REl - 0600054-27.2024.6.21.0051 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/05/2025 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e dele conheço, uma vez que consolidado nas decisões desta Corte o entendimento de que, mesmo após o transcurso das Eleições 2024, havendo discussão sobre multa, não há perda do objeto ou do interesse processual.

A sentença hostilizada considerou excedidos os limites da liberdade de expressão e de crítica, especialmente fundamentando que houve disseminação de informações sabidamente inverídicas, “pois naquele momento da publicação, ainda que tivesse sido determinada a remoção de conteúdo irregular de propaganda eleitoral, não havia prolação de decisão condenatória de quem quer que seja na representação eleitoral n. 0600049-05.2024.6.21.0051”.

Nesse sentido, colho na sentença (ID 45759287):

Trata-se de representação eleitoral para remoção de conteúdo na internet, noticiado pelo representado Portal Dia a Dia News e compartilhado pelos representados na rede social Instagram.

Merece procedência a presente representação.

Com efeito, pois o artigo 9º-C da Resolução do TSE nº 23.610/2019 estabelece que “é vedada a utilização, na propaganda eleitoral, qualquer que seja sua forma ou modalidade, de conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral.”
 

No caso concreto, foi veiculado pelo Portal Dia a Dia News e compartilhado pelos representados na rede social Instagram, notícia que continha informação que não correspondia à verdade, pois naquele momento da publicação, ainda que tivesse sido determinada a remoção de conteúdo irregular de propaganda eleitoral, tendo sido divulgada informação sabidamente inverídica, estando a questão ainda subjudice.
 

Como veículo de informação, era obrigação que competia ao Portal Dia a Dia News se certificar, antes de publicar a notícia, acerca do conteúdo da decisão divulgada, levando a informação correta à população, porém não o fez.
 

Por sua vez, os representados, também sabedores do teor da decisão judicial proferida naquele momento, que determinava apenas a remoção da publicação, mais uma vez, não exitaram em divulgar a notícia notoriamente inverídica, pois, como já dito, não havia nenhuma decisão naquele momento condenando quem quer que seja pela divulgação de fake news.

Veja-se, tinha o representado Heliomar, por ser o autor da representação em que foi proferida a decisão liminar, pleno conhecimento do teor da determinação judicial, a qual impunha apenas a remoção do conteúdo, no entanto, ciente disso, além de não alertar o representado Portal Dia a Dia News da impropriedade cometida, ainda deu divulgação à notícia inverídica veiculada, conduta também adotada pelo representado Gabriel, conforme se observa das imagens constantes à fl 04 da petição do ID 124380528, tendo ambos divulgado em seus perfis no Instagram a matéria referida, contrariando, juntamente com o Portal Dia a Dia News, o regramento eleitoral vigente.

E não encontra respaldo a assertiva conveniente dos representados Heliomar e Gabriel de que “se limitaram a reproduzir conteúdo previamente disponível ao público em geral, publicado por um veículo de comunicação estabelecido, o Portal Dia a Dia News”, não possuindo “qualquer vínculo de propriedade ou controle sobre o site onde a matéria foi veiculada, sendo, portanto, alheio à linha editorial e às decisões de publicação do Portal Dia a Dia News”, pois ambos tinham ciência de que não havia condenação naquele momento na representação eleitoral nº 0600049-05.2024.6.21.0051, ambos sabiam que se tratava de decisão proferida em caráter liminar e precário, porém não pouparam esforços em compartilhar a notícia, sabidamente inverídica, contrariando deliberadamente e intencionalmente, diga-se, mais uma vez, o regramento eleitoral existente.

Portanto, não há justificativa à conduta dos representados Heliomar e Gabriel.

Como já referido na decisão que apreciou o pedido liminar, a legislação eleitoral em vigor é clara em assegurar aos participantes do processo eleitoral a liberdade de expressão, desde que a manifestação não ofenda a honra ou a imagem de candidatos, candidatas, partidos, federações ou coligações, ou não configure fatos sabidamente inverídicos, conforme se infere do artigo 27, caput e §1º, da Resolução do TSE nº 23.610/2019, que assim dispõe:

"Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57-A).

