excedendo, portanto, o limite legalmente estabelecido.

O descumprimento do limite legal atrai a sanção disposta no § 3º do já citado artigo 23:

§ 3º A doação de quantia acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso.

A sentença (fls. 71-78) aplicou corretamente a regra e fixou a multa em cinco vezes o valor doado irregularmente, o mínimo, portanto, estabelecido pela norma cogente, perfazendo a cifra de R$ 9.937,85 (nove mil novecentos e trinta e sete reais e oitenta e cinco centavos), não merecendo reparo neste aspecto a decisão atacada.

Quanto à tese do recorrente de que, por equívoco, baseou-se no ano-calendário de 2014, cujo rendimento foi maior, não merece prosperar, pois se trata de regra objetiva, não cabendo alegação de desconhecimento nem de interpretação errônea. O recorrente alega uma espécie de erro de fato, uma suposta turbação do seu elemento de representação e da vontade no momento de agir. Na hipótese, é impossível inferir-se da vontade externada uma justificativa viável de representação, sendo também impossível reconhecer-se o erro de fato. 

Destaco que o comando contido no art. 23, I, da Lei n. 9.504/97 não condiciona a sua aplicabilidade à relevância do excesso ou à possível boa-fé do doador, bastando que este tenha desrespeitado os limites objetivamente expressos no dispositivo legal para a incidência da sanção correspondente.

Desse modo, inexiste possibilidade de se fazer juízo de ponderação acerca da boa ou má-fé do recorrente, assim como inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade ao caso concreto.

Outro não é o entendimento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. DECADÊNCIA. INEXISTÊNCIA. PROVA LÍCITA. AUTORIDADE COMPETENTE. DESPROVIMENTO.

(...)

5. Segundo jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral, "os princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade não autorizam o Poder Judiciário a aplicar multa abaixo do mínimo legal, como também não se pode considerá-la confiscatória, inclusive por não ter natureza tributária" (AgR-AI nº 68-22/SP, relª Ministra LUCIANA LÓSSIO, DJE 22.4.2014).

6. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Agravo de Instrumento n. 183693, Acórdão de 16.6.2014, Relator Min. LAURITA HILÁRIO VAZ, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 145, Data 07.8.2014, Página 180.)

 

ELEIÇÕES 2010. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AFASTAMENTO DA MULTA OU FIXAÇÃO DO SEU VALOR AQUÉM DO LIMITE MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. O princípio da insignificância não encontra guarida nas representações por doação acima do limite legal, na medida em que o ilícito se perfaz com a mera extrapolação do valor doado, nos termos do art. 23 da Lei das Eleições, sendo despiciendo aquilatar-se o montante do excesso. Precedentes: AgR-REspe n° 713-45/BA, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 28.5.2014; AgR-AI nº 2239-62/SP, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 26.3.2014.

2. Os postulados fundamentais da proporcionalidade e da razoabilidade são inaplicáveis para o fim de afastar a multa cominada ou aplicá-la aquém do limite mínimo definido em lei, sob pena de vulneração da norma que fixa os parâmetros de doações de pessoas física e jurídica às campanhas eleitorais.

3. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 16628, Acórdão de 17.12.2014, Relator Min. LUIZ FUX, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 35, Data 23.02.2015, Página 53.)

Registro, ainda, que a multa foi cominada em seu grau mínimo (cinco vezes o valor da quantia apurada em excesso – art. 81, § 2°, da Lei n. 9.504/97), demonstrando que o juízo singular levou em conta os argumentos do representado quando da aplicação da dosimetria da pena.

Quanto à alegação do recorrente de que está desempregado, alinho-me ao entendimento do magistrado de primeiro grau, a qual transcrevo, para evitar tautologia:

(...) não obstante passar de meras alegações desprovida de mínima comprovação, se fosse aceito como argumento para excluir a responsabilidade, na triste realidade brasileira, poucos seriam aqueles os responsabilizados pelos seus atos quando contrários a legislação vigente.

Por essas razões, entendo devida a pena de multa imposta ao recorrente, ressaltando-se que a importância deverá ser recolhida ao Fundo Partidário.

Entretanto, cabe acolhimento parcial do recurso para afastar a declaração de inelegibilidade do representado pelo período de 8 (oito) anos.

Explico.

A suspensão dos direitos políticos transcende – em muito – ao sancionamento econômico que já se estabeleceu. Por isso, a declaração judicial de inelegibilidade não pode ser considerada sem relação jurídica processual própria, assegurada defesa ampla e irrestrita sobre o tema, sendo seu reconhecimento de competência do juízo do registro de candidatura, se eventualmente a pessoa vier a se candidatar.

Assim prescreve o § 11 do art. 10 da Lei n. 9.504/97:

As condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro que afastem a inelegibilidade.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto, para afastar a declaração de inelegibilidade do recorrente, mantendo, no restante, a sentença (fls. 71-78), que aplicou a multa de R$ 9.937,85 (nove mil novecentos e trinta e sete reais e oitenta e cinco centavos), por doação acima do limite legal, não merecendo reparo neste aspecto a decisão atacada. Por fim, dou por prequestionados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.