RE - 5827 - Sessão: 29/01/2016 às 11:00

RELATÓRIO

RENAN TUIGO RIGO interpôs o presente recurso eleitoral de sentença proferida pelo Juízo da 20ª Zona Eleitoral, pela qual restou condenado ao pagamento de multa equivalente a cinco vezes a quantia doada para campanha eleitoral, nos termos do § 3º do art. 23 da Lei n. 9.504/97.

Segundo o magistrado, o recorrente agiu em contrariedade ao art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97, o qual estabelece o limite de doação para campanhas eleitorais em 10% dos rendimentos brutos auferidos pela pessoa física no exercício fiscal anterior ao do pleito.

Em suas razões (fls. 46-58), o recorrente alega, em preliminar, a nulidade da sentença em decorrência da ausência de citação válida. No mérito, requer a reforma da decisão de primeiro grau, com a improcedência da ação.

Em contrarrazões (fls. 79-80v.), em relação à matéria preliminar, o Ministério Público Eleitoral entendeu necessária a reabertura do prazo para apresentação da defesa, a fim de afastar eventual alegação de cerceamento. Quanto ao mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

Nesta instância, os autos foram encaminhados com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que pugnou pelo reconhecimento da nulidade apontada em preliminar e, no mérito, pelo provimento do recurso (fls. 84-88).

É o relatório.

 

VOTO

Eminentes colegas:

1. Admissibilidade

1.1 Tempestividade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal.

1.2 Preliminar de nulidade da sentença por ausência de citação válida

Em suas razões (fls. 46-58), o recorrente alega, em preliminar, a nulidade da sentença em decorrência da ausência de citação válida. Esclarece que, ao ajuizar a ação, o Ministério Público Eleitoral de Erechim indicou endereço diverso do seu, tendo a citação sido recebida também por pessoa diversa.

Com razão o recorrente.

A questão foi abordada em parecer do douto Procurador Regional Eleitoral (fls. 84-88), que a seguir transcrevo:

O representado arguiu a nulidade da sentença por vício na citação, vez que notificada pessoa diversa do representado.

Assiste razão ao recorrente. Vejamos.

O endereço contido na notificação (fl. 31) não é do domicílio do recorrente, mas sim da Cooperativa de Crédito Rural – CRESOL, conforme se verifica na conta de energia elétrica juntada à fl. 15. O endereço correto ao qual deveria ter sido encaminhada a notificação é o que consta no campo dados da unidade consumidora (Linha Rodeio, Distrito de Capoere, Erechim/RS) e não o endereço que consta abaixo do nome do genitor do representado, Sr. Antenor Antonio Rigo, endereço este da Cooperativa à qual o Sr. Antenor é sócio e mantém débito em conta de sua fatura de energia elétrica (Rua São Paulo, nº 62, Erechim-RS).

Ademais, verifica-se que no aviso de recebimento acostado à fl. 33, consta como recebedor da notificação a Sra. “Tainara Vial”, pessoa diversa do representado, sendo que dos documentos colacionados pelo recorrente, às fls. 60-70, restou comprovado que a Sra. Tainara é funcionária da Cooperativa CRESOL e que teria assinado o Aviso de recebimento sem perceber que estava dirigida ao ora recorrente.

Constatadas tais irregularidades, impende reconhecer que o processo é nulo porquanto inexistente a citação válida na pessoa do recorrente, o que constitui ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pelo qual faz-se necessário o retorno dos autos à origem para regularizar a citação e viabilizar a apresentação de defesa.

[…]

Ademais, a condenação trouxe prejuízo ao recorrente, que sequer teve conhecimento do processo, consoante se verifica da certidão exarada à fl. 36, cujo teor refere que o representado não apresentou defesa.

Nessa linha, tendo em vista os argumentos esposados, é de rigor o reconhecimento de nulidade da sentença, por inexistência de citação regular e consequente ausência de defesa, com o retorno dos autos à origem.

