REl - 0600952-63.2024.6.21.0011 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/05/2025 00:00 a 09/05/2025 23:59

VOTO

Preliminarmente, os recorrentes arguem nulidade do feito, alegando cerceamento de defesa, pois não teria sido oportunizada a oitiva da sua testemunha Jackson Wissmann, arrolado nas contestações (ID 45821659 e 45821663).

Em contrarrazões, a coligação recorrida entende que, em razão do rito célere imposto na Lei das Eleições (art. 40-B da Lei n. 9.504/97) e sendo eminentemente documental a prova, não haveria necessidade de produção de prova testemunhal.

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, lembra que o rito para a presente representação está inserido no art. 96 da Lei n. 9504/97 e que, apoiado em jurisprudência consolidada deste Tribunal, não há previsão de audiência para oitiva de testemunha nesse procedimento.

Com efeito, penso que há necessidade de ponderar, no caso concreto, entre os direitos fundamentais da ampla defesa e da duração razoável do processo. Nesse sentido, o rito estabelecido na lei eleitoral garante proporcionalmente a prestação jurisdicional adequada no curto espaço de tempo no período eleitoral, permitindo o exercício da ampla defesa e do contraditório ao exigir demonstração documental dos fatos, mesmo sem prever produção de prova oral, respectivamente conforme os arts. 40-B e 96 da Lei n. 9.504/97:

Art. 40-B. A representação relativa à propaganda irregular deve ser instruída com prova da autoria ou do prévio conhecimento do beneficiário, caso este não seja por ela responsável. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

Art. 96. Salvo disposições específicas em contrário desta Lei, as reclamações ou representações relativas ao seu descumprimento podem ser feitas por qualquer partido político, coligação ou candidato, e devem dirigir-se:

I - aos Juízes Eleitorais, nas eleições municipais;

II - aos Tribunais Regionais Eleitorais, nas eleições federais, estaduais e distritais;

III - ao Tribunal Superior Eleitoral, na eleição presidencial.

§ 1º As reclamações e representações devem relatar fatos, indicando provas, indícios e circunstâncias.

(...)

§ 5º Recebida a reclamação ou representação, a Justiça Eleitoral notificará imediatamente o reclamado ou representado para, querendo, apresentar defesa em quarenta e oito horas.

§ 6º Tratando-se de reclamação ou representação contra candidato, a notificação poderá ser feita ao partido ou coligação a que pertença.

(Revogado pela Lei nº 9.840, de 1999)

§ 7º Transcorrido o prazo previsto no § 5º, apresentada ou não a defesa, o órgão competente da Justiça Eleitoral decidirá e fará publicar a decisão em vinte e quatro horas.

§ 8º Quando cabível recurso contra a decisão, este deverá ser apresentado no prazo de vinte e quatro horas da publicação da decisão em cartório ou sessão, assegurado ao recorrido o oferecimento de contra-razões, em igual prazo, a contar da sua notificação.

(…)

Além disso, os recorrentes não demonstraram efetivo prejuízo com a ausência da prova, nem mesmo apontam a sua relevância para o deslinde do feito.

Nesse sentido, lembro a posição consolidada deste TRE no sentido de que “Não caracterizada a nulidade do feito por falta de coleta de prova oral, haja vista a celeridade do rito previsto para as representações por descumprimento à Lei das Eleições”: 

Recurso. Representação. Pesquisa eleitoral. Internet. Facebook. Eleições 2016. Matéria preliminar afastada. 1. O art. 33 da Lei n. 9.504/97, que dispõe sobre os requisitos legais para realização de pesquisa eleitoral, não restringe a aplicação de multa a pessoas jurídicas ou empresas. Reconhecimento da legitimidade passiva do recorrente, pessoa física. 2. Não caracterizada a nulidade do feito por falta de coleta de prova oral, haja vista a celeridade do rito previsto para as representações por descumprimento à Lei das Eleições. Ademais, despicienda a produção de prova testemunhal quando reputada como desnecessária ou meramente protelatória. A simples referência à investigação de intenções de voto desprovida de qualquer dado concreto, a exemplo do número de entrevistados, período de realização, margem de erro, comparativos, índices, entre outros, não se equipara à divulgação de pesquisa eleitoral, conforme já assentado por este Tribunal. No caso, referência a resultados de pesquisa eleitoral por meio de postagens com privacidade restrita no Facebook. Circunstância que restringe a publicação a amigos cadastrados e não de modo público, sem repercussão capaz de induzir ou manipular a vontade do eleitor. Inexistência de elementos suficientes para caracterizar a publicação como divulgação de pesquisa eleitoral no moldes conceituais exigidos pelo art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97. Reforma da sentença. Multa afastada. Provimento.

