REl - 0600542-58.2024.6.21.0058 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/05/2025 às 14:00

VOTO

1. Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos processuais, razão pela qual dele conheço.

2. Da documentação juntada em sede recursal

Acerca da juntada de novos documentos após a sentença, no âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar no curso da instrução, quando, da sua simples leitura, restar sanada a irregularidade, sem a necessidade de realização de nova análise técnica.

Potencializa-se, assim, o direito de defesa, especialmente quando a documentação mostra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de forma a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha (TRE-RS - REl n. 060026527 BOM JESUS/RS Relator Mario Crespo Brum, Julgamento em 21.02.2025, Publicação DJE-37 de 26.02.2025; e TRE-RS- PCE n. 060363225 PORTO ALEGRE/RS Relator Francisco Thomaz Telles, Julgamento em 29/01/2025, Publicação DJE-19 em 31.01.2025).

Assim, conheço da documentação acostada.

3. Mérito

Como relatado, ELISABETE RITTER DE VARGAS SILVA interpõe recurso em face de sentença que desaprovou sua prestação de contas relativa ao pleito de 2024, aplicou multa e determinou o recolhimento de R$ 17.000,00 ao Tesouro Nacional, porquanto configurado (a) o atraso na abertura de conta bancária, (b) o uso de recursos de origem não identificada (RONI), (c) a extrapolação do limite permitido para autofinanciamento, e (d) divergência entre as despesas registradas pela candidata e os extratos bancários.

O voto, adianto, será por manter em sua quase integralidade a bem-lançada sentença de primeiro grau. Em outras palavras, ínfimo reparo merece a douta decisão, pelas razões que passo a expor.

3.1. Da abertura extemporânea da conta bancária

O art. 8º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que o candidato, após a concessão do CNPJ de campanha pela Receita Federal do Brasil, tem 10 dias para providenciar a abertura de conta bancária específica para realizar a movimentação financeira de campanha.

A recorrente recebeu seu CNPJ em 12.08.2024 e inaugurou sua conta bancária em 12.09.2024, ou seja, 30 dias após a designação do CNPJ.

Conquanto a recorrente indique que o atraso na abertura da conta se deu em função de falha no sistema bancário, consta do ID 45894364 que o início do trâmite se deu em 05.09.2024, aliás, informação esta referida pela própria candidata no apelo.

A par desses marcos temporais, ainda que considerada fosse a data de 05.09.2024, a abertura tardia estaria confirmada.

Portanto, remanesce a falha.

3.2. Do uso de recursos de origem não identificada (RONI)

A recorrente, em ofensa ao disposto no art. 32 da Resolução TSE n. 23.604/19, aplicou R$ 17.000,00 em sua conta de campanha, sem identificar a origem do aporte.

No intuito de demonstrar as fontes da cifra percebida, a candidata alega ter recebido doações em espécie de apoiadores e que, somadas as contribuições, por ela foram depositadas em conta, tese que vem ratificada por declarações firmadas pelos ditos doadores (ID 45894365).

Malgrado a alegada fé pública pela recorrente atribuída às declarações acostadas, os atestados, nos moldes em que apresentados, é cediço, ostentam caráter unilateral, desprovidos, assim, da força probatória necessária a infirmar o entendimento exarado pelo juízo singular.

Mais a mais, de salientar que o art. 21, inc. I e § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 elege como meio válido para o ingresso de doações apenas a transferência entre contas ou o cheque nominal e cruzado, modalidades distintas da apresentada nos autos.

Com esses contornos, entendo não comprovada a origem do valor depositado em conta, devendo o montante de R$ 17.000,00 ser recolhido ao erário, em atenção ao § 4º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19.

3.3. Da extrapolação do limite de autofinanciamento

O limite para o uso de recursos próprios em campanha é de 10% do teto de gastos definido para o cargo pretendido. Em específico, para o pleito proporcional em Vacaria/RS, o termo para despesas foi de R$ 47.478,40, com limitador de autofinanciamento em R$ 4.747,84, de acordo com o art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e Portaria TSE n. 593/24.

No caso dos autos, de um total de recursos próprios de R$ 25.300,00, abatidos R$ 17.000,00 a título de recursos de origem não identificada (item 3.2), restam R$ 8.300,00 destinados pela recorrente a sua conta de campanha, a indicar a superação do limite de aportes pessoais em R$ 3.552,16 (R$ 8.300,00 – R$ 4.747,86).

Não há irresignação quanto ao ponto.

Desse modo, nenhum reparo à sentença ao impor multa sobre a quantia aplicada em excesso.

Relativamente à ponderação quanto ao valor envolvido para fins de mitigação, ou não, do juízo de reprovação, tal aspecto será examinado ao final da presente análise.

3.4. Da divergência entre as despesas registradas pela candidata e os extratos bancários

Os extratos bancários da conta utilizada para a movimentação financeira da recorrente indicam que os recursos de campanha foram empregados em sua totalidade (R$ 25.300,00).

Todavia, o valor das despesas declaradas pela candidata destoa dos registros bancários.

A recorrente, visando sanar tal mácula, retificou suas contas em duas ocasiões e, ainda, colacionou documentação com o apelo.

A primeira adequação relata despesas no valor de R$ 23.791,52.

