MSCiv - 0600035-43.2025.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/05/2025 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

Preliminar de ofício. Fixação de Competência.

Cuida-se de mandado de segurança, impetrado pelo Banco do Brasil S.A., contra ato do magistrado eleitoral titular da 033ª Zona Eleitoral, sediada em Passo Fundo/RS, em resumo, pela requisição de servidora daquela instituição financeira para realizar atividades no Cartório Eleitoral da 033ª ZE.

Inicialmente, tenho por relevante registrar que a competência dos Tribunais Regionais Eleitorais para requisitar servidores de outros órgãos está firmada no art. 5º da Resolução TSE n. 23.523/17 e, especificamente para o exame das contas, no art. 68 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em consequência, a autoridade coatora do ato de requisição poderia ser, forma hipotética, ou (1) o próprio Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, ou (2) titular de Juízo Eleitoral de primeiro grau.

Desse modo, e nos termos do art. 33, inc. I, al. “h”, do Regimento Interno desta Casa, a competência de processar julgar os mandados de segurança contra seus juízes eleitorais cabe ao próprio Tribunal. Vejamos:

Art. 31. Compete ao Tribunal:

I - processar e julgar, originariamente:

(…)

h) os mandados de segurança contra os atos seus, do Presidente e seus outros membros, dos juízes eleitorais e dos órgãos do Ministério Público Eleitoral de primeiro grau; (Grifei).

Passo ao exame da questão de fundo de causa.

Mérito.

O BANCO DO BRASIL S.A., sociedade de economia mista com capital aberto, insurge-se contra decisão proferida pelo Juízo da 033ª Zona Eleitoral, Passo Fundo/RS, no processo SEI n. 0002761-95.2025.6.21.8000. Em resumo, o ato tido como ilegal consiste na expedição do Ofício SEI n. 437/24, datado de 18.10.2024, no qual o juiz Alan Peixoto de Oliveira requisitara a funcionária KELIN DE CARLI DA SILVA BERTON pelo prazo de 2 (dois) anos, para fins do art. 68 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual prevê a requisição de servidores de diferentes órgãos para efetuar o exame das contas eleitorais, nestes termos:

Art. 68. Para efetuar o exame das contas, a Justiça Eleitoral pode requisitar técnicas ou técnicos do Tribunal de Contas da União, dos estados e dos tribunais e conselhos de contas dos municípios, pelo tempo que for necessário, bem como servidoras ou servidores ou empregadas ou empregados públicos do município, ou nele lotados, ou ainda pessoas idôneas da comunidade, devendo a escolha recair preferencialmente naquelas ou naqueles que tenham formação técnica compatível, dando ampla e imediata publicidade de cada requisição (Lei nº 9.504/1997, art. 30, § 3º) .

§ 1º Para a requisição de técnicas ou técnicos e outras colaboradoras ou outros colaboradores previstas(os) no caput, devem ser observados os impedimentos aplicáveis às(aos) integrantes de mesas receptoras de votos, previstos nos incisos de I a III do § 1º do art. 120 do Código Eleitoral .

§ 2º As razões de impedimento apresentadas pelas técnicas ou pelos técnicos requisitadas(os) serão submetidas à apreciação da Justiça Eleitoral e somente poderão ser alegadas até 5 (cinco) dias contados da designação, salvo na hipótese de motivos supervenientes.

Oficiado, o impetrante protocolou manifestação contrária à cedência, a qual foi indeferida pelo Juízo Impetrado nos seguintes termos de fundamentação (ID 45907589):

DESPACHO

Trata-se analisar petição formulada pelo Banco do Brasil S.A. relacionada aos aspectos da requisição da funcionária KELIN DE CARLI DA SILVA BERTON.

Inicialmente importante esclarecer que a presente requisição é lastreada na Lei 9.504/1997, artigo 30, § 3º, esse, devidamente regulamentado pela Resolução TSE n.º 23.607/2019, especificamente no artigo 68, dessa forma, deixo de analisar os demais institutos mencionados na supracitada petição:

Art. 68. Para efetuar o exame das contas, a Justiça Eleitoral pode requisitar técnicas ou técnicos do Tribunal de Contas da União, dos estados e dos tribunais e conselhos de contas dos municípios, pelo tempo que for necessário, bem como servidoras ou servidores ou empregadas ou empregados públicos do município, ou nele lotados, ou ainda pessoas idôneas da comunidade, devendo a escolha recair preferencialmente naquelas ou naqueles que tenham formação técnica compatível, dando ampla e imediata publicidade de cada requisição (Lei nº 9.504/1997, art. 30, § 3º). Grifei.

A servidora em comento está lotada em Passo Fundo e possui formação técnica compatível para realização da análise das contas de campanha.

O julgamento das contas de campanha na esfera da Zona Eleitoral compete ao Juiz Eleitoral, assim, a esse cabe a requisição para o fim específico em apreço.

De outra banda, acolho o pedido no tocante ao prazo de requisição, já que o artigo supramencionado determina que seja “pelo tempo que for necessário”. Logo, não cabe especificar o tempo exato, mas sim, pelo ínterim indispensável. Nesse sentido, informo que esta Zona Eleitoral possui, atualmente, aproximadamente 300 processos de candidatos e partidos para serem analisados e, nessa senda, determino que o Cartório Eleitoral envide esforços para que a tarefa seja realizada o mais brevemente possível e a cada 180 dias informe o andamento da análise, bem como, projeção de término.

Passo Fundo, datado e assinado eletronicamente.

ALAN PEIXOTO DE OLIVEIRA

 

Com a impetração do presente mandamus, inicialmente indeferi o pedido de concessão de medida liminar para suspender imediatamente a requisição, “inaudita altera pars”, ao fundamento de necessidade de esclarecimentos de parte da autoridade coatora, bem como a manifestação ministerial, até mesmo porque se cuida de ato reversível a qualquer tempo.