(TRE/RS, Recurso Eleitoral n. 16810, Relator Desembargador Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, Publicação: DEJERS, 27/03/2017) (Grifou-se.)

 

Portanto, rejeito a preliminar de nulidade.

Passo à análise do mérito.

Trata-se de recurso interposto por DARCI JOSE LAUERMANN e por BRIZAIDA SILOT RAMIREZ STAUDT, então candidatos aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeita de São Sebastião do Caí/RS, contra a sentença que julgou parcialmente procedente a representação ajuizada contra a COLIGAÇÃO UNIDOS PELA RECONSTRUÇÃO e aplicou multa de R$ 53.205,00, na forma do art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, em razão de divulgação em seus perfis de campanha no Instagram, com conteúdo de pesquisa irregular, sem prévio registro na Justiça Eleitoral, mediante a republicação do perfil de Vinicius Koepsel Cruz:

 

Sinteticamente, em sua defesa, os recorrentes negam a disponibilização e a autoria do conteúdo inquinado.

Por sua vez, a sentença pondera que os recorrentes “divulgaram em seus perfis na rede social Instagram (perfis @djninni_koepsel; @darciebrizaida”), em 30.9.2024, pesquisa eleitoral sobre os cargos em disputa em eleições majoritárias no município de São Sebastião do Caí em 2024”.

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, entende que o ônus probatório da “inocorrência da postagem em apreço” pertence aos recorrentes.

Contudo, entendo que, no ponto analisado, não se trata de fato impeditivo, modificativo ou extintivo a ser demonstrado pelos recorrentes, mas o que está sendo negada é a existência da própria publicação.

Nesse passo, não há como exigir prova negativa do recorrente, representando mero reforço de argumentação o vídeo juntado pela defesa, na tentativa de demonstrar a ausência do conteúdo ora em análise em suas redes sociais, no ID 45821660.

A propósito, o ônus de demonstrar que a publicação efetivamente existiu compete ao representante-recorrido mediante a instrução da petição inicial, no caso de manifestação em ambiente de internet, com a identificação do endereço da postagem, no âmbito e nos limites técnicos de cada serviço (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN); e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representada ou representado é a sua autora ou o seu autor, na forma determinada no art. 17, inc. III, da Resolução TSE n. 23.608/19:

(...)

Art. 17. A petição inicial da representação relativa à propaganda irregular será instruída, sob pena de não conhecimento:

(...)

III - no caso de manifestação em ambiente de internet, com a identificação do endereço da postagem, no âmbito e nos limites técnicos de cada serviço (URL ou, caso inexistente esta, URI ou URN) e a prova de que a pessoa indicada para figurar como representada ou representado é a sua autora ou o seu autor, sem prejuízo da juntada, aos autos, de arquivo contendo o áudio, a imagem e/ou o vídeo da propaganda impugnada. (Redação dada pela Resolução nº 23.672/2021)

(...)

Nesse sentido, a única identificação do endereço da postagem (URL) reflete publicação no stories do perfil do representado Vinicius Koepsel Cruz, cuja responsabilidade foi expressamente afastada em sentença.

Todavia, não vislumbro na inicial o mesmo cuidado em aferir a identificação da postagem por seu endereço eletrônico no perfil dos representados, ora recorrentes. Aliás, a única prova da publicação consiste em impressão de tela (print) da publicação inquinada, o que não é suficiente para comprovar a autoria e a existência do conteúdo no perfil dos recorrentes.

Sobre esse tema, ademais, este TRE, para o pleito de 2024, ao analisar a alegação de impossibilidade de apresentar a URL devido à natureza efêmera da publicação na rede social (story), reafirmou que a informação é obrigatória, na peça inicial, pois permite a aferição pelo julgador da efetiva disponibilização do conteúdo inquinado no ambiente da Internet e da sua autoria, conforme precedente de relatoria do Excelentíssimo Desembargador Mario Crespo Brum que colaciono:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO ENDEREÇO DA POSTAGEM - URL. INSTRUÇÃO DEFICIENTE DA PETIÇÃO INICIAL. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso eleitoral interposto contra sentença que extinguiu representação por propaganda eleitoral irregular sem julgamento de mérito, com fundamento na ausência de indicação do endereço da postagem (URL), conforme o disposto no art. 17, III, da Resolução TSE n. 23.608/19.

1.2. A representação trata de suposta propaganda eleitoral irregular consubstanciada em vídeo publicado por candidato ao cargo de vereador em rede social, no formato de story, o qual, nos termos da petição inicial, teria divulgado que o então candidato a prefeito havia sido condenado pelo crime de favorecimento à prostituição e que a recorrente seria conivente com a situação.