§ 1º A livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos, observado o disposto no art. 9º-A desta Resolução.(Redação dada pela Resolução nº 23.67102021)”

Por sua vez, o artigo 38 da Resolução do TSE nº 23.610/2019 estabelece que “a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático”, constando no §1º do mesmo artigo da Resolução que “com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.”

E no caso telado, tendo por norte o regramento legal apontado, notória e inconteste a violação à legislação eleitoral, porquanto, torno a repetir, a Justiça Eleitoral, em decisão liminar proferida na representação eleitoral nº 0600049-05.2024.6.21.0051, apenas havia determinado a cessação de propaganda irregular veiculada pelo candidato representado, inexistindo naquela ocasião decisão condenatória.

Portanto, ao agir dessa forma, fica aquele que promove a divulgação do conteúdo sujeito ao disposto no artigo 57-D, §3º, da Lei nº 9.504/97, que autoriza a remoção de conteúdo publicado em sítios de internet e redes sociais.

Assim, assentada a responsabilidade dos representados, passo à fixação da multa aplicável pela violação do regramento eleitoral.

O art. 57-D, §2º, da Lei nº 9.504/97 e o artigo 30, §1º da Resolução nº 23.610/19 impõem como sanção pela violação do dispositivo legal, multa no valor de R$ 5.000,00 a R$ 30.000,00.

No caso concreto, entendo por adequada a fixação da multa no valor de R$ 5.000,00 para o representado Portal Dia a Dia News, pois embora como canal de veiculação de notícias estivesse obrigado a verificar a veracidade das notícias divulgadas, se tratou de fato único, isolado, não havendo no curso do processo eleitoral reiteração de conduta.

Já em relação aos representados Heliomar e Gabriel, fixo a multa no valor de R$ 10.000,00, para cada um deles, justificando-se a elevação acima do mínimo em virtude da replicação, em rede social de ampla divulgação, de notícia sabidamente inverídica, sendo a conduta de ambos ainda mais reprovável pelo fato de que tinham ciência integral da decisão liminar deferida por este Juízo na representação eleitoral, que, repito, não impunha naquele momento condenação a qualquer dos envolvidos, mas apenas a remoção da propaganda tida por irregular, e em razão da reiteração da conduta, pois essa não foi a primeira irregularidade no âmbito da propaganda eleitoral feita pelos representados, que já contam como outras condenações proferidas por este Juízo por descumprimento da legislação eleitoral.

Ante o exposto, julgo procedente o pedido formulado pela COLIGAÇÃO RECONSTRUIR E AVANÇAR SÃO LEOPOLDO e pelo candidato a Prefeito NELSON SPOLAOR em face do PORTAL DIA A DIA NEWS, do também candidato a Prefeito HELIOMAR ATHAYDES FRANCO e do ex-candidato a Prefeito GABRIEL DIAS DA SILVA para o fim de, tornando definitiva a decisão, em tutela de urgência, que determinou a retirada da publicação constante no link https://www.portaldiadianews.com.br/rs/noticias/politica/nelson-spolaor-ana-affonso-e-mais-6-sao-condenados-por-fake-news-com-material-apocrifo-contra-heliomar-franco-em-sao-leopoldo.html?fbclid=PAZXh0bgNhZW0CMTEAAabswG2ZHr95PWgeCyQ-OUrJ3uff1vjaH-T-e3-vi1mIRaF0m9TtT7njpYQ_aem_uPL6aZrHTtyxvqbIdYWjlQ, bem com dos stories sobre a matéria divulgado na rede social Instagram, CONDENAR o representando Portal Dia a Dia News ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e os representados Heliomar Athaydes Franco e Gabriel Dias da Silva ao pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por cada um dos representados, por violação à regra do artigo 57-D, §3º, da Lei nº 9.504/97, a ser corrigido pelos critérios legais definidos em cumprimento de sentença.
 