Contudo, eminentes colegas, tenho por superar a questão preliminar. Não por entender que ao recorrente falte razão, mas sim por vislumbrar a possibilidade de que, uma vez analisado o mérito, possamos chegar a uma solução que ampare a pretensão do representado, tal como já consignou o douto Procurador em seu parecer.

E digo isso porque vejo que a conclusão a que chegou o ilustre Procurador, ao analisar o mérito do caso sob análise, está em consonância com a jurisprudência do TSE e deste Tribunal, no sentido de que ante a ausência de declaração anual de Imposto de Renda do doador, aplica-se a presunção de que o doador auferiu rendimentos no limite máximo para a isenção da obrigação de declarar rendimentos à Receita. Nesse caso, agora já adentrando no mérito, adianto que a situação do recorrente é análoga à coberta pela jurisprudência desta Casa, motivo pelo qual antecipo que, ao julgar o mérito, votarei pelo provimento do recurso.

Caso este não seja o entendimento dos demais colegas, VOTO pelo acolhimento da preliminar, reconhecendo a nulidade da sentença e determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito.

Superada a preliminar, passo ao exame do mérito.

2. Mérito

Pois bem, resta incontroverso que o recorrente efetuou doação para campanha eleitoral nas Eleições 2014 no valor de R$ 1.500,00 (fls. 06 e 12) e há cinco anos não realiza sua Declaração de Ajuste Anual de Imposto de Renda Pessoa Física (fl. 35).

Diante da ausência de declaração anual de Imposto de Renda da Pessoa Física referente ao ano anterior ao pleito eleitoral, conforme entendimento já pacificado neste Tribunal, é válida a presunção de que o doador tenha auferido rendimentos no limite legal máximo para a isenção da obrigação de declarar rendimentos ao Fisco Nacional, o qual era de R$ 25.661,70 para Declaração de Ajuste Anual do IRPF 2014.

Nesse sentido, transcrevo ementas de julgados deste Tribunal:

Recurso. Doação acima do limite legal. Pessoa Jurídica. Incidência do art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2010.

Procedência da representação no juízo de primeiro grau, haja vista o magistrado sentenciante ter considerado o limite de 2% aplicável às pessoas jurídicas.
Afastadas as preliminares de inépcia da inicial por falta de documentos, de nulidade do processo e da sentença proferida em primeiro grau. Acompanham a peça exordial documento proveniente da Receita Federal e demonstrativo de rendimento da representada. A abertura de vista ao promotor eleitoral não gera nulidade do processo. Tampouco a falta de oitiva de testemunhas é fator impeditivo para anular a sentença, vez que seu emprego é despiciendo frente ao acervo de documentos que acompanham os autos.
Ajuizamento tempestivo da representação, em razão da adequação da disciplina prescrita no art. 184, § 1º, do Código de Processo Civil para determinação do lapso temporal aplicável.
A doadora é empresária, operando sob firma individual. A sua qualificação como empresária define apenas a natureza de sua ocupação, não havendo que se falar em aquisição de personalidade jurídica. Reforma da sentença, porquanto não extrapolado o limite legal de doação de 10% sobre os rendimentos brutos auferidos pela recorrente no ano anterior à eleição, conforme inteligência do art. 23 da Lei n. 9.504/97. Provimento.

(RE n. 21-23.2011.6.21.0090 – Rel. Hamilton Langaro Dipp, Acórdão de 20.11.2012). (Grifei.)

 

Recurso. Doação acima do limite legal. Eleições 2010. Procedência de representação por doação acima do limite legal. Pessoa física. Condenação ao pagamento de multa. Enquadramento do valor doado aos limites máximos estabelecidos para a faixa de isenção da obrigação de declarar rendas ao Fisco, não extrapolando o lapso temporal fixado pelo art. 23, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97. Provimento.

