REl - 0600647-25.2024.6.21.0029 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/05/2025 às 14:00

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos processuais, razão pela qual dele conheço.

 

MÉRITO

Tal qual relatado, cuida-se de recurso eleitoral interposto por MARIO ANTONIO CANDIDO em face de sentença que desaprovou sua prestação de contas, relativa ao pleito de 2024, porquanto extrapolado o limite permitido para autofinanciamento, e determinou: (a) o recolhimento do valor correspondente a 100% do montante apurado como irregular, R$ 1.207,42; e (b) o recolhimento de recursos tidos como de origem não identificada, no montante de R$ 255,01.

Em apertada síntese, o recorrente entende injustificada a reprovação de suas contas, ao argumento de que o valor da falha não é significativo, que não houve má-fé no desatendimento às normas de regência e que todas as informações requeridas foram tempestivamente apresentadas à Justiça Eleitoral, como medida de transparência e higidez do procedimento de prestação de contas.

Com relação ao primeiro ponto, recordo que o limite para o uso de recursos próprios em campanha é de 10% do teto de gastos definido para cargo pretendido. Em específico, para o pleito proporcional em Sério/RS, o termo para despesas foi de R$ 15.985,08, importando no limitador de autofinanciamento de R$ 1.598,51, de acordo com o art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e Portaria TSE n. 593/24.

No caso dos autos, o recorrente não recebeu verbas públicas durante sua campanha, de sorte que suas receitas perfizeram o montante de R$ 3.806,00, sendo R$ 1.000,00 relativos à doação de pessoa física, R$ 1.000,00 de recursos estimáveis (por cessão de veículo automotor de propriedade do próprio candidato) e R$ 1.806,00 de doações advindas, também, do próprio candidato (autofinanciamento).

Aqui, apesar das razões recursais versarem basicamente sobre a ausência de má-fé na gestão financeira da campanha, tenho que, conforme redação expressa do art. 1.013, § 1º, do Código de Processo Civil (CPC), o efeito devolutivo do recurso inclui a matéria recorrida e todas as demais questões, "desde que relativas ao capítulo impugnado". De fato, o valor referente ao autofinanciamento por meio de utilização de receita estimável em dinheiro, por uso de automóvel próprio (R$ 1.000,00, comprovado pelo termo de cessão de uso de veículo e certificado de propriedade, ambos juntados no ID 45822782), deve ser afastado do cálculo em questão, excluindo-se da contabilização de receitas próprias, com amparo no entendimento do TSE de que o uso de veículo automotor do próprio candidato em campanha não configura gasto eleitoral, verbis:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. VEREADOR. APLICAÇÃO DE MULTA. AUTOFINANCIAMENTO. CAMPANHA ELEITORAL. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE. EXCLUSÃO DO CÔMPUTO. CESSÃO DE VEÍCULO DO PRÓPRIO CANDIDATO. PROVIMENTO DO APELO. APROVAÇÃO DAS CONTAS. SÍNTESE DO CASO 1. Trata–se de recurso especial eleitoral interposto em face do acórdão exarado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Piauí, no qual foi mantida a sentença proferida pelo Juízo da 41ª Zona Eleitoral daquele Estado, que desaprovou as contas de campanha do recorrente, referentes às Eleições de 2020, nas quais concorreu ao cargo de vereador, e aplicou–lhe multa no valor de R$ 1.836,70, por extrapolação do limite de autofinanciamento de campanha. ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL 2. O limite previsto no art. 23, § 2º–A autoriza o candidato a usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer, considerando como recursos próprios (autofinanciamento) aqueles definidos como dinheiro em espécie, bem como bens ou serviços estimáveis em dinheiro, desde que haja a transferência de propriedade e o proveito econômico definitivo do candidato. 3. A cessão de bens móveis e imóveis contabiliza limite próprio, no qual autorizado o uso de automóvel de propriedade do candidato, do cônjuge e de seus parentes até o terceiro grau para uso pessoal durante a campanha, independente do valor (art. 28, § 6º, III, da Lei 9.504/97). 3. A despeito do limite de autofinanciamento de campanha, o uso de veículo próprio (de natureza pessoal do candidato) nem sequer constitui gasto eleitoral, ressaltando que também não se enquadram nesse conceito as respectivas despesas acessórias como combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha (art. 26, § 3º, a da Lei 9.504/1997), dada, inclusive, a facultatividade de emissão do recibo eleitoral na “cessão de automóvel de propriedade da candidata ou do candidato, de cônjuge e de seus parentes até o terceiro grau para seu uso pessoal durante a campanha” (art. 7º, § 6º, III da Res.–TSE 23.607/2019). CONCLUSÃO Recurso especial eleitoral provido a fim de aprovar as contas do candidato a vereador recorrente, afastando–se a multa por não observância de limite de autofinanciamento.

(TSE - REspEl: 06002651920206180041 ESPERANTINA - PI 060026519, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 26.05.2022, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 152.) Grifei.

