PC - 9262 - Sessão: 02/04/2018 às 18:00

RELATÓRIO

Trata-se da prestação de contas anual do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS) referente ao exercício financeiro de 2014 (fls. 02-229).

Os responsáveis pela agremiação foram, de início, incluídos no feito na condição de partes (fl. 239). Posteriormente, contudo, em juízo monocrático, determinou-se que o processo fosse direcionado apenas ao órgão partidário (fl. 251), decisão contra a qual a Procuradoria Regional Eleitoral interpôs agravo regimental (fls. 265-271).

O Pleno deste Regional julgou pelo desprovimento do referido agravo regimental (fls. 274-277v.), ensejando a interposição de recurso especial pelo Ministério Público (fls. 281-288v.), o qual não foi admitido (fls. 290-294v.). Interposto agravo no recurso especial (fls. 303-308) teve seu seguimento negado pelo Tribunal Superior Eleitoral (certidão de fl. 533).

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI) procedeu ao exame preliminar das contas (fls. 354-355), abrindo-se prazo ao partido para a complementação de documentos (fl. 358), trazidos aos autos nas fls. 362-496.

A unidade técnica exarou parecer - instruindo-o com a documentação pertinente (fls. 507-531) - e, após manifestação do partido (fls. 540-567), emitiu parecer técnico conclusivo pela desaprovação das contas, com o acompanhamento de tabelas (fls. 570-574v.).

Na sequência, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela desaprovação das contas, pelo recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores cuja regularidade não foi comprovada e pela aplicação da penalidade de suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário pelo período de um ano (fls. 579-583v.).

Citado, o prestador ofereceu defesa com documentos (fls. 595-617), os quais foram submetidos à análise do órgão técnico (fls. 624-630).

O partido peticionou nos autos, juntando novos documentos (fls. 637-661), abrindo-se vista dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral, que registrou parecer nas fls. 665-671, reiterando sua manifestação anterior.

Considerando a alteração do entendimento deste Tribunal - a partir do julgamento do RE n. 35-87.2015.6.21.0115, em 10.11.2016 - foi determinada a inclusão no feito e a citação dos responsáveis pelo partido político à época do exercício financeiro - o então presidente PAULO ODONE CHAVES ARAÚJO RIBEIRO e o tesoureiro-geral JOÃO CARLOS FORNARI (fl. 673).

PAULO ODONE CHAVES ARAÚJO RIBEIRO e JOÃO CARLOS FORNARI apresentaram defesa, requerendo a aprovação das contas e, na hipótese de entendimento diverso, a aplicação do disposto no art. 37, caput e § 3º, da Lei n. 9.096/95, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 13.165/15 (fls. 686-693).

Encerrada a instrução processual (fl. 697) e exarado o parecer pela Procuradoria Regional Eleitoral, reafirmando seu posicionamento pela desaprovação da contabilidade e aplicação das sanções correlatas (fl. 703), os autos retornaram à SCI, que procedeu ao exame da documentação apresentada pelo partido nas fls. 638 a 661 (fl. 715).

O órgão partidário, PAULO ODONE CHAVES ARAÚJO RIBEIRO e JOÃO CARLOS FORNARI ofereceram alegações finais (fls. 724-725).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral ratificou o parecer exarado nas fls. 665-671, destacando a aplicação da Resolução TSE n. 23.464/15 às prestações de contas relativas aos exercícios financeiros anteriores ao de 2015 e a irretroatividade das alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15, em face dos princípios da isonomia e da segurança jurídica (fls. 727-728v.).

É o relatório.

 

VOTO

Trata-se da prestação de contas do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS) referente ao exercício financeiro de 2014.

De acordo com o parecer conclusivo e as demais análises realizadas pela Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste Tribunal (SCI) ao longo da instrução do processo (fls. 570-574v., 624-630 e 715), a contabilidade anual do partido apresentou falhas que ensejam a sua desaprovação.

A primeira delas, descrita no item “A” do parecer conclusivo, refere-se à ausência de retenção dos valores correspondentes ao Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF) incidente sobre o montante de R$ 30.000,00, pago com recursos do Fundo Partidário a João Carlos Fornari, tesoureiro do partido, em contrapartida pela prestação de serviços técnicos e de organização financeira, como demonstram os recibos de fls. 427, 468, 472, 474, 479 e 483.