(RE n. 85-56.2011.6.21.0147 – Rel. Desa. Maria Lúcia Luz Leiria, Acórdão de 18.10.2012). (Grifei.)

Portanto, partindo-se do rendimento de R$ R$ 25.661,70, tem-se que o representado poderia doar até o limite de R$ R$ 2.566,17. Como efetuou doação de R$ 1.500,00, não ultrapassou o limite legal.

Permito-me retornar ao parecer do douto Procurador Regional Eleitoral, pois com extrema propriedade examinou o tema, citando a jurisprudência do TSE e deste Regional, e propondo a conclusão a que acabei por me filiar. Por esse motivo, transcrevo a fundamentação trazida pelo ilustre integrante do Ministério Público, cujo teor igualmente adoto como razões de decidir (fls. 86v.-88):

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL ajuizou representação em desfavor de RENAN TOIGO RIGO, com base no art. 23, § 1º, inciso I da Lei n. 9.504/97, in verbis:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas:

I - no caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição;

Considerando-se o limite legal previsto no inciso I do parágrafo primeiro do art. 23 da Lei n. 9.504/97, não restou, nos autos, efetivamente demonstrado que houve excesso de doação por parte do recorrente.

No caso vertente, a sentença fundamentou-se no fato de o representado não ter declarado imposto de renda há mais de 5 (cinco) anos, presumindo com isso que o valor doado, no montante de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), é excessivo e condenando-o ao pagamento de multa no valor de cinco vezes o valor total doado.

Contudo, tal fato não pode ensejar por si só a ilegalidade da doação, e muito menos a incidência da multa sobre o valor total doado, consoante decisão contida na sentença, pois a lei é clara ao dispor que a multa incidirá sobre o excesso doado e não sobre o valor integral doado.

Compulsando os autos, verifica-se que o representado apresentou informações, perante o MPE à origem, no sentido de que é agricultor, porém ainda não teria confeccionado seu talão de produtor rural. Ainda, aduziu que a venda dos produtos resultantes de seu labor teria sido registrada no talão de seu irmão, Cristian Tuigo Rigo, no valor bruto total de R$ 44.068,80 (quarenta e quatro mil e sessenta e oito reais), o que lhe permitiria doar a quantia de R$ 4.406,00 (quatro mil, quatrocentos e seis reais e oitenta centavos).

Porém, em casos semelhantes aos dos autos, nos quais o doador não apresentou declaração de imposto de renda referente ao ano-calendário anterior ao da doação eleitoral, o entendimento do TSE e do TRE-RS segue no sentido de que o parâmetro a ser adotado para a incidência dos 10% (dez por cento) é o limite da isenção para a entrega da referida declaração:

ELEIÇÕES 2010. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. SUPERAÇÃO DO LIMITE LEGAL. FALTA DE APRESENTAÇÃO DE DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS. CÁLCULO DA MULTA. ADOÇÃO DA QUANTIA MÁXIMA DE RENDA ALBERGADA PELA ISENÇÃO COMO BASE DE CÁLCULO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. FUNDAMENTOS NÃO INFIRMADOS. SÚMULA Nº 182 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INOVAÇÃO RECURSAL. DESPROVIMENTO.

1. A simples reiteração de argumentos já analisados na decisão agravada, sem que haja no agravo regimental qualquer elemento novo que seja apto a infirmá-la, atrai a incidência do Enunciado da Súmula nº 182 do STJ.

2. In casu, o TRE-CE, no aresto que ensejou a interposição do recurso especial eleitoral, fixou multa ao ora Agravante por entender que este doou, na campanha eleitoral de 2010, valor superior ao limite fixado. Considerando a falta de apresentação da declaração de rendimentos em 2009, a Corte de origem utilizou, como base de cálculo para a incidência do percentual de 10% (dez por cento), o montante correspondente ao limite para isentar a pessoa física da entrega da referida declaração naquele ano.