 

Recente julgado desta Corte, de relatoria do eminente Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR reafirma a tese de que a cessão de veículo próprio não deve integrar o limite de gastos de autofinanciamento. Vejamos:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. AUTOFINANCIAMENTO. CESSÃO DE VEÍCULO PRÓPRIO. EXCLUSÃO DO CÔMPUTO DO LIMITE DE GASTOS. APROVAÇÃO DAS CONTAS. AFASTAMENTO DA MULTA. RECURSO PROVIDO.I. CASO EM EXAME 1.1. Recurso eleitoral interposto por candidato ao cargo de vereador contra sentença que aprovou suas contas com ressalvas e aplicou multa correspondente ao excesso de autofinanciamento na campanha eleitoral de 2024, em razão da utilização de recursos próprios que superaram o limite legal. 1.2. O recorrente sustenta que a doação estimável em dinheiro relativa à cessão de seu veículo próprio deve ser excluída do cálculo do limite de utilização de recursos próprios. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.1. Determinar se a cessão de veículo automotor de propriedade do candidato para uso em campanha eleitoral deve ser considerada no cômputo do limite de autofinanciamento, com reflexos na aplicação de sanção pecuniária. III. RAZÕES DE DECIDIR 3.1. O Tribunal Superior Eleitoral e este Tribunal têm entendimento no sentido de que a cessão de veículo automotor de propriedade do candidato para sua campanha não configura gasto eleitoral nem integra o limite de autofinanciamento. 3.2. Na hipótese, a exclusão da cessão do veículo do cálculo de autofinanciamento reduz o total de recursos próprios utilizados na campanha para valor inferior ao limite legalmente estabelecido, afastando a irregularidade. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1. Recurso provido. Aprovação das contas. Multa afastada. Tese de julgamento: “A cessão de veículo automotor de propriedade do candidato para uso pessoal em sua campanha eleitoral não configura gasto eleitoral, nem integra o limite de autofinanciamento.” Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 21, 27, § 1º, e 32; Lei n. 9.504/97, art. 28, § 6º, inc. III. Jurisprudência relevante citada: TSE, REspEl n. 0600265-19/PI, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJE, 26.5.2022; TRE/RS, REl n. 0600387-39.2020.6.21.0044, Rel. Des. Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, DJE, 28.10.2022.

(TER-RS - REL: 0601004-05.2024.6.21.0029 Relator: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, Data de Julgamento: 11.04.2025, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, 14.04.2025.) Grifei.

 

Assim, na linha da jurisprudência do TSE e desta Corte, permito-me concluir que a cessão, efetuada pela pessoa física do candidato para sua campanha, de automóvel que integre seu patrimônio, não deve ser contabilizada no limite de autofinanciamento previsto no art. 27, § 1º, da Resolução 23.607/19.

Ainda, verifica-se que, no conjunto de despesas, foram inclusos os gastos com assessoria contábil, no valor total de R$ 600,00, conforme recibo de pagamento autônomo – RPA e comprovante de transferência bancária apresentada no ID 45822770 em favor de Grasiel Sartori; e com serviços advocatícios, em favor de Márcia Bergmann, com documentos que comprovam o pagamento de R$ 900,00 em favor da causídica (ID 45822771).

À vista desta informação, friso que tais gastos também não estão sujeitos a limites que possam obstar ou limitar o exercício da ampla defesa. É a inteligência dos arts. 4º, § 5º, 35, § 3º, e 43, § 3º, todos da Resolução TSE n. 23.607/19, os quais seguem destacados:

Art. 4º Os limites de gastos de campanha serão definidos em lei e divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (Lei nº 9.504/1997, art. 18) (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021)

[…]

§ 5º Os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidata ou de candidato ou partido político, não estão sujeitos a limites de gastos ou a limites que possam impor dificuldade ao exercício da ampla defesa (Lei nº 9.504/1997, art. 18-A, parágrafo único).

 

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

[…]

§ 3º As despesas com consultoria, assessoria e pagamento de honorários realizadas em decorrência da prestação de serviços advocatícios e de contabilidade no curso das campanhas eleitorais serão consideradas gastos eleitorais, mas serão excluídas do limite de gastos de campanha (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 4º).

 

Art. 43. Com a finalidade de apoiar candidata ou candidato de sua preferência, qualquer eleitora ou eleitor pode realizar pessoalmente gastos totais até o valor de R$1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), não sujeitos à contabilização, desde que não reembolsados (Lei nº 9.504/1997, art. 27).

[...]

§ 3º Fica excluído do limite previsto no caput deste artigo o pagamento de honorários decorrentes da prestação de serviços advocatícios e de contabilidade, relacionados às campanhas eleitorais e em favor destas (Lei nº 9.504, art. 27, § 1º).

 

E não é outro o entendimento da Corte Superior Eleitoral sobre o tema autofinanciamento ao apontar que “as despesas com contador e advogado não estão sujeitas ao limite de gastos, devendo, portanto, serem excluídas da aferição do total de recursos próprios aplicados na campanha” (TSE - AREspEl: 0600337-03.2020.6.24.0085 ÁGUA DOCE - SC 060033703, Relator: Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 02.05.2023, Data de Publicação: Diário de Justiça Eletrônico - DJE 81, data 03.05.2023).