Embora não constitua atribuição dos órgãos técnicos da Justiça Eleitoral a fiscalização do recolhimento de tributos e do cumprimento de obrigações tributárias acessórias, a partir da orientação constante no parecer conclusivo (fl. 570v.), a agremiação procedeu ao pagamento da aludida dívida tributária, conforme as guias de recolhimento juntadas nas fls. 638-661.

Todavia, o saneamento da falha pelo prestador, especificamente no que se refere ao exercício financeiro de 2014, não obsta a que a unidade técnica deste Tribunal venha a examinar esses recolhimentos no âmbito da prestação de contas de 2016 – exercício em que o partido adimpliu a dívida tributária em questão –, analisando, por exemplo, a natureza e a origem dos recursos movimentados para essa finalidade.

No item “B” do parecer conclusivo, foi indicado que o órgão partidário registrou o recebimento da quantia de R$ 180.000,00, a título de verbas do Fundo Partidário, ao passo que o Diretório Nacional declarou ter efetuado o repasse de R$ 170.000,00, remanescendo, assim, o montante de R$ 10.000,00 sem origem identificada.

No entanto, ao manifestar-se sobre o parecer conclusivo, o órgão estadual trouxe aos autos declaração firmada pelo tesoureiro nacional da sigla partidária provando ter efetivamente havido a transferência de R$ 180.000,00 (fl. 602). Diante desse documento, o apontamento foi considerado sanado pela unidade técnica (fl. 624), não tendo, consequentemente, reflexo negativo sobre o julgamento das contas.

Referente à aplicação dos recursos oriundos do Fundo Partidário, o prestador sanou parcialmente as irregularidades identificadas no item “C” do parecer conclusivo com a apresentação dos documentos de fls. 603-616 (Item II da Análise de Documentos). Dessa forma, restaram sem comprovação os gastos elencados nas tabelas de fls. 574 e v. e 628, no valor total de R$ 56.919,45, o qual deverá ser recolhido ao Erário, nos termos do art. 34, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04.

Ainda com relação à aplicação dos recursos do Fundo Partidário, a agremiação sanou de forma parcial as inconsistências do item “D” do parecer conclusivo, mediante a apresentação da Nota Fiscal de Serviço n. 130 (fl. 612).

Logo, segundo a tabela de fl. 625, a ausência de comprovação de gastos efetuados na conta corrente destinada à movimentação de recursos do Fundo Partidário abrangeu a soma de R$ 3.903,19, igualmente sujeita à devolução ao Tesouro Nacional, em conformidade com o art. 34, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04 (Item IV da Análise de Documentos).

Segundo constatado pela SCI (item “E” do parecer conclusivo), a Direção Estadual do PPS transferiu recursos do Fundo Partidário para o Diretório Municipal de Porto Alegre, no montante de R$ 40.500,00, época em que o recebimento de novas quotas se encontrava suspenso por força da decisão proferida por este Tribunal nos autos da PC n. 18-52.20111.6.0160, que desaprovou as contas do órgão municipal, suspendendo novos repasses pelo período de 6 meses (fls. 521-525).

Como o acórdão prolatado por este Tribunal naquela prestação de contas transitou em julgado em 10.3.2014 (fl. 526), o período de suspensão correspondente recaiu entre 10.3.2014 e 10.9.2014, sendo, assim, manifestadamente irregular o repasse efetuado à esfera municipal de Porto Alegre no dia 09.4.2014 (fl. 630).

Apesar de o órgão estadual ter argumentado que efetuou o repasse antes de ser notificado da decisão suspensiva, por meio do Ofício n. 42, expedido em 30.4.2014 pelo Juízo da 160ª Zona Eleitoral de Porto Alegre (fl. 617), a justificativa não merece acolhimento para o fim de afastar a irregularidade.

E isso porque, depois de ser cientificado pela Justiça Eleitoral, competia ao prestador - na condição de ente partidário hierarquicamente superior e responsável pela fiscalização dos recursos do Fundo Partidário - diligenciar junto ao órgão municipal para que devolvesse a quantia indevidamente transferida, dever do qual não se desincumbiu, permitindo que a mesma fosse utilizada, como pode ser verificado no extrato da conta corrente de fl. 630.