A segunda modificação, não analisada pela unidade técnica, pois não observado o regramento eleitoral para sua apresentação, aponta gastos no montante de R$ 24.698,33.

Ou seja, em nenhuma das situações o somatório de gastos alcança os R$ 25.300,00 que ingressaram em conta e foram utilizados em sua integralidade, conforme extratos.

Todavia, tenho que a documentação acostada traz luz ao ponto.

O primeiro item dirimido é a diferença entre as despesas consignadas nas prestações retificadoras.

Do cotejo entre a primeira retificação, examinada pela órgão técnico, e a segunda, não avaliada, há uma diferença de R$ 906,85.

De acordo com a prestadora, a divergência decorre de 3 despesas, antes não relacionadas, mas que aportaram ao feito quando da segunda modificação, são elas:

- R$ 289,00, destinados a Igor M Souza Moraes para a confecção de jingle de campanha, ID 45894347 e 45894385;

- R$ 350,00, pagos a Mariano Telles da Fonseca por atividades de militância, ID 45894346 e 45894384; e

- R$ 267,85, ao Posto Julio, na aquisição de combustível, ID 45894345 e 45894383.
 

A roborar o sustentado no ponto pela recorrente, as transações constam identificadas nos extratos eletrônicos disponíveis no sistema Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais desta Justiça Especializada.

Consequentemente, a meu ver, merece guarida a declaração firmada com a segunda retificação da contabilidade, com despesas no valor de R$ 24.698,33, porquanto comprovados os gastos de forma satisfatória.

Resolvida a questão entre os gastos declarados nas contas retificadoras, passo à irregularidade propriamente dita, ou seja, a diferença entre as despesas consignadas pela prestadora e o valor constante nos extratos bancários.

O total de despesas, conforme registro eletrônico, foi de R$ 25.300,00, ao passo que o declarado pela recorrente foi de R$ 24.698,33, ou seja, há uma diferença de R$ 601,67.

Em nota explicativa, consta que tal dissonância se refere a serviço de impulsionamento junto ao Facebook, contratado pela candidata no valor de R$ 1.000,00 em créditos a serem utilizados no decorrer da campanha.

Entretanto, refere a prestadora que, da cifra destinada à divulgação de sua campanha, foram utilizados apenas R$ 398,33 em créditos.

Com efeito, a tese encontra respaldo na documentação acostada e nos extratos, pois identificado o pagamento de R$ 1.000,00 ao Facebook em 23.9.2024, período de campanha; e emitida nota pela empresa no valor de R$ 398,33, em 02.10.2024, momento da finalização do pleito.

Outrossim, adequada a destinação da diferença de R$ 601,67 de créditos não utilizados ao diretório municipal da agremiação, em consonância com o art. 35, § 2º, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, que determina que os gastos com impulsionamento “são aqueles efetivamente prestados, devendo eventuais créditos contratados e não utilizados até o final da campanha serem transferidos como sobras de campanha”.

Nesse particular, verifica-se que a recorrente comprovou a contento a destinação das verbas de campanha, conforme especificação abaixo, que bem sintetiza o entendimento aqui alcançado:

- R$ 25.300,00 ingressaram em conta;

- R$ 24.698,33 foram utilizados no pagamento de despesas;

- R$ 601,67, restantes, em razão da utilização de apenas R$ 398,33 dos R$ 1.000,00 em créditos destinados ao impulsionamento de campanha pelo Facebook, foram transferidos ao partido na localidade.

Desse modo, entendo sanada a irregularidade.

4. Conclusão

Em suma, sanada a irregularidade envolvendo gastos sem comprovação, persistem as falhas atinentes à abertura de conta bancária em atraso, recebimento de recursos de origem não identificada (RONI) e extrapolação do limite de autofinanciamento.

Quanto ao uso de RONI, cabe à recorrente transferir R$ 17.000,00 ao erário.

Em relação à extrapolação do limite de autofinanciamento, a recorrente juntou antecipadamente aos autos o comprovante de pagamento da multa no valor de R$ 532,82, equivalente a 15% do montante excedido, cumprindo, dessa forma, a determinação da decisão de origem.

Desse modo, os vícios, somados, perfazem R$ 17.532,82, montante que representa 69,29% do total de recursos auferido, de R$ 25.300,00, e superam, em valores absolutos e percentuais, os parâmetros utilizados por esta Corte para mitigar o juízo de reprovação das contas.

Em suma, como já referido, estou encaminhando o voto no sentido de dar parcial provimento  ao recurso, tão somente para, face à documentação ainda que intempestivamente apresentada, reputar esclarecida a divergência entre as despesas registradas pela candidata e os extratos bancários, único ponto, por sinal, em desacordo com alentado Parecer da douta Procuradoria da Regional Eleitoral. Excetuando esse aspecto, ficam de resto incorporados ao voto todos os demais argumentos explicitados no referido Parecer acerca das controvérsias postas.

5. Dispositivo

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, tão somente para afastar a irregularidade relacionada à divergência entre as despesas registradas pela candidata e os extratos bancários, mantida a sentença de desaprovação das contas, mormente em relação ao atraso na abertura da conta de campanha, à multa imposta pelo excesso do limite de autofinanciamento, já paga, e ao recolhimento de R$ 17.000,00 ao Tesouro Nacional, a título de recursos de origem não identificada.

É o voto.