Esta Corte Regional Eleitoral passou a adotar o mesmo entendimento para o pleito de 2024, conforme pode ser extraído da ementa de recente julgado de lavra do Excelentíssimo Desembargador Eleitoral NILTON TAVARES DA SILVA, que destaco a título ilustrativo:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. AUTOFINANCIAMENTO. DESPESAS COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CONTÁBEIS EXCLUÍDAS DO LIMITE DE GASTOS. AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE. APROVAÇÃO DAS CONTAS. MULTA AFASTADA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1 .1. Recurso interposto por candidato, eleito ao cargo de vereador, contra sentença que desaprovou suas contas de campanha, em razão da extrapolação do limite de autofinanciamento, e aplicou–lhe multa em valor correspondente a 100% sobre a quantia em excesso. 1.2. O recorrente alega que o aporte de recursos próprios não comprometeu a igualdade entre os concorrentes do pleito. Assevera que o valor é irrisório. Aduz, nesse sentido, que a jurisprudência do TSE aponta que falhas irrelevantes não justificam a desaprovação das contas. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2.1. Há duas questões em discussão: (i) saber se as despesas com serviços advocatícios e contábeis devem ser incluídas no cálculo do limite de autofinanciamento; (ii) saber se a multa imposta ao candidato deve ser afastada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3.1. Os gastos advocatícios e de contabilidade não estão sujeitos a limites que possam obstar ou restringir o exercício da ampla defesa, de sorte que devem ser subtraídos do cômputo geral de gastos, conforme arts. 4º, § 5º, 35, § 3º, e 43, § 3º, todos da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.2. Conforme entendimento do TSE, “as despesas com contador e advogado não estão sujeitas ao limite de gastos, devendo, portanto, serem excluídas da aferição do total de recursos próprios aplicados na campanha”. 3.3. No caso concreto, ao excluir as despesas advocatícias e contábeis do total de gastos, verifica–se que o recorrente respeitou o limite de autofinanciamento, não havendo razão para desaprovação das contas. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1. Recurso provido. Prestação de contas aprovada. Afastada a multa imposta. Tese de julgamento: "As despesas com contador e advogado devem ser excluídas da aferição do total de recursos próprios aplicados na campanha.” Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 4º, § 5º, 35, § 3º, e 43, § 3º. Jurisprudência relevante citada: TSE – AREspEl: n. 0600337–03.2020.6.24 .0085, Rel. Min. Sergio Silveira Banhos, julgado em 02.5 .2023.

(TRE-RS - REl: 06004400720246210100 VILA LÂNGARO - RS 060044007, Relator.: Nilton Tavares Da Silva, Data de Julgamento: 25.02.2025, Data de Publicação: DJE-38, data 27.02.2025.) Grifei.

 

Nessa ordem de ideias, tais dispêndios devem ser abatidos do total de despesas, restando, após sua subtração, o uso de apenas R$ 1.306,00 para fins de cálculo de ingresso de recursos próprios (R$ 3.806,00 – R$ 2.500,00).

A par de tais valores, tenho que o limite de autofinanciamento foi respeitado. Concluo, assim, que, não ultrapassado o delimitador legal, há ser reformada a sentença nesse capítulo.

A mesma conclusão não pode ser alcançada com relação ao apontamento de recurso de origem não identificada, relativamente à despesa de R$ 255,01 concernentes à nota fiscal emitida pela empresa FAVARETTO E SILVA COMERCIO DE COMBUSTIVEIS LTDA., contra o CNPJ de campanha, a qual não foi declarada na prestação e cujo pagamento não transitou nas contas de campanha.

Em sua defesa, o recorrente aduziu que “a ausência da despesa mencionada na prestação de contas, como dito, ocorreu devido a um erro de natureza operacional no preenchimento dos dados no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE). O candidato esclarece que não houve qualquer intenção de ocultar informações da Justiça Eleitoral, tratando-se de um lapso involuntário e, portanto, justificável diante do volume e complexidade das movimentações financeiras durante o período eleitoral”.

Destarte, realizado o pagamento da despesa sem trânsito dos recursos em conta de campanha e sem o registro em sua prestação de contas, correta a conclusão da sentença de que o montante de R$ 255,01 caracteriza recurso de origem não identificada, devendo ser mantida a determinação de recolhimento deste valor ao Tesouro Nacional, conforme arts. 14, § 2º, 32, § 1º, inc. VI, e 79, caput, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Concluindo, a falha remanescente, no montante de R$ 255,01, perfaz 6,70% do total auferido pelo candidato (R$ 3.806,00), percentual que autoriza a mitigação do juízo de reprovação das contas para aprová-las com ressalvas, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, na esteira do entendimento desta Corte.

Ante o exposto, VOTO pelo PARCIAL PROVIMENTO do recurso interposto por MARIO ANTONIO CANDIDO, para APROVAR COM RESSALVAS suas contas relativas às Eleições Municipais de 2024, mantendo a determinação de recolhimento da quantia de R$ 255,01 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.