Consequentemente, incide, também, na hipótese a penalidade de devolução da quantia de R$ 40.500,00 ao Tesouro Nacional, com base no art. 34, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04.

O apontamento constante no item “F” do parecer conclusivo diz respeito ao procedimento empregado para a utilização de recursos oriundos do Fundo Partidário, no montante de R$ 35.143,19.

A partir da conferência dos extratos bancários e dos cheques ns. 121, 128, 147 e 177 (juntados, respectivamente, nas fls. 167, 173, 190, 162) e ns. 125, 130 e 150 (registrados nas fls. 17-18 do Livro Razão – Anexo 2), constatou-se que esse valor foi transferido da conta corrente específica do Fundo Partidário para a conta bancária de Jorge Carlos Fornari, tesoureiro da agremiação, o qual, então, quitou despesas contraídas em nome do partido.

O procedimento – apesar de não ensejar a aplicação da penalidade de devolução da quantia ao Erário, por terem sido comprovados os gastos correspondentes – contraria, frontalmente, o regramento do art. 10 da Resolução TSE n. 21.841/04, segundo o qual as despesas partidárias devem ser realizadas por meio de cheques nominativos ou crédito bancário identificado, debitados diretamente na conta bancária destinada à movimentação dos recursos do Fundo Partidário (art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04).

É importante destacar que a SCI já havia identificado essa mesma irregularidade ao examinar a prestação de contas relativa ao exercício de 2013 (fl. 571v.), mostrando-se imprescindível que o partido efetue a adequação do seu procedimento a fim de assegurar transparência às operações realizadas com os recursos dessa natureza e viabilizar a fiscalização por parte desta Justiça Especializada.

Segundo o item “G” do parecer conclusivo, o partido recebeu recursos oriundos de fonte vedada, consistentes em contribuições advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum junto à administração pública direta e indireta (Assembleia Legislativa deste Estado e Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde), que fruiam da condição de autoridade, no valor total de R$ 17.939,92 (fls. 527-528).

Em sede de defesa, o PARTIDO, PAULO ODONE RIBEIRO e JOÃO CARLOS FORNARI alegaram que as pessoas físicas elencadas na tabela de fls. 527-528 não detinham a condição de autoridade, por exercerem cargos “(…) que se revestem de caráter de subordinação”, sendo as contribuições, ademais, efetuadas por meio de débito em conta-corrente, e não mediante desconto em folha de pagamento, mecanismo que caracterizaria o uso indevido de verbas públicas (fls. 599-600 e 691).

Ocorre que o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

(…)

No conceito de autoridade pública previsto no citado dispositivo legal, inserem-se os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o egrégio Tribunal Superior Eleitoral, com a Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1428, cuja ementa segue:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade. Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

(Consulta n. 1.428, Resolução n. 22.585 de 06.9.2007, Relator Min. José Augusto Delgado, Relator designado Min. Antonio Cesar Peluso, Publicação: DJ – Diário de Justiça, Data 16.10.2007, Página 172.) (Grifei.)

A Resolução TSE n. 23.077/09 foi publicada a partir dessa orientação jurisprudencial e determinou que, durante as arrecadações dos exercícios financeiros seguintes, os partidos políticos observassem o entendimento adotado pelo TSE na Consulta n. 1428 (Resolução TSE n. 22.585/07) no que concerne à contribuição de filiados, tendo em conta a interpretação dada ao inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, que concluiu pela impossibilidade de doação de titulares de cargos de direção e chefia:

PETIÇÃO. PARTIDO DA MOBILIZAÇÃO NACIONAL (PMN). ALTERAÇÕES ESTATUTÁRIAS. REGISTRO. DEFERIMENTO PARCIAL.

1. O partido político é obrigado a observar, na elaboração de seu programa e estatuto, as disposições constitucionais e as da Lei dos Partidos Políticos.

2. O estatuto do partido, ao dispor que todos os cargos em comissão na esfera de sua atuação pertencem ao partido e serão preenchidos por filiados da agremiação, subordina os interesses estatais a conveniências político-partidárias.