3. A adoção do parâmetro relativo à isenção do imposto de renda quanto a pessoas físicas para verificar o montante máximo de doação permitido, quando ausente a apresentação de declaração de rendimentos, é razoável, a fim de evitar que a falta de entrega daquele documento seja utilizada para obstar a configuração do ilícito previsto no art. 23, § 1º, I, da Lei nº 9.504/1997.

4. A inovação de tese recursal, em sede de agravo regimental, não se afigura admissível.

5. Agravo regimental desprovido.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 24991, Acórdão de 02.6.2015, Relator Min. LUIZ FUX, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 175, Data 15.9.2015, Página 63-64). (Grifado.)

 

Recurso. Representação. Doação acima do limite legal. Pessoa física. Art. 23 da Lei n. 9504/97. Firma individual. Ausência de informação acerca dos rendimentos brutos. Eleições 2012.

A atividade de empresário individual exercida pelo doador não é causa de aquisição de personalidade jurídica distinta da pessoa física.

A doação de empresa individual tem por parâmetro as regras da doação efetuada por pessoa física. O limite é de dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior ao da eleição.

Ausente declaração anual de Imposto de Renda do doador aplica-se a presunção de que auferiu rendimentos no limite máximo para isenção da obrigação de declarar rendimentos ao Fisco.

Doação que não extrapolou o valor limite estabelecido no art. 23, § 1º, I, da Lei n. 9.504/97. Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n. 2894, Acórdão de 25.9.2014, Relator DR. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 174, Data 29.9.2014, Página 3) (Grifado).

 

Recurso. Doação acima do limite legal. Pessoa Jurídica. Incidência do art. 81, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2010. Procedência da representação no juízo de primeiro grau, haja vista o magistrado sentenciante ter considerado o limite de 2% aplicável às pessoas jurídicas. Afastadas as preliminares. Interposição da representação perante juízo competente. Ajuizamento tempestivo da representação, em razão da adequação da disciplina prescrita no art. 184, § 1º, do Código de Processo Civil para determinação do lapso temporal aplicável. A doadora é empresária, operando sob firma individual. A sua qualificação como empresária individual define apenas a natureza de sua ocupação, não havendo que se falar em aquisição de personalidade jurídica. Informação advinda da Receita Federal, informando a ausência de rendimentos por parte do doador. Ante a ausência de notícia de que tenha realizado declaração de imposto de renda no ano de 2010, razoável presumir que a doadora, ao menos, tenha auferido rendimentos no valor de R$ 17.215,08, limite de isenção do imposto para o ano-base de 2009. Quantia doada em excesso, sem observar o limite legal de 10% dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição. Aplicação de multa prevista no art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97. Afastadas a fixação de correção monetária e juros de mora, a proibição de participar em licitações e de celebrar contratos com o Poder Público pelo período de 5 (cinco) anos, bem como a declaração de inelegibilidade da recorrente. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 7655, Acórdão de 22.11.2012, Relator DR. HAMILTON LANGARO DIPP, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 227, Data 26.11.2012, Página 11). (Grifado.)

Dessa forma, considerando que o representado não apresentou declaração de imposto de renda referente ao ano-calendário de 2013, bem como que a declaração ao fisco era obrigatória para todos que recebessem rendimentos tributáveis superiores a R$ 25.661,70 (vinte e cinco mil, seiscentos e sessenta e um reais e setenta centavos), o representado poderia doar o valor máximo de R$2.566,17 (dois mil, quinhentos e sessenta e seis reais e dezessete centavos).

Logo, tendo em vista que o representado efetuou a doação no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), não se configura a extrapolação do limite.

Pelas razões expostas, merece ser provido o recurso do recorrente.

Ante o exposto, superada a preliminar, e na linha do parecer ministerial, VOTO pelo provimento do recurso, a fim de julgar improcedente a representação.

É como voto, Senhor Presidente.