O Banco do Brasil alega, em suma:

1) a ilegalidade na realização de requisição de funcionária específica, de modo a ferir a  necessária impessoalidade na prática do ato;

2) a ilicitude do prazo estipulado  de 2 (dois) anos, o qual extrapolaria os limites legais fixados para a cessão;

3) a ilegitimidade da instituição para receber requisição da Justiça Eleitoral, por se tratar de pessoa jurídica de direito privado constituída na forma de sociedade de economia mista, de forma a não constar dentre os destinatários das requisições expedidas pela Justiça Eleitoral - destinatários estes que se encontram referidos nas Leis n. 4.737/65 (Código Eleitoral), n. 9.504/97, n. 6.999/82 e n. 13.328/16, ou nos normativos do Tribunal Superior Eleitoral, especificamente as Resoluções TSE n. 23.607/19 e TSE n. 23.523/17, e na Instrução Normativa TRE-RS n. 52/18;

4) a ausência da autorização do Plenário do TRE-RS, prevista no art. 11 da Instrução Normativa TRE-RS n. 52/18.

As informações vindas aos autos, remetidas pelo magistrado eleitoral substituto (ID 45917430) limitaram-se a reproduzir os termos da decisão contra a qual fora impetrado o presente writ e, como já relatado, a d. Procuradoria Regional Eleitoral posiciona-se pela concessão do direito líquido e certo vindicado, ID 45939483.

Pois bem. 

a) Requisição nominal. Possibilidade.

De início (muito embora este Tribunal apenas excepcionalmente utilize requisições modo nominal), afasto a alegação de haver ilegalidade na requisição específica de funcionário, visto constar expressamente tal possibilidade na Resolução TSE n. 23.523/17, art. 3º, parágrafo único: as requisições poderão ser nominais, mediante a indicação do juiz eleitoral ou do tribunal eleitoral, muito embora este Tribunal apenas excepcionalmente utilize a prática de realizar requisições modo nominal.

b) Requisição. Prazo. Necessidade.

Da mesma forma, não viceja ilegalidade no prazo estipulado pela autoridade tida como coatora no ato tido como ilegal, pois o art. 30 da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que a cedência se dará pelo tempo que for necessário.

Antecipo, contudo, que assiste razão ao impetrante quanto ao próximo argumento, suficiente para a concessão da segurança.

Senão, vejamos.

c) Requisição. Sociedade de Economia Mista. Impossibilidade.

A autoridade coatora fundamentou decisões (Ofício SEI n. 437/24, que requisita KELIN DE CARLI DA SILVA BERTON, e Despacho SEI n. 2141007, que rejeita a manifestação do Banco do Brasil) na Lei n. 9.504/97, art. 30, § 3º, e na Resolução TSE n. 23.607/19, art. 68.

Transcrevo:

Lei 9.504/97

Art. 30 (…)

§ 3º Para efetuar os exames de que trata este artigo, a Justiça Eleitoral poderá requisitar técnicos do Tribunal de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, pelo tempo que for necessário.

Resolução TSE n.º 23.607/19

Art. 68. Para efetuar o exame das contas, a Justiça Eleitoral pode requisitar técnicas ou técnicos do Tribunal de Contas da União, dos estados e dos tribunais e conselhos de contas dos municípios, pelo tempo que for necessário, bem como servidoras ou servidores ou empregadas ou empregados públicos do município, ou nele lotados, ou ainda pessoas idôneas da comunidade, devendo a escolha recair preferencialmente naquelas ou naqueles que tenham formação técnica compatível, dando ampla e imediata publicidade de cada requisição (Lei nº 9.504/1997, art. 30, § 3º).

Em síntese, a Lei das Eleições nomina os Tribunais de Contas como órgãos passíveis de serem demandados para cedência de funcionários à Justiça Eleitoral com o objetivo de cooperar na análise das contas – fundamento do ato impetrado. O rol é, de fato, ampliado pela Resolução n. 23.607/19, mas unicamente para incluir órgãos públicos municipais.

Sublinho que o Banco do Brasil S.A. se trata de pessoa jurídica de direito privado - sociedade de economia mista, possui inclusive capital aberto, com ações negociadas em bolsa de valores, de forma que não se enquadra em quaisquer das previsões normativas da espécie. Nessa linha, o órgão ministerial bem pondera que o Banco do Brasil opera em regime de concorrência no setor bancário. Nesse contexto, a retirada compulsória de um funcionário específico pode comprometer gravemente sua eficiência operacional, impactando sua competitividade no mercado bancário e financeiro.

A requisição eleitoral não é absoluta, ainda que fundada na preferência dos serviços eleitorais indicada no art.  365 do Código Eleitoral. Exige a observância dos ditames legais e regulamentares para sua validade, o que não ocorreu no requerimento enviado ao Banco do Brasil S.A. Vale fazer constar, aliás, a precariedade de instrução do processo administrativo SEI n. 0002761-95.2025.6.21.8000, que, pelo dever de fundamentação (também presente nos processos administrativos), haveria de fazer constar a passagem do expediente por votação do Plenário desta Corte ou, havendo, os motivos da dispensa de tal submissão. 

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO para conceder integralmente a segurança ao Banco do Brasil S.A., tornar sem efeito a requisição de KELIN DE CARLI DA SILVA BERTON, realizada pelo Juízo da 33ª Zona Eleitoral de Passo Fundo, e determinar a imediata devolução da funcionária à instituição.

Oficie-se, com urgência, ao Juízo da 033ª Zona Eleitoral, acompanhado do interior teor da presente decisão.