3. É vedado ao partido determinar a seus parlamentares a desobediência ao disposto nos regimentos das respectivas Casas Legislativas, uma vez que a autonomia partidária não coloca em plano secundário as disposições regimentais dessas Casas.

4. É vedado ao partido impor a seus parlamentares a declaração de voto, porque, em alguns casos, o voto secreto tem índole constitucional, especialmente na hipótese de cassação de mandato de parlamentar.

5. A fixação de critérios de contribuição de filiados do partido deve observar a interpretação dada ao inciso II do art. 31 da Lei nº 9.096/95 na Resolução-TSE n. 22.585/07.

6. Pedido deferido parcialmente.

(TSE. Petição n. 100, Resolução n. 23077 de 04.6.2009, Relator Min. Marcelo Henriques Ribeiro de Oliveira, Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 147, Data 4.8.2009, Página 105 RJTSE - Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 20, Tomo 3, Data 4.6.2009.)

Nesse sentido, consolidou-se a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e deste Regional para considerar vedadas as contribuições ou doações efetuadas por detentores de cargo demissível ad nutum da administração pública direta e indireta, que exerçam função de chefia ou direção, vale dizer, com poder de autoridade:

Prestação de contas anual. Partido político. Diretório Estadual. Exercício financeiro de 2012. Preliminar afastada. A tramitação de ADI no Supremo Tribunal Federal questionando a inconstitucionalidade de matéria comum ao presente processo não tem o condão de provocar seu sobrestamento. O controle concentrado exercido pela Corte Superior não representa prejuízo ao controle difuso de constitucionalidade realizado por qualquer juiz ou tribunal.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

Nova orientação do TSE no sentido de que verbas de origem não identificada e de fontes vedadas devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto na Resolução TSE n. 23.464/15.

Aplicação dos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade para fixar a sanção do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário em um mês.

Desaprovação.

(TRE-RS, PC n. 76-79, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanha, 31.5.2016.) (Grifei.)

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Exercício financeiro de 2014.

Prefacial afastada. A aplicabilidade imediata das disposições processuais da Resolução TSE n. 23.432/14, e mais recentemente da Resolução TSE n. 23.464/15, não alcança a responsabilização dos dirigentes partidários, por se tratar de matéria afeta a direito material. Manutenção apenas do partido como parte no processo.

A abertura de conta bancária específica é obrigatória, ainda que não ocorra arrecadação e/ou movimentação de recursos financeiros. Exigência que viabiliza o emprego dos procedimentos técnicos de exame das contas pela Justiça Eleitoral, no exercício da sua atividade fiscalizatória.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. In casu, doação proveniente de Secretário Adjunto do Meio Ambiente, cargo que acumula funções de assessoramento com as de direção e coordenação. As alterações introduzidas pela Lei 13.165/2015, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, suprimindo a sanção de suspensão de novas contas do Fundo Partidário, não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes da sua vigência.

Nova orientação do TSE no sentido de que verbas de fontes vedadas devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto na Resolução TSE n. 23.464/15. Redução do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para dois meses.

Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 18-62, Relatora Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja, 02.8.2016.) (Grifei.)

No caso concreto, as contribuições elencadas como irregulares são advindas de titulares de cargos vinculados à Assembleia Legislativa deste Estado (Coordenador-Geral de Bancada, Chefe de Gabinete e Chefe de Gabinete de Líder) e à Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde (Chefe de Seção/Núcleo), todos inseridos no conceito de autoridade pública, por exercerem cargo de chefia e direção, independentemente do modo como seus ocupantes efetivam a contribuição ao partido, ou seja, se por meio de desconto em folha ou débito em conta bancária.

Ademais, é pressuposto do cargo em comissão a atribuição de direção, chefia e/ou assessoramento, como taxativamente dispõe o art. 37, inc. V, da Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[…]

V – as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.

Não há como acolher, portanto, a tese de que o cargo de “Chefe” não tem por atribuição a “chefia”. O contrário significaria negar a natureza do cargo e ignorar o comando constitucional, o qual prevê que os cargos em comissão se destinam exclusivamente às atribuições de direção, chefia e assessoramento.