1.3. A recorrente alegou a impossibilidade de apresentar a URL devido à natureza efêmera da publicação na rede social (story), argumentando que a vasta documentação apresentada aos autos supriria tal exigência.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. A controvérsia consiste em: (i) verificar se a ausência de indicação da URL nas representações por propaganda eleitoral na internet, ainda que a postagem tenha sido temporária, justifica a extinção do processo sem julgamento de mérito; (ii) analisar se a documentação apresentada pela recorrente supriria o requisito legal para instrução da inicial.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. O art. 17, inc. III, da Resolução TSE n. 23.608/19 exige, para o conhecimento da representação por propaganda eleitoral irregular na internet, a indicação do endereço da postagem. Informação obrigatória através da qual o órgão judicial poderá aferir se ficou demonstrada a efetiva disponibilização do conteúdo no momento em que acessada a página da internet.

3.2. A jurisprudência é consolidada no sentido de que a ausência do endereço da postagem na petição inicial de representação relativa à propaganda irregular, não suprida por outros meios idôneos de prova, conduz à extinção do processo sem resolução de mérito.

3.2. O simples link direcionado ao Google Drive, em que armazenada suposta extração da postagem, não assegura a certeza quanto ao teor e à efetiva publicação daquele conteúdo, nem que a parte representada seja, de fato, a autora das publicações.

3.3. Na espécie, não atendido o art. 17, inc. III e § 2º, da Resolução TSE n. 23.608/19. Incerteza sobre a disponibilização e autoria do conteúdo. Impossibilidade de prosseguimento da análise do material para verificar sua legalidade e o impacto que poderia causar na formação da opinião do eleitorado. Inviabilidade do próprio processamento da ação. Manutenção da sentença.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: "A ausência de indicação de endereços das postagens em representação por propaganda eleitoral irregular inviabiliza o conhecimento da petição inicial, justificando a extinção do processo sem resolução do mérito."

Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.608/19, art. 17, incisos I e III, § 2º; Código de Processo Civil, art. 485, inc. IV.

Jurisprudência relevante citada: TRE-CE, RE n. 060044458, Acórdão, Des. Daniel Carvalho Carneiro, PSESS, 15.10.2024; TRE-MG, RE n. 060008459, Acórdão, Des. Júlio César Lorens, PSESS, 09.10.2024; TRE-BA, RE n. 060017106, Acórdão, Des. Ricardo Borges Maracajá Pereira, PSESS, 14.10.2024.

(TRE/RS, REl n. 0600636-82.2024.6.21.0162, Relator Desembargador Mario Crespo Brum, Publicação: DJE, 30/01/2025).

Destaco que, no julgado acima ficou assentado o ônus processual do representante em comprovar o endereçamento eletrônico da publicação, não sendo suficiente para um juízo condenatório apenas o print da postagem em rede social, ainda que efêmera, a partir do seguinte argumento:

Veja-se que a recorrente tomou conhecimento da publicação quando esta se encontrava em divulgação no Instagram, o que lhe possibilitava ter preservado a URL respectiva.

Não se trata aqui de ciência posterior à publicação temporária, o que lhe impediria de preservar o endereço eletrônico e, por conseguinte, poderia fazer a prova mediante outros elementos.

Nessa linha, apenas a apresentação do print e vídeo da publicação do não é prova suficiente da sua divulgação na rede social Instagram.

Quanto ao vídeo constante no link apresentado na petição inicial, este sequer contém alguma indicação do local ou sítio em que teria sido publicado ou veiculado, de modo que seria necessária a apresentação da URL da sua alegada divulgação.

Posto isso, a recorrente não atendeu ao requisito do art. 17, inc. III, da Resolução TSE nº 23.608/19, de forma que foi correta a sentença que extinguiu o processo, sem julgamento do mérito.

Logo, constato a incerteza sobre a disponibilização e autoria do conteúdo da suposta pesquisa nos perfis dos recorrentes nas redes sociais em razão da falta de condição essencial da formação da presente ação, a indicação precisa do endereço eletrônico (URL ou outro meio) que permita ao Judiciário a correta compreensão dos fatos.

Dessa forma, divirjo do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, pois entendo não comprovada a existência do fato, em face da não apresentação do respectivo endereço eletrônico do conteúdo publicado pelos recorrentes, motivo pelo qual merece reforma a sentença para julgar improcedente a presente representação em relação aos recorrentes Darci José Lauermann e Brizaida Silot Ramirez Staudt e afastar as penalidades impostas.

ANTE O EXPOSTO, rejeito a material preliminar e VOTO pelo provimento do recurso.