Entretanto, não vislumbro hipótese de divulgação de fato sabidamente inverídico, capaz de ensejar a multa por infração ao art. 57-D da Lei n. 9.504/97.

Na linha da jurisprudência do Tribunal Superior, os fatos sabidamente inverídicos a ensejar a ação repressiva da Justiça Eleitoral são aqueles verificáveis de plano (R–Rp n. 0600894–88/DF, Rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS de 30.8.2018).

A publicação veiculada pelo Portal Dia a Dia News não disseminou fato sabidamente inverídico com relação aos recorridos, pois efetivamente havia processo judicial (representação) em andamento (Rp n. 0600049-05.2024.6.21.0051), no qual foi proferida decisão liminar, provisória, que determinou a cessação da propaganda irregular veiculada então pelo candidato representado.

O Tribunal Superior Eleitoral já assentou que a mensagem, para ser qualificada como sabidamente inverídica, deve conter inverdade flagrante que não apresente controvérsias (Ac. de 26.10.2010 na Rp n. 367516, rel. Min. Henrique Neves).

Ademais, não visualizo irregularidade na utilização do termo “condenação” em referência à determinação, imposição, penalização, culpabilização, etc, que recaiu sobre as partes obrigadas a interromper a propaganda irregular, pois não se espera do “homem médio” conhecimento acerca da distinção entre decisão liminar e definitiva.

Nesse sentido, a ementa de julgado que abaixo colaciono:

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2022. REPRESENTAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA. FATO "SABIDAMENTE INVERÍDICO". VEICULAÇÃO NA INTERNET. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A interferência da Justiça Eleitoral no debate político deve ser mínima e essencial e ocorrer somente em casos de ofensa ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos contra candidatos, partidos e coligações. 2. O fato sabidamente inverídico é aquele indiscutível, que não necessita de prova. A inveracidade deve ser perceptível de imediato, por todo e qualquer cidadão mediano. Precedentes. 3. In casu, a matéria impugnada refere-se a fatos divulgados na mídia, que noticiaram os motivos da cassação do mandato do candidato. Logo, não há elementos na publicação que possam caracterizar extrapolação do direito à liberdade de expressão e pensamento. 4. Recurso conhecido e desprovido.

(TRE-PA - RP: 06012825920226140000 BELÉM - PA, Relator: Des. JOSÉ AIRTON DE AGUIAR PORTELA, Data de Julgamento: 13.09.2022, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 13.09.2022.) (Grifo nosso)

 

O conceito de informação sabidamente inverídica é juridicamente indeterminado, mas se pode extrair da doutrina e jurisprudência que necessariamente deve ser uma informação cuja inveracidade salta aos olhos, que não reclama elucidações.

No caso, o problema não está no uso da palavra “condenados”, pois eles efetivamente foram condenados a retirar a propaganda considerada irregular, mesmo que a título precário.

A questão central está na ausência de informação/esclarecimento de que aquela condenação ainda era provisória.

Na espécie, a divulgação da notícia se deu em 28.09.2024, a liminar foi concedida e os representados, ora recorridos, intimados em 30.09.2024, no dia seguinte foi demonstrado nos autos o cumprimento da decisão. Por fim, no dia 13.10.2024, a decisão liminar foi confirmada na sentença, a qual julgou procedente a representação.

Assim, considerando o tempo de exposição da veiculação da notícia (03 dias), entendo ausente potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral.

Desse modo, como bem pontuado pela douta Procuradoria Regional Eleitoral, “a referência à condenação até pode ser considerada descontextualizada, porém sem potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral, nos termos do art. 9º-C da Res. TSE nº 23.610/19, mormente porque, alguns dias após a notícia, os envolvidos foram, de fato, condenados pela disseminação de fake news” (ID 45759300).

Isso posto, tenho que a publicação em tela se equivocou ao não informar a provisoriedade de decisão, porém esta conduta não enseja a multa por infração ao art. 57-D da Lei n, 9.504/97.

Diante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para julgar improcedente a representação, afastando as multas impostas, nos termos da fundamentação.