Assim, os cargos constantes do rol de doadores mencionados conferem às pessoas que os exercem a condição de autoridade, pois encerram, a toda evidência, poder de decisão e exigem gerenciamento de pessoas e recursos, inserindo-se no conceito de “autoridade” para efeitos da lei em comento.

Nessa linha, cito os seguintes julgados deste Tribunal:

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Diretório municipal. Doação de fonte vedada. Art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/1995. Exercício 2011.

Desaprovam-se as contas quando constatado recebimento de doações de servidores públicos ocupantes de cargos demissíveis ad nutum com condição de autoridade. No caso, secretários municipais, diretor de departamento, diretor-executivo, chefe de setor e chefe de gabinete.

Redução da pena de suspensão de cotas do Fundo Partidário. Incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/1995.

Provimento parcial.

(TRE-RS, PC n. 113 29, Relator Dr. Leonardo Tricot Saldanha, 31.5.2016.) (Grifei.)

 

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Fonte vedada. Exercício financeiro de 2014.

Prefacial afastada. Manutenção apenas da agremiação como parte no processo. A aplicabilidade imediata das disposições processuais da Resolução TSE n. 23.432/14, e mais recentemente da Resolução TSE 23.464/15, não alcança a responsabilização dos dirigentes partidários, por se tratar de matéria afeta a direito material.

Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Recursos oriundos de dois vereadores e de um secretário municipal, enquadrados no conceito de agentes políticos, detentores de funções com poder de autoridade. Excluído desse conceito o cargo de assessor jurídico, por exercer função exclusiva de assessoramento.

Nova orientação do TSE no sentido de que verbas de origem não identificada e de fontes vedadas devem ser recolhidas ao Tesouro Nacional, nos termos do disposto na Resolução TSE n. 23.464/15. Adequação do quantum a ser recolhido. Redução do prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para um mês.

Provimento parcial.

(TRE-RS, PC n. 23 61, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, 07.7.2016.) (Grifei.)

 

Prestação de contas anual. Partido político. Resolução TSE n. 21.841/04. Exercício financeiro de 2012. Configuram recursos de fonte vedada as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Na espécie, indubitável a natureza de chefia dos cargos de chefe de gabinete, indicada no próprio nome do cargo e confirmada pela descrição das atribuições em lei. Reconhecida a fonte como vedada, a quantia recebida indevidamente deve ser recolhida ao Fundo Partidário. Determinada a suspensão do repasse de novas cotas do Fundo Partidário pelo prazo de 1 (um) mês, haja vista as alterações introduzidas pela Lei 13.165/2015, que deram nova redação ao art. 37 da Lei n. 9.096/95, não terem aplicação retroativa a fatos ocorridos antes da sua vigência.

Desaprovação.

(TRE-RS, PC n. 73 27, Relatora Desa. Liselena Schifino Robles Ribeiro 01.12.2015.) (Grifei.)

Conclui-se, desse modo, pelo recebimento de recursos de fonte vedada, no valor de R$ 17.939,92, em descumprimento ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 c/c o art. 5º, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04, falha que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, é capaz de ensejar, por si só, a desaprovação das contas (TSE, AgR-REspe n. 14022/SP, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, DJE de 05.12.2014).

Quanto a essa temática, importa registrar, ainda, que, embora não mais subsista a vedação às doações realizadas por ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que sejam filiados a partido político, por força da nova redação conferida ao art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, essa inovação não tem aplicação retroativa, sob pena de afronta aos princípios da isonomia e da segurança jurídica, como firmado por este Tribunal no julgamento do RE n. 14-97, de relatoria do Dr. Luciano André Losekann, cuja ementa transcrevo a seguir:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, Relator Dr. Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017.)

Por fim, na mesma linha da manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, a irregularidade inicialmente apontada no item “H” do parecer conclusivo, atinente à ausência de destinação do percentual de 5% das verbas do Fundo Partidário para a criação e manutenção de  programas que promovam e divulguem a participação política das mulheres, restou superada com a juntada do Demonstrativo de Despesas e da Nota Fiscal de Serviço n. 130 (fls. 611-612), comprovando ter sido atendido o disposto no art. 44, inc. V, da Lei n. 9.096/95 (Item VII da Análise dos Documentos).

Portanto, no contexto das contas, remanescem falhas que comprometem a regularidade da contabilidade anual do partido, tanto no que se refere aos recursos provenientes do Fundo Partidário quanto aos de natureza diversa, atraindo o juízo de desaprovação das contas.

Os recursos irregularmente movimentados do Fundo Partidário, no montante total de R$ 101.322,64 (soma das quantias de R$ 56.919,45, 3.903,19 e 40.500,00, referidas nos itens III, IV e V da Análise dos Documentos), devem ser transferidos ao Tesouro Nacional, com base no art. 34, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04.

Assim, também, os recursos provenientes de fontes vedadas, no valor de R$ 17.939,92, devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, seguindo critério adotado por este Tribunal a partir do julgamento da PC n. 72-42 (Relatoria da Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, na sessão de 04.5.2016).

Relativamente à suspensão, com perda do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário, cabe ressaltar que as alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15 no texto da Lei n. 9.096/95 não têm aplicação retroativa aos fatos ocorridos antes de sua vigência, na linha da jurisprudência deste Tribunal (RE n. 31-80, Relatoria do Des. Paulo Roberto Lessa Franz, julgado em 08.10.2015) e do Tribunal Superior Eleitoral (RESP n. 65-48, Relator Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 25.8.2016, p. 35).

Idêntica interpretação foi adotada por este Regional ao definir que a penalidade de devolução da importância irregularmente movimentada do Fundo Partidário, acrescida de multa de 20%, mediante desconto nos futuros repasses de quotas ao partido, prevista no caput e § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/95, com o advento da Lei n. 13.165/15, não pode ser aplicada às prestações de contas de exercícios anteriores, como no caso sob exame (AgReg na PC n. 49-62, Relator Des. Carlos Cini Marchionatti, julgado em 27.9.17).

Além disso, este Tribunal, seguindo também a orientação da Corte Eleitoral Superior, em reiterados julgados envolvendo o recebimento de recursos de fontes vedadas, tem entendido pela incidência do § 3º do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos, que, em sua redação original – anterior ao advento das alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15 e em vigor durante o exercício de 2014 – determina a suspensão pelo prazo de 1 a 12 meses, aplicável de forma proporcional e razoável, afastando, assim, o período preestabelecido em 1 ano pelo art. 28, inc. II, da Resolução TSE n. 21.841/04.

No presente caso, os recursos irregularmente movimentados do Fundo Partidário (R$ 101.322,64) representam 56,29% da totalidade dos recursos dessa espécie destinados à agremiação (R$ 180.000,00).

O valor recebido de fontes vedadas (R$ 17.939,92) perfaz 25,08% do total dos Recursos de Outra Natureza (R$ 71.522,03), parâmetro que deve ser utilizado como base de cálculo do referido percentual, devidamente excluídos os recursos do Fundo Partidário por possuírem natureza distinta, segundo orientação do Tribunal Superior Eleitoral (AgR-REspe n. 140-22, Relator Min. Gilmar Mendes, acórdão de 11.11.2014).

Nesse cenário, e dentro de uma escala de proporcionalidade, considerada a composição das irregularidades e os valores nominais e percentuais apurados, os quais não podem ser enquadrados como insignificantes, tenho que a penalidade de suspensão, com perda, do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, pode ser fixada pelo período de 6 (seis) meses, com esteio no art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS), referentes ao exercício financeiro de 2014, com fundamento no art. 24, inc. III, al. “a”, da Resolução TSE n. 21.841/04, determinando:

a) o recolhimento, ao Tesouro Nacional, do valor de R$ 101.322,64 (cento e um mil trezentos e vinte e dois reais e sessenta e quatro centavos), referente às verbas do Fundo Partidário (art. 34, caput, da Resolução TSE n. 21.841/04), bem como da quantia de 17.939,92 (dezessete mil novecentos e trinta e nove reais e noventa e dois centavos), oriunda de fontes vedadas, nos termos da fundamentação; 

b) a suspensão, com perda, do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário, pelo período de 6 (seis) meses, nos moldes do art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95, a contar do trânsito em julgado desta decisão.